Porta fechada

Creche municipal não tem obrigação de matricular irmãs gêmeas

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25 de maio de 2004, 10h51

O Poder Judiciário até pode discutir questões de orçamento dos municípios. Mas não é possível impor aos órgãos públicos obrigação de fazer que importe gastos, sem que haja rubrica própria para atender à determinação.

O entendimento foi firmado pela 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que desobrigou a direção da Creche Municipal de Vila Basiléia, em São Paulo, de matricular duas irmãs gêmeas com pouco mais de três anos. A decisão foi unânime.

O Ministério Público de São Paulo entrou com Mandado de Segurança na Justiça paulista buscando obrigar o governo da capital e a creche municipal de Vila Basiléia a matricular as duas irmãs. O Tribunal de Justiça considerou que, embora a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente prevejam o atendimento em creche e pré-escola para as crianças de zero a seis anos como dever do Estado, não cabe ao Judiciário se ingerir no poder discricionário do Executivo.

Para os desembargadores, a matéria envolve questões de orçamento e disponibilidade de dinheiro público com dotação específica a efetivação da medida. Com essa tese, indeferiu o pedido, o que levou o Ministério Público a recorrer ao STJ.

A ministra Eliana Calmon, relatora do recurso, considerou que o Estatuto da Criança e do Adolescente, nos artigos 54 e 208, complementa a determinação constitucional que impõe ao Estado o dever de atender com creche e pré-escola as crianças até seis anos. Assim está previsto no capítulo “Da Proteção Judicial dos Interesses Individuais, Difusos e Coletivos”.

Além disso, não se pode esquecer a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que estabelece a gratuidade do ensino fundamental. “Com efeito, há, para o governo, obrigação de atender, em qualquer caso, ao ensino fundamental. De referência à educação infantil, não existe prioridade, principalmente porque, nos programas de educação pré-escolar, cabe ao município atuar com cooperação técnica como obrigatória e gratuita”, ressaltou a ministra.

A ministra afirmou também que não se pode mais aceitar o entendimento de que não cabe ao Judiciário intrometer-se nas questões orçamentárias do município, “mas também não é possível impor aos órgãos públicos obrigação que importe gastos, sem que haja rubrica própria para atender à determinação”.

A ministra negou o pedido do Ministério Público. Para ela, o MP mostrou que o município tem obrigação, sendo direito de todas as crianças exigir o cumprimento dessa obrigação. Contudo não demonstrou as condições para a realização dessas obrigações.

O ministro Franciulli Netto, que acompanhou o voto da relatora, afirmou que o Ministério Público pode e deve fiscalizar todas as vezes que houver abuso ou desvio no cumprimento dessas normas, mas daí a impor especificamente que sejam feitas matrículas ou que se abram vagas, a distância é enorme.

Para o ministro João Otávio de Noronha, também da 2ª Turma, a educação é tarefa do Estado, não só do município, cabendo contribuição tanto de verbas federais como do Estado. “Estaríamos jogando todo o ônus no município, que já pode estar com todo o seu orçamento sobrecarregado e dependeria, para efetividade dessa medida – volto a dizer que não estou falando de dois casos, falo no geral – de verbas outras oriundas do Estado ou da própria União”. (STJ)

Resp 503.028

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