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Advogados e juízes do Trabalho carregam o mesmo fardo

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17 de maio de 2004, 17h23

Após a revista ConJur haver publicado artigo de minha autoria a respeito da situação dos serviços na Justiça do Trabalho (http://conjur.uol.com.br/textos/27060/), notei que foi divulgado como artigo, editorial subscrito pelo Presidente da Amatra II (http://conjur.uol.com.br/textos/27100/) manifestando a posição de que “lamenta as declarações do Advogado João José Sady”.

Mais acertado, penso eu, seria lamentar os fatos que relatei em minhas declarações que, aliás, só reafirmam o que já havia dito em artigo anterior, também, na ConJur (http://conjur.uol.com.br/textos/24079/) quanto às causas da calamidade: “A dificuldade principal é a falta de mão de obra. As varas mais recentes foram criadas sem criar novas vagas para funcionários que nelas se ativassem. Despojaram as preexistentes, deslocando servidores de um lugar para o outro. Na antiga política do “cobertor curto”, descobriram o pé e não conseguiram cobrir o peito. Mesmo os claros gerados pelas aposentadorias não estão sendo supridos por falta de recursos orçamentários. Entre os funcionários remanescentes, mais da metade está acometida de doenças ósteomusculares causadas pelo trabalho, resultando num estado de semi-invalidez”.

A alegada razão da resposta da Amatra é a de que o meu artigo teria retratado uma irreal situação de “calamidade pública”. No entanto, reconhece que o judiciário trabalhista em São Paulo faz audiências, promove acordos, produz sentenças mas, não está conseguindo executar suas próprias decisões. Como diz o artigo da Amatra: se o processo não é despachado, é porque faltam magistrados. Se a decisão não é cumprida, é porque faltam funcionários. A nota apresenta o mesmo retrato constante em meu artigo mas, parece ressentir-se do fato de que é um advogado a fazer tal descrição. Nas palavras da Amatra, o cenário chama-se “dureza de nosso dia-a-dia” mas, o mesmo cenário em meu artigo, seria um “engodo”.

A Advocacia, data maxima venia concessa, tem todo o direito de comentar, por exemplo, as deficiências do prédio novo porque sem a participação das nossas entidades não haveria prédio. É certo que o edifício somente chegou a ser inaugurado em virtude dos esforços sobre-humanos da atual Presidente do Tribunal mas, não se pode esquecer de que nós advogados tivemos decisiva atuação para que o governo federal não abandonasse a construção e as nossas entidades intervieram por diversas vezes para ajudar a trazer verbas para ultimar a obra. Da mesma forma, fomos nós advogados que saímos às ruas, em comícios e passeatas quando se propunha a extinção da Justiça do Trabalho. E a Advocacia é que foi desenterrar o projeto de lei de criação de novos cargos, estacionado na CCJ da Câmara e conseguiu fazê-lo caminhar para diante.

Talvez, a palavra calamidade seja imprópria para descrever este quadro, o mais importante é quadro e não a palavra que o resume. Por outro lado, nós já escrevemos vezes sem contas para elogiar o esforço desmedido de juízes e servidores para fazer operar aquela máquina deteriorada. No entanto, se é certo que juízes e servidores suportam uma carga pesada, é certo, também que nós advogados arcamos com um fardo do mesmo tamanho. Talvez, até um pouco maior, porque a paralisia da máquina inviabiliza o nosso sustento sem diminuir “a dureza do dia a dia” e faz com que venhamos a sofrer uma estressante pressão de nossos clientes. O cidadão comum se comunica com o aparelho judiciário através dos advogados e é nestes ouvidos que vem depositando toda sua fúria diante da violação de seu direito a um serviço público de mínima qualidade.

Assim, é preciso que todos os membros da família forense percebam que as nossas palavras não visam atingir ou crucificar a ninguém e nem muito menos intentam expandir nossa popularidade. É preciso que a deterioração destes serviços e as causas deste sucateamento não fiquem como segredos bem guardados entre juízes e advogados mas, ao contrário, sejam compartilhadas e até alardeadas, aos jurisdicionados.

O Tribunal não conseguirá resolver os seus problemas de verbas pelos caminhos meramente burocráticos e os horizontes orçamentários somente virão a ampliar-se se nós convencermos o povo e os seus representantes, de que a situação é grave e que somente será remediada com mais verbas. Então, é preciso falar a este respeito e não, apenas, cerrar os dentes e continuar a padecer deste suplício interminável. A denuncia deste estado de calamidade não é uma “farpa pública” contra o Judiciário mas, a melhor colaboração que a advocacia pode prestar para que se possa sair deste atoleiro. Até hoje, não se avançou quase nada pelos esforços praticados dentro dos muros. Ao contrário, os avanços somente foram possíveis quando se obteve o apoio da opinião pública. Assim, por meu lado, também, lamento as declarações contidas no referido editorial.

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