Linhas cruzadas

Cade permite volta com restrições da TII ao controle da BrT

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30 de junho de 2004, 19h45

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica, por unanimidade, decidiu pela volta, com restrições, da Telecom Italia ao controle da Brasil Telecom, confirmando a virada de jogo a favor da empresa italiana, sinalizada nos meios políticos e anunciada pela Consultor Jurídico na segunda-feira, dia 28.

Apesar de reconhecer “a dificuldade prática e buscando um equilíbrio tênue”, o conselheiro-relator Fernando de Oliveira Marques manteve a Medida Cautelar, concedida em março, na queda de braço entre a Telecom Itália e suas sócias na Brasil Telecom, com importantes alterações.

A Telecom Itália continua impedida de indicar diretores e de exercer o direito a veto, mas pode indicar membros para o Conselho de Administração, desde que sejam independentes e que nunca tenham exercido qualquer atividade na empresa italiana.

Nas reuniões do Conselho, o presidente deverá elaborar pautas separadas, quando se tratar de SMP, LDI e LDN, ou seja, telefonia celular e ligações de longa distância internacional e nacional, áreas onde conflitam os interesses da Telecom Italia e da Brasil Telecom.

As duas empresas têm um ano para eliminar a sobreposição de licenças de telefonia móvel e de ligações de longa distância.

Com essas medidas o Cade entendeu que estarão asseguradas na esfera concorrencial as informações estratégicas e sensíveis de mercado. O Conselho, que em março havia corrigida uma decisão de Anatel que conflitava com a Lei Geral de Telecomunicações, recuou agora e permitiu que a TII volte a participar do controle de sua concorrente, a BrT.

A medida cautelar continua valendo até que o Cade defina o mérito da questão, mas nada está decidido ainda.

Sob o ponto de vista societário, a questão está sendo analisada pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em ação interposta pela Telecom Itália. Ao mesmo tempo, o Grupo Opportunity, outro dos sócios da BrT, levou a questão para a Câmara de Arbitragem de Londres, órgão previsto no Acordo de Acionistas para dirimir dúvidas em questões societárias.

Leia a integra da Medida Cautelar:

MEDIDA CAUTELAR nº 08700.000018/2004-68

(Apensada aos atos de concentração nº 53500.002400/2004 e Ato de Concentração n.º53500.005049/2003, conexos).

REQUERENTE : CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA (CADE) – “EX OFFICIO” E ANIMEC.

REQUERIDAS : Telecom Itália International N.V., Techold Participações S.A., Timepart Participações Ltda., e Solpart Participações S.A.

TERCEIRA INTERESSADA: Brasil Telecom S.A.

ADVOGADOS : Pedro Dutra, Eduardo Caminati Anders, Kevin Mundie, Arnoldo Wald, Ivo Waisberg, Marcus Vinícius Vita Ferreira, Sérgio Bermudes, Robson Goulart Barreto, Djenane Lima Coutinho, Fábio Amaral Figueira, Cláudia Domingues Santos, Daniela Fonseca Arreguy, Danielle Toscano e Hermida e outros.

CONSELHEIRO-RELATOR: Fernando de Oliveira Marques

Ementa: Pedido de Reconsideração. Conhecido e Provido parcialmente. Medida Cautelar concedida no Despacho Gab.FOM n.10/04, especificamente no tocante à vedação da participação da TII nos temas STFC (LDI e LDN) e SMP no Conselho de Administração da Solpart, Brasil Telecom Participações S.A. e Brasil Telecom S.A. A TII poderá retornar, somente ao Conselho de Administração, na esteira da decisão veiculada no Informe ANATEL n.155/2004/PVCPC/PVCP/SPV-PBCPD/PBCP/SPB e visando-se tão somente a garantia / preservação dos interesses envolvidos nos investimentos de alto vulto de capital empregados, aos blocos de controle das empresas Solpart, Brasil Telecom Participações S.A. e Brasil Telecom S.A., desde que: (i) somente indique Conselheiros, na forma do Aditivo ao Acordo de Acionistas de 2002 (fls.2055/2132), abstendo-se totalmente de indicar diretores à quaisquer delas; (ii) somente participe, por meio dos Conselheiros que vier a indicar na forma do Aditivo ao Acordo de Acionistas de 2002, das deliberações em matérias que não guardem qualquer tipo de relação (direta) aos serviços de STFC (LDI e/ou LDN) e/ou SMP; (iii) os elaboradores das pautas de reuniões dos Conselhos de Administração, ou seja, seus respectivos presidentes, separem os temas em pautas diversas, (iii.a) uma suscetível à participação da TII, por meio dos Conselheiros que indicar, nos termos do Aditivo ao Acordo de Acionistas de 2002, (iii.b) outra não suscetível (vedada) ao comparecimento por parte de referidos Conselheiros, indicados pela TII, sendo estas últimas devidamente fundamentadas por escrito por parte de seus elaboradores; (iv) nas reuniões não suscetíveis de participação dos Conselheiros indicados pela TII, os temas abordados, necessariamente, deverão dizer respeito aos serviços de STFC (LDI e/ou LDN) e/ou SMP e temas diretamente relacionados, sendo estes últimos, necessariamente, ligados aos principais em aspectos de estratégia concorrencial, tal como orçamentos para campanhas de marketing e planos de investimento em desenvolvimentos de produtos, ativos (lato sensu), instrumentos, tudo isto em síntese, voltado ao desenvolvimento das atividades de STFC (LDI e/ou LDN) e/ou SMP. Imposição de multa diária para a hipótese de descumprimento de qualquer das determinações contidas na medida cautelar ora mantida, na forma dos Despachos Gab.FOM 10/04 e 14/04, com acolhimento dos itens acima relativos ao pedido de reconsideração.


DESPACHO GAB. FOM N.28/04

(Versão Pública)

1. DA PRELIMINAR:

Instada a se manifestar sobre o Pedido de Reconsideração, trouxe a ANIMEC ao feito a alegação da existência de uma prejudicial de mérito, impossibilidade jurídica do pedido, a uma, sustentando que a decisão que veiculou a medida cautelar, através do Despacho Gab.FOM n.10/04, homologado pelo Conselho, não subsiste como decisão singular, mas sim como decisão coletiva do Conselho, restando, assim impossibilitada sua re-análise pelo Relator do feito, porquanto já esgotada essa possibilidade quando da homologação do Despacho pelo Plenário, a duas, porque a Lei de Processos Administrativos no âmbito da administração pública federal não é aplicável no caso em apreço por estar inserido em procedimento regido por lei específica (Lei 8.884/94), senão vejamos:

“1. Apóia-se a Telecom Itália no art.56 da Lei 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da administração pública federal, para oferecer o pedido de reconsideração ao Despacho Gab. FOM n.010/2004.

2. Há, d.v., um equívoco manifesto na pretensão, pois a decisão singular proferida pelo em. Conselheiro Relator foi referendada pelo Plenário desse Conselho. A decisão singular não subsiste como decisão singular, mas sim como decisão coletiva do Conselho.

(…)

4. Importa ressaltar que se tivesse o em. Conselheiro Relator deferido o pedido de liminar sem submeter tal decisão ao referendo do Conselho, ai sim, d.v., poder-se-ia cogitar do cabimento do pedido de reconsideração dirigido ao Conselheiro, que, caso não reconsiderasse a decisão singular, encaminharia para o Conselho examinar o recurso.

(…)

6. Se o em. Conselheiro Relator não tivesse submetido sua decisão singular ao referendo do Plenário, poderia a Telecom Itália interpor o recurso para o Plenário, nos termos do inciso VI, do art.7º, da Lei n.8884/94, reclamando a reconsideração para o Relator.

7. Mas, conforme anunciado, a Telecom Itália apoiou seu pedido de reconsideração no art.56 da Lei 9.784/99 que dispõe sobre o cabimento de recurso de uma instância para outra na administração

8. Esse dispositivo pressupõe, necessariamente, o recurso contra uma decisão de uma autoridade para a instância hierarquicamente superior.

(…)

10. Ora, no caso sob exame não poderá o em. Conselheiro Relator ‘reconsiderar’ a decisão coletiva do Plenário.

(…)

13. Desse precedente jurisprudencial se pode extrair, ainda, outra conclusão plenamente aplicável ao caso sob exame, qual seja, a de que as regras contidas na Lei 9.784/99 não tem aplicação ao processo administrativo do CADE, por expressa previsão na própria Lei 9.784/99, quando esta excepciona sua aplicação nos processos administrativos regidos por disciplina própria: art.69. Os processos administrativos específicos continuarão a reger-se por lei própria, aplicando-se-lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta Lei.

14. Ora, o processo administrativo do CADE está disciplinado na Lei n.8.884/94 e neste diploma legal o legislador determinou a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil (art.83).

15. Não é possível, portanto, d.v., invocar-se a aplicação da Lei 9.784/99 de forma subsidiária ao processo administrativo do CADE – pelo menos da forma como foi reclamada pela Telecom Itália – porque incompatível com o regramento legal existente a pretensão ‘pedido de reconsideração’ contra a decisão proferida pelo Plenário desse Conselho.

16. Está a se exigir assim o indeferimento liminar do pedido de reconsideração, porque se trata de pedido juridicamente impossível.” (fls.2547/2552). (destaquei).

Antes de ponderar os argumentes que sustentam a alegação de impossibilidade jurídica do pedido, esposada na manifestação da ANIMEC, lembro que o procedimento que rege a Medida Cautelar no âmbito deste Conselho está posto na Resolução CADE n.28/02, a qual prevê como se dá o procedimento de decisão inicial de concessão da medida bem como a possibilidade de sua revisão, a saber:

Art.1º A medida cautelar poderá ser deferida de ofício, pelo Relator ou pelo Plenário, ou em virtude de requerimento escrito e fundamentado da SEAE, SDE, Procuradoria do CADE ou qualquer legítimo interessado no ato de concentração analisado.

15. A revogação ou revisão parcial da medida cautelar e do APRO sempre será possível, seja por iniciativa do CADE ou por provocação do interessado, quando se verificar alteração nos requisitos que ensejaram a sua concessão ou celebração.

Ora, como se pode verificar nos dispositivos acima, contrapostos às alegações da ANIMEC, a revogação ou revisão parcial da medida cautelar é possível ao CADE, seja por iniciativa própria, enquanto guardião do interesse público jazido em sua atividade em defesa da concorrência, seja por provocação de interessado, descabendo aqui a forma como se deu referida provocação, desde que pertinente e oportuna. E, assim, considero o ‘pedido de reconsideração’ da TII como uma típica provocação de um sujeito diretamente interessado no feito que traz à baila a eventual verificação de adequação e calibração da medida cautelar em voga para um melhor atendimento ao interesse público, representado, aqui, na defesa da concorrência, do mercado, dos consumidores e da economia nacional.


Para tanto, retiro respaldo do parecer da Procuradoria Geral do CADE (fls.), a saber:

“2. Em vista disso, tenho como tranqüila a aplicabilidade, ao caso, do disposto no artigo 15 da Resolução CADE n° 28/2002, que disciplina as medidas cautelares do Conselho:

‘Art. 15- A revogação ou revisão parcial da medida cautelar e do APRO sempre será possível, seja por iniciativa do CADE ou por provocação do interessado, quando se verificar alteração nos requisitos que ensejaram a sua concessão ou celebração.’

A revogabilidade, diga-se, é prevista no artigo 6° da mesma Resolução, ao facultar a concessão da cautelar, nos seguintes termos:

‘Art. 6°- A medida cautelar conserva a sua eficácia até o fim do julgamento do mérito do ato de concentração pelo Plenário do CADE, podendo, porém, a qualquer momento, ser revogada ou ter o seu conteúdo modificado.’

Tais dispositivos guardam conformidade com a natureza dos provimentos cautelares, por definição provisórios e deferidos mediante cognição sumária dos elementos da causa, e como tais reconhecidos pelo Código de Processo Civil —aplicável ao processo administrativo concorrencial por força do artigo 83 da Lei 8884/94 —, cujo artigo 807 admite expressamente a revogação ou modificação das medidas cautelares:

‘Art. 807- As medidas cautelares conservam a sua eficácia no prazo do artigo antecedente e na pendência do processo principal; mas podem, a qualquer tempo, ser revogadas ou modificadas.’

A respeito da modificação da medida cautelar, comenta Humberto Theodoro Jr.:

‘A decisão de processo cautelar é sempre provisória por repousar sobre fatos mutáveis. A permanência de seus efeitos fica, por isso mesmo, subordinada à continuidade do estado de coisas no qual se assentou.

Alterados os fatos, modifica-se a base da decisão cautelar, que ao se amoldar a eles pode exigir modificação ou mesmo revogação da medida cautelar deferida.’ (Processo Cautelar, São Paulo, Edição Universitária de Direito, 8ª edição, 1986)

Acrescente-se o comentário de Antônio Cláudio Costa Machado no que respeita ao procedimento:

‘(…) a revogação, como a modificação, não exige ação e processo incidente, podendo o juiz concedê-las por simples decisão nos próprios autos após oitiva da parte contrária (normalmente tais pedidos são feitos pelo requerido em contestação)’ (Código de Processo Civil Interpretado, Saraiva, 3ª, 1997).

3. Considerando que os documentos apresentados pelas partes e interessadas inovaram na matéria fática do processo, concluo pela admissibilidade do pedido de reconsideração, com fundamento no artigo 15 da Resolução CADE n° 28/2002.

Afasto, portanto, os fundamentos do artigo 5°, XXXIV, a, da Constituição Federal, bem como o artigo 56 da Lei 9784/99, tendo em vista a existência de norma específica a reger a matéria, e a consagrada máxima de interpretação, segundo a qual a regra especial prevalece sobre a geral.

Entendo, ainda, inexistir afronta ao artigo 50 da Lei 8884/94, no caso, considerando não se tratar, a medida cautelar de decisão definitiva, mas de decisão provisória, mediante juízo de cognição sumária, revogável e modificável, nos termos da regulamentação própria do CADE, com amparo na disciplina processual civil correspondente.

No que concerne ao procedimento aplicável, entendo que, em se tratando de modificação da medida cautelar concedida, a competência é do Conselheiro-relator, sujeita a homologação do Conselho, nos termos dos artigos 6° e 7° da Resolução n° 28/02”. (fls.)

Desta forma, com base nos argumentos acima esposados e fortalecidos pelo quanto trazido à baila pela Procuradoria Geral do CADE, rejeito a preliminar levantada pela ANIMEC, bem como seus fundamentos, para declarar saneado o feito e prosseguir sua análise.

2. DA PREMISSA DA ANÁLISE EM SEDE CAUTELAR:

Tal como destacado no item anterior, o procedimento que rege a medida cautelar está posto na Resolução CADE n.28/02, na qual, reforçando a natureza específica desse expediente processual cautelar, positivara-se:

Art.3º A concessão de medida cautelar ocorrerá, fundamentadamente, nas situações em que estiverem presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, face a tutela da defesa da concorrência.

Eis aqui a premissa básica de análise do presente pedido de reconsideração, ou, da hipótese de revogação ou revisão parcial da medida cautelar concedida no Despacho Gab.FOM n.10/04: a precariedade e a natureza perfunctória / não exauriente da presente análise, que se pauta em crivo de verossimilhança das alegações fundamentando uma atuação do CADE pautada no poder geral de cautela.

Para tanto, mantenho os fundamentos relativos ao fumus boni iuris e periculum in mora esposados no Despacho Gab.FOM n.10/04, o qual veiculou a medida cautelar objeto do presente pedido de reconsideração, os quais transcrevo abaixo:


“XLIX. Posta a análise nesses foros, é inegável a possibilidade de abalo concorrencial no segmento de telecomunicações, indicativa de provável supressão de concorrência no setor, notadamente no que concerne : a) aos serviços de telefonia SMP – Serviço Móvel Pessoal, na Região II do Plano Geral de Outorgas, que abrange o Distrito Federal e os estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins, Rondônia e Acre e b) aos serviços de chamadas LDN – Longa Distância Nacional e LDI – Longa Distância Internacional, em todo o território nacional.

L. Entendo presente, em vista de tais razões, o fumus boni iuris a justificar que ao menos nesta fase do processo se busque preservar o status concorrencial com a preservação concorrencial e atuação independente da Brasil Telecom e da Telecom Itália, até que se ultime a análise dos atos de concentração 53500.002400/2004 e 53500.005049/2003, ao fim dos quais será possível autorizar (com ou sem restrições), ou vetar, a depender das circunstâncias apuradas, as operações notificadas.

LI. Desse modo, acolho os precisos fundamentos dos órgãos pareceristas no que concerne ao fumus boni iuris, donde passo a sublinhar o seguinte.

LII. Do parecer da SDE : “Assim sendo, verifica-se que a atual configuração, tanto do mercado de serviços SMP quanto de STFC, nas modalidades LDN e LDI, têm a BrT e a TIM como concorrentes diretas. Considerando tratar-se de um mercado com elevadas barreiras à entrada, como mencionado acima, conjugado com o número de players, o nível de acesso a informações que a qualidade de acionista indireto da BrT conferiria à TIM, viabiliza a utilização de tais informações de modo a mitigar as relações de concorrência que se estabeleceriam entre elas. Assim, observa-se que o acesso a informações entre concorrentes pode tornar-se um instrumento de alteração do nível de concorrência nos mercados em tela, o que é prejudicial, conforme já exposto nesta exordial, tanto ao mercado, objeto de proteção da Lei 8.884/94, como aos consumidores, o que evidencia a presença do requisito de fumus boni iuris”.

LIII. Do parecer da SEAE: “Note-se que o direito fundamental a ser protegido com a suspensão da operação até o julgamento do mérito pelo CADE é o bem-estar econômico dos consumidores. (…) A aplicação do poder geral de cautela não é estranho à Lei 8.884/94; pelo contrário, a prevenção está contemplada de forma genérica, ampla e expressa no artigo 9º, incisos III e IV, ao conferir aos ilustres Conselheiros do CADE competência para determinar as diligências que se fizerem necessárias ao exercício de suas funções, bem como adotar medidas preventivas, fixando o valor da multa diária pelo seu descumprimento. Tais dispositivos legais conferem ao Conselheiro o poder geral de cautela para preservar as relações de mercado até a decisão final do Processo, garantindo a perfeita instrução do feito a ser realizada pela Secretaria de Acompanhamento Econômico e pela Secretaria de Direito Econômico, ou por outros órgãos instados pelo Conselheiro a apresentar seus posicionamentos. (…) Desta forma, conclui esta Secretaria que o pedido da Representante, no que tange à suspensão da operação até o julgamento definitivo do mérito, encontra-se amparado em fundamentado fumus boni iuris.”

LIV. E, por fim, da A. Procuradoria-Geral do CADE : “O retorno da TII ao Grupo de controle da Solpart (Brasil Telecom), mesmo com algumas restrições impostas pela Anatel, não afasta a alteração no modo concorrencial entre as empresas, pois não vejo como uma empresa possa ter acesso aos dados e informações comerciais de sua concorrente e deixe de decidir em matérias estratégicas e as condições da concorrência permanecerem intactas. É certo que a percepção da concorrência entre as empresas se modificam” (sic).

LV. Julgo presente, portanto, o requisito do fumus boni iuris, e anoto que desse entendimento só discrepou o parecer ministerial, que num tal contexto, restou como posição isolada nestes autos, não sendo suficiente a abalar a convicção ora demonstrada, dado mesmo que a opinião ali articulada não tem caráter vinculante.

LVI. De outro lado, é manifesto o periculum in mora, ante a possibilidade de imediato,/u> retorno da TII ao grupo de controle da Solpart / Brasil Telecom, ao que se vê dos documentos trazidos aos autos, mormente tendo em conta o aforamento de ação perante a 4ª Vara Empresarial da Comarca do Rio de Janeiro que, apenas sob o enfoque societário, pretende outorgar à TII liminarmente o direito de retornar ao Grupo de Controle da Brasil Telecom.

LVII. Essa a interpretação que se extrai da eloqüente redação do dispositivo contratual (cláusula 5.1, antes referida), que afirma categoricamente que as “Seções Suspensas” – vale dizer, as relativas ou decorrentes da operação anterior de saída da TII / TIM – “dispostas na Seção 4 supra serão automática e imediatamente restauradas a pleno efeito e vigência sem a necessidade de outra ação pelas Partes aqui representadas, devendo ser a partir de então observadas e reforçadas pelas Partes, seus respectivos diretores, representantes e designados, incluindo sem limitações, o Presidente da Assembléia de Acionistas ou das Reuniões do Conselho de Administração da Companhia, Companhia Controladora ou Companhia Operacional pertinentes”.

LVIII. Trago à colação, outrossim, em tema de periculum in mora, a percuciente análise articulada nos judiciosos pareceres que seguem.

LIX. Pela SDE: “Nesse contexto, a efetivação da operação poderá ocasionar alterações irreversíveis ou de difícil reparação no processo concorrencial nestes mercados, que poderão tornar a decisão do presente feito completamente inócua, pois jamais terá o condão de restabelecer a situação anterior (status quo ante). Desse modo, entende-se que a medida cautelar se faz necessária para evitar os ditos danos irreparáveis ou de difícil reparação ao mercado, trazidos pela união de esforços entre a Requerente, passíveis de ocorrer pelo tempo demandado para a análise do feito pelo SBDC. Destarte, verifica-se o preenchimento in totum do requisito do periculum in mora.”

LX. Pela SEAE: “O que importa destacar aqui é que uma eventual reversão do ato, uma vez imitida a Telecom Itália no exercício das atribuições que pleiteia, poderá ser tarde demais, pois ainda que seja a Telecom Italia posteriormente afastada do controle da Solpart, as informações acima referidas poderão já estar em mãos da TIM, sendo então irreparável o dano causado à livre e justa competição no mercado relevante. Desta forma, conclui esta Secretaria que o pedido da Representante, no que tange à suspensão da operação até o julgamento do mérito, encontra-se fundamentado no que tange ao periculum in mora” (sic)

LXI. Pela d. Procuradoria autárquica (excerto da conclusão) : “Entendo que o fumus boni iuris e o periculum in mora se caracterizam pelo retorno da TII ao Grupo de Controle da Brasil Telecom, a qual terá poder de gestão, mudando o ambiente concorrencial entre as empresas, conforme já mencionado, e pela possibilidade de irreversibilidade da operação, tendo em vista que a demora no julgamento do ato de concentração, relativo ao retorno da TII ao Grupo da Brasil Telecom, poderá gerar danos irreparáveis ou de difícil reparação ao mercado de telefonia. Diante do exposto, conclui-se que se constata nos autos elementos suficientes para configurar o fumus boni iuris e o periculum in mora necessários para o deferimento da medida cautelar” (fls.1036/1064).


Desta feita, afastadas quaisquer prejudiciais à análise do presente, bem como estabelecidas as premissas básicas naturais ao procedimento cautelar em apreço, passo a avaliar o objeto do pedido de reconsideração.

3. BREVE HISTÓRICO DO OBJETO:

Trata-se, como exposto no Relatório, de Pedido de Reconsideração de Medida Cautelar concedida (Despacho Gab.FOM n.10/04) no bojo de uma operação sui generis em que a Telecom Italia International N.V.(TII) visa exercer unilaterlamente o direito de retornar ao bloco de controle da Solpart Participações S.A. (Solpart), controladora, por sua vez, da Brasil Telecom S.A.

Tal retorno, previsto no Aditivo ao Acordo de Acionistas da Solpart Participações S.A. (Solpart) de 27 de agosto de 2002 e apresentado aos órgãos de defesa da concorrência (Ato de Concentração nº 53500.002400/2004), foi inicialmente questionado pela ANIMEC (Associação Nacional de Investidores do Mercado de Capital) junto à Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e a este E. CADE. A ANIMEC aponta os possíveis impactos regulatórios e concorrenciais que a coincidência de outorgas para operar o SMP (Serviço Móvel Pessoal) e a longa distância nacional e internacional do STFC (Serviço Telefônico Fixo Comutado), decorrentes deste ato de concentração, poderão gerar; e solicitou a este E. CADE a concessão de Medida Cautelar paralisando a operação até que este E. Plenário se manifeste finalmente sobre o mérito da questão. Após a análise dos fatos, o Plenário do CADE concedeu a Medida Cautelar, em 17 de março de 2004, na esteira do exarado no Despacho Gab. FOM n.10/04.

3.1. Histórico do setor:(1)

Por ocasião da privatização do Sistema Telebrás, a Telecom Itália, juntamente com a Techold Participações S.A. (Techold) e Timepart Participação Ltda (Timepart), passou a deter o controle da Brasil Telecom por meio da sociedade Solpart, por sua vez, controladora da Brasil Telecom Participações S.A. (Brasil Telecom Participações ou BTP).

Em 2001, as sociedades hoje reunidas na TIM Celular S.A (TIM) adquiriram licenças para a prestação do SMP nas regiões I, II e III do Plano Geral de Autorizações do SMP (PGA); e do STFC nas modalidades Longa Distância Nacional (LDN) e Internacional (LDI) nas regiões I, II e III do Plano Geral de Outorgas (PGO). A TIM é controlada pelo grupo Telecom Itália que também controla a TII. Dadas as relações de controle e coligação da Telecom Itália com a Brasil Telecom e considerando o art. 16 do PGA do SMP, a TIM só poderia iniciar suas atividades quando a BrT tivesse cumprido suas obrigações de universalização e expansão previstas para dezembro de 2003. A BrT, entretanto, não havia antecipado o cumprimento de tais metas, restando à Telecom Itália as seguintes opções: (i) aguardar o cumprimento, pela Brasil Telecom, das metas de universalização; ou (ii) deixar de participar do bloco de controle da BrT para que a TIM pudesse imediatamente iniciar a exploração do SMP.

A TII optou pela segunda alternativa acima descrita, alienando à Timepart e à Techold, em 27 de agosto de 2002, ações ordinárias da Solpart correspondentes a 18,29% do capital votante da BrT, suspendendo seus direitos societários na cadeia societária da Brasil Telecom através da celebração do Acordo de Acionistas da Solpart. Esta alienação foi aprovada pela Anatel (Ato nº 23.190), encontrando-se ainda sob análise no CADE, na forma do Ato de Concentração nº 53500.005049/2002.

No entanto, o Aditivo ao Acordo de Acionistas da Solpart, datado de 27 de agosto de 2002, aprovado pela Anatel, previa que a suspensão de todos os direitos de controle da TII na Solpart prevaleceria até a ocorrência de qualquer um dos seguintes eventos (“Evento Causador”):

“(a) O advento de 1º de janeiro de 2004;

(b) A publicação, por parte da Anatel, da certificação do cumprimento de metas de universalização fixadas para 31 de dezembro de 2003 pela Brasil Telecom;

(c) A ocorrência, após a aprovação da Operação pela Anatel, de novo impedimento, decorrente de lei, Regulamentação, decisão administrativa ou judicial superveniente (incluindo, mas não limitando, medidas liminares) que impeça: (i) a prestação do Serviço Móvel Pessoal – SMP, pela TIM Brasil S/A, ou suas subsidiárias, em razão da Telecom Italia International (STET) na Solpart; ou (ii) A Telecom Italia International (STET) de manter os efeitos e a validade da venda e transferência das ações à TIMEPART e à TECHOLD.”

Ocorre que, após a retirada da TII de seu bloco de controle, a BrT adquiriu em novo processo de licitação promovido pela Anatel, o direito para prestar o SMP na Região II do PGA-SMP e o STFC nas modalidades LDN e LDI nas Regiões I, II e III do PGO. A TIM, por sua vez, também adquiriu autorizações para exploração de LDN e LDI nas regiões I, II e III do PGO.


Enquanto a BrT aguardava da Anatel a publicação da certificação da antecipação do cumprimento das obrigações de universalização e expansão, a Telecom Itália solicitou anuência prévia da Anatel para retornar ao grupo de controle da BrT. Tal anuência foi concedida pela Anatel, sob determinadas circunstâncias, e encontra-se em análise em referida Agência Reguladora sob o Ato de Concentração nº 53500.002400/2004, o qual deverá ser remetido ao CADE para apreciação final. A Anatel certificou a antecipação do cumprimento de metas pela BrT.

É justamente sobre este último ato de concentração, que prevê a recompra das ações da Solpart pela TII e a restauração de seus direitos políticos (que voltaria então a participar do controle da BrT), que trata a presente medida cautelar.

3.2. Posicionamento da Anatel:

A Anatel se manifestou sobre o caso em questão por meio do Ato nº 41.780, de 16 de janeiro de 2004. Este ato, a partir da verificação do cumprimento das metas de universalização e qualidade da BrT:

(i) expediu autorizações à Brasil Telecom para explorar o STFC nas modalidades local e longa distância nacional nas Regiões I e III e Setores 20, 22 e 25 da Região II do PGO; e na modalidade longa distância internacional nas Regiões I, II e III do PGO;

(ii) determinou ao Superintendente de Serviços Privados da Anatel que outorgasse à Brasil Telecom Celular S.A (Brasil Telecom Celular ou BTCel), mediante autorização, o uso das radiofreqüências necessárias à prestação do SMP na Região II;

(iii) anuiu com a operação de retorno da Telecom Italia International ao grupo de controle da Solpart Participações S.A e ao da Brasil Telecom S.A com as restrições ali estabelecidas.

Considerando que, diante destes atos, haveria superposição de outorgas entre as duas operadoras, o que aponta para um conflito de regulamentação do setor de telecomunicações, a Anatel estabeleceu o prazo máximo de 18 meses, contatos a partir da data de publicação do referido ato, para que o Grupo Telecom Itália e o Grupo Brasil Telecom, detentores de autorizações e concessões para a prestação do STFC, nas modalidades longa distância nacional e internacional em todo País e do SMP na Região II, adotem as medidas necessárias para que deixe de haver superposição de outorgas nas Regiões I, II e III do PGO e na Região II do PGA-SMP, sob pena de aplicação das sanções previstas na legislação.

A Anatel determinou também que, enquanto prevalecer esta superposição, a TII fica impedida de participar, direta ou indiretamente, em todas as instâncias decisórias, das deliberações sobre matérias relacionadas a estas outorgas. O Ato da Anatel estabelece ainda que suas disposições não eximem as partes envolvidas do cumprimento de obrigações junto a outras entidades.

Posteriormente, em 14 de abril de 2004, a Anatel se manifestou sobre o pedido de reconsideração da medida cautelar adotada pelo CADE formulado pela TII. A posição da agência, não obstante, reconheça os problemas regulatórios e concorrenciais, é favorável ao pedido de reconsideração, alegando que as decisões contidas no Ato nº41.780 afastam, no seu entender, “as hipóteses que pudessem constituir elementos de fumus boni iuris e periculum in mora que porventura viessem a existir caso a TII fosse impedida de voltar ao controle da Solpart e caso a Brasil Telecom não pudesse iniciar a operação comercial do SMP”. (Informe da Anatel nº 155 de 14 de abril de 2004, pág. 23).

3.3. Posicionamento do Ministério Público Federal:

Na mesma linha, manifestou-se o órgão ministerial (fls.1206/1222) pelo acolhimento integral do Pedido de Reconsideração, por entender que a questão já teria sido objeto de decisão da Anatel. Sustentando, outrossim, (i) a sugestão de introduzir um Acordo de Preservação de Reversibilidade da Operação (APRO) como medida eficaz voltada a sanar o feito até que se decida em definitivo suas questões de mérito; bem como (ii) a instauração de um conflito de atribuições entre CADE, Anatel e CVM, a ser resolvido pelo Conselheiro-Relator.

Com relação à sugestão do APRO, tratarei mais à frente, ao passo que, quanto à instauração de um conflito de atribuições a ser por mim, Relator do feito, resolvido, vejo que não se está diante de situação nesse sentido. Vale dizer, tal como será mais à frente considerado, não há um conflito de atribuições entre o CADE e a Anatel, vez que são órgãos revestidos de competências e finalidades distintas, o primeiro visando tutelar a concorrência e o segundo regular o mercado de telecomunicações. Trata-se da relação / interface da regulação geral com a regulação setorial. Quanto menos se diga existente um conflito entre estes dois órgãos e a CVM, revestida de competência diversa do CADE e da Anatel, não tendo sido, em nenhum momento mencionada nos autos. O que não impede que, para exaurir a busca pelo atendimento máximo ao interesse público em jogo, seja oficiada para opinar sobre a decisão ora esposada.


3.4. Posicionamento da SEAE/MF:

Informando (fls.2688) que não constatou a presença de fatos novos no feito a partir da expedição de seu primeiro parecer em atenção ao pedido de Medida Cautelar, a SEAE/MF absteve-se de tecer novas considerações mantendo as incialmente exaradas acerca da Medida Cautelar para o presente pedido de reconsideração.

3.5. Posicionamento da SDE/MJ:

Na esteira de seu primeiro parecer, exarado em atenção ao pedido de medida cautelar, pronunciou-se a SDE/MJ no sentido de manter referida medida contanto que fosse re-adequada ao contexto do presente processo, a saber:

“Conforme referido, em sua manifestação anterior a pedido do CADE, esta SDE recomendou a concessão de Medida Cautelar, por ter vislumbrado a possibilidade de a operação sob análise ocasionar alterações irreversíveis na dinâmica concorrencial nos mercados envolvidos. Identificados, na ocasião, o fumus boni iuris e o periculum in mora, sugeriu-se uma ação de caráter preventivo por parte do SBDC, com vistas a evitar a ocorrência de danos irreparáveis à coletividade.

Após análise das considerações da ANATEL, da documentação adicional e dos pareceres técnicos encaminhados pelas empresas envolvidas, esta SDE reitera seu entendimento no sentido de que estão presentes os elementos fumus boni iuris e o periculum in mora, que justificaram a concessão de Medida Cautelar.

Contudo, examinando tais documentos e pareceres, esta SDE concluiu que os remédios propostos anteriormente possivelmente não tenham sido os mais adequados para atender às preocupações concorrenciais identificadas, razão pela qual esta SDE houve por bem, em razão da solicitação do CADE, manifestar-se novamente para reiterar seu entendimento, mas sugerir a adoção das medidas abaixo referidas.

Diante dos fatos narrados e cumulativamente às medidas adotadas pela ANATEL, sugere esta SDE que se determine-se à TII, ou a qualquer outra empresa do Grupo Telecom Itália, que se comprometa a:

a- não exercer o direito previsto nos itens 4.4 e 4.5 do Acordo de Acionistas da Solpart, conforme aditado pelas partes em 27 de agosto de 2002, especificamente não indicar, nomear, votar, eleger ou substituir diretores, sob qualquer denominação, na Solpart, na Brasil Telecom Participações S.A. (doravante denominada “BrT Par”) e na BrT, como não indicar pessoas para serem nomeadas, pelos Conselhos de Administração, para ocupar qualquer cargo das diretorias da Solpart, da BrT Par e da BrT;

b- ao executar o disposto nos itens 4.2 e 4.3 do Acordo de Acionistas de 2002, eleger, indicar ou escolher para cargos dos Conselhos de Administração da Solpart, BrT Par e BrT, conselheiros independentes, de forma que nenhuma dos indicados seja diretor, conselheiro, administrador ou funcionário, direta ou indiretamente, de empresa ou entidade do Grupo Telecom Itália;

c- abster-se a TII de exercer, por si ou por meio dos membros dos conselhos de administração da Solpart, da BrT Par ou da BrT, por meio dos seus representantes, o direito de veto previsto nos itens 4.8.6, 4.8.6.1 e 4.8.6.2 do Acordo de Acionistas de 2002, em matérias que digam respeito à prestação do Serviço Telefônico Fixo Comutado, nas modalidades de longa distância nacional e internacional, nas Regiões I, II e III pela BrT, ou do Serviço Móvel Pessoal na Região II, pela Brasil Telecom Celular;

d- abster-se a TII de requerer ou buscar acesso, na qualidade de acionista, a estudos, relatórios, papéis ou documentos, de qualquer natureza, ou a arquivos eletrônicos, que tratem do desenvolvimento e atividade da BrT, relativos à prestação do STFC, nas modalidades LDN e LDI, nas Regiões I, II e III, bem como da Brasil Telecom Celular, relativos à sua entrada e operação no mercado de SMP na Região II; e

e- abster-se a TII de praticar, por si ou por meio dos membros dos conselhos de administração ou dos seus representantes nas reuniões prévias de acionistas, qualquer ato que vise obstar ou impedir, por qualquer meio, a independência e separação operacional e comercial da Brasil Telecom Celular em relação à BrT.

Sem prejuízo das recomendações acima, as quais visam neutralizar eventual falseamento da concorrência em virtude de o Grupo Telecom Itália vir a ter acesso a informações estratégicas da BrT, é importante ressaltar que, especialmente no que tange à letra “b”, o desempenho das atividades do membro do conselho de administração, nos termos da Lei 6.404/76 (Lei das Sociedades por Ações), exige que ele aja de forma imparcial, sempre no interesse da companhia.

(…)

Diante de todo o exposto, acredita-se que a adoção das medidas supra referidas sejam suficientes para evitar o falseamento da concorrência até que a sobreposição de outorgas venha ser resolvida, especialmente, considerando-se a recomendação de (i) que o conselheiro seja independente e (ii) tal como sugerido pela ANATEL, que TII fique impedida de participar, em todas as instâncias decisórias, das deliberações da BrT sobre matérias relacionadas as outorgas de SMP, LDI e LDN, enquanto se mantiverem as sobreposições.


Outrossim, caso o CADE entenda que a medida acima sugerida não seria suficiente para evitar que o Grupo Telecom Itália viesse a ter acesso a informações da BrT que poderiam implicar falseamento de concorrência, o CADE poderia sugerir que, quando da discussão e/ou deliberação de determinadas matérias em reuniões do Conselho de administração, a serem especificadas, o membro do conselho de administração indicado pela TII não participaria de tais reuniões, desde que este E. Conselho entenda que tal recomendação não viole norma cogente.” (fls.2699/2708). (destaquei).

Assim, ante a melhor decodificação da realidade do presente feito, proporcionada pelo enriquecimento informacional trazido pelas várias reuniões e diligências em seu bojo realizadas, opina a SDE/MJ pela melhor adequação da medida cautelar.

3.6. Posicionamento da Procuradoria do CADE:

De forma análoga à SDE/MJ, a Procuradoria Geral do CADE opina por uma melhor adequação da medida cautelar em voga, entendendo que:

“3. Quanto ao mérito, após presenciar os extensos debates e esclarecimentos produzidos pelas partes e interessadas, concluo, sumariamente, assistir razão à postulante Telecom Itália Internacional, no que diz respeito à extensão dos efeitos da medida cautelar concedida.

A questão apresenta três dimensões, uma societária, uma regulatória e uma concorrencial. Esta última, a mais restrita delas, deveria ser a única atingida pelo exercício das atribuições do CADE, ainda que possa ser tormentoso traçar a linha divisória entre as três dimensões.

De toda forma, observo, consoante a manifestação da ANATEL produzida em 14 de abril de 2004, que a agência reguladora ressalvou o alcance da vedação como sendo as matérias relacionadas às outorgas, isso é, as decisões relativas aos mercados de SMP e STFC-LDI e LDN.

O Ato n° 41.780, de 16.1.2004, em seu artigo 10, dispôs:

‘Art. 10- Estabelecer que, enquanto permanecerem as superposições das mencionadas outorgas, a Telecom Itália Internacional N.V., direta ou indiretamente, fica impedida de participar, em todas as instâncias decisórias, das deliberações sobre matérias relacionadas a estas outorgas.’

Frisou-se, posteriormente, a importância da “manutenção do sigilo das informações relativas às operações do SMP e do STFC LDN e LDI da BrT Celular e da Brasil Telecom S/A”, de modo a evitar o conflito de interesses.

Os modos de implementação dessa diretriz foram buscados na fase de tentativa de definição de solução consensual, tendo sido sugerida a abstenção, pela Telecom Itália, da indicação de Diretores, e da prática de atos que importem conhecimento ou participação em matérias relacionadas às outorgas em questão.

Tais entendimentos indicam a pertinência da reconsideração da medida cautelar, de modo a ajustá-la ao escopo da atuação do Conselho, nos lindes do direito concorrencial.

A definição mais precisa da forma de execução da decisão caberá ao Conselheiro-relator, em seu despacho, sujeito à homologação do Conselho.

São as observações que ofereço à consideração do ilustre Conselheiro Fernando de Oliveira Marques”. (fls.2690/2698)

Sugere então a Procuradoria Geral do CADE um ajustamento da medida cautelar ao escopo de atuação deste E. Conselho.

4. DO MERCADO RELEVANTE CONTEXTO DA PRESENTE AÇÃO ANTITRUSTE EM SEDE CAUTELAR:

Atentando para a dimensão e complexidade deste caso, parti a uma análise mais aprofundada do que seria a base e o foco da presente ação antitruste adotada por este E.Conselho. Tomo para tanto uma nova definição prévia do mercado relevante in casu, seja na ótica do produto quanto na ótica geográfica, para que seja possível realizar um “corte cirúrgico” no quanto pertinente à defesa da concorrência e no quanto transcendente à competência deste E. Conselho.

Como de praxe e em respeito ao viés inegavelmente pragmático da perspectiva antitruste, colho dos fatos e dos ditos pelos envolvidos no feito os indícios suficientes à definição prévia (porquanto em sede cautelar) do mercado relevante em questão, a saber:

“O Grupo Telecom Itália, através da TIM, detém as autorizações para a prestação de SMP nas Regiões I, II e III do PGO. Detém, ainda, autorizações para a prestação dos serviços de LDN e LDI em todo o território nacional.

A BrT, como visto, detém (i) através da BrT Cel, autorização para explorar o SMP na Região II do PGO; e (ii) outorgas para explorar os serviços de telefonia fixa LDI e LDN em todo o País. Nota-se, portanto, que o Grupo Telecom Itália é concorrente direto da BrT, tanto no mercado de SMP (Região II do PGO), como no mercado de STFC, nas modalidades de LDN e LDI em todo o território nacional. Com a volta ao controle, a TII exercerá poderes políticos, nomeando diretores, possuindo cadeiras no Conselho de Administração e tendo acesso às informações privilegiadas.”(2) (destaquei).


No mesmo sentido, mas de forma contundente:

“Como ressaltado pela ANATEL, a operação em questão envolve quatro mercados relevantes distintos: (I) o mercado de SMP; (II) o STFC local; (III) o STFC de longa distância nacional; e (IV) o STFC de longa distância internacional. Do ponto de vista geográfico, a ANATEL divide a Região II do PGA em três áreas: a área geográfica dos Estados do Paraná e Santa Catarina; a área geográfica do Rio Grande do Sul e a área dos demais Estados que integram tal Região. (3)(4)(Destaquei).

“Assim, temos para o caso em questão, os seguintes mercado em sua dimensão produto: SMP (Serviço Móvel Pessoal) e STFC (Sistema Telefônico Fixo Comutado) nas modalidades LDN e LDI (Longa Distância Nacional e Longa Distância Internacional).” (5)

Dessa forma, ante a possibilidade de ampliação da cobertura por parte das empresas inseridas na demanda, adoto, em definição prévia, o mercado relevante sob a ótica do produto como sendo o de SMP, STFC (LDN e LDI), situados na Região I, II e III do Plano Geral de Outorgas (PGO), como escopo de ação antitruste no presente feito, servindo igualmente balizar a atividade decisória em voga. Ressaltando que quanto ao SMP, somente há sobreposição na Região II do PGO.

5. DA NECESSÁRIA COMPLEMENTAÇÃO JURÍDICO-CONCORRENCIAL À DECISÃO DA ANATEL:

Oriunda da ANATEL, a questão objeto principal do presente pedido de reconsideração (o retorno da TII ao controle da Solpart mediante o exercício do direito afixado no Acordo de Acionistas) teve a seguinte guarida:

CONFIDEDNCIAL”. (fls.5/26 apartado confidencial).” (Destaquei).

Todavia, ante os indícios fáticos e jurídicos, constatou-se que prescindira referido parecer, embora perfeitamente inserido em sua função regulatória, de eficácia concorrencial suficiente a atender totalmente o interesse público jungido na demanda.

Isto porque tratam-se de relações em busca do atendimento integral ao interesse público, consubstanciado no mesmo objeto social (relações de mercado entre agentes econômicos no setor de telecomunicações), em que órgãos diversos, com funções complementares abarcam parcelas diversas de referido objeto social. Vale dizer, ao CADE cabe a tutela da defesa da concorrência e à Anatel o exercício e tutela específica em telecomunicações (regulação setorial).

Essa situação de dupla atuação visando ampliar a esfera de abrangência do objeto social focado pelo interesse público não afeta a relação entre as autoridades envolvidas no processo, uma vez que as diferentes competências materiais específicas de atuação se complementam, face à verificação e/ou não de pontos de tangência em suas finalidades, tal como respaldado nos excertos abaixo:

“No mercado do SMP na Região II do PGA-SMP existe um ambiente competitivo e a entrada do quarto competidor completará o modelo traçado para o setor.

(…)

A Anatel idealizou um modelo concorrencial de 4 operadoras por área de prestação, que vem aos poucos demonstrando ser eficaz na busca de uma estrutura de mercado cada vez menos concentrada.”. (in Parecer da ANATEL, fls. 5/26, apartado confidencial).

“Em 16 de janeiro, a ANATEL autorizou a sua volta, concedendo 18 meses para a questão da superposição de outorgas ser decidida pelas partes. Essa decisão impôs a restrição de proibir a TII de deliberar sobre os assuntos relativos às outorgas sobrepostas durante o período, mas lhe permite acesso às informações estratégicas da BrT, bem como mantêm os demais poderes políticos de gerência. (6) (destacamos).

Nessa linha, lembrando do dito no parecer ministerial sobre o conflito de atribuições, alertando novamente para sua inexistência, vale observar o trecho:

“A regulação, em especial no mercado de telecomunicações, está subordinada aos princípios concorrenciais. Por isso, como em nenhuma outra Agência Reguladora brasileira, a Lei Geral de Telecomunicações explicita, de modo a espancar qualquer dúvida, a mais completa coordenação entre as competências da ANATEL e do CADE. A ANATEL faz às vezes da Secretaria de Direito Econômico, isto é, instrui o feito. Isso não afasta a competência concorrente da SDE na instrução de PAs e ACs no setor de telecomunicações. O CADE pode ouvir a SDE ou a SEAE em processos que envolvem qualquer mercado, sem prejuízo da instrução das Agências. No setor de Telecomunicações, os Pareceres da ANATEL, necessários e relevantíssimos para a formação da convicção do Plenário do CADE, evidentemente, não são vinculativos. As competências do CADE foram, integralmente, preservadas pela LGT. O artigo 7º da Lei 9.472/97 estabelece que, em matéria de defesa da concorrência no setor de telecomunicações, cabe à ANATEL submeter ao CADE todos “os atos envolvendo prestadora de serviço de telecomunicações, no regime público ou privado, que visem a qualquer forma de concentração econômica, inclusive mediante fusão ou incorporação de empresas, constituição de sociedade para exercer o controle de empresas ou qualquer forma de agrupamento societário”. A Lei Geral ressalva, expressamente, as competências legais pertencentes ao CADE (art. 19, XIX). Portanto, em matéria de defesa da concorrência, é o CADE quem dá a palavra final.


Tal configuração enquadra-se no modelo de competências complementares elaborado por OLIVEIRA:

‘as atribuições entre as duas autoridades não se sobrepõem. Há nítida divisão de trabalho, segundo a qual a agência regulatória cuida exclusivamente das tarefas de regulação técnica e econômica, enquanto a autoridade de defesa da concorrência aplica a lei antitruste’(7).

Não existe, nesse setor, imunidade antitruste que fundamente a não aplicação da Lei 8.884/4 aos atos das prestadoras de telecomunicações. A Lei 9.472/97 prevê, expressamente, que “as normas gerais de proteção à ordem econômica são aplicáveis ao setor de telecomunicações” (art. 7º caput da Lei 9.472/97). As concentrações operadas no setor são previamente analisadas pela Agência e aprovadas ou não sob o prisma regulatório. O controle do CADE é posterior e realizado com base na Lei 8.884/94(8). Enquanto a aprovação realizada pela Agência ocorre com fundamento no arcabouço regulatório do setor, a aprovação do CADE é realizada com base no direito da concorrência. Assim, não existe conflito entre o ato da ANATEL e decisão do CADE vetando a efetivação da operação. O ato da ANATEL decorre de uma verificação da compatibilidade da operação (volta da TII ao bloco de controle da BrT) em relação à Lei Geral de Telecomunicações. A análise do CADE é pautada na compatibilidade da operação em relação à Lei de Defesa da Concorrência. Dessa forma, eventual decisão do CADE, impedindo o retorno da TII não estaria confrontando a decisão da ANATEL, mas tornando a análise mais detalhada, já que incorpora aspectos não contemplados pela Agência.

Cabe à ANATEL, em seu exame ex ante da operação, impedir que uma única pessoa jurídica explore, de forma direta ou indireta, idêntica modalidade de serviço nos regimes público e privado na mesma região (art. 68 da LGT), valendo-se de subsidiária ou qualquer outro estratagema societário que dissimule sua atuação dúplice. Nesta etapa, deve a ANATEL solucionar o problema regulatório e não aplicar a Lei de Defesa da Concorrência. Qualquer solução da ANATEL que evite a cumulação de outorgas de uma mesma modalidade de serviço na mesma região estará conforme ao que preceitua a LGT, mas não será necessariamente compatível com o regime estatuído na Lei de Defesa da Concorrência. O cumprimento do artigo 68 da LGT nem sempre conduz à melhor solução sob o prisma da concorrência. Uma decisão da ANATEL que elimine a sobreposição de outorgas, mas restrinja a pluralidade de players no mercado de SMP, é compatível com o artigo 68, mas não com o sistema de defesa da concorrência. Em suma, no exame de concentrações ex ante, a ANATEL é menos sensível ao problema antitruste. Cabe ao CADE dar a palavra final quanto ao retorno da TII à BrT, incorporando à análise da ANATEL a dimensão antitruste.

(…)

As competências do CADE foram, integralmente, preservadas pela LGT. O artigo 7º da Lei 9.472/97, estabelece que, em matéria de defesa da concorrência no setor de telecomunicações, cabe à ANATEL submeter ao CADE todos ¨os atos envolvendo prestadora de serviço de telecomunicações, no regime público ou privado, que visem a qualquer forma de concentração econômica, inclusive mediante fusão ou incorporação de empresas, constituição de sociedade para exercer o controle de empresas ou qualquer forma de agrupamento societário¨. A Lei Geral ressalva, expressamente, as competências legais pertencentes ao CADE (art. 19, XIX).

Cabe à ANATEL, em seu exame ex ante da operação, impedir que uma mesma pessoa jurídica explore, de forma direta ou indireta, uma mesma modalidade de serviço nos regimes público e privado na mesma região (art. 68 da LGT). Nesta etapa, deve a ANATEL solucionar o problema regulatório e não aplicar a Lei de Defesa da Concorrência. Qualquer solução da ANATEL que evite a cumulação de outorgas de uma mesma modalidade de serviço na mesma região estará conforme ao que preceitua a LGT, mas não necessariamente está compatível com o regime estatuído na Lei de Defesa da Concorrência. O cumprimento do artigo 68 nem sempre conduz à melhor solução sob o prisma da concorrência. Assim, cabe ao CADE dar a palavra final quanto ao retorno da TII à BrT, incorporando à análise da ANATEL a dimensão antitruste.”(9) (destaquei).

Somente com a concessão da Medida Cautelar e com a conseqüente suspensão da cláusula 4.4 (e demais relativas) do Aditivo ao Acordo de Acionistas de 2002, impossibilitou-se qualquer tipo de ação, inclusive as revestidas de efeitos concorrenciais, no bojo do processo em epígrafe. Situação esta que, por sua vez, não solucionou a questão, porquanto engessou qualquer outro tipo de ação por parte da TII, inclusive aquelas voltadas, v.g., à mera fiscalização capital empregado / investimento realizado. Ou seja, por mais que se justificasse pela natureza cautelar subjacente, a medida adotada pelo CADE, na esteira do Despacho Gab.FOM n.10/04, precisou ser revista e melhor adequada ao contexto concorrencial do presente feito, para ater-se à intervenção mínima necessária ao resguardo concorrencial do mercado visando o benefício da economia geral e dos consumidores.


6. DA TENTEATIVA DA ELABORAÇÃO DE UM APRO:

Atento à necessidade de calibração da medida concedida no Despacho Gab.FOM n.10/04, desperta pelo Pedido de Reconsideração ora em comento, na esteira da sugestão do Parquet, em seu parecer relativo ao Pedido de Reconsideração de fls.1206/1222, foi intentada a introdução de um Acordo de Preservação da Reversibilidade da Operação (APRO), tendo para tanto sido realizadas diversas reuniões (cujas listas de presença encontram-se juntas às fls.2383/2384; 2386/2387; 2430-A/2430-B; 2684/2685).

Foi posta a questão em discussão e chegou-se a um denominador: a TII abriria mão de grande parte de seus direitos constantes no Aditivo ao Acordo de Acionistas de 2002, permanecendo tão somente com o direito a indicar conselheiros a figurarem nos Conselhos de Administração com o fito precípuo de preservar o vultuoso capital empregado na BrT. Em palavras claras, a TII, por meio dos conselheiros que viesse a indicar deixaria de participar de reuniões envolvendo os temas direta e indiretamente relacionados a STFC (LDN e/ou LDI) e/ou SMP, passando tão somente a participar de outras questões alheias a referidos temas. E mais, a seleção dos temas em que a TII poderia participar ou não, ficaria a cargo dos Presidentes dos Conselhos de Administração, todos eles indicados pela Techold e Timepart, acionistas majoritários / controladores.

Todavia, mesmo diante de um cenário favorável ao APRO, não se logrou êxito, porquanto as empresas, notadamente Techold, Timepart e Brasil Telecom, não vislumbraram possibilidade de, posta a controvérsia e o denominador, figurar a TII nos Conselhos de Administração, ainda que em situação circunscrita, com o fito de fiscalizar e deliberar sobre questões alheias ao mercado relevante contexto da presente ação antitruste.

É dizer, afastadas as possibilidades de contato com dados e informações relativos aos serviços de STFC (LDI e LDN), bem como de SMP, termos incluídos no conjunto componente do mercado relevante contexto da ação antitruste em sede cautelar em voga, mesmo assim, as empresas não apresentaram solução amigável ao conflito, alegando para tanto, notadamente, Techold, Timepart e Brasil Telecom, que não há possibilidade jurídica e fática ao estabelecimento de qualquer participação sem que contanto deixe-se de afetar aspectos concorrenciais inseridos na questão.

Voltado ao atendimento, na maior medida, do interesse público, este CADE, por mim e demais Conselheiros representado, inclusive por sua D. Procuradora Geral, intentaram conduzir o debate ao ajuste com mínima intervenção visando o resguardo do mercado, dos consumidores e de seus players. Esforços que, desafortunadamente, não obtiveram sucesso na confecção de um APRO neste processo.

7. SOPESANDO OS INTERESSES ENVOLVIDOS NO FEITO:

Embora elevados montantes de capital tenham sido empregados por parte de todas as empresas envolvidas neste feito, este E. CADE deve procurar tutelar em primeiro lugar a defesa da concorrência e os consumidores, expoentes do interesse público que permeia sua atividade típica de órgão de Estado conforme previsto na Lei 8.884/94.

O que se buscou com a tentativa de introdução do APRO e o que igualmente se busca com esta decisão é adequar, levando-se em consideração a ordem necessária de relevância dos vários interesses envolvidos no feito, a proteção do mercado interno, da livre concorrência, dos consumidores, sem avançar sobre os aspectos regulatórios e privados.

Assim, a imediata tutela da concorrência também é exercida in casu pela tutela mediata dos montantes de capital empregados no setor em apreço, porquanto consideráveis e aptos a conferir salubridade às atividades que mutuamente se provocam resultando incremento na competição no setor.

Na esteira, observo a idéia de interesse público veiculada pelo Prof. Celso Antonio Bandeira de Mello, para quem:

“33. O que fica visível, como fruto destas considerações, é que existe, de um lado, o interesse individual, particular, atinente às conveniências de cada um no que concerne aos assuntos de sua vida particular – interesse, este, que é o da pessoa ou grupo de pessoas singularmente consideradas -, e que, de par com isto, existe também o interesseigualmente pessoal destas mesmas pessoas ou grupos, mas que comparecem enquanto partícipes de uma coletividade maior na qual estão inseridos, tal como nela estiveram os que os precederam e nela estarão os que virão a sucedê-los nas gerações futuras.

Pois bem, é este último interesse o que nomeamos de interesse do todo ou interesse público. Não é, portanto, de forma alguma, um interesse constituído autonomamente, dissociado do interesse das partes e, pois, passível de ser tomado como categoria jurídica que possa ser erigida irrelatamente aos interesses individuais, pois, em fim de contas, ele nada mais é que uma faceta dos interesses dos indivíduos: aquela que se manifesta enquanto estes – inevitavelmente membros de um corpo social – comparecem em tal qualidade. Então, dito interesse, o público – e esta já é uma primeira conclusão -, só se justifica na medida em que se constitui em veículo de realização dos interesses das partes que o integram no presente e das que o integrarão no futuro. Logo, é destes que, em última instância, promanam os interesses chamados públicos.


Donde, o interesse público deve ser conceituado como o interesse resultante do conjunto dos interesses que os indivíduos pessoalmente têm quando considerados em sua qualidade de membros da Sociedade em pelo simples fato de o serem.” (in Curso de Direito Administrativo, 17ª Ed., p.52/53). (Destaquei).

Na linha do conceito de interesse público acostado, necessita o CADE, em sua função de tutor da defesa da concorrência, procurar, à sua vez, atender esse interesse geral (de todos, enquanto membros da sociedade), atuando nos limites do necessário ao resguardo do mercado interno, da livre concorrência, dos consumidores, em síntese, da economia como um todo.

Assim, alertado para a necessidade de adequação da medida cautelar exarada, realizou-se novo juízo do adotado sob o enfoque dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, objetivando-se chegar ao mínimo necessário de intervenção em defesa do interesse público em jogo, qual seja, a defesa da concorrência.

Prima face, vale a pena atentar para alguns dos princípios que conferem subsídios à edificação do raciocínio em torno das atividades da Administração Pública em busca ao máximo atendimento ao interesse público. Dentre eles, destacamos o princípio vetor consubstanciado na conjunção das assertivas (a) da supremacia do interesse público ao interesse privado e (b) da indisponibilidade, pelo administrador, do interesse público. Deste, decorrem outros princípios, em que faremos uma rápida incursão, quais sejam, (a) finalidade, (b) motivação, (c) razoabilidade e (d) proporcionalidade.

Pelo princípio da finalidade, tem-se que toda a Lei é instrumental voltado à consecução do interesse público, que, em última análise, alude a interesses da sociedade como um todo. Desse modo, o que explica, justifica e confere sentido a uma norma é precisamente a finalidade que a anima. Dado que extraímos das lições do Professor Celso Antônio Bandeira de Mello:

“O que explica, justifica e confere sentido a uma norma é precisamente a finalidade que a anima. A partir dela é que se compreende a racionalidade que lhe presidiu a edição. Logo. É na finalidade da lei que reside o critério norteador de sua correta aplicação, pois é em nome de um dado objetivo que se confere competência aos agentes da Administração.” (in Curso de Direito Administrativo Brasileiro, p.33, 34)-(destacamos).

Em busca da finalidade, a Administração deve motivar-se em preceitos legais aplicados à realidade fática. Disso retiramos outro princípio basilar da atividade Administrativa (Lato sensu), qual seja, o princípio da motivação:

“O princípio da motivação determina que a autoridade administrativa deve apresentar as razões que a levaram a tomar uma decisão. ‘Motivar’ significa explicar os elementos que ensejaram o convencimento da autoridade, indicando os fatos e os fundamentos jurídicos que foram considerados.” (in Processo Administrativo, p.58 – Sérgio Ferraz e Adilson Dallari). (destacamos).

Agregada aos princípios da finalidade e da motivação, encontra-se a razoabilidade, consubstanciada na idéia de “bom-senso”, pertencente ao jargão popular e aplicada ao Direito. Com propriedade, Weida Zancaner aponta que:

“Em suma: um ato não é razoável quando não existiram os fatos em que se embasou; quando os fatos, embora existentes, não guardam relação lógica com a medida tomada; quando, mesmo existente alguma relação lógica, não há adequada proporção entre uns e outros; quando se assentou em argumentos ou em premissas, explícitas ou implícitas, que não autorizam, do ponto de vista lógico, a conclusão deles extraída” (in Estudos em homenagem a Geraldo Ataliba – Direito Administrativo Constitucional, p.623).

Intimamente relacionado ao princípio da razoabilidade, “a ponto de até se confundir com ele” (sic. Sérgio Ferraz, in Processo Administrativo, p.63), bem como ligado aos demais princípios acima arrolados, temos o princípio da proporcionalidade. Esse princípio volta-se a vedar excessos desarrazoados nas condutas da Administração Pública, por meio da aferição da compatibilidade entre os meios e os fins da atuação administrativa, para evitar restrições desnecessárias ou abusivas.

“Suzana Toledo Barros (O princípio da Proporcionalidade e o Controle de Constitucionalidade das Leis Restritivas de Direitos Fundamentais, p.71) inverte, de alguma forma, o relacionamento entre os princípios ao considerar que a proporcionalidade pode ser tomada em dois sentidos: em sentido amplo, corresponde ao conceito de razoabilidade; em sentido estrito, corresponde à representação mental de equilíbrio, de relação harmônica, entre duas grandezas.” (in Processo Administrativo, Sérgio Ferraz e Adilson Dallari, p.64).


Filtrando o objeto do presente nos universos conotativos dos conceitos veiculados pela doutrina acerca dos princípios acima arrolados, notadamente razoabilidade e proporcionalidade, é possível a realização de um balizamento da medida cautelar de modo a restringi-la ao mercado relevante previamente definido, e instâncias a ele diretamente relacionadas.

Mais respaldo a essas idéias, retiro de trecho de parecer juntado aos autos:

“A livre concorrência é princípio fundante da ordem econômica. Trata-se de ‘liberdade econômica’ que, conjugada com outros princípios – livre iniciativa, livre escolha do consumidor, liberdade de contratar, liberdade de empresa e liberdade de entrada no mercado, para exemplificar –, fornece as bases da ordem jurídica capitalista. As ‘liberdades econômicas’ são complementares umas em relação às outras. Isso implica a ponderação de todas elas, de modo a que nenhuma liberdade “individual e subjetiva” seja restringida sem que, da limitação, resulte a expansão das liberdades “coletivas e difusas”. É por isso que a Lei 8.884/94 dispõe ser a “coletividade” a titular dos bens jurídicos protegidos pelo diploma concorrencial (art. 1º, parágrafo único) e que a legislação sobre direitos difusos é subsidiariamente aplicável à matéria (art. 83).

A máxima de direito antitruste que afirma ser a concorrência – e não os concorrentes – o objeto da tutela concorrencial, introduz, como elemento central e guia hermenêutico para a análise sistemática da Lei 8.884/94, a “utilidade social” de uma economia competitiva. Assim, a livre iniciativa, por exemplo, é limitada pela função social da propriedade e da empresa. Além disso, por serem liberdades conjugadas sempre no plural, pertencem a todos e devem conviver com as liberdades de cada um. Não é o “concorrente” que possui liberdade individual para concorrer, mas sim o mercado que deve garantir o ambiente institucional para que todos possam concorrer em paridade de condições.” (in Parecer do Prof. Celso Campilongo, fls.2442/2480).

De tudo quanto foi exposto, concluo que há espaço e necessidade ao aprimoramento da medida cautelar veiculada pelo Despacho Gab.FOM n.10/04, homologado por este E. Plenário na 316ª Sessão Ordinária, para aprimorar seus limites ao necessário resguardado pela Lei 8.884/94. Destacando que o escopo da decisão de aprimoramento da medida busca preservar a concorrência que por sua vez também é assegurada in casu pela salvaguarda da saúde econômico-financeira dos agentes econômicos envolvidos no feito até decisão final regulatória e concorrencial.

Ou seja, a decisão de aprimoramento busca ser favorável tanto ao mercado, à concorrência, como aos agentes econômicos envolvidos no feito na medida em que visa (i) prestigiar concorrentes em benefício da concorrência e dos consumidores, (ii) proteger os investimentos realizados conforme a autorização da ANATEL e (iii) construir solidez sistêmica entre regulação e concorrência e um ambiente econômico-jurídico de maior segurança jurídico-econômica.

Tenho para comigo que o grande interesse público tutelado in casu equivale à estabilidade institucional em face dos administrados.

Tudo isto, na esteira do inicialmente fixado como premissa de análise do presente feito, de forma provisória, até a decisão final dos dois Atos de Concentração em trâmite no SBDC, que, frise-se, deverão ser julgados em conjunto, dada a inequívoca conexão existente, por inegável identidade de objetos.

Expostas, destarte, as razões e situações fáticas que demonstram a necessidade de aprimoramento da medida cautelar veiculada pelo Despacho Gab.FOM n.10/04, homologado por este E. Plenário na 316ª Sessão Ordinária, passo a decidir.

8. CONCLUSÃO

Ante o exposto, recebo o pedido de reconsideração, com fulcro no artigo 15, da Resolução CADE n.28/02, e dou-lhe parcial provimento, mantendo a medida cautelar inicialmente concedida por meio do Despacho Gab.FOM n.10/04, adaptando-a, com base nos princípios da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, da indisponibilidade pelo administrador do interesse público, da razoabilidade e da proporcionalidade no tocante aos seguintes aspectos:

A TII poderá retornar, na esteira da decisão veiculada no Informe ANATEL n.155/2004/PVCPC/PVCP/SPV-PBCPD/PBCP/SPB e visando-se tão somente a garantia / preservação dos interesses envolvidos nos investimentos de alto vulto de capital empregados, aos blocos de controle das empresas Solpart, Brasil Telecom Participações S.A. e Brasil Telecom S.A., desde que:

(i) somente indique Conselheiros, independentes, na forma do Aditivo ao Acordo de Acionistas de 2002 (fls.2055/2132), abstendo-se totalmente de indicar diretores à quaisquer delas. Ou seja, ao executar o disposto nos itens 4.2 e 4.3 do Acordo de Acionistas de 2002 (dentre outras disposições), eleger, indicar ou escolher para cargos dos Conselhos de Administração da Solpart, BrT Par e BrT, conselheiros independentes, de forma que nenhum dos indicados seja diretor, conselheiro, administrador ou funcionário, direta ou indiretamente, de empresa ou entidade do Grupo Telecom Itália.


(ii) somente participe, por meio dos Conselheiros que vier a indicar na forma do Aditivo ao Acordo de Acionistas de 2002 das deliberações em matérias que não guardem qualquer tipo de relação (direta) aos serviços de STFC (LDI e/ou LDN) e/ou SMP, inclusive nas respectivas reuniões prévias de acionistas.

(iii) os elaboradores das pautas de reuniões dos Conselhos de Administração, ou seja, seus respectivos presidentes, separem os temas em pautas diversas, (iii.a) uma suscetível à participação da TII, por meio dos Conselheiros que indicar, nos termos do Aditivo ao Acordo de Acionistas de 2002, (iii.b) outra não suscetível (vedada) ao comparecimento por parte de referidos Conselheiros, indicados pela TII, sendo estas últimas devidamente fundamentadas por escrito por parte de seus elaboradores.

(iv) nas reuniões não suscetíveis de participação dos Conselheiros indicados pela TII, os temas abordados, necessariamente, deverão dizer respeito aos serviços de STFC (LDI e/ou LDN) e/ou SMP e temas diretamente relacionados, sendo estes últimos, necessariamente, ligados aos principais em aspectos de estratégia concorrencial, tal como orçamentos para campanhas de marketing e planos de investimento em desenvolvimentos de produtos, ativos (lato sensu), instrumentos, tudo isto em síntese, voltado ao desenvolvimento das atividades de STFC (LDI e/ou LDN) e/ou SMP.

(iv.a) nas reuniões não suscetíveis de participação dos Conselheiros indicados pela TII, em que deverão necessariamente ser abordados temas diretamente ligados aos serviços de STFC (LDI e/ou LDN) e/ou SMP, os direitos de voto, veto a prerrogativa e necessidade de presença (comparecimento para aprovação de deliberações) de referidos membros permanecerão suspensos até a decisão final dos processos (atos de concentração) subjacentes ao expediente cautelar em apreço, que provavelmente ocorrerá em até 18 meses fixados no referido informe da ANATEL, dos quais restam a correr aproximadamente 12 meses.

Mantenho a decisão inicial (Despacho Gab.FOM n.10/04, complementado pelo Despacho Gab.FOM n.14/04, homologados nas Sessões Ordinárias do CADE 316ª e 317ª, respectivamente) nos seus fundamentos e determinações somente relativos às sanções por descumprimento das obrigações aqui veiculadas, sendo que as restrições impostas neste Despacho substituem as contidas nas decisões anteriores.

Publique-se o dispositivo deste decisório (item 8 – “CONCLUSÃO”) na Imprensa Oficial.

Cumpra-se.

Submeto a presente decisão, ad referendum, à manifestação deste plenário.

Brasília, 30 de junho de 2.004

Fernando de Oliveira Marques

Conselheiro-Relator

Notas de rodapé

1- Grande parte do descrito neste item foi retirado do Parecer Tendências Consultoria Integrada, fls.2482 (em caderno próprio).

2- in Argumentos da Brasil Telecom esposados para a Consulta do Prof. Celso Campilongo, fls.2445/2480.

3- Informe n º 155/2004/PVCPC/PVCP/SPV-PBCPD/PBCP/SPB, p. 11.

4- Ibidem.

5- In Parecer Tendências Consultoria, fls.2482 (em caderno próprio).

6- Argumentos da Brasil Telecom, representada pelo Dr. Ivo Waisberg, utilizados para a consulta que originou o Parecer Prof. Celso Campolongo, fls.2446/2480.

7- Cf. OLIVEIRA, Gesner. Concorrência – Panorama no Brasil e no Mundo. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 66, Apud, Parecer do Prof. Celso Campilongo, fls.2446/2480.

8- “la defensa de la competencia es un instrumento de acción indirecto que opera no definiendo las conductas de las empresas en el mercado ex ante, sino corrigiendo ex post aquellas que impiden el libre juego de la competencia adecuada. Cf. PALARES, Luis Cases. Derecho Administrativo de la Defensa de la Competencia. Madrid: Marcial Pons, 1995, p. 40.(grifos nossos), Apud Parecer do Prof. Celso Campilongo, fls.2442/2480.

9- In Parecer do Prof. Celso Campilongo, fls.2442/2480.

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