Operação Gralha Azul

Acusados de venda de árvores nativas responderão ação penal

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15 de julho de 2004, 18h48

O Ministério Público Federal em Chapecó (SC) ingressou, nesta quarta-feira (14/7), com ação penal contra três pessoas acusadas de extrair, comercializar e transportar árvores nativas.

A operação denominada Gralha Azul é feita conjuntamente entre o Ibama, Polícia Federal e MPF para proteger espécies nativas ameaçadas de extinção.

Em maio de 2004, um proprietário rural informou que havia plantado 412 pés de pinheiro brasileiro em sua propriedade de 56 hectares, na região de Marechal Bormann, em Chapecó. Na verdade, a declaração era falsa: tratavam-se de espécies nativas, protegidas por legislação ambiental.

Um engenheiro agrônomo, também denunciado na ação, firmou a declaração do proprietário em documento público ao elaborar o projeto de retirada dos “pinheiros” da propriedade de Nadaletti.

Em Anotação de Responsabilidade Técnica, o engenheiro agrônomo atestou que a extração era de manejo florestal, ou seja, de árvores plantadas e não de floresta nativa. Com as falsificações em mãos, um dono de madeireira informou ao Ibama que procederia ao corte e transporte dos “pinheiros”.

O desmate ocorreu em junho deste ano, no período de queda de sementes, e recaiu sobre uma espécie ameaçada de extinção, a araucária angustifólia.

Naquele mesmo mês, policiais federais e fiscais do Ibama, durante a Operação Gralha Azul, prenderam em flagrante o proprietário rural, que acompanhava a derrubada das árvores pelos funcionários da Madeireira Oeste. Na ocasião, foi encontrado um caminhão carregado de toras de araucária.

O procurador da República em Chapecó, responsável pela denúncia à Justiça Federal, é Harold Hoppe.

Ação nº 2004.72.02.002344-3

Leia a íntegra da ação penal:

EXMO(A) SR(A) DR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA 1ª VARA DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CHAPECÓ

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por seu agente signatário, no uso de suas atribuições legais, vem, perante Vossa Excelência, nos autos do processo nº 2004.72.02.002344-3, e com base no Inquérito Policial nº 087/2004 oriundo da Delegacia de Polícia Federal em Chapecó/SC, oferecer DENÚNCIA contra:

REINERIO NADALETTI, brasileiro, casado, técnico em contabilidade, natural de Erechim/RS, nascido em 01.08.1960, filho de Guerino Nadaleti e Silene Boiani Nadaleti, portador de identidade nº 12/R-824.401/SSI-SC, residente na Rua Maranhão, 275-D, Santo Antônio, em Chapecó;

DARCI CASTAGNA, brasileiro, casado, industrial, natural de Águas de Chapecó, nascido em 26.07.1960, filho de Raimundo Castagna e Ernestina Giongo Castagna, portador de identidade nº 1.016937/SSP-SC, residente na Rua Basílio Danieli, 112, Centro, em Chapecó;

LEOCIR PEDRO MORO, brasileiro, engenheiro agrônomo, natural de Rodeio Bonito/RS, nascido em 14.06.1966, filho de Augusto Moro e Delize Pitol Moro, portador de identidade nº 7023096766/II-RS, residente na Avenida Progresso, 365, centro, em Chapecó;

MADEIREIRA OESTE LTDA, pessoa jurídica de direito privado dedicada ao desdobramento e beneficiamento de madeira, comércio varejista e atacadista de madeiras em geral, CNPJ nº 83.314.245/0001-10, com sede na Rua Ernesto Piazza, s/nº, em Nova Itaberaba/SC;

pela prática dos seguintes fatos delituosos:

1. No dia 27 de maio de 2004, neste município de Chapecó, Reinério Nadaletti inseriu declaração falsa em documento particular, alterando a verdade sobre fatos juridicamente relevantes.

Na ocasião, o denunciado declarou que os 412 pés de pinheiro brasileiro (araucária angustifolia) existentes em sua propriedade de 56 ha localizada no Distrito de Marechal Bormann, em Chapecó, haviam sido plantados com recursos próprios, quando, em verdade, tratavam-se de espécies nativas, objeto de especial proteção pela legislação ambiental, conforme Laudo de Vistoria Técnica de fls. 33/40.

2. No dia 27 de maio de 2004, em Chapecó, Leocir Pedro Moro, na condição de engenheiro agrônomo vinculado ao Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de Santa Catarina – CREA, inseriu declaração falsa em documento público, alterando a verdade sobre fatos juridicamente relevantes.

Na oportunidade, de posse da declaração falsa emitida por Reinério Nadaletti, e sem vistoriar tecnicamente o imóvel supramencionado, o acusado elaborou e firmou projeto para retirada de pinheiros brasileiros (araucária angustifolia) em A.R.T. (Anotação de Responsabilidade Técnica), permitindo, assim, a comercialização e o transporte da madeira como se decorrente de manejo florestal fosse, quando, em verdade, tratava-se de floresta nativa, consoante Laudo de Vistoria Técnica de fls. 33/40.

O acusado recebeu em torno de R$ 50,00 ou R$ 60,00 de Darci Castagna para elaboração da A.R.T.

3. Nas mesmas circunstâncias de tempo e local, Leocir Pedro Moro deixou de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental a que estava contratualmente obrigado.

Na condição de profissional contratado pela Madeireira Oeste Ltda para elaborar projeto de corte de araucárias angustifólia na propriedade de Reinerio Nadaletti, o acusado não investigou tecnicamente se as araucárias a serem abatidas decorriam de manejo florestal (silvicultura) ou, ao contrário, se tratava de floresta nativa, permitindo, assim, a ocorrência de grave dano ambiental.

4. No dia 1º de junho de 2004, no escritório regional do IBAMA em Caçador, o denunciado Darci Castagna fez uso dos documentos ideologicamente falsos supramencionados, informando ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente que procederia ao corte e ao transporte de pinheiros brasileiros (araucária angustifólia) plantados, quando, em verdade, tratava-se de floresta nativa, objeto de especial proteção.

Na ocasião, após contatar com os acusados Leocir e Reinerio, e deles obter as falsas declarações, dirigiu-se ao IBAMA e protocolou aludidos documentos para, assim, derrubar e comercializar os 412 exemplares de araucárias nativas.

5. Entre os dias 9 e 28 de junho de 2004, na propriedade de Reinerio Nadaletti, localizada no distrito de Marechal Bormann, em Chapecó, os denunciados Reinerio Nadaletti, Leocir Pedro Moro, Darci Castagna e Madeireiras Oeste Ltda, em conjugação de esforços e unidade de desígnios, destruíram ou danificaram florestas nativas, objeto de especial preservação pela legislação ambiental.

Na oportunidade, Darci Castagna, administrador da Madeireiras Oeste, após contatar com Reinerio Nadaleti e com este negociar a aquisição das 412 árvores de araucárias nativas pelo preço de R$ 100,00 o metro cúbico, e depois de obter daquele e de Leocir Pedro Moro documentos ideologicamente falsos, que legitimariam o corte das espécies em extinção, procedeu, com o apoio de funcionários, caminhão e trator da Madeireira Oeste Ltda ao corte da floresta nativa.

O corte ocorreu no período de queda de sementes, e recaiu sobre espécie ameaçada de extinção (araucária angustifólia).

No dia 28 de junho, porém, policiais federais e fiscais do IBAMA, após avistarem um caminhão carregado com toras de araucárias, deslocaram-se até o local e prenderam em flagrante Reinerio Nadaleti, que acompanhava a derrubada das árvores pelos funcionários da Madeireira denunciada.O IBAMA constatou que 202 exemplares de Araucaria angustifolia já haviam sido derrubados, conforme Laudo de Vistoria Técnica de fls. 33/40 e Autos de Infração.

6. Entre os dias 9 e 28 de junho de 2004, os denunciados Darci Castagna e Madeireira Oeste Ltda transportaram e mantiveram em depósito madeira sem licença válida para todo o tempo da viagem ou do armazenamento, outorgada pela autoridade competente.

Na ocasião, após a destruição da floresta nativa, funcionários da madeireira, utilizando caminhões da empresa, transportaram toras da propriedade de Reinerio Nadaleti, no distrito de Marechal Bormann, zona rural de Chapecó, até a Rua Ernesto Piazza, sem número, no município de Nova Itaberaba/SC, sede da Madeireira Oeste Ltda, tudo conforme Auto de Infração nº 337511 do IBAMA.

ASSIM AGINDO:

a) Reinerio Nadaleti incorreu nas sanções do art. 299 do Código Penal (documento particular) e art. 50 c/c art. 53, inc. II, alíneas ‘a’ e ‘c’ da Lei nº 9.605/98, todos na forma dos arts. 29 e 69 do Código Penal.

b) Leocir Pedro Moro cometeu os crimes previstos no art. 299 do Estatuto Repressivo (documento público) e art. 50, c/c art. 53, inc. II, alíneas ‘a’ e ‘c’, e, por fim, art. 68, todos da Lei nº 9.605/98, sendo que os delitos do art. 299 do Código Penal e art. 68 da Lei dos Crimes Ambientais foram cometidos em concurso formal de crimes (art. 70 do Cód. Penal); os demais, outrossim, foram perpetrados na forma dos arts. 29 e 69 do Código Penal.

c) Darci Castagna incorreu nas penas do art. 304, por duas vezes, na forma do art. 70, ambos do Código Penal, e nas sanções do art. 46, parágrafo único, e art. 50 c/c art. 53, inc. II, alíneas ‘a’ e ‘c’ da Lei nº 9.605/98, todos na forma dos arts. 29 e 69 do Código Penal.

d) Madeireira Oeste Ltda incorreu nas sanções do art. 46, parágrafo único, e art. 50 c/c art. 53, inc. II, alíneas ‘a’ e ‘c’ da Lei nº 9.605/98, todos na forma do art. 69 do Código Penal.

Face ao exposto, o Ministério Público Federal requer o recebimento e autuação da presente denúncia, com citação dos acusados para interrogatórios e demais atos processuais, sob pena de revelia, bem como a oitiva das testemunhas abaixo arroladas, e, ao final, a condenação daqueles às sanções penais correspondentes.

Chapecó, 13 de julho de 2004.

Harold Hoppe

Procurador da República

TESTEMUNHAS:

1. Marcelo Kammers, Analista Ambiental do IBAMA, lotado em Florianópolis;

2. Olício Leão Marques, Analista Ambiental do IBAMA, lotado em Chapecó;

3. Gilberto Luiz Haiduk, industrial, residente na Rua Porto Alegre, nº 663-E, Edifício Olímpio Tormem, bairro Centro, CEP 89800-000, em Chapecó, telefone (49) 3221796, e endereço comercial Distrito Marechal Bormann, CEP 89800-000, Haiduk Industrial e Comércio Ltda, telefone 3223014.

4. Alcimar Machado Borges, Agente de Polícia Federal, lotado na Delegacia de Polícia Federal de Chapecó.

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