Peso no bolso

"Reforma sindical vai atender interesses dos grandões."

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2 de fevereiro de 2004, 12h53

O jornal Folha de São Paulo, edição de 30 de janeiro de 2004, trouxe reportagem anunciando ter conseguido “consenso” em proposta de reforma sindical, fechada no âmbito do Fórum Nacional do Trabalho e a ser encaminhada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, onde se quer a extinção do dissídio coletivo, a data-base para negociação, bem como a retirada de competência da Justiça do Trabalho para julgar a greve legal ou ilegal.

No Brasil, parece que tudo é feito por amadores. É assustador que estes “reformadores” divulguem que vão estruturar algo tão importante em cima de raciocínios que pecam por tanta falta de informação: “acaba a possibilidade de julgamento pela Justiça do Trabalho de greves. Ninguém poderá dizer mais que uma greve é abusiva”, afirmou ele “”.

O coordenador do fórum e secretário de Relações do Trabalho, Osvaldo Bargas, é um bom sujeito e muito bem intencionado, mas, deveria seguir o velho bordão “consulte, antes, um advogado”. Será que não há ninguém por ali para explicar que o artigo 5º XXXV da CF é uma cláusula pétrea e, portanto, não adianta querer revogar a regra de que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito”?

É elementar que em face deste dispositivo constituir cláusula pétrea, não poderá sequer ser apreciada pelo Congresso Nacional, uma PEC que diga que o abuso do direito de greve não poderá ser apreciado pelo Poder Judiciário. Então, o projeto que eles estão desenvolvendo vai funcionar saindo o tiro pela culatra: eles vão conseguir obter que o Judiciário possa continuar mandando parar a greve, mas, não podendo julgar as reivindicações.

Em suma, a reforma não vai consistir em tirar o poder do estado em fazer parar o movimento. Irá limitar-se a retirar do estado o poder de emitir uma sentença que substitua o contrato que as partes não conseguiram ajustar mediante o entendimento direto.

Passou o tempo em que os trabalhadores eram assaltados pelo Tribunal que lhes impunha um julgamento do conflito coletivo de trabalho, apenas, para fazer cessar um movimento grevista. Hoje em dia, oito em cada dez greves terminam no Tribunal porque o sindicato sabe que não consegue segurar o rojão muito tempo e busca o arbitramento judicial. Este tipo de reforma vai atender aos interesses dos “grandões” e deixar na mão os “baixinhos”, ou seja, o sindicato de alta capacidade de conflito não precisa do arbitramento e os pequenos vão ter que se limitar a CLT. Mais confisco salarial vem aí pela frente.

Leia a reportagem da Folha de São Paulo:

“São Paulo, sexta-feira, 30 de janeiro de 2004.

TRABALHO

Negociação ganhará outros moldes; não haverá mais a greve abusiva

Reforma vai acabar com o dissídio

JULIANNA SOFIA

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A reforma sindical acabará com instrumentos históricos de negociação. A proposta fechada ontem pelo FNT (Fórum Nacional do Trabalho) a ser encaminhada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva extingue o dissídio coletivo e a data-base para negociação. A previsão do governo é enviar a reforma ao Congresso até março.

A reforma sindical também muda as regras do direito de greve. “Estamos adotando o modelo da OIT [Organização Internacional do Trabalho]”, explicou o coordenador do fórum e secretário de Relações do Trabalho, Osvaldo Bargas. Com as mudanças, acaba a possibilidade de julgamento pela Justiça do Trabalho de greves. “Ninguém poderá dizer mais que uma greve é abusiva”, afirmou ele.

Hoje, os sindicatos de trabalhadores e patrões iniciam a negociação de um acordo coletivo antes da data-base, que é o período anual para revisão dos acordos, incluindo o reajuste salarial.

Não havendo acordo, uma das partes pode acionar a Justiça do Trabalho, ajuizando um dissídio coletivo. Cabe, então, à Justiça do Trabalho definir as regras para o acordo, que passam a ser normas.

“Os mecanismos de negociação passam a ser fortíssimos. Será quase obrigatório haver negociação”, disse o coordenador da bancada dos trabalhadores no FNT e presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho.

Pelas novas regras, a negociação coletiva não terá uma data-base. Os acordos trabalhistas poderão fixar prazos diferentes para as cláusulas do contrato coletivo. Cláusulas sociais, por exemplo, poderão vigorar por três anos. As econômicas, por período menor.

Antes de vencer o prazo definido no acordo coletivo, as partes iniciam a negociação. Não havendo consenso até a data limite do acordo, seu prazo de validade pode ser prorrogado por 90 dias, que ainda poderão ser renovados.

Nesse período de negociação, as duas partes em comum acordo poderão solicitar arbitragem ou mediação pública ou privada. A arbitragem privada poderá ser um escritório de advocacia. Já a pública será a Justiça do Trabalho.

A nova lei estabelecerá que nenhuma das partes poderá se recusar a negociar, sob pena de ser multada. No caso de reincidência, a entidade sindical está sujeita a perder o direito de representar determinada categoria. A decisão do árbitro, seja o público ou o privado, será definitiva.

Fonte: Folha de São Paulo

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