No grito

Em Criciúma (SC), prefeito cassado resiste a decisão judicial.

Autor

  • Jorge Nemr

    é advogado conselheiro da Diamante Geração de Energia e coordenador do Comitê de Ética e Responsabilidade Social da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústria de Base (ABDIB).

30 de dezembro de 2004, 20h41

Em Criciúma, Santa Catarina, o prefeito eleito teve seu registro cassado por ter usado dinheiro público em um ato político que o beneficiou e por ter feito propaganda institucional fora do período permitido. Nas urnas, a diferença do número de votos em relação ao segundo colocado foi de uns poucos pontos percentuais. No Tribunal Regional Eleitoral, por cinco votos a um, a justiça entendeu que a sua vitória não foi justa.

O prefeito não aceitou a decisão da justiça e resolveu comandar um acampamento do MST diante da Prefeitura. Dizem que só sairão de lá se o político considerado inelegível for empossado.

O Princípio da Restritividade é um dos cânones do direito administrativo. O grande mestre nesta área do direito, José Cretella Júnior nos ensina que: “O agente do Estado pode fazer apenas o que a norma jurídica o autoriza de modo expresso, ao passo que o cidadão comum pode fazer tudo o que não seja proibido por lei”. Assim sendo, aprendemos que o servidor público número 1 da Federação (presidente), do estado (governador) e do município (prefeito) têm o dever legal e moral de respeitar e cumprir as leis, dando exemplo para os demais servidores públicos, cidadãos e principalmente para os seus eleitores.

O prefeito cassado recorreu três vezes ao Tribunal Superior Eleitoral, em Brasília, instância máxima em questões eleitorais. Nos três julgamentos foi mantida a decisão, a diplomação e a posse do segundo colocado nas urnas.

Diante dessa situação, o exemplo que se espera de um homem público honrado é o respeito pelo cumprimento das leis que ele e o seu partido político ajudaram a criar. Saber perder e saber ganhar são apanágios do bom político.

A Lei Eleitoral foi uma vitória da sociedade e dos partidos que a aprovaram. A Justiça, alicerce da democracia, deve ser respeitada para garantir a integridade do Estado de Direito.

Atacar decisões judiciais e acusar levianamente os Tribunais não é atitude dignificante, tampouco honra um partido político que se notabilizou, ao longo de sua história e legitimamente, pela luta contra os abusos que traem a vontade do povo e o interesse público.

A lei eleitoral foi criada para ser respeitada. Ganhar no “tapetão” (como dizem as faixas colocadas em frente à prefeitura local) é ganhar na impunidade. Não é o que acontece e tampouco será a melhor forma para que o prefeito cassado lustre a sua biografia.

A confirmação dessa verdade é que a mesma lei que norteou a cassação do primeiro colocado nas eleições de Criciúma, está sendo invocada por vários candidatos derrotados do mesmo partido em outros municípios de Santa Catarina. Em alguns casos, novas eleições já foram marcadas por força das representações levadas à justiça eleitoral pelo Brasil afora. Não pode haver dois pesos e duas medidas! A lei vale para todos os candidatos. Se ela é rigorosa demais (este não é o meu entendimento) que se mude a lei, mas enquanto válida, ela deve ser cumprida e defendida por todos, principalmente por se conhecer as regras do jogo antes do início da partida.

Portanto, no meu entendimento, mobilizar eleitores e o MST para acampar em frente da Prefeitura e declarar que eles só irão sair de lá quando o prefeito eleito cassado assumir a cadeira de prefeito, além de ser uma afronta a todos os Poderes da nossa democracia, é explorar o povo e usá-lo como massa de manobra para tentar ganhar no grito. A idéia central que governa o direito do administrador público é a predominância do interesse público sobre o interesse privado. Muitos não podem e não devem ser sacrificados pelo benefício de poucos, mas sim, o sacrifício de poucos deve ser feito pelo benefício de muitos.

O foro competente para este caso, não é a praça pública. É o Tribunal Superior Eleitoral!

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