Direitos autorais

Justiça vai decidir se H.Stern plagiou trabalho de artista gaúcha

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20 de abril de 2004, 9h52

Uma fórmula matemática poderá ser o elemento decisivo para decidir uma inédita questão que tramita no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: a discussão sobre direitos autorais — e eventual indenização — relativos a uma coleção de jóias.

O caso está empatado em 4 x 4 e, por isso, teve seu julgamento suspenso na última sexta-feira (17/4), quando era apreciado pelo 5º Grupo Cível. A autora da ação é a artista gaúcha Maria Bernardete Conte, de 56 anos de idade, que move uma ação em que acusa a cinquentenária H.Stern Comércio e Indústria S.A de plágio.

Consta da ação que, em 1992, Bernardete criou protótipos de brincos, colares, gargantilhas e pulseiras, com temas indígenas, que entregou ao departamento de marketing da H.Stern, em São Paulo, propondo a venda da criação ou uma parceria.

Vinte e quatro horas depois, a artista recebeu a resposta de que não havia interesse. Em 1994, Bernardete ficou sabendo que a coleção “Purangav” (que, em tupi guarani, significa beleza) foi lançada nos EUA, Europa e Brasil, em desfiles estrelados pela modelo Naomi Campbell. Começou então a venda das jóias – ditas plagiadas.

Seguiu-se demorada ação judicial, iniciada em setembro de 1996, durante a qual um parecer técnico reconheceu “semelhanças exaustivas” entre a coleção da artista gaúcha e os produtos colocados à venda pela H.Stern.

Mesmo assim, a sentença de primeiro grau negou que houve plágio. E esse começava a ser também o rumo do recurso, a partir do voto do desembargador Paulo Kretzmann, em junho de 2002, baseado em conclusões do perito oficial. Um pedido de vista do revisor, desembargador Luiz Ary Vessini de Lima, mudou o curso da decisão.

Ele flagrou “coincidências” e votou pela condenação da H.Stern por “plágio, do qual decorreu o uso indevido de obra da autora”. A indenização estabelecida seria de 6% sobre o valor bruto de cada peça vendida e mais R$ 20 mil (valores de junho de 2002) pelos danos morais.

A H.Stern tenta reverter o resultado, levando a matéria a rejulgamento através do recurso de embargos infringentes. Seu advogado, Athos Gusmão Carneiro, sustentou “as flagrantes diferenças entre as peças criadas pela artista e as que foram produzidas e comercializadas pela empresa”.

Também afirmou que as idéias criativas do artesanato indígena — em que é inspirada a coleção Purangav — “são de domínio público e não constituem privilégio ou exclusividade de ninguém”.

O 5º Grupo Cível se dividiu em duas correntes. Os que acompanharam a desembargadora relatora Mara Larsen Checchi aderiram à idéia dela de que “a concepção artística de jóias inspirada no artesanato indígena brasileiro (acervo de domínio público) não caracteriza cópia, plágio ou obra derivada de outra coleção criada sobre o mesmo tema, quando cada uma desenvolve estilos diferentes, produzindo resultados finais estéticos também diferentes, sem nenhuma identidade de estruturação na escolha dos referenciais”.

Outros quatro desembargadores acompanharam a linha proposta pelo desembargador Vessini de Lima: “Há que se distinguir a contrafação do plágio. No primeiro a obra é simplesmente copiada. Na segunda, ao contrário, a despeito de certa diversidade material, as linhas de criação apresentam algo em comum, sendo que as coincidências estão exaustivamente apontadas no laudo pericial da assistente técnica da autora, o qual, por sua precisão e rigor metodológico, merece prevalecer sobre as conclusões genéricas e subjetivas do louvado oficial”.

Numa próxima sessão do 5º Grupo, o 3º vice-presidente do tribunal gaúcho, desembargador Marco Aurélio dos Santos Caminha, será convocado para desempatar o resultado. Ele já terá vista dos autos do volumoso processo a partir da próxima semana.

Parecer matemático

Para sustentar a tese de que as jóias da coleção vendidas pela H.Stern são plágio feito a partir da criação da artista gaúcha, o advogado Ruy Zoch Rodrigues apresentou, na resposta aos embargos infringentes, um estudo realizado pela doutora Vera Clotide Garcia, do Instituto de Matemática da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. São oito laudas de um trabalho com a exposição de probabilidades, cálculos e fórmulas.

Na parte conclusiva de seu parecer, a doutora em Matemática diz textualmente que “a probabilidade de que, numa escolha casual, totalmente aleatória, este tipo de coincidência múltipla ocorra é de 1 em 1.000.000.”

Dois dos quatro desembargadores que votaram pelo reconhecimento do plágio aceitaram a pertinência do parecer matemático. Até porque todos os julgadores admitiram “as dificuldades em termos olhos para claramente sacar e apontar as eventuais coincidências entre a criação da artista e as jóias vendidas pela empresa”.

O estudo matemático foi repelido pela relatora Mara Checchi, para quem “os cálculos partem de bases falsas”. Resta saber se o voto do desembargador Marco Aurélio Caminha vai admitir, ou não, que a Matemática pode ser utilizada para definir se houve, de fato, o plágio. (Espaço Vital)

Processo: 70.005.218.722

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