Doenças do trabalho

Conheça as implicações legais do empregador em casos de LER

Autor

  • Antonio Carlos Vendrame

    é engenheiro químico e engenheiro de Segurança do Trabalho presidente do Comitê de Perícias Judiciais junto à ABS - Agência Brasil de Segurança e perito da Justiça do Trabalho Justiça Cível e Justiça Federal.

28 de março de 2002, 17h00

As LER – Lesões por Esforços Repetitivos – e DORT – Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho – são afecções que podem acometer os nervos, músculos, tendões, sinóvias, fáscias e ligamentos, juntos ou separadamente, atinge os membros superiores, região escapular e do pescoço. Tais doenças, caracteristicamente, são sempre degenerativas e cumulativas, além de sempre precedidas de alguma dor ou incômodo.

As doenças não fazem distinção entre os trabalhadores, acometendo desde o trabalho sedentário até o trabalho sob carga. Anunciada, erroneamente, como uma nova doença, elas sempre existiram. Porém, faltava-lhes um nome específico e o reconhecimento devido como patologia associada ao trabalho. Problemas como tendinite, tenossinovite, epicondilite, bursite, lombalgias e outras síndromes, sempre estiveram presentes entre os trabalhadores, mas, a falta de conhecimento induzia o paciente a acreditar que era somente mais uma dor muscular passageira. Tais doenças foram reconhecidas como doença do trabalho através da Portaria nº 4.062/87 do MPAS.

Também conhecida como a doença dos digitadores, eis que esta categoria foi a primeira a manifestar intensamente seus efeitos, as LER/DORT possuem como fator de risco os movimentos repetitivos, as posturas inadequadas, o uso de força muscular excessiva, a ausência de pausas e a organização do trabalho.

A responsabilidade da empresa

Ao nascer o homem torna-se passível de direitos e obrigações, na verdade mais obrigações que direitos. Ao adquirir personalidade jurídica, uma sociedade adquire algumas responsabilidades. Os empresários cônscios de suas responsabilidades conseguem perpetuar sua atividade; ao contrário, aqueles que negligenciam seus deveres, põem em risco a continuidade de seus negócios, bem como seu patrimônio particular.

Questões relacionadas aos acidentes e doenças do trabalho, que aos olhos do leigo parecem inocentes dificuldades, tornam-se elefantes brancos que atemorizam até mesmo os mais hábeis advogados. Sapientíssimo o adágio popular: melhor prevenir do que remediar! A prevenção, desde que implementada oportunamente, tem operado milagres nesta área. É verdade irrefutável que a prevenção é um investimento. No entanto, a prevenção gera seus efeitos ex nunc, isto é, o que passou, passou… Prevenção não retroage no tempo.

Interessante ressaltar que não somente a prevenção técnica deve ser implementada, mas também, a prevenção jurídica, que se ocupa de produzir documentos legais dando cumprimento à legislação vigente. Admitimos que cumprir e fazer cumprir todas as normas de segurança e medicina do trabalho é tarefa árdua e talvez impossível para determinadas estruturas.

A responsabilidade civil da empresa

O acidente do trabalho encontra-se devidamente conceituado no art. 19 da Lei nº 8.213/91. Além do acidente típico, o art. 20 da mesma Lei criou a figura da “entidade mórbida”, representada pela doença do trabalho e doença profissional.

A responsabilidade civil do empregador está legalmente prevista na Constituição de 1988, art. 7º, XXVIII – “seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa”, bem como pelos artigos 159, 1.518, 1.521 e 1.523 do Código Civil.

Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

Art. 1.518. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado e, se tiver mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação.

Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os autores os cúmplices e as pessoas designadas no art. 1.521.

Art. 1.521. São também responsáveis pela reparação civil:

… III – o patrão, amo ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou por ocasião dele.

Art. 1.522. A responsabilidade estabelecida no artigo anterior, nº III, abrange as pessoas jurídicas que exercem exploração industrial.

O art. 1.521 preceitua-se a responsabilidade direta do patrão; o art. 1.523 condiciona a responsabilidade à existência de culpa. A responsabilidade indireta do patrão pelo ato culposo de preposto, ensejou a Súmula 341 do TST: “É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto”.

A ação acidentária, requerendo benefício previdenciário, deve ser ajuizada contra o INSS. Nesta ação não cabe a apreciação da culpa do empregador, já que a responsabilidade do Estado é objetiva. Na ação indenizatória, ajuizada contra o empregador, cujo foro competente, ainda se discute se é o trabalhista ou civil, deve o acidentado demonstrar a culpa do empregador, cuja responsabilidade é subjetiva. A responsabilidade civil da empresa não exclui a prestação assistencial do INSS.

O ato ilícito pode ocorrer por ação ou por omissão, em ambos os casos, se a ação for voluntária e/ou intencional, teremos o ato ilícito doloso; ao contrário, se a ação for involuntária, não obstante ocorrendo o dano dada sua imprevisibilidade, temos o ato ilícito culposo.

Ato culposo é o praticado por negligência, imperícia ou imprudência.

– negligência é a omissão voluntária de diligência ou cuidado, falta ou demora no prevenir;

– imprudência é a forma de culpa que consiste na falta involuntária de observância de medidas de precaução e segurança, de conseqüências previsíveis, que se faziam necessárias no momento para se evitar um mal ou a infração da lei;

– imperícia é a falta de aptidão, habilidade, ou experiência, ou de previsão, no exercício de determinada função, profissão, arte ou ofício.

Uma vez ocorrido o acidente do trabalho, ou mesmo a doença – equiparável ao acidente – constatados os requisitos probatórios, cabe à empresa indenização, seja por dano material, seja por dano moral com base no art. 159 do Código Civil. No entanto, o autor de uma ação civil, necessita provar a ocorrência dos quatro requisitos probatórios cumulativamente:

a existência do acidente (ou doença);

o nexo causal (relação entre o acidente e a atividade laboral);

a culpa da empresa (nas modalidades de negligência, imprudência ou imperícia);

o prejuízo do acidentado.

Assim, provando a empresa que inexiste pelo menos um dos requisitos, prejudicada fica a ação. Voltamos a ressaltar que a indenização civil é cumulativa com o pagamento do seguro social, além do que, havendo culpa da empresa, cabe ação regressiva do INSS para ressarcimento dos valores pagos ao segurado.

Notemos que ao nos referirmos à responsabilidade civil, a única contraprestação existente é a pecuniária, isto é, todos os danos são cobertos por parcelas monetárias. Estão incluídas nos danos materiais as indenizações por despesas médicas e hospitalares, bem como o pagamento de pensão vitalícia até os 65 anos de idade da vítima e ainda, o ressarcimento dos lucros cessantes, equivalente aos salários que o acidentado deixou de perceber em função do acidente. Quanto ao dano moral, as indenizações oscilam entre 200 e 800 salários mínimos, justificadas pela dor psíquica do acidentado.

A responsabilidade penal

Ao contrário da responsabilidade civil que é satisfeita por indenização financeira, na responsabilidade penal está implícita a pena, inclusive restritiva de liberdade. A responsabilidade civil é restrita à pessoa jurídica, a responsabilidade penal alcança a pessoa física dos sócios, diretores e seus prepostos, cuja pena encontra-se no art. 132 do Código Penal, in verbis:

Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto ou iminente – Pena: detenção de três meses a um ano se o fato não constitui crime mais grave.

Atualmente, cogita-se também na responsabilidade penal da pessoa jurídica, particularmente dos crimes contra o meio ambiente, cuja pena, obviamente, não é de restrição de liberdade, mas pecuniária. Desnecessário complementar que, a condenação criminal gera o reconhecimento da responsabilidade civil, já que a sentença penal condenatória é título executivo no civil.

Revista Consultor Jurídico 28 de março de 2002.

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    é engenheiro químico e engenheiro de Segurança do Trabalho, presidente do Comitê de Perícias Judiciais junto à ABS - Agência Brasil de Segurança e perito da Justiça do Trabalho, Justiça Cível e Justiça Federal.

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