Briga trabalhista

Justiça trabalhista condena ex-funcionário de empresa por má-fé

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22 de março de 2002, 16h14

O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (SP) condenou um ex-funcionário por litigância de má-fé. A 1ª Vara de São José dos Campos havia arbitrado a multa em 20% sobre o valor da causa. O TRT-SP manteve a condenação e incluiu mais 10% para o pagamento de honorários advocatícios.

O ex-funcionário foi condenado por ter cobrado, na Justiça, valores trabalhistas que já haviam sido pagos pela empresa. De acordo com a decisão, ele “omitiu o fato de que já havia recebido indenização, quando da rescisão de seu contrato de trabalho, no importe de R$ 2.421,73, a qual, conforme confessou posteriormente em seu depoimento pessoal”.

A empresa foi defendida pelo advogado Carlos Augusto Marcondes de Oliveira Monteiro, do escritório Aureliano Monteiro Neto Advogados Associados.

Segundo o advogado, é comum ex-funcionários entrarem na Justiça para reivindicar valores que já receberam da empresa. “Muitos acham que não perdem nada se entrar na Justiça. Por isso, abarrotam o Judiciário com esses tipos de causas”, criticou.

O Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região também foi condenado solidariamente, ou seja, também pode ser executado pela litigância de má-fé.

Veja a decisão

Processo TRT 15ª Região nº 28913/2000-RO-0

Recurso Ordinário – Rito Ordinário

1º Recorrente: Marcel Maia

2º Recorrente: Gerdau S/A

1ª Vara Trabalhista de São José dos Campos

Inconformadas com a r. sentença de fls. 64/66, que julgou improcedente a reclamatória, recorreram as partes.

O reclamante, ordinariamente, sustenta, em resumo, que o fato de ter tomado ciência das parcelas que lhe foram pagas quando da rescisão do seu contrato de trabalho não significa que ele tenha transacionado o período restante de estabilidade que tinha no emprego em face de ter sido eleito membro titular da CIPA, mas sim, que apenas teve ciência dos valores a ele pagos naquele momento.

Alega que o ato de demissão está eivado de nulidade, e, assim, requer seja julgada procedente a sua reclamatória, com pedido de antecipação de tutela, determinando a sua reintegração imediata aos quadros funcionais da reclamada, bem como condenando-a a pagar todos os salários e demais consectários legais até o trânsito em julgado da presente ação.

Requer, ainda, que seja reformada a r. sentença no tocante à litigância de má-fé, declarando a sua boa-fé processual, anulando a determinação de pagamento da indenização imposta na r. sentença.

A reclamada, adesivamente, requer, em apertada síntese, que seja aplicado, no caso em tela, o disposto no artigo 1531 do Código Civil, em decorrência da litigância de má-fé por parte do autor, condenando-o a pagar em dobro o exato valor constante do termo resilitório que veio perseguir em juízo, e, com ele, solidariamente, seu sindicato de classe. Requer, também, a condenação do autor ao pagamento dos honorários advocatícios, tanto em face da sucumbência quanto pela sua litigância de má-fé.

Contra-razões, pela reclamada, às fls. 85/90, e, pelo reclamante, às fls. 103/106.

A D. Procuradoria, à fl. 111, considerou não haver, naquela oportunidade, interesse a justificar a sua intervenção, e, opinou apenas pelo prosseguimento do feito.

É o Relatório.

V O T O

Conheço do recurso, porque preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

RECURSO DO RECLAMANTE

REINTEGRAÇÃO/ESTABILIDADE PROVISÓRIA

O reclamante sustenta que o fato de ter tomado ciência das parcelas que lhe foram pagas quando da rescisão do seu contrato de trabalho não significa que ele tenha transacionado o período restante da estabilidade que tinha no emprego em face da sua eleição como membro titular da CIPA, mas sim, que apenas teve ciência dos valores a ele pagos naquele momento.

Alega que o ato de demissão está eivado de nulidade, e, assim, requer seja julgada procedente a sua reclamatória, com pedido de antecipação de tutela, determinando a sua reintegração imediata aos quadros funcionais da reclamada, bem como condenando-a a pagar todos os salários e demais consectários legais até o trânsito em julgado da presente ação.

O seu pleito é improcedente.

Primeiramente, ressaltamos que é totalmente inviável a reintegração pleiteada, já que o período estabilitário já se escoou integralmente.

Neste sentido é a orientação Jurisprudencial da SDI, nº 116, que dispõe:

Estabilidade provisória. Período estabilitário exaurido. Reintegração não assegurada. Devidos apenas os salários desde a data da despedida até o final do período estabilitário.

E, também se verifica que os salários referentes ao período restante da estabilidade provisória já foram pagos, em forma de indenização, conforme comprova a cópia do TRCT juntada por cópia à fls. 28, e, expressamente confessado pelo reclamante em seu depoimento pessoal de fl. 33.

Saliente-se que o período estabilitário restante abrangia pouco mais de dois meses, sendo que o reclamante, conforme documento de fl. 28, recebia remuneração no importe de R$ 794,00 por mês, tendo sido-lhe pago uma indenização no importe de R$ 2.421,73, o que revela a existência de indenização integral quanto a este direito.

Destarte, nego provimento ao recurso.

LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ

Requer, o autor, que seja reformada a r. sentença no tocante à litigância de má-fé, declarando-se a sua boa-fé processual e anulando a determinação de pagamento da indenização imposta na r. sentença.

In casu, o reclamante, na exordial, além de requerer a sua reintegração aos quadros da reclamada, pleiteou também o pagamento de todas as verbas salariais do período em que ficou afastado do serviço, e seus consectários legais (veja item “A” de fl. 10).

Porém, omitiu o fato de que já havia recebido indenização, quando da rescisão de seu contrato de trabalho, no importe de R$ 2.421,73, a qual, conforme confessou posteriormente em seu depoimento pessoal (fl. 33), sabia referir-se ao pagamento dos salários do período restante de sua estabilidade provisória como cipeiro (pouco mais de dois meses).

Portanto, ao pleitear pagamento de todas as verbas salariais do período em que ficou afastado do serviço, acabou por litigar de má-fé, visto ter incluído em seu pedido o pagamento de verbas sabidamente já pagas.

Destarte, correta a imposição por parte do Juízo de origem no tocante ao pagamento de uma indenização à reclamada por sua litigância de má-fé, arbitrada em um por cento mais 20% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 18, “caput” e parágrafo 2º, do CPC.

Destarte, nego provimento.

RECURSO DA RECLAMADA

APLICAÇÃO DO ARTIGO 1531 DO CÓDIGO CIVIL

A reclamada requer seja aplicado, no caso em tela, o disposto no artigo 1531 do Código Civil, em decorrência da litigância de má-fé por parte do autor, condenando-o a pagar em dobro o exato valor constante do termo resilitório que veio perseguir em juízo, e, com ele, solidariamente, seu sindicato de classe.

Não procede o seu pleito, isto porque o preceito da lei civil do art. 1531 do Código Civil foi revogado pelos artigos 14 a 18 do Código de Processo Civil, que disciplinaram por inteiro a caracterização da litigância de má fé e a sanção a ela correspondente. Assim, por força do que dispõe a parte final do § 1º do art. 2º da LICC, especificamente sob das expressões “… quando regule inteiramente a matéria de que trata a lei anterior”.

O art. 1531 do Código Civil, quando diz que “aquele que demandar por dívida já paga”, está cogitando de cobrança judicial de dívida, pois a noção de demanda envolve a idéia da lide posta em discussão em Juízo, através do processo. É patente a finalidade da norma civil em apenar o litigante antiético, pois no art. 1532 preconiza expressamente que “Não se aplicarão as penas dos arts. 1530 e 1531, quando o autor desistir da ação, antes de contestada a lide”. Assim, não há dúvida que se trata de sanção a ser imposta a quem for parte em processo.

Não se pode esquecer quão incipientes eram as normas processuais, por ocasião da promulgação do Código Civil que, por evidente, não contemplavam disposições prevendo sanção ao litigante de má fé. A disposição do Código Civil revela nítida intenção do legislador civil de 1916 em suprir lacuna das leis processuais de então, quando impôs a multa por litigância de má fé, adentrando, por conseguinte, na seara do direito processual para frear o litigante que não se pautasse por princípios éticos.

O atual Código de Processo Civil, editado mais de meio século após a promulgação do Código Civil, inegavelmente é obra legislativa moderna e melhor acabada. Houve por bem, então, o legislador de 1973 disciplinar a matéria por inteiro e com maior alcance, incluindo hipóteses não cogitadas pelo legislador civil. Assim, pela disposição da parte final do parágrafo 1º do art. 2º da LIIC, o art. 1531 do CCB encontra-se revogado.

Poder-se-ia argumentar que a norma que impõe a multa, no caso, tem natureza de direito material. Ainda que se assim se admita, não seria esta a única hipótese que o legislador processual adentrou à seara do direito material.

Destarte, nego provimento.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Requer, também, a condenação do autor ao pagamento dos honorários advocatícios, tanto em face da sucumbência quanto pela sua litigância de má-fé.

Os honorários advocatícios, na Justiça do Trabalho, não decorrem pura e simplesmente da sucumbência. Necessário se faz estarem presentes os requisitos previstos nos enunciados 219 e 319, ambos do C. TST, o que não ocorreu no caso em tela.

Porém, tendo em vista que restou caracterizada a litigância de má-fé por parte do autor, e, em conformidade com o disposto no artigo 18 do CPC, deve o mesmo arcar com os honorários advocatícios da parte “ex adversa”.

Note-se que, in casu, o reclamante não pleiteou a concessão do benefício da Justiça Gratuita.

Assim, dou provimento ao recurso adesivo para condenar o reclamante ao pagamento dos honorários advocatícios à reclamada, no importe de 10% do valor dado à causa, por litigância de má-fé. .

Por tais fundamentos, decide-se conhecer dos recursos, para negar provimento ao interposto pelo reclamante, e, dar parcial provimento ao interposto pela reclamada, a fim de condenar o autor também ao pagamento dos honorários advocatícios à parte “ex-adversa”, tudo conforme fundamentação supra, mantendo, no mais, a r. sentença de origem, nos termos retro.

JOSÉ ANTONIO PANCOTTI

Juiz Relator

Revista Consultor Jurídico, 22 de março de 2002.

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