Garantia de vida

OEA determina que o Brasil garanta a vida de presos em RO

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14 de março de 2002, 16h58

O Brasil terá que proteger a integridade física dos detentos da penitenciária Urso Branco, em Rondônia. A determinação é da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA.

A Comissão acatou, nesta quinta-feira (14/3), a solicitação de medida cautelar encaminhada pela Comissão Justiça e Paz de Porto Velho e pelo Centro de Justiça Global.

O documento encaminhado pelas duas organizações destaca o massacre do dia 1º de janeiro de 2002. Na ocasião, pelo menos 27 presos teriam sido mortos, depois de a direção do presídio ter colocado, nas mesmas celas, matadores e presos do “seguro”.

A Comissão da OEA entendeu que o governo brasileiro e o governo de Rondônia não adotaram medidas concretas para garantir a vida dos detentos do Urso Branco. Por isso, são responsáveis pelas execuções dos detentos.

Em documento de quatro páginas encaminhado ao governo, a OEA determina um prazo de 15 dias para que o governo brasileiro adote de imediato medidas necessários para proteger a vida e a integridade pessoal dos internos do presídio. Determina também que o governo tome medidas necessárias para confiscar as armas que estão com os detentos e ainda inicie uma investigação para determinar as responsabilidades penais e administrativas pelas mortes.

No dia 18 de fevereiro de 2002, os detentos Sidnei José da Silva, Marcos Oliveira Monteiro e Arimacy Cavalcante foram assassinados dentro dos pavilhões, enquanto aguardavam transferência de cela. No dia 21 de fevereiro, a Polícia Militar conseguiu chegar a tempo de impedir o assassinato de mais três presos do “seguro”, que estavam em “celas improvisadas”. Entretano, os presos ficaram bastante feridos ao serem agredidos por companheiros de facção adversária.

No dia 10 de março, os detentos Jussiê Costa e Silva e Alessandro Ferreira da Silva foram mortos por colegas. Silva teve a cabeça e um braço decepados.

Veja a íntegra da medida cautelar que resultou na determinação da OEA

Ofício no. JG-RJ 091/02

Rio de Janeiro, 05 de março de 2002

Ao Sr. Santiago Canton

Secretário Executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA

Solicitação de Medidas Cautelares para proteger a vida e a integridade física dos presos da penitenciária Urso Branco no estado de Rondônia, Brasil

Prezado Senhor Secretário:

A Comissão Justiça e Paz da Arquiodiocese de Porto Velho e o Centro de Justiça Global vêm denunciar as graves ameaças de morte contra as pessoas a seguir elencadas, assim como para solicitar que a Comissão ordene o Estado brasileiro a tomar medidas cautelares para proteger a vida e integridade física de:

Marco Cirílio Alves de Oliveira, Gilson Batista Andrade, Itamar Aleixo da Silva Filho, Manoel Almiro Brasil, Adir Carvalho Vieira, Célio da Silva, Sílvio Nascimento de Castro, Mauro Marcelino França da Silva, Evandro Lélio Pinto, Josias Santos Matias, Cristiano Gonçalves de Souza, Estivelson Rodrigues da Silva, Antônio Marcos, Denis Raulino de Araújo, Valquian Ricardo Gomes dos Santos, Júlio Soares de Araújo, José Pereira de Jesus, Anderson de França, Raimundo Nonato Peres de Oliveira, Melke Barbosa de Oliveira, Alexandre Pereira Rodrigues, Evandro Pinheiro Câmara, Erli Rangel, Fábio Ribeiro dos Santos, Sidney Rodrigues Barbas Gonçalves, Emilson Lopes da Silva, Adilson Custódio dos Santos, Celso Cordeiro de Godói, Jaires Ferreira de Lima, José Pães do Nascimento, Nildo Silva Costa, Jackes de Oliveira Moraes, Marlindo Oliveira da Silva, Lenilson Alves Dutra, Altemir Carlos de Freitas, José de Lira de Souza, Valmir Ramos dos Santos, Edivaldo Pinheiro de Souza, Cláudio Visele Gomes, Gilberto Carvalho de Oliveira, Edson Cláudio da Costa, Juliano Oliveira Rodrigues, Francelino Alves de Souza, João Gomes dos Santos, Josué da Silva Luna, Claudionor Soares Pinto e Edson Frota Mendes Primo.

Todas essas 47 pessoas são detentos no presídio de Urso Branco na cidade de Porto Velho, Rondônia e encontram-se em situação de grave risco e perigo iminente. Como detalhamos nesta solicitação, pelo menos 30 presos foram mortos no presídio Urso Branco num período de pouco mais de dois meses, desde 31 de dezembro de 2001. As últimas 03 mortes ocorreram em 18 de fevereiro.

Dada a história de violência, a falta de medidas necessárias para proteger os presos citados, e o clima de tensão que continua no presídio, as entidades peticionárias acima nominadas vêm solicitar que esta Comissão autorize medidas cautelares para protegê-los, amparados pelo artigo 25 do regulamento, pois encontram-se em risco suas integridades física e moral.

Breve Histórico

A situação carcerária no Brasil a cada ano que passa tem se deteriorado: superlotação crônica, instalações deficientes, massacres em diversas penitenciárias, rebeliões dos presos, a corrupção de agentes penitenciários e tortura dos presos são alguns exemplos do cotidiano dos estabelecimentos prisionais.


No estado de Rondônia (norte do Brasil), especificamente na cidade de Porto Velho, temos um exemplo que retrata esta problemática: a Casa de Detenção José Mário Alves, conhecida como “Urso Branco”.

O Presídio Urso Branco foi inaugurado há cinco anos e, desde então, funciona sem credenciamento do Ministério da Justiça.

Desde novembro de 2000, a Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Porto Velho tem acompanhado a situação do presídio Urso Branco. Nesta mesma época, ocorreu no dia 05 de novembro de 2000, uma das rebeliões mais violentas dos últimos anos, que culminou na morte de três detentos e deixou 30 feridos. O departamento administrativo foi totalmente destruído e com ele o arquivo interno, o qual continha o cadastramento dos presos. Desde então, não tem sido mais possível saber ao certo quantos e quem são os presos que se encontram naquela unidade prisional.

Após este incidente, a Polícia Militar do Estado de Rondônia assumiu a administração do local, sendo que desde então passaram pelo cargo de diretor diversos oficiais da polícia militar.

Em agosto de 2001, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados fez uma visita ao presídio e se reuniu com o Governador do Estado, José Bianco, que se comprometeu a fazer melhorias no Urso Branco em 30 dias. Pouco tempo depois, no dia 11 de setembro, em represália ao não cumprimento da promessa de reforma do estabelecimento, os detentos assassinaram seis companheiros de cela.

Em virtude deste fato, um representante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal, Deputado Orlando Fantazinni, e o Diretor do Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça, Dr. Ângelo Rocalli, realizaram nova visita ao presídio. Com essa visita, percebeu-se que a situação do presídio continuava a mesma, inclusive com agravamentos em alguns aspectos: a superlotação piorou, diversos túneis foram cavados para tentativas de fugas, os relatos de torturas permaneceram constantes, assassinatos de presos (pelos próprios presos), falta de atendimento especializado (médico, psicológico, religioso), contínuas ações violentas da tropa de choque da Polícia Militar, além, da falta contínua de medidas sócio-educativas para os detentos sentenciados.

Até o presente momento não houve iniciativa efetiva por parte do Governo do estado com relação a situação de abandono do presídio. Também não foram tomadas medidas para amenizar as tensões entre os presos, como por exemplo transferir os supostos matadores para outro estabelecimento prisional.

Antecedentes do fato

No dia 07 de dezembro de 2001, alguns instantes antes da chegada da Comissão de Justiça e Paz, ocorreu um conflito interno entre os presos. Houve a tentativa do “boi” , onde um grupo arrebentou os cadeados da cela e estavam puxando os detentos da outra cela, com o fim de mata-los. Foi quando um dos agentes penitenciários escutou os gritos de pedido de socorro e com um a arma atirou para cima, dispersando o grupo que iria executar a matança.

Este grupo que realizou o “boi”, seria composto por supostos matadores do presídio. O grupo que seria executado estaria tentando evitar mais mortes, pois os mesmos resolveram ficar todos juntos na mesma cela, armados com “chuchos” , para proteger alguns que estavam ameaçados de morte.

Depois do acontecido resolveu-se que se colocaria os detentos que escaparam da morte em uma cela separada e protegida dos pavilhões, lugar que ficou conhecido como “seguro”. Cabe frisar que no Brasil, as celas de “seguro” constituem a área do presídio em que permanecem os presos condenados a morte pelos colegas. “Seguro” é a expressão comumente utilizada nos estabelecimentos penitenciários para se referir ao local em que ficam os presos que cometeram crimes cruéis (estupradores, matadores de aluguel, etc ). Estes detentos necessitam ficar isolados, para que não sofram punições, represálias e atentados à vida e à integridade física, por parte dos demais presos.

A partir desse impasse, a tensão no presídio se agravou mais, pois de acordo com comentários entre os presos, estes estavam revoltados com os que estavam no seguro pois seriam transferidos para um pavilhão reformado. Via de regra, no Brasil, as condições físicas das celas de “seguro” costumam ser bem piores do que as condições nas outras áreas do presídio. Sem admití-lo publicamente, os diretores dos presídios no Brasil escolhem celas menores ou em pior estado para as áreas de seguro para não criar incentivos para os presos solicitarem transferência para fora da área geral. Inclusive, em muitos presídios, as celas destinadas ao “seguro”, dadas as suas condições inferiores e a superlotação que as caracteriza, são usadas como celas de castigo.

Algumas medidas foram tomadas pelo Juiz da Vara de Execuções Penais, Dr. Arlen Silva de Souza, com a finalidade de recolher para dentro dos pavilhões os chamados “celas livres”. Os “celas livres” (freqüentemente conhecidos como “faxina” por trabalharem na limpeza interna dos presídios) eram aqueles presos de confiança das autoridades que trabalhavam nas dependências dos pavilhões entregando alimentação para os presos nas celas, trabalhando na lavanderia e na limpeza geral. Como os presos de “seguro”, esses costumam ser segregados da população carcerária geral para não correrem risco de vida. A ordem do Juiz Arlen foi dada através do ofício de número 4794/01/VEP, no dia 20 de dezembro de 2001, dirigida ao diretor do presídio Weber Jordano Silva, que dizia o seguinte:


“Determino a Vossa Senhoria, que todos os apenados da denominada “Cela Livre”, sejam recolhidos nas celas, até ulterior deliberação deste Juízo, sob pena de responsabilidade. Que a partir desta data não está autorizado nenhum apenado a ficar na condição de “cela livre””.

Essa medida, porém, foi cumprida somente no dia 01 de janeiro de 2002.

Fatos

No dia 31 de dezembro de 2002, o diretor do Presídio Urso Branco, Weber Jordano, os representantes da SUPEN, Rogério e Cel. PM Abimael Araújo e o Diretor da Companhia de Controle de Distúrbio – CCD, Cel. PM Garret, chegaram ao interior do presídio para executar a ordem expedida pelo Juiz da Vara de Execuções Penais. Conjuntamente, esta equipe tomou a iniciativa de retirar das celas dos pavilhões os presos que eles julgavam ser os “matadores”, considerados os presos mais perigosos, por estarem colocando em risco de vida os presos que estavam no “seguro”.

Essa tentativa de separar os matadores manifesta, no mínimo, a falta de conhecimento da situação carcerária no Brasil, assim como no presídio Urso Branco, e, no pior das hipóteses, um ato temerário das autoridades responsáveis pela execução da decisão judicial. O processo que as autoridades usaram para escolher os “matadores” antes de separá-los dos demais presos foi muito pouco rigoroso.

As autoridades retiraram à força os presos que elas consideraram ser os “matadores” dos pavilhões e colocaram estes nas celas existentes fora dos pavilhões, nas proximidades da administração. Após esta operação, os presos “celas livres” foram colocados dentro das celas nos pavilhões. Continuando a operação, já que em tese os “matadores” estariam totalmente isolados, o próximo passo foi transferir os presos do “seguro” para dentro das celas nos pavilhões.

É bom salientar que foram distribuídos cinco presos do “seguro” em cada cela, perfazendo um total de 45 (quarenta e cinco) presos. Segundo relatos da maioria dos sobreviventes, também esses presos foram retirados à força e conduzidos aos pavilhões.

Por volta das 18hs, a operação estava encerrada. A Força Tarefa da Polícia Militar e a equipe que gerenciou tal tarefa se retiraram do local, pois era final de expediente e feriado. A partir de então, somente os agentes penitenciários ficaram responsáveis por toda a segurança do presídio.

Por volta das 21hs do dia 1º de janeiro de 2002, os presos do pavilhão iniciaram uma rebelião e começaram a assassinar os detentos do seguro, em virtude de grupos rivais terem sido colocados nas mesmas celas. Essa informação foi obtida através de telefonemas que alguns familiares receberam de detentos presos. Nos telefonemas, os presos comunicaram que dois detentos já haviam sido executados. A reivindicação dos supostos executores era para que as autoridades e a imprensa se deslocassem para o local o mais rápido possível pois, caso contrário, as mortes continuariam.

Apesar do aviso dos detentos, o governador em Exercício, Miguel de Souza, só começou a tomar medidas para garantir o controle do presídio, no meio da tarde do dia 2 de janeiro de 2002. A tropa de choque da Polícia Militar de Rondônia entrou no presídio as 15hs do dia 2 de janeiro de 2002, 18 horas após o início da matança.

Ao terminar a revista, por volta das 17h30 o Cel Abimael Araújo, Superintendente de Assuntos Penitenciários, anunciou que foram encontrados 45 corpos de detentos em estado deplorável com cabeças decepadas, braços e pernas mutilados a golpes de “chuchos”. Não foi possível à Comissão de Justiça e Paz acompanhar a saída dos corpos do presídio e tampouco a chegada destes ao IML (Instituto Médico legal) de Porto Velho, o que impossibilitou a confirmação do número de mortos.

Na noite do dia 02 de janeiro, o governador em exercício de Rondônia, Miguel de Souza, explicou que a informação do Gabinete de Gerenciamento de Crise, dando conta de 45 mortos, se baseou na informação de presos sobreviventes e que, na realidade, após a revista da Polícia Militar o número de mortos era 27.

No entanto, a imprensa local informa que a relação de 45 vítimas foi dada após a revista da Polícia Militar. Diversos presos também informaram à imprensa que o número de mortos era maior. A Comissão de Justiça e Paz recebeu um telefonema afirmando que alguns corpos foram conduzidos ao Pronto Socorro João Paulo II e logo enterrados, sem passar pelo Instituto Médico Legal (IML).

A Rádio Caiari recebeu informação de um médico legista dando conta de que o Instituto Médico Legal teria recebido 31 corpos e não vinte e sete como foi informado pelas autoridades. O site www.rondoniagora.com.br chegou a divulgar que “o Instituto Médico Legal, IML, confirmou o transporte dos corpos dos 45 apenados em um caminhão da Secretaria de Estado da Educação”. No dia 05 de janeiro, a afiliada local da TV Globo, TV Rondônia, divulgou uma matéria afirmando que foi realizada uma recontagem dos presos e que estavam faltando 11 detentos.


No dia 04 de janeiro, a Diretora de Pesquisa e Comunicação do Centro de Justiça Global, Sandra Carvalho, participou de reunião em Porto Velho com a presença do Vice-Governador, da Secretária de Justiça do Ministério da Justiça, dos Juízes da Vara de Execução, Procurador Geral do Estado, Procurador Geral de Justiça, Promotor da Vara de Execuções, parlamentares, autoridades policiais entre outros. O objetivo da reunião era, principalmente, tomar medidas emergenciais para garantir a vida dos presos do “seguro” que sobreviveram e que ainda continuavam no presídio. A reunião terminou sem que o Governo de Rondônia tenha encontrado uma solução imediata para o problema.

O governo federal e o governo estadual comprometeram-se a iniciar uma reforma nas instalações do presídio Urso Branco. No entanto, o prazo previsto para que tais obras sejam concluídas é de quatro meses . Além disso, a reforma será realizada sem a transferência dos detentos, o que pode gerar situações de risco ainda mais graves.

Durante a reunião, o Promotor da Vara de Execuções, Dr. Francisco Afonso responsabilizou a Direção do Presídio Urso Branco pela matança, assinalando que “em qualquer lugar do mundo se sabe que não pode misturar os presos do seguro com os demais”. Disse ainda que o Ministério Público “está pensando no porvir, na desculpa que as autoridades vão dar quando o presídio desabar na cabeça dos presos, uma vez que sua estrutura está abalada e é muito grande a infiltração no local”.

No dia 05 de janeiro a Comissão de Justiça e Paz, entrou no interior dos pavilhões do presídio juntamente com os familiares. Ouviram alguns relatos de presos sobreviventes, que afirmam que os responsáveis pelas mortes foram o Juiz e os que executaram a operação.

Os detentos relataram ainda que por volta das 21 horas de 01 de janeiro de 2001, escutaram gritos dentro de diversas celas onde tinham sido colocados os presos do “seguro”. Vários deles pediram por ajuda, gritavam socorro para os agentes penitenciários, mas nada fizeram. Alguns agentes chegaram a falar: “Vocês se entendam, pois não fomos nós que fizemos as mudanças.” Afirmaram que aqueles presos que foram distribuídos nas diversas celas não tiveram quase nenhuma chance de escapar.

Uma semana após o massacre, 47 presos sobreviventes e ameaçados de morte foram transferidos para duas “celas” improvisadas (tratam-se de salas originariamente destinadas à administração do presídio), sem grades ou qualquer outra forma de proteção. Além disso, presos de facções distintas foram colocados nas mesmas “celas” .

Em 10 de janeiro, o Centro de Justiça Global encaminhou um ofício (Ofício nº JG/RJ 008/02) para a Sra. Asma Jahangir, Relatora Especial sobre Execuções Sumárias da ONU, denunciando as execuções ocorridas no Presídio Urso Branco. Encaminhamos uma cópia desse ofício como anexo a esta solicitação.

A recontagem dos presos, coordenada pelo Ministério Público, só aconteceu dezesseis dias após as mortes. Foram recontados 653 presos no total. Destes, 82 estavam sem cadastro, 571 estavam cadastrados pelo Ministério Público. Quatro presos estavam hospitalizados. Sobraram 124 cadastros cujo os presos não estavam no presídio. Somente várias semanas depois esses presos foram apresentados pelo Governo de Rondônia, sendo que cinco continuam desaparecidos.

No dia 18 de fevereiro de 2002, os detentos Sidnei José da Silva, Marcos Oliveira Monteiro e Arimacy Cavalcante foram assassinados dentro dos pavilhões, enquanto aguardavam serem transferidos para o “seguro”.

No dia 21 de fevereiro a Polícia Militar conseguiu chegar a tempo de impedir o assassinato de mais três presos do “seguro”, que encontravam-se nas tais “celas improvisadas”. Estes detentos, no entanto, ficaram bastante feridos e foram agredidos por outros presos de facção adversária.

Dentro desta situação, requeremos à Comissão que intervenha, com a máxima urgência, no sentido de exigir proteção dos presos Marco Cirílio Alves de Oliveira, Gilson Batista Andrade, Itamar Aleixo da Silva Filho, Manoel Almiro Brasil, Adir Carvalho Vieira, Célio da Silva, Sílvio Nascimento de Castro, Mauro Marcelino França da Silva, Evandro Lélio Pinto, Josias Santos Matias, Cristiano Gonçalves de Souza, Estivelson Rodrigues as Silva, Antônio Marcos, Denis Raulino de Araújo, Valquian Ricardo Gomes dos Santos, Júlio Soares de Araújo, José Pereira de Jesus, Anderson de França, Raimundo Nonato Peres de Oliveira, Melke Barbosa de Oliveira, Alexandre Pereira Rodrigues, Evandro Pinheiro Câmara, Erli Rangel, Fábio Ribeiro dos Santos, Sidney Rodrigues Barbas Gonçalves, Emilson Lopes da Silva, Adilson Custódio dos Santos, Celso Cordeiro de Godói, Jaires Ferreira de Lima, José Pães do Nascimento, Nildo Silva Costa, Jackes de Oliveira Moraes, Marlindo Oliveira da Silva, Lenilson Alves Dutra, Altemir Carlos de Freitas, José de Lira de Souza, Valmir Ramos dos Santos, Edivaldo Pinheiro de Souza, Cláudio Visele Gomes, Gilberto Carvalho de Oliveira, Edson Cláudio da Costa, Juliano Oliveira Rodrigues, Francelino Alves de Souza, João Gomes dos Santos, Josué da Silva Luna, Claudionor Soares Pinto e Edson Frota Mendes Primo.


Esses 47 detentos são os sobreviventes do massacre do dia 1º/01/2002. Conforme já afirmamos, todos eles são presos ameaçados de morte e encontram-se atualmente em duas “celas” improvisadas (tratam-se de salas destinadas à administração do presídio), sem grades ou qualquer outra forma de proteção. Além disso, presos de facções distintas foram colocados nas mesmas “celas”.

Neste sentido, as tais “celas” onde encontram-se hoje os presos do “seguro” não oferecem qualquer garantia de segurança aos detentos, em virtude da suas condições precárias. Prova disso, é que em 21.02.02, mais três presidiários foram vítimas de tentativa de assassinato no interior de uma das “celas”.

Análise

O artigo 25, 1, do novo Regulamento dispõe que:

“Em caso de gravidade e urgência e toda vez que resulte necessário de acordo com a informação disponível, a Comissão poderá, por iniciativa própria ou a pedido de parte, solicitar ao Estado de que se trata a adoção de medidas cautelares para evitar danos irreparáveis às pessoas”.

Conforme estabelece o artigo 25 do Regulamento e a reiterada prática da Comissão, que tem agido sempre em prol da defesa dos direitos da pessoa humana, são cabíveis medidas cautelares quando a vida e/ou integridade física de uma ou mais pessoas está sendo diretamente ameaçada.

No caso em tela dividiremos em tópicos para melhor comprovação do preenchimento do regulamento:

a) danos irreparáveis às pessoas: trata-se de perigo iminente à vida dos presos que sobreviveram ao massacre de pelo menos 30 presos na penitenciária de “Urso Branco” (27 no incidente de 31 de dezembro-01 de janeiro, e mais 03 assassinados em 18 de fevereiro) e principalmente daqueles que estavam no “seguro” em razão das ameaças feitas por presos “matadores”que permanecem no presídio. Além disso, o caso em questão trata de presos que tiveram restringido seu direito à liberdade, mas não os seus direitos aos demais direitos humanos, como o direito à vida. Desta forma, caso este crime se concretize, irreparáveis serão os danos, tanto dos ameaçados, quanto de seus familiares, uma vez que, tanto a morte, quanto uma grave lesão corporal que sofram, não poderão ser reversíveis.

b) gravidade e urgência: se deve principalmente porque o presídio ainda está com clima de tensão devido as mortes nos dias 01 de janeiro e 18 de fevereiro de 2001. Há possibilidade de vingança por parte daqueles que eram amigos dos que morreram, além do mais, é possível que haja mais mortes daqueles que já estavam sendo ameaçados mas que sobreviveram ao massacre em “Urso Branco”. Há informação ainda que os presos que precisariam estar no seguro continuam misturados nos pavillões, correndo dessa forma sério risco de vida.

c) necessidade: é necessário que se coloquem essas pessoas a salvo, pois não existe garantia nenhuma de que os mesmos permaneçam vivos, tendo em vista que as autoridades locais não vêm tomando as medidas necessárias para protegê-los. De acordo com que foi exposto acima, numa reunião de diversas autoridades estaduais e outras ONG’s, a respeito sobre medidas emergenciais, nada ficou decidido, sendo que o Governo de Rondônia ainda não encontrou uma solução para o problema.

Pedido

Em função da gravidade dos fatos ora narrados e das violações a direitos humanos que estão na iminência de ocorrer, com base no artigo 25 do novo Regulamento da Comissão, os peticionários vêm requerer que a Comissão solicite ao governo brasileiro a adoção de medidas cautelares, afim de que sejam preservadas as integridades físicas e moral dos presos citados acima , para:

a) requisitar ao Governo brasileiro que transfira, de forma imediata, os presos que estão ameaçados de morte para um outro estabelecimento prisional (ainda que provisório), que assegure efetivamente a vida e a integridade física dos referidos detentos;

b) requisitar ao Governo brasileiro que tome as medidas necessárias para que a reforma do presídio Urso Branco cumpra as determinações legais e que a Comissão Justiça e Paz e o Conselho Penitenciário do Estado de Rondônia tenham acesso ao projeto da obra e possam fiscalizá-la e garantir a aplicação integral dos recursos orçamentários disponibilizados pelo governo federal;

Atenciosamente,

Padre Paulo Tadeu Barausse

Estrela Dalva Campos Amodeo

Fabianny C.Andrade

Comissão Justiça e Paz da Arquiodiocese de Porto Velho, Rondônia

Dom Moacyr Grechi

Arcebispo Metropolitano da Arquidiocese de Porto Velho, Rondônia

James Cavallaro

Andressa Caldas

Sandra Carvalho

Leandro Franklin Gorsdorf

Centro de Justiça Global

Revista Consultor Jurídico, 14 de março de 2002.

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