Enganação máxima

Cobrança de consumação mínima em danceterias pode gerar prisão

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12 de março de 2002, 11h43

Ninguém duvida que o Brasil é um país singular, totalmente diferente de qualquer outra nação da terra. Dentre muitas peculiaridades, uma das características mais marcantes na sociedade brasileira é a institucionalização de certos usos e costumes, que acabam ganhando força de lei. Um desses costumes é a obrigatoriedade da consumação mínima em bares, danceterias e casas noturnas.

Um jovem, por exemplo, resolve ir à uma discoteca e na entrada é informado que será obrigado a consumir pelo menos R$ 40,00 durante a noite. Ou seja, não lhe é oferecido alternativa: ou consome sua cota ou paga pelo que não consumiu. Às vezes, ele nem está com vontade de beber ou está tomando um remédio que impede a ingestão de bebidas alcoólicas. Outras vezes, para não perder o dinheiro cobrado, bebe em excesso, sai dali dirigindo o seu carro e causa um grave acidente de trânsito com vítimas. Tudo porque se viu coagido a beber. Mais um caso típico onde a busca gananciosa e desmedida por lucros arbitrários acabam gerando um problema social e familiar.

Infelizmente, esse tipo de conduta abusiva por partes de bares e casas noturnas é praticado pela maioria dos estabelecimentos como se fosse Lei. Impuseram goela abaixo da sociedade essa situação criminosa da cobrança de consumação obrigatória, como se permitido fosse.

Ora, o Código de Defesa do Consumidor brasileiro, considerado um dos mais avançados do mundo, é bem claro em seu artigo 39, inciso I, quando estabelece que é vedado o fornecimento de produto ou serviço condicionado à compra de outro produto ou serviço. É a chamada “venda casada”, prática considerada totalmente abusiva e ilegal.

Logo, é proibido um estabelecimento obrigar que alguém consuma, seja em bebida ou em comida, um valor mínimo exigido na entrada. A casa noturna não pode condicionar a entrada de uma pessoa em seu recinto, estabelecendo o quanto ela deverá gastar. O consumidor pode entrar quando quiser e consumir o que bem entender.

Não se pode proibir a entrada de um consumidor em um comércio. Ou a casa noturna cobra um valor fixo a título de ingresso (com bilhetes devidamente autorizados pela prefeitura) ou não se cobra nada.

Se o dono ou gerente da casa noturna, porém, impedir a entrada daquele que se nega a pagar a consumação mínima, a saída é discar 190 e chamar imediatamente a polícia. Os infratores serão conduzidos à delegacia, onde será lavrado um Termo Circunstanciado, que obrigará o autor do fato a comparecer no fórum perante o Juizado Especial Criminal, de acordo com a Lei nº 9.099/95 e a Lei 10.259/01. Caso o infrator se recuse a seguir tal procedimento, poderá ser decretada a sua prisão, pois essa prática abusiva é crime previsto no artigo 66 do Código de Defesa do Consumidor, com pena de detenção de três meses a um ano ao infrator e multa.

Portanto, que fique bem entendido a todos os leitores: cobrar consumação obrigatória é proibido por lei. Quem se sentir lesado, deve procurar as entidades de defesa do consumidor, como o Procon e o IDEC, pois somente esses órgãos poderão pressionar o poder Público para que tal procedimento abusivo seja banido. Essa prática escandalosa e imoral da cobrança de consumação mínima é uma enganação máxima e tem que acabar.

Revista Consultor Jurídico, 12 de março de 2002.

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