Contratos de distribuição

O abuso de direito na denúncia e os tribunais do país

Autor

  • Paulo Eduardo Lilla

    é acadêmico de Direito da Fundação Armando Álvares Penteado – FAAP e do Curso de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC – SP.

21 de maio de 2002, 12h37

5 – A DENÚNCIA ABUSIVA DOS CONTRATOS DE DISTRIBUIÇÃO

5.1. O Exercício Lícito do Direito de Denúncia

Como já analisamos, os contratos de distribuição podem ser por tempo determinado ou por tempo indeterminado. Quanto aos contratos por tempo determinado, seria impossível admitir sua resilição unilateral por meio da denúncia. A denúncia, nesse caso, seria sempre abusiva, seria verdadeira rescisão contratual, podendo a parte prejudicada, requerer a resolução do contrato cumulada com perdas e danos.

Já nos contratos de distribuição por tempo indeterminado, a resilição unilateral é meio lícito de pôr termo ao contrato, desde que preenchidos alguns requisitos como o aviso prévio, por exemplo, que tem como finalidade evitar a ruptura brusca do vínculo, prejudicando os investimentos do denunciado, que não teria tempo suficiente para amortizar os custos. A ausência de aviso prévio pode ser compensada pelo pagamento de indenização pelo denunciante dos prejuízos da outra parte. As condições previstas para a denúncia dos contratos de distribuição são justificadas para salvaguardar os interesses do distribuidor que geralmente é prejudicado pelo fim do contrato. O tempo de aviso prévio serve para que o distribuidor possa tomar uma série de medidas de natureza diversa que lhe permitem amortizar os efeitos da ruptura, preparar seu futuro como empresário depois da extinção do vínculo contratual(37).

Alguns autores acreditam que deve haver justa causa para denunciar os contratos de distribuição por tempo indeterminado, o que é um verdadeiro absurdo, posto que ninguém é obrigado a vincular-se eternamente em uma relação contratual. É como entendem HUMBERTO THEODORO JÚNIOR e ADRIANA MANDIM THEODORO DE MELLO: “Na Denúncia unilateral dos contratos de distribuição vigentes indeterminadamente, entretanto, impõe-se a concessão de aviso prévio, com antecedência adequada e compatível com o vulto e com a duração do negócio de distribuição. Mas observados esses requisitos impostos pela boa-fé e a lealdade, a denúncia do contrato é direito fundado nas mesmas razões econômicas e morais que justificam a extinção do contrato no termo ajustado previamente pelas partes. Lembre-se de que a provisoriedade do contrato de distribuição é da sua essência, e não coaduna com os princípios gerais do direito privado a sujeição eterna do indivíduo a uma relação contratual” (38).

Outro aspecto fundamental diz respeito à concepção do distribuidor como empresário independente e que, portanto, assume os riscos de sua atividade comercial(39).

Dessa forma, sendo lícita a denúncia do contrato, cumprindo todos os seus requisitos, principalmente concedendo aviso prévio compatível com a natureza do negócio e os investimentos do distribuidor, parte geralmente prejudicada pela denúncia, não há que se discutir sobre indenização por perdas e danos, indenização de clientela, ou, até mesmo, renovação compulsória do contrato, pedidos freqüentes, apesar de indevidos, que podem ser observados na jurisprudência brasileira.

Por outro lado, é muito comum uma empresa fabricante firmar contrato de distribuição por tempo indeterminado com uma distribuidora, exigindo desta pesado investimento em publicidade, mão-de-obra, maquinaria, etc, sendo que depois de determinado período, o fabricante denuncia o contrato com um prazo ínfimo de aviso prévio, fazendo com que o distribuidor não tenha chances de amortizar seus investimentos. Tal conduta é abusiva e configura-se como verdadeira rescisão contratual, devendo o fabricante indenizar o distribuidor por perdas e danos.

Esse tipo de abuso é muito comum nas relações jurídicas entre fabricantes e distribuidores, sendo que a extinção, nesse caso, opera não como resilição (denúncia), mas como verdadeira rescisão do contrato, podendo o distribuidor requerer na justiça a resolução contratual cumulada com perdas e danos.

5.2. O Abuso de Direito na Denúncia dos Contratos de Distribuição

Vimos que, apesar da denúncia ser meio lícito de pôr termo aos contratos por tempo indeterminados, como os contratos de distribuição, desde que preenchidos alguns requisitos, muitos abusos vêm sendo cometidos na dissolução desses contratos.

Há casos em que a denúncia do contrato opera como verdadeira rescisão contratual, configurando o abuso de direito. Sobre a possibilidade de ocorrer abuso de direito na dissolução dos contratos, citamos a excelente lição de DARCY BESSONE, para quem “o abuso pode, ainda, ocorrer na dissolução dos contratos. Em alguns, a rescisão pode, unilateralmente, partir de um só dos contratantes, mesmo sem que concorra violação de qualquer de suas cláusulas ou o assentimento da outra parte. Assim, no mandato, como na locação de serviços ou na sociedade por tempo indeterminado. O legislador, atento a razões superiores estabelece, em casos tais, exceções à regra de que nenhuma das partes vinculadas pelo contrato pode, a seu arbítrio, desligar-se. A derrogação do princípio inspira-se em motivos especiais, que devem ser atendidos. Não seria civil, no entanto, que o titular da prerrogativa se utilizasse dela no propósito de causar prejuízos ao outro contratante ou causando-os inconsideradamente, mesmo sem a intenção de produzi-los. Neste uso anormal, antifuncional, consistiria o abuso” (40).


Muitas empresas industriais, para burlar a obrigação de denunciar o contrato com boa-fé, concedendo aviso prévio suficiente, firmam contratos de distribuição verbal, sem prazo determinado, acreditando que poderão denunciar o contrato a qualquer tempo, sem aviso prévio e, pior, tentando fazer transparecer que há mero contrato de compra e venda entre fabricante e atacadista. Tal atitude configura-se como abuso de direito, pois há verdadeira rescisão do contrato, podendo o distribuidor requerer a resolução do contrato cumulada com perdas e danos(41).

Para RUBENS REQUIÃO, “a rescisão unilateral desmotivada pode, perfeitamente, ser revista sob as luzes da teoria do abuso de direito, atribuindo à vítima do ato abusivo um direito à indenização” (42).

Podemos chamar a denúncia abusiva de rescisão contratual, posto que há, na verdade, inadimplemento culposo do contrato que o fabricante tenta mascarar ao utilizar-se da denúncia para dissolver seu vínculo com o distribuidor.

Cumpre-nos ressaltar que pode o fabricante resolver o contrato, sem a denúncia e, conseqüentemente, sem aviso prévio, se houver inadimplemento contratual por parte do distribuidor.

Há diversos casos na jurisprudência brasileira em que o distribuidor não cumpriu devidamente suas obrigações, tendo o fabricante, de imediato, posto termo ao contrato. Configura-se, também, nesse caso, abuso de direito por parte do distribuidor, requerer na justiça indenização por perdas e danos, já que a rescisão do contrato foi provocada por ele, e não pelo fabricante. O fabricante não tem obrigação de denunciar contrato, concedendo aviso prévio, quando houver inadimplemento do distribuidor(43).

Nos contratos de distribuição por tempo determinado, não é lícita a denúncia, posto que já há tempo previsto para o cumprimento de todas as obrigações(44). O que deve existir, na verdade, é um tempo mínimo de duração do contrato, já que a duração, como vimos, é uma das características inerentes ao tipo contratual em estudo. Mesmo nos contratos por tempo indeterminado, deve haver um prazo mínimo de duração do contrato para que o distribuidor possa obter um retorno satisfatório de seus investimentos.

Sendo assim, configura-se abuso de direito estabelecer contrato de distribuição por tempo determinado, sem prazo mínimo para o distribuidor amortizar seus investimentos, da mesma forma, nos contratos por tempo indeterminado, em que a denúncia do contrato somente poderá ser efetivada após tempo razoável, de acordo com a natureza do negócio.

Na maioria das vezes, o abuso de direito ocorre quando o fabricante exerce a denúncia do contrato de distribuição com aviso prévio ínfimo, principalmente quando sua relação contratual com o distribuidor tenha durado longos anos, gerando confiança recíproca e maior integração entre ambas empresas. Não menos comum é a ruptura do contrato sem qualquer denúncia mediante notificação e, conseqüentemente, sem a concessão de aviso prévio compatível com a natureza do negócio e com o vulto nos investimentos do distribuidor(45).

A jurisprudência enfrentou problemas ao definir o prazo de aviso prévio a ser concedido, já que, muitas vezes, em contratos de distribuição que duraram por mais de dez anos, é verdadeiro ato abusivo o fabricante conceder aviso prévio de trinta a noventa dias, por exemplo.

Para LEONARDO SPERB DE PAOLA, “se o distribuidor atingiu as metas estabelecidas, tem justificada confiança na continuidade do contrato. Nesse contexto, é irrazoável a sua denúncia imediata ou dentro de um breve período de tempo. Trata-se, aqui, de uma das concretizações mais notórias do princípio da boa-fé” (46).

A importância do aviso prévio na denúncia dos contratos de distribuição, justifica-se na necessidade do distribuidor poder, através de tempo suficiente, amortizar os custos de seus investimentos, principalmente quando o contrato é provido de cláusula de exclusividade, ou seja, quando o distribuidor se obriga a vender, exclusivamente, os produtos do fabricante. Nesse caso, sem prazo suficiente para amortizar seus investimentos, o distribuidor perderia, de forma brusca , seu negócio, sem tempo para liquidar o estoque, dispensar seus empregados e resolver outras pendências relativas aos seus investimentos.

Compartilham do mesmo entendimento HUMBERTO THEODORO JÚNIOR e ADRIANA MANDIM THEODORO DE MELLO: “O que se tem exigido para afastar a abusividade da denúncia unilateral do contrato é a concessão de aviso prévio suficiente ao encerramento dos negócios ou a sua adaptação a uma nova atividade, que seja conforme à natureza do contrato, aos costumes e à boa-fé” (47).

Dessa forma, configurando-se abuso de direito dessa natureza, cabe ao distribuidor requerer na justiça a resolução do contrato cumulada com perdas e danos, ou até mesmo, através de ação cautelar, requerer prazo suficiente de aviso prévio, sendo obrigado o fabricante a manter o vínculo contratual, dependendo da natureza do negócio, até que o distribuidor possa amortizar seus investimentos.


5.3. Indenização pela Rescisão de Contrato de Distribuição

Os tipos de indenizações possíveis quando há denúncia abusiva de contrato de distribuição ou rescisão contratual, são a indenização por perdas e danos e a polêmica indenização de clientela.

A indenização por perdas e danos por inadimplemento contratual do fabricante deve cobrir as despesas feitas pelo distribuidor na exploração do negócio e que o fabricante aproveitará após a extinção do vínculo, as indenizações trabalhistas a que tiverem direito os empregados do distribuidor dispensados em virtude da extinção do contrato de distribuição; deverá, também, recomprar o estoque de mercadorias, já que não terá mais serventia para o distribuidor.

Se o inadimplemento do contrato for causado pelo distribuidor, fica este obrigado a indenizar os lucros cessantes e os danos emergentes ao fabricante.

No entanto, mesmo que o distribuidor seja culpado pelo inadimplemento contratual, o fabricante deve cumprir suas obrigações pendentes com o distribuidor, independentemente do direito de ser indenizado por perdas e danos.

Já a indenização de clientela, apesar de polêmica, foi bem acolhida pela jurisprudência brasileira, a exemplo do que ocorre no direito europeu.

Originariamente, a indenização de clientela surgiu em alguns países europeus na tipificação legal do contrato de agência para, depois, ser também admitida nos contratos de distribuição.

Segundo ANTONIO PINTO MONTEIRO, “de acordo com o que temos entendido e conforme o modelo que a lei portuguesa adotou, a indenização de clientela constitui, no fundo, uma compensação a favor do agente, após a cessação do contrato, pelos benefícios que o principal continue a auferir com a clientela angariada ou desenvolvida pelo agente”. E assim continua: “Ela é devida seja qual for a forma por que se põe termo ao contrato ou o tempo por que este foi celebrado (por tempo determinado ou por tempo indeterminado) e acresce a qualquer outra indenização a que haja lugar (por exemplo, por falta ou insuficiência de pré-aviso ou por violação do contrato pelo principal). É como que uma compensação pela “mais valia” que o agente proporciona ao principal, graças à atividade desenvolvida pelo primeiro, na medida em que o principal continue a aproveitar-se dos frutos dessa atividade, após o termo do contrato de agência” (48).

Não se trata, na verdade, de uma indenização, pois não é necessária prova, pelo agente, de dano. O que conta são os benefícios proporcionados pelo agente à outra parte, benefícios que, ao longo da vigência do contrato, eram desfrutados por ambas as partes, e que, após seu término, apenas o principal ou proponente irá desfrutar(49).

Trata-se, para boa parte dos juristas, de uma expressão da doutrina do enriquecimento ilícito. Dessa forma, os serviços prestados pelo agente devem ser retribuídos através da indenização de clientela, caso contrário haveria um enriquecimento sem causa e injusto do principal ou proponente. Essa seria a função da indenização de clientela.

A jurisprudência de diversos países da Europa vem aplicando esse entendimento por analogia aos contratos de distribuição, por considerar a semelhança existente entre ambos. Semelhança também notada pelo legislador pátrio que introduziu, como vimos, no mesmo capítulo do Novo Código Civil, um tratamento comum tanto para o contrato de agência, quanto para o contrato de distribuição.

Devemos ter muito cuidado ao analisar a questão da indenização de clientela, já que os clientes, na maioria das vezes, não são conseguidos apenas pelo esforço do distribuidor, mas, também, pela marca e bom nome da empresa fabricante, sem contar com fatores externos que podem levar um cliente à determinada distribuidora, como a proximidade de sua residência, por exemplo.

Por um lado, a captação de clientela é fruto do esforço do distribuidor, que investe pesado em publicidade e em qualidade de serviços prestados para atrair os clientes; por outro lado, a clientela está estreitamente vinculada à marca, propriedade do fabricante(50). Vimos que os contratos de distribuição são contratos de integração e de colaboração recíproca, sendo que ambas as partes obtém vantagens no negócio. O fabricante é beneficiado pela rápida e eficiente distribuição dos seus produtos em larga escala ao mercado consumidor, através de sua rede de distribuição. Os distribuidores, por sua vez, são beneficiados pela exclusividade na revenda dos produtos de determinada marca em determinado território.

É difícil provar a indenização de clientela, no entanto ela é geralmente devida quando a marca não é conhecida no mercado, ou quando se trata de empresa multinacional conhecida em outros países, mas não no país em que opera uma de suas distribuidoras. Sendo assim, provada a contribuição da distribuidora na captação da clientela, cabe reparação do fabricante quando da dissolução do vínculo contratual, independentemente de constatação de inadimplemento culposo da empresa distribuidora, pois se trata de indenização sui generis, ou seja, a finalidade da reparação é evitar o enriquecimento sem causa do fabricante.


5.4. As regras do Novo Código Civil para a Denúncia do Contrato de Distribuição

Vimos que o Novo Código Civil tipifica o contrato de distribuição, fixando algumas regras para sua dissolução.

O principal problema enfrentado pela jurisprudência brasileira, como ficou demonstrado, reside no abuso de direito na denúncia dos contratos de distribuição por tempo indeterminado. A denúncia, nesses casos, opera como verdadeira rescisão contratual, posto que o fornecedor não concede aviso prévio suficiente para que o distribuidor possa amortizar os custos de seu investimento e preparar negócios futuros.

O artigo 473 do Novo Código Civil dispõe que “a resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte”. E prossegue, no parágrafo único do mesmo artigo, “se, porém, dada a natureza do contrato, uma das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos”.

De acordo com o dispositivo, nos contratos de distribuição em que o distribuidor teve de arcar com custos elevados para executar o negócio, não importará o prazo de aviso prévio concedido pelo fabricante quando da denúncia do contrato se o prazo não for suficiente para a amortização dos investimentos do distribuidor.

Haveria, no caso, não uma indenização da parte prejudicada, mas a continuação compulsória do contrato pelo tempo necessário à amortização dos custos do distribuidor(51).

No mesmo sentido, o artigo 720 do mesmo Código, determina que “se o contrato for por tempo indeterminado, qualquer das partes poderá resolve-lo, mediante aviso prévio de noventa dias, desde que transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto do investimento exigido do agente”. E prossegue, no parágrafo único, “no caso de divergência entre as partes, o juiz decidirá da razoabilidade do prazo e do valor devido”.

Apesar de o legislador ter fixado um prazo de aviso prévio de 90 dias, tornou relativa a questão dependendo da natureza do negócio e do vulto do investimento exigido do agente ou distribuidor, fornecendo-lhe prazo suficiente para amortizar os custos de seus investimentos.

Dessa forma, há como se evitar denúncia abusiva de contrato de distribuição com prazo ínfimo de aviso prévio, problema enfrentado diversas vezes pela jurisprudência brasileira.

Quanto à indenização, o legislador fixou algumas regras precisas, como a do artigo 715 que dispõe que o distribuidor terá direito à indenização se o fabricante, sem justa causa, cessar o atendimento das propostas ou reduzi-lo tanto que se torna antieconômica a continuação do contrato. Nota-se que o legislador refere-se aos casos de resolução do contrato, que pode ocorrer tanto pela cessação do fornecimento, de produtos pelo fabricante ao distribuidor, ou a diminuição desse fornecimento. Havendo justa causa, há resolução do contrato, posto que haveria inadimplemento do distribuidor, mas, não havendo justa causa, há verdadeira rescisão do contrato, pois a culpa, no caso, recai sobre o fabricante.

Se o distribuidor for dispensado por justa causa, de acordo com o artigo 717, terá direito a ser remunerado pelos serviços úteis prestados ao fabricante. No entanto, esse direito não exclui a indenização por perdas e danos devidas ao fabricante pelos prejuízos causados.

O Novo Código Civil, apesar da confusão terminológica e conceitual, resolve o problema da amortização dos custos do distribuidor quando da extinção do vínculo contratual, possibilitando prazo de aviso prévio compatível com a natureza do negócio celebrado entre as partes.

Traz normas claras também para a indenização do contrato e põe fim à indenização de clientela, já que não condiz com a natureza dos contratos de distribuição, posto que o distribuidor é comerciante autônomo e obtém benefícios com a utilização da marca do fabricante, e, portanto, deve assumir os riscos de sua atividade.

6. CONCLUSÃO

Os contratos de distribuição apesar de serem um dos meios mais eficientes de ligação de produção ao público consumidor, e de integração entre empresa fabricante e empresa distribuidora, vêm sendo objeto de diversos litígios nos nossos Tribunais.

Muitos abusos vêm sendo cometidos na extinção desses contratos, principalmente por fabricantes que abusam do direito de denúncia nos contratos por tempo indeterminado, ou até mesmo chegam a cometer esse tipo de abuso nos contratos por tempo determinado causando prejuízos irreversíveis para o distribuidor. Não podemos esquecer, por outro lado, de mencionar que alguns abusos são cometidos pelo distribuidor, já que a denúncia é meio lícito de pôr termo ao contrato por tempo indeterminado, desde que preenchidos alguns requisitos, como a boa-fé e a concessão de prazo de aviso prévio suficiente, de acordo com a natureza do negócio e com o vulto nos investimentos do distribuidor.


O contrato de distribuição é atípico misto até a entrada em vigor do Novo Código Civil. Essa atipicidade mista contribuiu para os abusos cometidos na denúncia dos contratos de distribuição, já que não havia amparo legal e a jurisprudência brasileira não permitia a aplicação analógica da Lei nº 6.729/79 (Lei Ferrari) aos demais contratos de distribuição.

O Novo Código Civil, apesar de algumas falhas, principalmente na conceituação de contrato de distribuição, proporcionou regras precisas para a dissolução desses contratos, com o intuito de evitar possíveis abusos a serem cometidos nessa relação contratual tão relevante para a sociedade, para o desenvolvimento da economia de mercado, e para a segurança do trânsito jurídico que, segundo GUSTAV RADBRUCH(52), é necessidade vital do comércio.

*O trabalho teve o 1º lugar no Concurso de Monografia e Pesquisa da Faculdade de Direito da FAAP – Prêmio Josaphat Marinho. O professor Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa foi o orientador da pesquisa.

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____________________. Novo Código Civil – Texto Comparado, São Paulo: Atlas, 2002.

Notas de rodapé

1 Enzo Roppo, O Contrato, p. 67.

2 – Cf. Augusto Baldassari, I Contratti di Distribuzione: Agenzia, Mediazione, Concessione di Vendita, Franchising.

3 – Orlando Gomes, Contratos, p. 374.

4 – Humberto Theodoro Júnior e Adrana Mandim Theodoro de Mello, Apontamentos sobre a Responsabilidade Civil na Denúncia dos Contratos de Distribuição, Franquia e Concessão Mercantil, pp. 14/15.

5 – Francesco Galgano, Diritto Privato, p. 544.

6 – Claude Champaud, La concession Commerciale, in: Revue Trimestrielle de Droit Commercial, p. 471.

7 – Waldirio Bulgarelli, Contratos Mercantis, p. 459.

8 – Antonio Pinto Monteiro, Denúncia de um Contrato de Distribuição, p. 47.

9 – Fernando Netto Boiteaux, Contratos Mercantis, p. 100.

10 – Essa independência, como veremos adiante, é relativa, posto que o fabricante, concedente, tem o poder de fiscalizar as operações de venda da distribuidora, uma vez que esta se beneficia da utilização do prestígio da marca do concedente. Trata-se, na verdade, de contrato de integração horizontal e colaboração recíproca, que gera direitos e obrigações para ambas as partes.

11 – Teresa Puente Muñoz, ob. cit. p. 22.

12 – Humberto Theodoro Júnior e Adriana Mandim Theodoro de Mello, ob. cit. p. 12.

13 – Assim esclarece Requião: “Esclarecido, como já foi efetuado no item 2 acima, de que não nos convence a distinção de nomenclatura entre concessão ou franquia” (Concessão Comercial Atípica e seus Efeitos, in: Aspectos Modernos de Direito Comercial, 3º volume, p. 251).

14 – Waldirio Bulgarelli, ob. cit. p. 458.

15 – Fabio Konder Comparato, Franquia e Concessão de Venda no Brasil: Da Consagração ao Repúdio, in: Revista de Direito Mercantil, nº 18, pp. 53/54.

16 – Humberto Theodoro Júnior e Adriana Mandim Theodoro de Mello, ob. cit. p. 18.

17 – Teresa Puente Muñoz, ob. cit. p. 44.

18 – Pedro Pais de Vasconcelos, Contratos Atípicos, p. 207.

19 – Ibidem, p. 214.

20 – Álvaro Villaça Azevedo, Validade de Denúncia em Contrato de Distribuição sem Pagamento Indenizatório, in: RT 737 – março de 1997 – 86º ano.

21 – Cf. Acórdão do STJ, do Ministro Eduardo Ribeiro, Presidente e Relator, Agravo Regimental no AG nº 43.329-3 SP (93.0026159-2): “Contrato de distribuição relativo à informática. Impossibilidade de aplicação analógica de disposições contidas na Lei 6.729/79, a estabelecer uma regulamentação especialíssima para as relações pertinentes “a concessão comercial entre produtores e distribuidores de veículos automotores em via terrestre”. Trata-se de diploma que estatui conjunto normativo particularmente distinto do direito comum, criando significativas restrições à autonomia da vontade, que não se hão de estender a situações nele não previstas”. Podemos citar também acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro também é contrário a aplicação da analogia: “Contrato de Concessão Comercial – Possibilidade de Denúncia – Descabimento de Indenização – Inaplicabilidade da Lei nº 6.729/79 – Voto Vencido: Indenização devida – Apuração em liquidação por artigos (Relator Desembargador Roberto Guimarães, Apelação nº 3.396/90)

22 – Art. 4º – Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

23 – Leonardo Sperb de Paola, Sobre a Denúncia dos Contratos de Distribuição, Concessão Comercial e Franquia, in: Revista Forense – Vol. 343.

24 – Ibidem, p. 134.

25 – José Alexandre Tavares Guerreiro, Aplicação Analógica da Lei dos Revendedores, in: RDM, nº 49, p. 38.

26 – Eros Roberto Grau e Paula A. Forgioni, Restrição à Concorrência, Autorização Legal e seus Limites – Lei 8.884, de 1994 e Lei 6.729, de 1979 (“Lei Ferrari”), in: RDM, vol. 114, p. 271.

27 – Norberto Bobbio, O Positivismo Jurídico – Lições de Filosofia do Direito, p. 218.

28 – Carlos Maximiliano, Hermenêutica e Aplicação do Direito, p. 210.

29 – Tercio Sampaio Ferraz Jr., Introdução ao Estudo do Direito, p. 302.

30 – Orlando Gomes, ob. cit. pp. 374/375.

31 – Sílvio de Salvo Venosa, Direito Civil – Contratos em Espécie, p. 620.

32 – Ibidem, p. 621.

33 – Orlando Gomes, ob., cit., p. 188.

34 – Ibidem.

35 – Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito das Obrigações vol. II, p. 99.

36 – Darcy Bessone, ob., cit., p. 250.

37 – Tereza Puente Muñoz, p. 175.

38 – Humberto Theodoro Júnior e Adriana Mandim Theodoro de Mello, ob., cit., p. 26.

39 – Cf. acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo que afasta a idéia de denúncia vazia nos contratos de distribuição por tempo indeterminado, considerando apenas necessário aviso prévio compatível com a natureza do negócio ajustado entre as partes: “Distribuição Comercial – Contrato – Prazo indeterminado – Denúncia vazia – Cláusula expressa que a autoriza, sem indenização, mediante notificação prévia – Proposta de redução gradativa das relações negociais, num período de nove meses, recusada pela distribuidora – Resilição ulterior por iniciativa desta – Abuso de direito não caracterizado – Indenização não devida – Recurso não provido” . (Apelação Cível nº 72.347-4 – São Paulo, Relator Cezar Peluso, in: JTJ – LEX – 211/18).

40 – Darcy Bessone, ob., cit., p. 236.

41 – Cf. acórdão da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: “Distribuição. Contrato. Caracterização do contrato de distribuição entre o fabricante de produtos alimentícios e o seu repartidor. Desfazimento unilateral e injustificado do contrato pelo produtor. Indenização devida, compreendendo danos emergentes e lucros cessantes”. Mais adiante, o Desembargador Ruy Rosado de Aguiar expõe em seu voto: “Diante desse quadro, não se sustenta a tese da ré, de certo modo ingênua, querendo fazer crer que o seu relacionamento com a autora não passava de simples operação de compra e venda entre fabricante e atacadista, como se fosse possível esquecer que a autora, durante mais de 20 anos, exerceu com exclusividade, na região, a distribuição dos produtos (apesar de a exclusividade não ser característica indispensável a este contrato), usando o nome e a marca da produtora, seguindo a tabela de preços por ela fixados, exercendo a distribuição do produto em Santa Maria e arredores, e dedicando-se quase que com exclusividade para essa distribuição, como foi constatado na perícia”. (Apelação Cível nº 590017778 – Relator Des. Ruy Rosado de Aguiar Júnior – julgamento dia 12/06/1990).

42 – Rubens Requião, Concessão de Venda com Exclusividade, in: Aspectos Modernos de Direito Comercial, p. 140.

No mesmo sentido, cf. Teresa Pente Muñoz: “Ahora bien, cuando la ruptura del contrato es consecuencia del ejercicio abusivo del derecho de denuncia, es consequencia de una denuncia improcedente, el concessionario tiene derecho a ser indemnizado, siendo preocupación constante de los tribunales franceses, como ya hemos dicho, el evitar el abuso del derecho a través del ejercicio de esta faculdad”. Ob. cit. P. 178.

43 – Cf. acórdão do Superior Tribunal de Justiça: “Concessão Comercial. Rescisão do contrato. Justa causa. Demonstração no processo que a concessionária dera causa à resilição do contrato. Descabe o pedido de indenização. Nulidades processuais inexistentes. Recurso não conhecido” – Recurso Especial nº 79.636-RS, Relator Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, 27 de fevereiro de 1996 (data do julgamento).

44 – Cf. recente acórdão da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Alçada de Minas Gerais que concedeu pedido de indenização ao distribuidor por denúncia (verdadeira rescisão), pelo fabricante, do contrato de distribuição por tempo determinado firmado entre eles: “Contrato de Revenda e Distribuição – Prazo Determinado – Rescisão Contratual – Notificação – Indenização – A autonomia da vontade deve respeito ao equilíbrio entre os contratantes, e o rompimento do contrato, como o referido, gera direito à reparação pela mais valia da clientela conquistada, despesas com aquisição de bens, etc”. Apelação Cível nº 327097-3, Relator, Juiz Maciel Pereira – julgado dia 22/03/2001.

45 – Cf. Acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul parece exemplificar a questão: “Contrato de Distribuição de Bebidas – Sendo indeterminado o prazo de sua duração, nenhuma das partes pode lhe pôr fim, imotivadamente, sem previamente avisar a outra. Assim procedendo o fabricante, causa dano grave ao distribuidor, inopinadamente privado de uma importante fonte de lucro e forçado a redimensionar sua estrutura operacional em função da perda. Indenizáveis são os danos daí diretamente decorrentes, bem como os lucros cessantes” . Apelação Cível nº 593136930 – 6ª Câmara Cível – Porto Alegra – Relator, Sr. Adroaldo Furtado Fabrício – 21 de dezembro de 1993.

No mesmo sentido, acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná, Apelação Cível nº 218/88, de Curitiba – 8ª Vara Cível – Relator Des. Negi Calixto – 23 de novembro de 1988.

46 – Leonardo Sperb de Paola, ob., cit., p. 142.

47 – Humberto Theodoro Júnior e Adriana Mandim Theodoro de Mello, ob., cit., p. 30.

48 – Antonio Pinto Monteiro, ob., cit., p. 79.

49 – Ibidem.

50 -Teresa Puente Muñoz, p. 2

51 – Leonardo Sperb de Paola, p. 143.

52 – Introdução à Ciência do Direito, p. 89.

Autores

  • Brave

    é acadêmico de Direito da Fundação Armando Álvares Penteado – FAAP e do Curso de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC – SP.

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