Terça-feira, 14 de maio.

Primeira Leitura: FHC, Serra e Lula devem tentar acalmar o mercado.

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14 de maio de 2002, 9h09

Hora H

O risco subiu 2,96%, com o dólar fechando a R$ 2,52. Bolsa em queda. É, aparentemente, o pior dos mundos. E olhem que não faltou um coquetel de notícias que podiam ser consideradas positivas na segunda-feira: superávit na balança comercial na segunda semana de US$ 210 milhões, o que eleva o acumulado no ano para US$ 1,7 bilhão; a Fipe apontando deflação de 0,03%, a Receita divulgando arrecadação recorde em abril, de R$ 19,8 bilhões. Mais ainda: o presidente do BC até acenou com queda de juros por conta da inflação descendente.

Sem ânimo

Mas nada disso foi o bastante para animar os mercados. A disparada de índices negativos para o Brasil se deve mesmo ao chamado risco político. O mercado agora põe preço na possibilidade de Lula ganhar as eleições ainda no primeiro turno.

Responsabilidade

É chegada a hora de governo e PT perceberem a responsabilidade que têm no atual cenário polÍtico. Ao governo cabe operar para tentar acenar ao mercado com algum incentivo ao crescimento. Ao PT cabe deixar claro que o mundo não acabará no dia primeiro de janeiro de 2003 se Lula for eleito.

À mesa

Como cada um deve operar? Para começo de conversa, devem-se sentar à roda de uma mesa FHC, seu candidato, José Serra, e o próprio Lula. Pacto pela governabilidade mesmo. O governo deve buscar baixar os juros e combinar com o PT uma tática de abafa no Congresso para aprovar a CPMF.

O PT, por sua vez, tem de dizer que não se opõe coisa nenhuma à Lei de Responsabilidade Fiscal e que nem pensa em romper com o FMI porque o atual acordo expira em novembro. Nem haverá com o que romper.

Radicalização

O pior efeito dessa convergência de notícias será, se acontecer, a radicalização da campanha. Caso, de fato, novas pesquisas eleitorais venham a indicar a chance de Lula ser eleito no primeiro turno ou uma queda significativa de Serra, a base governista vai exigir da campanha que o candidato tucano avance na jugular de Lula, acusando-lhe incompetência, despreparo, inexperiência – enfim, o vasto saco de maldades de que uma campanha política é capaz.

Nova hegemonia

Por que isso é ruim? Porque PT e PSDB têm tudo para constituir, como defende Primeira Leitura, o novo núcleo da hegemonia da política brasileira. A hegemonia do centro. Se a campanha se radicaliza e, ainda assim, Lula vence, certamente vencerá um partido menos afeito à negociação do que na hipótese de uma disputa franca e tranqüila.

Se Serra vence, do mesmo modo, um acordo futuro com o PT com vistas à governabilidade fica bem mais difícil. Eis a hora de FHC demonstrar que é, de fato, um estadista. Eis a hora de Serra e Lula demonstrarem que são candidatos também a estadista, não apenas a presidente do Brasil.

Coletiva

Na entrevista a correspondentes da segunda-feira, Lula pediu que Hugo Chávez ouça a sociedade civil, que haja eleições em Cuba, afirmou que o Brasil honrará os compromissos da dívida externa, que o que está acordado por este governo é letra válida no próximo. Está tudo absolutamente direito.

Mas parece que isso, por si mesmo, já não vale tanto. É preciso dar sinais claros, internos, de que o partido disputa o poder para valer. Assim, sinais no que se refere à CPMF e à Lei de Responsabilidade Fiscal são obrigatórios.

Hipocrisia

O acordo que os Estados Unidos fazem com a Rússia de redução das armas nucleares é a melhor definição do que é a hipocrisia na definição do escritor Oscar Wilde: “é o tributo que o vício presta à virtude”.

As armas que sobram são o bastante para destruir o mundo muitas vezes – embora só haja um, e uma só destruição baste… – e, aprovado o tal escudo antimísseis, todo o resto perde sentido. Em suma: o acordo de agora em nada tira o potencial beligerante, militarista e unilateralista do governo republicano de George. W. Bush.

Assim falou…Luiz Inácio Lula da Silva

“Deve haver algum espertinho ganhando dinheiro com isso [especulação]. Posso garantir que não é o PT”.

Do presidenciável do PT, aos correspondentes estrangeiros, ao comentar os movimentos especulativos no Brasil.

Tudo é história

Em meados do século 19, o Brasil exibia indicadores econômicos e até sociais – apesar da escravidão – tão ou mais virtuosos do que os Estados Unidos e alguns dos países mais ricos da Europa. Por decisões erradas de suas elites, entramos no século 20 como um dos países mais atrasados do planeta, perdido em relações de compadrio, em patrimonialismo, em miséria econômica.

Maiores detalhes no livro A Nação Mercantilista (Editora 34), do jornalista e historiador Jorge Caldeira. Agora, de novo, o país vive um momento crucial. Ou faz um pacto pela governabilidade futura – e, então, tudo pode ser melhor – ou o confronto eleitoral evolui para o tudo ou nada. Como país, fizemos escolhas erradas no século 19. Seria penoso repeti-las no século 21.

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