Flexibilização e economia

Advogado critica flexibilização trabalhista e economia argentina

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3 de maio de 2002, 17h56

A Argentina fez toda a lição de casa dentro do receituário neoliberal. Privatizou suas empresas. Flexibilizou toda sua legislação trabalhista, acreditando que com isso haveria preservação dos empregos e até o seu incremento. Deu no que deu. A Argentina está quebrada e, como se fosse um doente terminal, cede a todas as pressões para receber novos empréstimos do FMI, atualmente necessários, já que sua economia toda se tornou dependente das amarras do sistema econômico mundial globalizado. Quanto mais se paga, mais a dívida cresce assustadoramente como denuncia o Tribunal da Dívida Externa, pela Fundação Perseu Abramo, ainda com dados colhidos até 1998, assim, concluindo:

“Estes débitos, como a metástase de um câncer, não param de crescer. Tomemos a dívida externa, por exemplo. Em 1964, ela era de US$ 3 milhões; uma “ninharia”, se compararmos ao volume que veio a atingir ao longo dos anos.

Nove anos depois, ela já remontava US$ 13,76 bilhões. Em 1978, chegou a US$ 52 bilhões, saltou para 71,5 bilhões em 1980 e para US$ 115 bilhões em 1989. Em 1994, no início do governo Fernando Henrique Cardoso, este papagaio chegou a US$ 146 bilhões. Hoje, ela está batendo em 212 bilhões de dólares. O mais curioso – para dizer o mínimo – é que somente de 1989 a 1997, o Brasil já desembolsou, a título de juros e amortizações, US$ 216 bilhões. Ou seja, a dívida era 115, pagamos 216 e continuamos devendo 212 bilhões de dólares. Somente em 1998, pagaremos pelo serviço da dívida, o equivalente ao orçamento anual do ministério da Saúde: US$ 17,8 bilhões”, in (www.jubileu2000.org.br).

De lá para cá, o valor da dívida externa cresceu mais ainda, apesar da pesadíssima sangria no orçamento nacional para o pagamento dessa dívida. De acordo com o 2º Tribunal da Dívida Externa (Rio /99), a dívida já foi paga e prosseguir com o seu pagamento é uma forma de submeter o país aos interesses do capital financeiro internacional e do G7, ferindo de morte a soberania nacional.

Rejeitando as críticas do próprio FMI, por seu diretor do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI, Cláudio Loser, concluindo que o excessivo endividamento externo deixa o país em situação vulnerável, o governo brasileiro reagiu, através do chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes.

Segundo ele, “não vê risco para a dívida externa de US 209,4bilhões”, já que o valor da dívida externa é alto, mas tem um perfil de vencimentos muito diversificado, está estável e com tendência de queda.

Ele destacou também que mais de 50% da dívida é de responsabilidade do setor privado, o que reduz o risco para o País.Do total de US$ 209,4 bilhões do estoque da dívida externa registrado em janeiro, cerca de US$ 92,3 bilhões são do setor público. O restante é de responsabilidade do setor privado”. (O Estado de São Paulo, 23 de abril de 2002).

Existem em trâmite no Congresso Nacional diversos projetos de lei do executivo federal pretendendo o desmonte da legislação trabalhista, sob discurso de que isso irá modernizar as relações de trabalho, manter os empregos e até incrementá-los. Veja-se o exemplo do projeto de modificação do art. 618 da CLT para que prevaleça o negociado em vez do legislado.

Enquanto as entidades sindicais eram fortes, bem estruturadas, esta proposta não veio. Agora que os sindicatos estão enfraquecidos, sem qualquer força para impor suas reivindicações, como conseqüência da crise econômica mundial, do desemprego, o governo insiste nessas propostas que já não deram certo na Argentina e que não darão certo aqui.

Ao capital especulativo transnacional só interessa o lucro, o aumento da produtividade e a redução dos custos operacionais, sem nenhum compromisso com o social, com a dignidade da pessoa humana, com a vida, que é o papel do Estado, visando à promoção do bem comum, conforme os fundamentos já expendidos nos nossos artigos divulgados pela Revista Consultor Jurídico, em especial intitulado por Soberania, o inalienável direito dos povos livres, e o por Desmonte trabalhista – Flexibilização é exigência das transnacionais em países ricos.

Veja relato sobre o posicionamento dos argentinos em relação a privatização de suas empresas

Buenos Aires – Cansados da recessão e decepcionados com o governo, os argentinos também estão insatisfeitos com o funcionamento das empresas de serviços públicos privatizadas, que no meio da maior crise econômica da História, pretendem aumentar suas tarifas. Por este motivo, grande parte dos argentinos sonha com a reestatização das empresas privatizadas. Isso é o que indica uma pesquisa da consultora Hugo Haime e Associados, que sustenta que 65% dos argentinos estão a favor da reestatização.

Segundo Hugo Haime, na época das privatizações, ao longo dos anos 90, a maioria dos argentinos aprovava as vendas das empresas estatais, “sempre que isso trouxesse bem-estar. Quando o bem-estar não está, é lógico que as pessoas desconfiam do modelo econômico”.

Ao longo do governo do ex-presidente Carlos Menem (1989-99), todas as empresas estatais foram privatizadas, com raríssimas exceções, como as usinas atômicas e as decadentes instalações de “Fabricaciones Militares”, no passado, uma imensa empresa estatal que fabricava desde bombas até veículos, passando por vagões de bondes.

A pesquisa também indica que 60% dos entrevistados afirmam que a Argentina nunca mais teria que pagar sua dívida externa pública. Somente 34% dos argentinos seriam favoráveis ao pagamento.

No entanto, para os argentinos, os vínculos com o sistema financeiro internacional não teriam que ser cortados, já que 52% dos pesquisados consideram que para sair da crise é necessário negociar com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Apenas 37% afirmam o contrário.

Pagamento de dívidas

Segundo a Fundação Capital, dezoito grandes empresas argentinas pararam de pagar suas dívidas desde janeiro. No total, estas empresas não conseguiram pagar débitos de US$ 541 milhões, tanto em capital como juros. Os setores mais atingidos são o bancário, com 39% do total dessa dívida; comunicações, com 14,7% dos vencimentos; energia elétrica, com 11,9%; petróleo, 8,2% e gás, 7,5%.

A Fundação sustenta que as empresas argentinas que se endividaram no exterior ao longo da maior parte da década passada “hoje se encontram com enormes problemas financeiros e se encontram diante de uma iminente moratória generalizada”.

Inflação

Diversos analistas consideram que o país está no caminho de uma disparada da inflação. Segundo Héctor Valle, ex-assessor do ministério da Produção, com o dólar a 2 pesos, a estimativa é que a inflação anual chegue a 40%. Com o dólar a 3 pesos, poderia chegar a 60%.

No entanto, Valle considera que poderá chegar a muito mais: “Se ficasse em 60%, seria um sucesso. Mas é muito difícil evitar que ocorra uma espiral inflacionária”.

Para o ex-ministro da Economia, Roberto Alemann, a pior medida que o governo poderia ter daqui para frente é a de – no meio de um cenário de desvalorização diária – emitir moeda e implementar uma indexação mensal que fosse automática para preços e salários.

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