Relações trabalhistas

TST livra sindicato de condenação por litigância de má-fé

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2 de maio de 2002, 10h31

O dispositivo da legislação civil que prevê punição para quem tenta obter na justiça os valores correspondentes a uma dívida que já foi paga não tem aplicação no âmbito do Direito do Trabalho. O posicionamento foi adotado pela Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho durante o exame de um recurso de revista ajuizado por um restaurante de São Paulo contra sindicato que cobrou dívidas que já tinham sido pagas. A Turma, por unanimidade, acompanhou o voto da juíza convocada Eneida de Araújo.

Em 1996, o Sindicato dos Empregados no Comércio Hoteleiro e Similares de São Paulo ingressou na Justiça do Trabalho com uma reclamação trabalhista contra o Restaurante América Alameda Santos. O sindicato queria obter o dinheiro relativo a contribuições assistenciais e confederativas que não teriam sido recolhidas pela empresa. A entidade queria receber também os valores acrescidos de multas e indenizações.

O Restaurante América afirmou que pagou todas as contribuições assistenciais. Em relação às contribuições confederativas, argumentou que sua fixação foi determinada por uma assembléia do sindicato e não por norma coletiva. O órgão empregador também sustentou que as multas pretendidas eram devidas pelos próprios trabalhadores, uma vez que a empresa deixou de fazer os descontos das contribuições confederativas a pedido dos empregados. Por isso, o Restaurante América afirmou que o sindicato agiu com litigância de má-fé e pediu a condenação da entidade com base no artigo 1531 do Código Civil.

O dispositivo da lei civil estabelece que “aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas, ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir”.

A 60ª Vara de Conciliação e Julgamento paulistana deu ganho de causa à empresa. De acordo com a decisão, “as verbas solicitadas foram todas pagas, sendo certo que o sindicato deveria ter efetuado uma auditoria correta em suas contas antes de postular o que foi pago nas épocas próprias”. A Justiça mandou o sindicato pagar 20% do valor da causa por ter agido com “deslealdade processual”. Também determinou o dobro das verbas pleiteadas, nos termos do artigo 1531.

A decisão foi modificada pela 9ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. Segundo o TRT-SP, o pagamento da indenização dobrada não era devido pela entidade sindical uma vez que “a sanção prevista no artigo 1531 do Código Civil não era aplicável aos processos trabalhistas”.

O Restaurante América propôs recurso de revista ao Tribunal Superior do Trabalho. Os ministros da Terceira Turma entenderam que não existe norma específica – na legislação trabalhista – para punir o comportamento adotado pelo sindicato. O ministro Carlos Alberto Reis de Paula acrescentou que nem para “pedidos impróprios feitos por trabalhadores ou seus advogados”.

A relatora da matéria, juíza convocada Eneida de Araújo, afastou a possibilidade de aplicação da legislação civil ao caso por incompatibilidade com o Direito do Trabalho. “Com efeito, tendo o sistema trabalhista suas regras próprias, somente se recorre ao direito comum quando suas normas não forem incompatíveis com os princípios fundamentais do Direito do Trabalho”.

De acordo com a juíza, “o Direito do Trabalho funda-se em princípios específicos, entre os quais desponta o da proteção ao trabalhador, com as regras da aplicação da norma mais favorável e da condição mais benéfica”.

“Assim, é imperativo que as regras do direito comum, que possam incidir nas relações trabalhistas decorram desses mesmos princípios, sob pena de não ter aplicação adequada ao caso concreto”, concluiu.

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