Parceria civil

Parceria Civil: Lei deve refletir o que ocorre na vida real.

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1 de maio de 2002, 11h24

É impressionante como os indivíduos têm dificuldades com as mudanças embora, muitas vezes, elas não signifiquem nada além de mostrar a realidade. Tramita no Congresso Nacional, e não é de hoje, a Lei de Parceria Civil.

Entre acertos e equívocos, tem o objetivo de regulamentar a união entre seres humanos do mesmo sexo, fazendo com que tais relações sejam reconhecidas pelo Direito e pelos indivíduos que convivem em sociedade, conscientes de que somos muito diferentes e temos opções de vida tão múltiplas como nossos conceitos, raças, prioridades, religiosidades, etc…

Não se pode fechar os olhos para algo que transcende a vontade de ver de alguns. Há pessoas que vivem afetivamente de modo peculiar e particular, mas que não necessariamente, por isso, podem ser consideradas diferentes das demais pessoas que compõem o universo Jurídico.

Temer encarar a realidade é muito mais que preconceito com a opção sexual do indivíduo, que muito cá entre nós, não interessa a ninguém. Negar a existência de uniões entre pessoas do mesmo sexo é retroceder no caminho magnífico da evolução sociológica do homem, é desnaturar o poder de discernimento e consciência inerente em cada um de nós.

É inequívoco que cidadãos como nós merecem do Estado a mesma proteção independentemente do que façam na vida privada, que de novo, nada temos a ver com isso. Indigna a falsa ética que torna moralidade em patologia impeditiva da conseqüência natural da vida: a mudança.

Mudar de idéia não significa seguir opções alheias, mudar de conceitos, compreende perceber a vida dos outros com a cautela necessária para respeitar o modo de convivência, não elaborando pré-julgamentos.

A religião que tem um papel importante na formação do indivíduo. Não pode servir de meio de intolerância e discriminação. Há gente como a gente que vive diferente da gente. E daí?

É bom lembrar que o mundo vive em guerra há séculos pela intolerância religiosa que perpetua chefes de crença disfarçados de tiranos, que com balas de canhão, fingem ser superiores. Nós fingimos que acreditamos que o motivo da guerra é a religião quando na verdade é a ignorância, a crueldade, a intolerância.

Nossa condescendência transforma religiosos profissionais em assassinos confessos, que em busca de “Um Deus Soberano” lavam com sangue a nossa capacidade de nos indignarmos. E isso tudo tem a ver com a Lei em questão, que traz à tona valores arraigados à humanidade há séculos, sobretudo, num país em que se herdou tudo que se tem e não se aprendeu o principal: elaborar conceitos.

Ninguém nega a diferença evidente que se constata quando nos deparamos em nosso cotidiano com duas mulheres ou dois homens se beijando. Acontece que este impacto não deve ser confundido com imoralidade, pois é inequívoco que casais heterossexuais em muitas ocasiões são promíscuos e imorais. Parece claro que homossexualidade não significa promiscuidade. A diferença básica é que nos acostumamos com a falta de moral dos heterossexuais como sendo “uma imoralidade permitida”.

Por mais que alardeemos quando vemos cenas impactantes no dia a dia, não nos indignamos de verdade a ponto de desligarmos a TV definitivamente naquele horário, por exemplo.

É muito mais confortável nos indignarmos com a ficção que com a realidade. Posto isso, parecem ficar mais claros os motivos que levam muitos de nós a achar que atender ao anseio social de legalização destas uniões é “um absurdo”. Absurdo é negar que estes cidadãos (repito: cidadãos) tenham direitos como nós de amar, dividir a vida e compartilhar os bens com quem lhe pareça direito. Deveria e deverá ser o DIREITO.

Revista Consultor Jurídico 1º de maio de 2002 .

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