Direito da Informática

Análise sistemática e semântica: existe um Direito da Informática?

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24 de junho de 2002, 12h59

Data: 24/06/2002

Título:

Resumo: Análise sistemática e semântica: existe um Direito da Informática?

Subtítulo: O direito da informática não é um ramo autônomo

A utilização da terminologia “Direito da Informática” se tornou muito comum antes mesmo de se discutir se este conjunto de termos é correto. No entanto, antes de abordar diretamente o tema, se faz necessário estudar temas de importância complementar.

I – Direito da Informática e Informática Jurídica

Enquanto o direito da informática é um ramo de atuação normativa coerciva e estatal, objetivando um dever-ser da conduta, através de uma técnica social específica visando um fim social, a informática jurídica é uma técnica do ramo da informática voltada à prática do direito, desenvolvendo o que a informática tem de mais útil para as atividades relacionadas ao direito, na qual se destaca, por enquanto, os “softwares”, bastante popularizados perante a comunidade jurídica.

O objeto material do direito da informática é o “hardware” (base rígida), “software” (não se excluindo desta acepção o ´vírus´, como qualquer outro programa executável), redes, etc… Obviamente não serão todos os materiais produzidos pela informática ou para a informática tratados como bens jurídicos, apenas aqueles com relevância e repercussão jurídica, destacando-se entre estes os que possuem destaque social, seja positiva ou negativamente, na forma econômica ou sentimental, à longo ou curto prazo, como uma atividade nova ou um novo meio prático para realização de atividades antigas e etc… Logicamente, os seus usos, efeitos, finalidades e atividades correlatas deverão ser analisados pelos interpretes e construtores do direito para a correta avaliação da sua importância no sistema social.

De fato, as inovações trazidas pela informática ao mundo do direito são quase todas positivas. É possível, hoje, remeter peças judiciais através de diversos aparelhos eletrônicos, parcela relevante dos nossos bancos de dados foi substituída por meios de armazenamento eletrônico, diminuindo substancialmente o espaço físico necessário para o funcionamento de um escritório ou repartição pública, além de variados materiais voltados especificamente à gestão dos negócios, diminuindo o tempo gasto pelos operários do direito na sua rotina habitual. No entanto, não há de se confundir a praticidade gerada com a “preguiça”, visto que não existem mudanças significativas. os negligentes habituais e incompetentes de plantão apenas se expressarão de uma forma diferente. Mesmo assim, vale citar alguns deboches, como daqueles que afirmam terem sido julgados pelo Windows ou que resumem a hermenêutica moderna em apenas três atividades, “Recortar, colar e copiar”.

II- Outras definições para o Direito da Informática

Acreditamos que a formulação “direito virtual”, assim como “ciberdireito” transmitem uma falsa idéia do que seria o direito voltado à informática. Apesar de ter significado bastante óbvio e corrente, devem ser menos preferíveis à expressão “direito da informática”. O direito é uma ordem positiva do dever-ser, “habitando” o “mundo das idéias”, sendo que a sua relevância objetivamente material se resume aos meios biológicos sentimentais e sociais que o valoram como ordem de repressão legitimada. Portanto, certo é que o valor subjetivo garantido ao direito não o permite que “sobreviva” no mesmo plano das coisas concretas que este regula, neste caso, o mundo eletrônico, como falsamente pretendem as nomenclaturas atacadas, como se fosse possível um direito com uma vigência no virtual. Entretanto, mesmo assim, não se trata de um pecado capital designar na forma referida, assim como quando nos referimos à terminologia “Direito Penal” não faltam doutrinadores afirmando que seria mais correto chamá-lo de “Direito Criminal”, apesar de chamarem seus escritos de “Curso de Direito Penal”. A matéria se mostra na prática um quanto tanto irrelevante, apesar de imprimir a discussão acadêmica como exposta.

III – Formas de Organização do Direito – Existe um Direito da Informática?

Há três formas principais de sistema que atuam na organização do direito em diferentes ramos.

A primeira a ser aqui tratada é a organização pedagógica, este tipo de organização é voltado ao modo de ensino, que, por razões obvias, pode ou não se auxiliar dos outros dois modos de organização. A divisão neste sistema não é complexa, ou seja, as matérias estão dispostas de forma a se integrar entre si numa visão ampla e preliminar sobre o direito, com limitações no que tange a aplicação do direito na vida prática. Nesta organização, se destacam matérias propedêuticas que auxiliam na compreensão do fenômeno jurídico, que não fazem parte objetiva do sistema normativo.

A segunda forma de organização, derivada da análise científica, é a organização sistemática do tema, em especialidade de matérias. Nesta, estão destacadas diferentes campos, sendo imprescindível que cada tópico possua certa autonomia perante aos demais, com campo normativo e científico próprio, além de pesquisadores especialmente dedicados ao objeto em análise, se caracterizando por um conjunto de princípios e institutos relativamente independentes perante o conjunto legislativo. Logicamente, nesta independência se respeita a hierarquia e complementação (seja analogicamente ou diretamente) que as diferentes áreas normativas fornecem a outras. Assim, pode-se perceber que um mesmo objeto material, como o comércio, por exemplo, pode ser analisado sobre diferentes “pontos de vista” normativos, sem que haja qualquer conflito normativo. Muito embora os diferentes planos no mundo concreto possam se mostrar inseparáveis e coesos, na abstração, cada um destes tópicos possui uma distinção que deriva ou do interesse científico, ou do interesse social, que, através do legislador, preferiu distinguir determinado campo com princípios e normas próprias para uma atuação mais coerente com a vontade social.

A terceira forma que trataremos se refere a uma organização problemática. Nesta organização, não está evidente a independência científica, mas, na verdade, o estudo de campos do direito de forma inter-relacionada visando uma determinada função social, solucionando um determinado problema. Assim surgem as expressões: direito empresarial, do consumidor, rural, industrial, comercial, e também o Direito da Informática, como um conjunto de materiais úteis a estas estruturas sociais.

Destarte, o direito da informática é na verdade uma parte da ciência jurídica responsável por regulamentar a informática, atuando, portando, em diversos ramos do direito, como no material e processual civil (assinatura digital, contratos no mundo virtual; registro de domínios; seguro de bens virtuais ou informatizados; responsabilidade civil, perturbações em geral, invasão da privacidade e destruição de propriedade virtual ou informatizada; provas ilícitas; direitos autorais sobre “software” e “hardware”; controle legal do conteúdo e forma dos “softwares”; competência territorial; “juntada” regular de documentos; ciência e prazos; atividades irregulares no processo; composição judicial por meios eletrônicos, etc…), penal (diferenciação dos crimes de informática puros e impuros; valoração e pena; discussão acerca da tipicidade ou inaplicabilidade de dispositivos velhos em atividades realizadas através de aparelhagem eletrônica, classificação dos criminosos pelo tipo aplicável, competência territorial em crimes à distância, por exemplo), tributário (tributação de atividades econômicas realizadas no mundo virtual, distinção das atividades, aplicação ou não de certas normas tributárias; incidência tributária territorial; regulamentação e legitimação da informática como uma forma de pagamento, declaração de imposto, etc.) e até trabalhista (no “networking”, ou trabalho realizado à distância através de instrumentos informatizados; incidência legislativa em se tratando de “Networking” em diferentes países), etc.

O direito da informática não é um ramo autônomo, mas um conglomerado atípico dos mais variados campos legislativos, resultado de uma revolução silenciosa da tecnologia. Embora a autonomia pareça derivar das modificações sociais que reclamam novos princípios e normas, a revolução tecnológica é a mais recente fase da revolução industrial, que se desenvolve para exigir nova postura frente às atividades sociais eminentemente inovadoras, cujo tratamento, apesar de se tornar especial em determinadas ocasiões, não se distingue em essência das outras atividades e estruturas existentes cujo tratamento se dá pelas matérias clássicas do Direito moderno.

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