Bom-dia, recipiente!

Bom-dia, recipiente: como transformar pessoas em objetos

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13 de junho de 2002, 20h35

O mundo jamais foi tão exposto à língua inglesa como agora, com o advento da Internet. Isso tem gerado dois problemas. Ou antes, características. Uma: o inglês está sendo deturpado. Imagine um monte de brasileiro, francês, africano, russo, chinês, croata, todo mundo se comunicando em inglês na Internet? Bela salada, não?

Mas a segunda característica, é que a língua materna desses internautas também está sendo deturpada. Bem, pelo menos aqui no Brasil. Quem nunca recebeu um arquivo “atachado” num e-mail? Eu sinto arrepios só de ouvir ou ler essa palavra. Se você quiser ter uma mínima chance de que eu abra um arquivo vindo num e-mail seu, mande-o anexado à mensagem. Se você disser que ele está atachado, eu não abro. Com um nome desses só pode ser vírus. O pior é que tem gente que envia arquivos “attachados”, com dois Ts, que são muito mais pesados e congestionam a rede.

Por que adaptar uma palavra tão feia quanto “atachar” se já temos “anexar”? Encriptar é outra pérola. Também não abro mensagens encriptadas, só as criptografadas. Não confio nas encriptadas, elas devem ter sido violadas. Esses dias, recebi um release que trazia uma pérola de Mayorca. Era uma nova tecnologia chamada “encriptografia”. Hahaha. O pior é que é verdade!

Tá, eu sei, esse tipo de adaptação lingüística sempre existiu, e nós temos a garagem, o toalete, o gol (que se tornou quase brasileiro, por sinal), e assim por diante. Eu aceito isso e também uso. Por exemplo, eu vivo deletando arquivos. Deletar é uma palavra simpática, e é uma adaptação até mais apropriada para a informática do que apagar. Mas forçar a barra não dá.

Por causa da supremacia do inglês na Internet, tem gente virando recipiente. Um simples pote para guardar café, ou uma garrafa para conter líquidos. É sério! “Recipient”, em inglês, pode ser “recipiente”, mas quando se trata de mensagens, é o equivalente a destinatário. Mas tem um pessoal por aí que está chamando os destinatários de recipientes. Pegam a palavra original e traduzem ao pé da letra. Se fosse receptor, vá lá, mas mesmo assim, no Brasil, quem recebe um e-mail ou carta é o destinatário.

Os spammers, então, que como todos sabem, têm o QI abaixo de 100 (como um certo presidente americano), estão transformando milhões de pessoas em vasilhas. Eles vivem vendendo programas para enviar mensagens em massa para 10 milhões de recipientes de uma vez.

Cuidado, portanto, ao abrir certos e-mails, principalmente os spams. Se de repente você acordar estático, com um sensação de estar retendo líquidos em demasia, pode ter sido transformado numa simples “long neck”. Sem retorno.

(Dos “Logs de Maldoror“)

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