Arresto suspenso

Justiça favorece ex-administradores do Banespa

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4 de junho de 2002, 15h50

II – COMPETÊNCIA DE JUÍZO

Determina-se a competência do Juízo, na hipótese, pelo disposto nos artigos 45 e 46, da Lei 6.024, de 13 de março de 1.974, a que faz remissão o artigo 19, do Dec.lei 2.321, de 25 de fevereiro de 1.987.(111)

De se concluir, pois, que para a hipótese agora examinada tem competência um dos Juízos das Varas Cíveis Centrais desta comarca, tendo em vista que, como se anotou anteriormente, o principal estabelecimento do Banco do Estado de São Paulo S/A. fixa-se na Praça Antonio Prado, nº 6, Centro, nesta Capital.

Ainda que assim não fosse, estaria a regra geral de determinação de competência insculpida no Código de Processo Civil(112) a permitir o ajuizamento nesse foro.

Trata-se, de qualquer forma, de caso de distribuição por dependência, tendo em vista que a ação civil pública cautelar de arresto correspondente foi distribuida a esse Juízo, como se anotou inicialmente.(113)

II – LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

A legitimidade ativa para a propositura da ação civil pública contra os responsáveis pelos prejuízos causados a uma instituição financeira está expressa no ordenamento jurídico nacional, a começar pela Constituição Federal. (114)

Conforme já anotado anteriormente, a Lei n. 6.024/74, em seus artigos 45 e 46, incumbiu ao Ministério Público a propositura da demanda civil pública de ressarcimento dos danos apurados em instituição financeira. E o artigo 19, do Dec.lei n. 2.321/87, determina a aplicação dos mesmos princípios à hipótese do regime de administração especial temporária.(115)

Tal legitimação ativa também é reconhecida pela Lei da Ação Civil Pública. (116)

Para o ressarcimento de danos causados, direta ou indiretamente, ao patrimônio público, como no caso de prejuízos decorrentes de irregularidades praticadas por administradores de instituição financeira estatal, bem como para a responsabilização por prejuízos causados à própria companhia e seus credores, incumbe, ao Ministério Público o ajuizamento da competente ação civil pública.(117)

A lei não podia ser mais clara e a jurisprudência firme nesse sentido.(118)

Não fosse só por isso, seria ainda indispensável a promoção da demanda, para a defesa do interesse dos investidores do mercado de valores mobiliários. Sabe-se que os prejuízos apurados a partir do decreto de intervenção, pelo Banco Central, em uma instituição bancária constituída sob a forma de sociedade anônima de economia mista, refletem de modo imediato em resultados negativos sobre os títulos de valores mobiliários de sua emissão, que, evidentemente, são passíveis de reparação.

E a lei também aí é expressa ao reconhecer a legitimidade ativa ad causam da Instituição. (119)

Não importa, de outra parte, que venha a ser encerrado o regime especial a que tenha sido submetida a instituição financeira(120).

O comando legislativo, a propósito, está atento à questão. (121)

Não podemos perder de vista que a pretensão ora veiculada visa também à proteção do patrimônio público, vez que é inegável que o prejuízo causado ao Banco do Estado influiu no aumento do déficit público, que sempre é suportado pela sociedade em geral. (122)

III- DECRETO DO REGIME DE ADMINISTRAÇÃO ESPECIAL TEMPORÁRIA NO BANESPA, PELO BANCO CENTRAL

Ocorre que o Banco Central do Brasil, com fundamento nos artigos 2º, da Lei 6.024, de 13 de março de 1.974(123), e 1º, do Decreto-lei 2.321, de 25 de fevereiro de 1.987(124), decretou o regime de administração especial temporária no Banco do Estado de São Paulo S/A., por ato de 30 de dezembro de 1.994 (125)(fls.188/189, do anexo 001)(126), nomeando Conselho Diretor, com todos os poderes de gestão(127).

Nomeou também o Banco Central Comissão para a instauração e instrução de inquérito(128), nos termos e para os fins dos artigos 41(129) e 45 e seus parágrafos, da Lei 6.O24, de 13 de março de 1.974, 19, do Decreto-lei 2.321, de 25 de fevereiro de 1.987.

IV – INTERVENÇÃO EM INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS

Como é sabido, estão as empresas comerciais sujeitas à falência, podendo — de outro lado — beneficiar-se da concordata.(130)

Embora seja considerada também empresa de natureza mercantil, a instituição financeira, dada a potencialidade dos riscos que acarreta à sociedade, enquanto captadora de poupança popular, sujeita-se a um regime de permanente fiscalização do Banco Central que, constatando eventual irregularidade, pode decretar-lhe a intervenção, a liqüidação extrajudicial ou promover-lhe a falência. (131)

As instituições financeiras, porque depositárias de recursos alheios, não podem licitamente confessar-se em situação de dificuldade financeira. Por isso, estão proibidas de pleitear concordata. (2


Em outros termos, pode o Banco Central decretar a intervenção em uma empresa bancária, apenas substituindo seus administradores, quando vislumbra a possibilidade de devolvê-la saneada ao mercado(133). Nessa hipótese, não há a paralisação de suas atividades. Pode ele decretar a liqüidação extrajudicial da instituição financeira, quando verifica que as irregularidades são de tal ordem danosas ao sistema financeiro nacional, que julga ser a extinção da empresa a melhor alternativa. Nesse caso, os bens da empresa são arrecadados e alienados publicamente, para o conseqüente pagamento aos credores e investidores(134). Pode, ainda, o Banco Central, ao constatar a irreversível insolvência da empresa bancária, pleitear judicialmente o decreto da falência.(135)

V SITUAÇÃO DOS BANCOS ESTATAIS

Incluem-se no regime descrito tanto as instituições financeiras privadas como as públicas não federais, de modo que estas últimas podem submeter-se aos regimes de intervenção e liqüidação extrajudicial.(136)

É importante que se constate que o Decreto-lei 2.321, de 25 de fevereiro de 1.987, acabou ampliando o leque de alternativas ao Banco Central, no que se refere ao sistema de intervenção nas instituições bancárias, instituindo também o chamado regime de administração especial temporária.(137)

Nesse caso, há a nomeação de um conselho diretor para substituir a administração responsável pelas irregularidades, por prazo definido no decreto, sem suspensão das atividades.

É o que sucede, por exemplo, com o Banespa, até porque, como sociedade de economia mista, deve sujeitar-se ao regime jurídico próprio das empresas privadas.(138)

VI -CONSTITUIÇÃO E CARACTERÍSTICAS DO BANESPA

Constituiu-se a mencionada sociedade, com a denominação de Banco de Crédito Hypothecário e Agrícola do Estado de S. Paulo, em 14 de junho de 1909 e tinha por objeto o desconto e redesconto de letras agrícolas e letras ou ordens de lavradores; empréstimos e adiantamentos aos lavradores e comissários, com garantia; emissão de debêntures; e depósito a prazo fixo ou em conta-corrente, com ou sem juros (v. estatuto, fls.192/201, do anexo 001(139)). Em 19 de novembro de 1.926, passou a sociedade a denominar-se BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO, ampliando, então, seu objeto para, além do fomento à agricultura, explorar outras operações bancárias ou comerciais permitidas em lei (v. estatuto, fls.211/216, do anexo 001).

Seu capital social era de 6.330.000$000 (seis milhões, trezentos e trinta mil contos de reis), equivalente, então, a 10 milhões de francos (v. fls.1593, do anexo 006)

Passou a atuar como Banco Múltiplo a partir de 17.01.90, conforme certificado expedido pelo Banco Central em 19 de janeiro daquele ano (v.fls.1593), quando tinha um capital social de Ncz$. 488.520.000,00 (cf. fls.230/345, do anexo 001).

Cuida-se de sociedade de economia mista de capital aberto, atuando sob a forma de Banco Múltiplo, com operações de Banco Comercial, Crédito Financiamento e Investimento, Crédito Imobiliário, Desenvolvimento e Investimento, bem como de mercado de taxa de câmbio (v. fls.11593, do anexo 029).

Continua com sua sede na Praça Antonio Prado, 6, nesta cidade, e possuía, até a data do decreto da intervenção uma rede de 624 agências, das quais 559 localizadas no Estado de São Paulo, 53 nas demais unidades da federação e 12 no exterior, além de uma subagência em Ciudad Del’Este, Paraguai, 4 escritórios de representação localizados em Washington, Lisboa, Milão e Moscou, e uma subsidiária integral em Luxemburgo (v.fls.11593, do anexo 029).

Na data do decreto da intervenção, tinha o Banco um capital social de R$. 739.213.871,07, dividido em 18.720.000.000 ações ordinárias nominativas escriturais com direito a voto e igual número de ações preferenciais nominativas escriturais sem direito a voto, totalizando 37.440.000.000 ações, todas sem valor nominal (v.fls.11594, do anexo 029).

Até a data da intervenção, contava o Estado de São Paulo com 66,67% das ações com direito a voto, o que lhe garantia a qualidade de acionista controlador, pertencendo as restantes (33,33% das ações com direito a voto e a totalidade das preferenciais) a outros acionistas (v.fls.11594, do anexo 029).

Detinha o Banespa, por sua vez, o absoluto controle, com mais de 99% do capital social, das empresas Banespa S/A Corretora de Câmbio e Títulos, Banespa S/A. Arrendamento Mercantil, Banespa S/A. Adm. de Cartões de Crédito e Serviços, Banespa S/A. Serviços Técnicos e Administrativos e Banque Banespa International – Luxemburgo (v.fls.11595, do anexo 029).

VIII – CAUSAS DO DECRETO DO REGIME DE INTERVENÇÃO

De acordo com o que apurou a Comissão de Inquérito, ocorreram inúmeras irregularidades no comando de controle e administração do Banco, de que decorreu grande prejuízo à instituição bancária paulista, a saber, exemplificativamente:


1) a excessiva concentração de operações de crédito com o governo do Estado, equivalentes, na data da intervenção, a R$.9.413 milhões, representando 80,4% do total da carteira e 432,1% do patrimônio líquido do Banco (fls.1429/1668, do anexo 006, 11605, do anexo 029), incluindo-se aqui as chamadas operações de antecipação de receita orçamentária — ARO — (cf. anexos 065/069(140)), utilizadas com excesso, a ponto de comprometer o giro financeiro do Banco, engessando-lhe completamente a dinâmica de investimentos e causando-lhe considerável prejuízo(141);

2) irregularidades nas operações de crédito com o setor privado, com a inscrição de altíssimas somas em créditos em liqüidação, totalizando na data da intervenção 292,02%, enquanto a média da soma de tais operações em instituições bancárias privadas é de comprometimento de cerca de 15% do patrimônio líquido (v. fls.11684, do anexo 029);

3) diversos vícios no deferimento e na condução de várias operações de crédito, com irregularidades graves no âmbito administrativo-operacional do banco, revelando atitude de descaso com o patrimônio da instituição, constituído em grande parte com dinheiro público (v. fls.8/9, do anexo 040(142)), como:

a) concessão de crédito acima dos limites cadastrais das empresas, como Gurgel, Consid, Editora Três e outras;

b) créditos concedidos anteriormente à constituição das garantias, como, Cooperativa Agrícola Cotia e Cooperativa Agrícola Sul Brasil, por exemplo;

c) a concessão de novos créditos que, na realidade, serviram para liquidar outras operações detidas pelos financiados, como Cooperativa Cotia, Cinco e Larreina;

d) deferimento de créditos totalmente incompatíveis com o porte dos financiados, como por, exemplo, no caso da Paraquímica, empresa com um capital social de US$ 339,59, contemplada com linha de crédito de US$ 23 milhões;

e) concessão de crédito com garantias insuficientes, como Mendes Junior, Internacional CO., Tratex e Gurgel;

f) créditos concedidos à revelia de pareceres contrários de agências, como Construtora Mendes Junior, Siderúrgica Mendes Junior, Larreina, CBT e Ampicalf;

g) alta concentração de riscos e continuada prática de liberação de recursos a empresas com nítidos sinais de incapacidade financeira de pagamento, como Cooperativa Cotia, Indústrias Nardini e Vasp;

h) concessão de créditos a empresas sem ficha cadastral, como no caso da Paraquímica, cujo sócio-controlador, Sr. Paulo Macruz, estava incluído em lista do Banespa, indicando inidoneidade financeira, bem como nos casos da Cinco e Ampicalf;

i) operação deferida com clara e notória ingerência política, como na hipótese da Paraquímica, que realizou operação de crédito com o Banespa, depois de interferência direta do então Governador do Estado, Sr. Luiz Antonio Fleury Filho;

j) concessão de créditos a empresas com cadastro vencido, como Siderúrgica Mendes Junior e Cinco;

k) créditos concedidos a empresas sem qualquer tradição de negócio junto ao Banespa, como nos casos da Paraquímica, Gurgel, Cinco e Vale do Rio Grande;

l) créditos concedidos a empresas com sérias restrições cadastrais próprias ou de sócios, como nos casos da Paraquímica, Gurgel, Cia. Agrícola e Pastoril Vale do Rio Grande e Ampicalf;

m) acolhimento de garantias expressamente vedadas pela regulamentação do Conselho Monetário Nacional, relativa a endividamento público, como nos casos de Siderúrgica Mendes Junior, Cia. Agrícola e Pastoril Vale do Rio Grande.

Constam, dentre outras, as seguintes empresas privadas beneficiárias de operações irregulares:

– Cooperativa Agrícola Cotia, a partir de maio de 1.991 – US$. 441.979.000,00 (cf. fls.11690, 11692/11709, do anexo 029);

– Viação Aérea São Paulo S/A. – Vasp, a partir de antes de sua privatização em 1.990, com débitos pendentes desde agosto de 1985 – US$ 202.850.000,00 (cf. fls.11.690, 11.710/11.729, do anexo 029);

– Paraquímica S/A. Indústria e Comércio, com operações de crédito a partir de novembro de 1.991 – US$ 110.857.000,00 (cf. fls. 3.054/3.159, 11.690, 11.730/11.737, do anexo 029);

– Grupo Mendes Junior, a partir de julho de 1.989 – US$ 93.722.000,00 (v. fls.11.690, 11.738/11.746, do anexo 029);

﷓ Construtora Tratex S/A., a partir de julho de 1.991 – US$ 74.799.000,00 (cf. fls.11.690, 11.747/11.756, do anexo 029);

– Gurgel Motores S/A., a partir de dezembro de 1.991 – US$ 56.852.000,00 (v.fls. 11.690, 11.757/11.766, do anexo 029(143);

– Indústrias Nardini S/A., a partir de março de 1.989 – US$ 50.479.000,00 (v.fls. 11.763/11.767, do anexo 029);

– Grupo São Jorge, a partir de junho de 1.989 – US$ 44.771.000,00 (v. fls. 11.690, 11.770/11.777, do anexo 029(144));


– Grupo Olvedra, a partir de julho de 1.991 – US$ 39.772.000,00 (cf. fls.11.690, 11.778/11.784, do anexo 029(145);

– Cia. Agrícola e Pastoril Vale do Rio Grande, a partir de setembro de 1.990 – US$ 30.252.000,00 (v.fls.11.690, 11.785/11.789, do anexo 029);

– Cinco Cia. Interamericana de Navegação e Comércio, a partir de janeiro de 1.992 – US$ 24.976.000,00 (v. fls. 11.690, 11.790/11.803, do anexo 029(146);

– Indústria Mineradora Horizonte Novo Ltda., a partir de agosto de 1.991 – US$ 23.266.000,00 (v.fls. 11.690, 11.804/11.808, do anexo 029);

– Consid Indústria e Comércio Ltda., a partir de setembro de 1.991- US$ 22.018.000,00 (cf. fls.11.690, 11.809/11.810, do anexo 029(147);

– Cooperativa Central Agrícola Sul Brasil, a partir de setembro de 1.991 – US$ 19.331.000,00 (v.fls. 11.690, 11.811/11.817, do anexo 029);

– Grupo Três Editorial, a partir de dezembro de 1.989 – US$ 16.932.000,00 (v. fls. 11.690, 11.818/11.829, do anexo 029);

w Thanco Ind. e Comércio de Ônibus Ltda., a partir de dezembro de 1.991 – US$ 16.869.000,00 (fls. 11.690, 11.830/11.832, do anexo 029 (148);

– Fazenda Cacau Açu Ltda., a partir de agosto de 1.991 – US$ 14.239.000,00 (cf. fls. 11.833/11.838, do anexo 029);

– Ari – Depósito e Comércio de Sutiens Ltda., a partir de abril de 1.992 – US$ 7.890.000,00 (fls. 11.690, 11.839/11.846, do anexo 029);

– Vega Sopave S/A., a partir de 1.990 – US$ 3.363.000,00(cf. fls. 11.691, 11.847/11.861, do anexo 029(149);

– Larreina Ind. e Comércio de Produtos de Mandioca Ltda., a partir de outubro de 1.991 – US$ 2.284.000,00 (v.fls. 11.691, 11.863/11866, do anexo 029);

– Cia.Brasileira de Tratores, a partir de dezembro de 1.991 – US$ 2.222.000,00 (cf. fls. 11.691, 11.867/11.870, do anexo 029);

– Associação de Micro e Pequenas Indústrias de Calçados de Franca – Ampicalf, a partir de setembro de 1992 – US$ 1.484.000,00 (v.fls. 11.871/11.872, do anexo 029).

Constatou-se, ainda, que em outras diversas operações não foram observados os princípios operacionais básicos de segurança, liqüidez e rentabilidade (v. fls. 11.873/11.878 – do anexo 029).

De acordo com o que se apurou, ocorriam irregularidades, ainda, em relação à complementação de aposentadorias de funcionários (v. fls. 11.879, 11.884/11.887, do anexo 029); na contratação sem concurso de funcionários do Baneser – Banespa S/A. Serviços Tecnicos e Administrativos, cujo capital social era 99,99% do Banco do Estado, e pagamento de mão-de-obra e serviços especiais não destinados à empresa, desde 1988 (v. fls. 10.177/10.448, do anexo 025, 11.879/11.880, 11.888/11.891, do anexo 029(150).

Ainda: manutenção de inúmeras agências deficitárias, desde 1.990 (v. fls. 10.449/10.675, do anexo 026, 11.880/11.881, 11.892/11.906, do anexo 029); com despesas decorrentes de campanhas publicitárias sem qualquer retorno econômico ao Banco (v.fls. 11.881/11.882, 11.907/11.911, do anexo 029(151);

instalação, com elevado prejuízo, de restaurante de funcionários em imóvel locado ao Banco pelo Jockey Club de São Paulo, em agosto de 1.988 (v.fls. 11.085/11.123, do anexo 027, 11.883, 11.912/11.919, do anexo 029).

Essas irregularidades estão minuciosamente descritas no relatório de conclusão das apurações da Comissão de Inquérito do Banco Central (fls. 11.616/11.919, do anexo 029), que passa a fazer parte integrante desta inicial.

VIII – APURAÇÃO DE PREJUÍZO

A partir do decreto da intervenção, da administração especial temporária ou da liqüidação extrajudicial, cabe ao Banco Central nomear comissão de inquérito, para a apuração dos prejuízos causados pela administração da empresa. (152)

Pode o Banco Central arquivar o inquérito correspondente quando constatada a inexistência de prejuízo. Entretanto, sempre que resultar prejuízo, deve remetê-lo ao Judiciário, que abrirá vista do mesmo ao Ministério Público, para a promoção das ações de arresto de bens e responsabilidade (v. arts. 45 e 46, da Lei 6.024/74). (153)

O prejuízo aí referido é não só aquele causado a terceiros, credores da empresa submetida a esses regimes especiais, como também aqueles causados à própria empresa e aos portadores de títulos de valores mobiliários de sua emissão.

Apurou a Comissão, então, na data do decreto do regime de administração especial temporária, a existência de prejuízo da ordem de R$ 2.814.632.000,00, de responsabilidade das pessoas que o administraram ou com ele mantiveram vínculo de controle nos últimos cinco (5) anos anteriores à intervenção (cf. fls. 11.921, do anexo 029(154).

Além disso, constatou-se, por meio do inquérito mencionado, que o resultado negativo apurado traduz apenas parte dos danos causados ao Banco do Estado e conseqüentemente a seus acionistas, aos investidores do mercado de capitais, bem como a toda a coletividade. Na verdade, as operações irregulares ou ilícitas realizadas acabaram montando quantia bem superior que, por constituir o real prejuízo, também há de ser objeto de ressarcimento por parte daqueles que se encontravam no comando da instituição no período considerado na investigação.


Não é preciso muito trabalho para constatar o conceito de prejuízo que, em qualquer dicionário comum, significa o ato de prejudicar ou causar dano; lesar; danificar; diminuir o valor de; depreciar; rebaixar.

Em outros termos, não tem prejuízo a empresa que, no balanço de suas contas, tem um patrimônio suficiente para cobrir suas obrigações. Quando, todavia, apresenta a empresa um patrimônio de valor inferior ao seu passivo, acaba por ter prejuízo, que deve corresponder exatamente à diferença entre o valor do passivo (composto de obrigações passivas) e do ativo (conjunto de bens corpóreos e incorpóreos em que se transformou o capital investido).

É o que a Comissão de Inquérito ora chama déficit patrimonial, ora de patrimônio líquido negativo ou de passivo a descoberto (v. fls.11.921, do anexo 029).

Esse prejuízo, aliás, vem se ampliando desde longa data, como informou a referida Comissão de Inquérito (v. quadro de fls. 11.613, do anexo 029).

Mesmo que a empresa, entretanto, revele situação superavitária, são passíveis de ressarcimento os prejuízos decorrentes de operações danosas que, se não chegaram a acarretar desequilíbrio no balanço de contas de crédito e débito, impediram que sociedade se colocasse em situação patrimonial mais vantajosa.

Não é outra coisa senão o valor que pretende o legislador ver ressarcido pelos administradores da instituição financeira sob regime de intervenção(155).

Com efeito, só a soma das operações irregulares de crédito relacionadas pela Comissão de Inquérito, chegava, na data da intervenção, ao valor de US$. 1.301.767 mil, equivalente então a R$ 1.101.294.000,00 (v. fls. 11.690/11.691, do anexo 029).

O passivo atuarial do Banespa, decorrente da complementação de benefícios previdenciários de funcionários, fora de sua atribuição legal, chegava a R$ 1.586.000.000,00 (cf. fls. 11.879, 11.884/11.887, do mesmo anexo 029).

A transferência de recursos ao Baneser, sem qualquer contraprestação, para pagamento de funcionários contratados ilegalmente, lotados em diversos órgãos da administração pública, inúmeros dos quais, segundo se apurou, apadrinhados de políticos e até fantasmas, chegou a US$. 470 milhões, valor que correspondia à época da intervenção a R$. 397.620.000,00 (v. fls. 11.879/11.880, 11.888/11.891, do anexo 029).

As despesas com publicidade estranhas às finalidades bancárias somavam o equivalente a R$ 1.886.580,00; as despesas irregulares com instalação de restaurante no Jockey Clube local chegaram a R$ 3.960.972, sempre considerando a data da intervenção (v. fls. 11.883, 11.912/11.919, do anexo 029).

Considerados esses fatos, o prejuízo já somaria R$ 3.090.761.552,00.

Ademais, apurou a Comissão de Inquérito a ocorrência de danos decorrentes da manutenção de um incontável número de agências deficitárias (cf. fls.11.892/11.906, do anexo 029).

Não é só.

É público e notório o fato de que o mercado financeiro é altamente sensível, sendo evidente, pois, que qualquer notícia acerca de uma simples operação de sucesso ou insucesso envolvendo um banco ou da existência de alguma irregularidade em administração é suficiente para abalar-lhe as estruturas.

O próprio Banco Central, recentemente, justificou com essa sensibilidade do mercado financeiro a sua censura à tentativa do Poder Legislativo de instalar a CPI do Sistema Financeiro, fato que ocupou espaço na grande imprensa.

Sucede que, em razão das irregularidades e do prejuízo constatado, foi o Banco do Estado de São Paulo S/A. submetido a um regime que abalou e degradou sua credibilidade no mercado de captação de recursos, a ponto de sofrer prejuízo patrimonial de tal ordem que acabou reduzindo o valor das ações representativas de seu capital social a cerca de 40% de seu índice de preço anterior. Tanto que esse fato fez com que o Banespa deixasse a condição de segundo maior banco múltiplo nacional para ser praticamente desconsiderado no ranking atual. Basta verificar que, enquanto no dia 22 de dezembro de 1994 (uma semana antes do decreto da intervenção) o lote de mil ações preferenciais, nominativas do Banespa era cotado em R$ 11,50(156)

passou a ser vendido em 22 de março de 1996 a R$ 4,60(157)

Considerando que a ação nada mais é do que a parte mínima do capital social(158) devendo este guardar equivalência com o patrimônio da sociedade(159) conclui-se que, a partir do valor contábil do patrimônio líquido do Banespa, no dia 30 de dezembro de 1994, de US$ 1.420.540 mil (v. fls. 11.613, do Inq.BC e 360, do ICP 05/95), o prejuízo dos investidores chegou então a US$ 852.324 mil, equivalente a R$ 721.066.000,00.

Como se vê, o prejuízo apurado pela Comissão de Inquérito deve ser acrescido da perda patrimonial decorrente de todas as operações irregulares e, ainda, da crise de credibilidade a que foi o banco paulista submetido.

IX – RESPONSABILIDADE DE NATUREZA OBJETIVA E SOLIDÁRIA DOS ADMINISTRADORES E CONTROLADORES DA INSTITUIÇÃO SOB REGIME DE INTERVENÇÃO, ADMINISTRAÇÃO ESPECIAL OU LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL

Sabe-se que a responsabilidade societária define-se pelo tipo da sociedade comercial constituída, de tal modo que, enquanto os sócios da Sociedade em Nome Coletivo, por exemplo, respondem solidariamente com a sociedade em relação às obrigações sociais, os sócios da Sociedade Anônima ou da Sociedade por Quotas de Responsabilidade Limitada respondem subsidiária e limitadamente pelas obrigações sociais. Desde que tenham integralizado o capital subscrito, nada mais têm os sócios destas últimas sociedades a responder.

Em relação às sociedades comerciais comuns de responsabilidade limitada, pouco importa seja administrador ou não o sócio. A responsabilidade é idêntica entre os sócios, sempre proporcional à subscrição individual do capital social.

Existe no Direito societário a responsabilidade solidária e objetiva dos administradores, pelos prejuízos causados em virtude do não cumprimento dos deveres impostos por lei para assegurar o funcionamento normal da companhia(160)

Entretanto, as sociedades bancárias seguem regra jurídica distinta, ou seja, aí há a chamada responsabilidade objetiva e solidária dos administradores em relação aos prejuízos apurados na sociedade. (161)

Trata-se, aliás, de critério abrangente às instituições financeiras estatais(162)

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