Maluf é condenado

Leia decisão que manda Maluf indenizar Alckmin por danos morais

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23 de julho de 2002, 18h50

O juiz da 25ª Vara Cível da Comarca de São Paulo, Rodrigo Nogueira, condenou o ex-prefeito Paulo Maluf a pagar indenização por danos morais para o governador Geraldo Alckmin. O valor da indenização foi arbitrado em cem salários mínimos. O ex-prefeito vai recorrer da decisão.

O governador disse que se sentiu ofendido com uma nota publicada no jornal Folha de S. Paulo, no dia 14 de fevereiro, sob o título “Jogo sujo e mentiroso”. Na nota, o ex-prefeito criticou a viagem de representantes do Ministério Público à Suíça para investigar supostas contas bancárias em seu nome. Também disse que não houve o mesmo empenho em situações envolvendo Alckmin.

“A mesma velocidade de investigação não existe para encontrar os eventuais crimes que teriam sido praticados pelo governador Geraldo Alckmin no superfaturamento de 80% nas obras do Rodoanel”, disse.

O juiz entendeu que “tais declarações trazem a certeza de dano moral ao autor, na medida que notória a constrangedora situação daquele que, homem público, se vê acusado de envolvimento em superfaturamento de obra realizada em seu Governo e em prática de ato de improbidade administrativa”.

De acordo com o advogado Eduardo Nobre, do escritório Leite, Tosto e Barros Advogados Associados, que representa o ex-prefeito, a nota não foi ofensiva e sim “defensiva”.

Leia a íntegra da decisão:

Poder Judiciário

Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

25ª Vara Cível da Comarca da Capital – São Paulo

Processo nº 000.02.031798-0

Indenização

Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho move ação de indenização por danos morais contra Paulo Salim Maluf alegando que ter sido ofendido pelo requerido em nos por ele subscrita e distribuída aos principais jornais do país, com publicação, dentre vários órgãos de imprensa, pela “Folha de São Paulo”, na edição de 14/02/2.002, em sua página A-7. A nota encontra-se transcrita na inicial e destaca o autor as seguintes frases que reputa ofensivas à sua honra e imagem: “(…) Desta vez, com o agravante de a viagem de todos àquele país ser paga com dinheiro dos cofres públicos, o que caracteriza ato de improbidade administrativa, que envolve e compromete diretamente o governador Geraldo Alckmin. (…)” “(…) eventuais crimes que teriam sido praticados pelo Governador Geraldo Alckmin no superfaturamento de 80% das obras do Rodoanel (…)” Requer a condenação do demandado ao pagamento de indenização pelos danos morais sofridos pelo requerente, em valor a ser arbitrado pelo Juízo, e ainda que providencie a publicação de eventual sentença condenatória na “Folha de São Paulo”.

Com a inicial vejo o documento de fl. 16.

Devidamente citado (fls.24), o requerido apresentou contestação (fl. 26/45). Alega, preliminarmente, ilegitimidade passiva “ad causam”, afirmando que deve figurar no pólo passivo da ação apenas a empresa jornalística ou o responsável pela publicação da nota referida na inicial. No mérito, sustenta em síntese, a inexistência de calúnia, injúria e difamação, entendendo não haver prova do dolo do réu, da gravidade objetiva do dano e da gravidade da falta. Aduz ainda que o valor de eventual condenação deve respeitos os limites trazidos pela Lei nº 5.250/67, fixando-se, no dolo concreto a quantia mínima prevista.

Juntou os documentos de fl. 47/71.

Houve réplica (fls. 85/90).

É o relatório. DECIDO

O feito comporta julgamento no estado em que se encontra, não necessitando de dilação probatória (art. 330, I, do CPC).

O pedido indenizatório tem por fundamento o artigo 5º inciso X, C.C. artigo 159 do Código Civil, sendo dirigido corretamente contra aquele que é apontado na inicial como autor da ofensa. Dessa forma, a preliminar de ilegitimidade passiva “ad causam” não comporta acolhimento.

Não há controvérsia quanto ao conteúdo das declarações feitas pelo requerido em nota publicada no jornal “Folha de São Paulo”, no dia 14/02/2.002, página A-7 (v. fl. 16), sendo necessária apenas a análise da repercussão destes fatos na esfera jurídica do autor.

Ao contrário do que sustenta o requerido, as afirmações livre e conscientemente feitas por ele na referida nota possuem, além do alegado aspecto defensivo, claro conteúdo ofensivo à honra e à imagem do autor.

É o que se depreende das frases destacadas pelo requerente na inicial. Vejamos.

“(…) Desta vez, com o agravante de a viagem de todos àquele país ser paga com dinheiro dos cofres públicos, o que caracteriza ato de improbidade administrativa que envolve e compromete diretamente o governador Geraldo Alckmin (…)”

“(…) eventuais crimes que teriam sido praticados pelo Governador Geraldo Alckmin no superfaturamento de 80% das obras do Rodoanel (…)”(grifei).

Note-se que, nesta segunda hipótese embora tenha o requerido tido o cuidado de não afirmar a existência da prática de crimes pelo autor (“eventuais”e “teriam”), descuidou quando deu como certa a existência de “superfaturamento de 80% das obras do rodoanel”, o que tentou corrigir em sua contestação no qual, a fl. 27, quarto parágrafo, fez constar o “eventual superfaturamento das obras do Rodoanel Mário Covas”.

Tais declarações trazem a certeza de dano moral ao autor, na medida que notória a constrangedora situação daquele que, homem público, se vê acusado de envolvimento em superfaturamento de obra realizada em seu Governo e em prática de ato de improbidade administrativa.

Entendo incorreta, na fixação do dano, a tese que atribui caráter sancionatório à lesão moral. Ao contrário, todo a responsabilidade civil brasileira é pautada no aspecto ressarcitório, sob pena de se estabelecer valores desproporcionais parra lesões assemelhadas, apenas pela diferente capacidade econômica de seu causador.

O equívoco reside na consideração realizada por parte da doutrina no sentido de que é necessário desestimular condutas assemelhadas por parte do causador e tal objetivo só seria obtido pela fixação de valor proporcional à capacidade econômica deste. Entretanto, a responsabilidade civil, por lesão ao indivíduo, não é uma via de única mão. Ao contrário das lesões aos interesses difusos, no qual o valor da condenação reverte-se em favor de um fundo público para a lesão moral e individual a reversão é feita em favor da vítima.

Portanto, se no primeiro caso uma punição maior a quem ostenta grande capacidade econômico é justificável pela sua reversão em benefício de toda sociedade, no segundo caso a reversão à vitima geraria nítido enriquecimento sem causa, como se fosse moralmente justo desejar ser lesionado por alguém com melhor situação econômica.

Daí porque o valor deve ser fixado com moderação, levando em consideração apenas a lesão gerada e nunca as partes envolvidas no evento danoso.

A lei pátria não traça limites objetivos, não se aplicando à hipótese os parâmetros fixados pelo artigo 51 da Lei de Imprensa, o qual trata da responsabilidade do jornalista profissional. Logo, o arbitramento judicial é o caminho correto.

No caso em tela, entendo suficiente para o ressarcimento o valor de 100 (cem) salários mínimos.

Observo, por fim, improceder o pedido de publicação da presente sentença no jornal que divulgou a ofensa em apreço, pois, como dito acima, esta ação tem por fundamento o artigo 5º, inciso X da Constituição Federal c.c. artigo 159 do Código Civil, e não a Lei de Imprensa.

Ante ao exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido indenizatório para condenar o requerido ao pagamento de 100 (cem) salários mínimos ao autor a título de danos morais. Sobre tal valor incidirão juros de mora de 0,5% ao mês, contados da data da publicação da ofensa (17/02/2002), nos termos do artigo 962 do Código Civil. Vencido em parte mínima o autor, condeno o demandado ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios da parte contrária, fixados em 15% do valor da condenação.

P.R.I.

São Paulo, 27 de junho de 2002.

Rodrigo Nogueira

Juiz de Direito

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