Internet legal

Internet legal: as 'pérolas' dos PLs sobre Tecnologia da Informação

Autor

  • Omar Kaminski

    é advogado e consultor gestor do Observatório do Marco Civil da Internet membro especialista da Câmara de Segurança e Direitos do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) e diretor de Internet da Comissão de Assuntos Culturais e Propriedade Intelectual da OAB-PR.

20 de julho de 2002, 16h40

Há mais de uma centena de Projetos de Lei relacionados à Tecnologia da Informação tramitando na Câmara dos Deputados.

A maioria versa sobre o uso ilícito do computador (cibercrimes), pornografia e abusos sexuais que possam ocorrer na Internet, e sobre as limitações na troca de arquivos com conteúdo impróprio. Há uma manifesta preocupação com as crianças e os adolescentes que, hoje, são os filhos da Grande Rede.

Outros tratam da informatização dos atos processuais, digitalização de documentos, comércio eletrônico, certificação digital, privacidade, propriedade intelectual, julgamento à distância, vislumbrando o futuro.

Alguns são verdadeiras “pérolas”, outros se destacam pela lucidez e relevância.

Direito à cópia

O Dep. José Machado (PT/SP), por meio do PL nº 1.590/1999, apresentado em 31/8/1999, pretende dar nova redação ao art. 6º, inciso I da Lei nº 9.609/1998, que permite “a reprodução, em um só exemplar, de cópia legitimamente adquirida, desde que se destine à cópia de salvaguarda ou armazenamento eletrônico, hipótese em que o exemplar original servirá de salvaguarda”:

“Art. 6º, I – a reprodução de exemplares para uso próprio na mesma empresa, de cópia legitimamente adquirida, proibindo-se a transferência para outras empresas e a sua comercialização”.

Machado justifica que “da forma com que está redigido atualmente (…), uma empresa que tenha uma rede de funcionamento de informática, constituída por vários computadores, terá que pagar o valor da licença de cada programa indispensável ao seu funcionamento (DOS, Windows, Excel, Word), implantado em cada computador da rede. Essa exigência torna proibitiva a implantação da rede de informática nas empresas, especialmente se se tratar de empresas de pequeno porte. Por outro lado, tais empresas não podem prescindir de tal tecnologia, obviando-se a necessidade de se buscar uma solução que, ao mesmo tempo que proíba a pirataria, evite que a legislação pertinente não se transforme em um obstáculo à informatização das empresas.”

A proposição encontra-se na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) com o Relator, Dep. Julio Semeghini, findo o prazo de 05 sessões para apresentação de emendas em 1/12/1999. Está aguardando Parecer.

Bug do Milênio

Dadas as “conseqüências do bug do milênio”, a proposta do PL nº 1.323/1999 cita a obrigatoriedade de adequação dos sistemas computacionais à transição para o ano 2000:

“Art. 1º – Ficam obrigados os fornecedores de equipamentos de informática a disponibilizarem suporte técnico necessário à adaptação de computadores e similares à transição para o ano 2000.

§ 1º – São objetos da presente lei as máquinas, equipamentos e acessórios dos computadores e similares comercializados.

§ 2º – O suporte técnico deverá reportar-se não apenas sobre os softwares e os hardwares, mas também deverá disponibilizar informações precisas sobre manutenção e manejo das máquinas, equipamentos e acessórios.

Art. 2º – Os fornecedores ficam obrigados, no prazo de 30 dias, a realizar o procedimento de adequação e esclarecimento técnico de que trata esta lei, os quais deverão ocorrer até no máximo, 31/12/1999.

Art. 3º – O descumprimento desta lei ficará sujeito ao previsto na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.”

O autor da proposição apresentada em 30/6/1999, Dep. Wanderley Martins (PDT/RJ), fundamentou que “a grande maioria dos computadores foram projetados para trabalhar apenas com os dois últimos algarismos do ano e, como na passagem para o ano 2000 o mostrador apresentará apenas os 00, a máquina poderá interpretá-lo como sendo um ano já conhecido, no caso, o ano de 1900. Tal problema afeta não só os programas do computador, mas todos os seus componentes e equipamentos acessórios, que estão preparados para responder ao sistema atual. As conseqüências a serem geradas pelo ‘bug do milênio’ são imprevisíveis, mas certamente poderão transtornar diversos setores desde os aperelhos domésticos até o controle da aviação ou de satélites, por exemplo, e algo precisa ser feito imediatamente objetivando evitar, ou pelo menos minimizar os prejuizos que poderão ser causados.”

A proposição não passou do ano de 2000. Está na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) desde 29/9/1999, e tem como Relator o dep. Julio Semeghini. Vencido o prazo, não foram apresentadas emendas. Aguarda Parecer.

Dia do Internauta

O Dep. Dr. Hélio (PDT/SP), por meio do PL nº 3.781/00 apresentado em 21/11/2000, quer instituir o “Dia do Internauta”, a ser comemorado em todo dia 26/12 – data de nascimento do matemático e astrônomo inglês Charles Babbage, considerado o “Pai do Computador”, unanimemente reconhecido como o mais importante dos pioneiros na era dos computadores.

Na justificativa, o deputado diz que “o processo de informatização em todos os setores produtivos ou mesmo de ações sociais de caráter social – e, especialmente, de comunicação e informação – é flagrante em todo o mundo. O advento da rede mundial de computadores, a Internet é outro fator que, conjugado a este avançado processo de informatização nos dá a possibilidade de infindáveis novos avanços em todas as áreas possíveis. Assim, nada mais justo do que um dia comemorativo destinado a todos que atuam na área da informação e que participam da difusão do conhecimento. Hoje, correspondem a inúmeros jovens, adultos e idosos que se integraram e ampliaram seus conhecimentos de forma ágil e diversificada.”

Foi recebida em 15/5/2001 a manifestação da Relatora, Dep. Nice Lobão, da Comissão de Educação, Cultura e Desporto (CECD):

“O acesso a informações cruciais para a própria sobrevivência, com uma velocidade, amplitude e volume, previamente desconhecidos dependerá, em larga medida, do acesso à Rede. A participação política de todos dependerá da familiaridade com a internet. De fato, recentemente, realizou-se na Suíça, a primeira eleição por este meio. Frente a este quadro nosso parecer é favorável ao projeto de lei.”

Recebido em 29/5/2001 pela Comissão de Constituição e Justiça e de Redação (CCJR), obteve em 10/8/2001 o Parecer da Relatora, Dep. Zulaiê Cobra, pela constitucionalidade, juridicidade e técnica legislativa:

“(…) Todavia, a juridicidade da proposição pode dar margem a controvérsias, em face do teor da Súmula da Jurisprudência nº 4, desta Comissão, assim ementada: ‘Projeto de lei que institui dia nacional de determinada classe profissional é injurídico.’ (…) É possível afirmar que a classe dos internautas não se confunde com classe profissional, pois é constituída por todas as pessoas que ‘naveguem’ habitualmente pela Internet, tenham ou não uma profissão definida, raciocínio mais condizente com a natureza da moderna tecnologia que permite o acesso à informação por meio da Rede Mundial de Computadores a qualquer pessoa, independente de categoria profissional.”

Encerrado o prazo, não foram apresentadas emendas. Está pronta para pauta.

Pay-Per-Vício

O Dep. De Velasco (PSL/SP) pretende limitar a exibição e veiculação da luta livre ou “vale-tudo”, aos canais pagos chamados de “pay-per-vício” – segundo a explicação da ementa, constante na página de consulta de tramitação de preposições. (O PL nº 3.280/01, apresentado em 27/6/2001, não utiliza esse termo mas sim “pay-per-view”).

De Velasco justifica que “como o próprio nome está a dizer, a ‘luta livre’ e o ‘vale-tudo’ são um festival de pancadaria, violência e brutalidade que é apresentado (e justificado) como um esporte, mas que na realidade, não passa de uma exploração de impulsos primitivos e nada racionais que jazem nos recônditos da alma humana. Dominados pela educacão, pela moral, pela cultura, pela religião, vêm no entanto à tona em situações extremas de penúria material e espiritual e de agressão ao que há de mais essencial em termos de dignidade do ser humano. O vale-tudo é um espetáculo deprimente, que degrada os participantes ativos e passivos, uma sucessão de baixarias que nada tem a ver com os tradicionais valores desportivos, como espírito de competição, lealdade, saúde física e higiene mental, tem o condão de despertar o ser primitivo que então dormitava sob o peso da civilização.”

A Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI), aprovou em 30/5/2001 o Parecer favorável do Relator, Dep. Luiz Moreira, com emenda substitutiva: “restringir o horário para a exibição desse tipo de programa, com chamadas contendo frases de advertência sobre a natureza da programação e recomendação da faixa etária desaconselhada”.

Moreira examinou: “em princípio, concordo com o objetivo pretendido pelo autor, qual seja o de evitar que esse tipo de espetáculo deprimente continue a ser exibido indiscriminadamente, agredindo os valores éticos e sociais da pessoa humana e da família. Embora reconheça mérito na iniciativa do nobre colega, sou forçado, porém, a discordar da proibição que pretende impor as estações de televisão, salvo os canais ‘pay-per-view’, de exibirem esse tipo de lutas. Na forma como está proposta, incide a redação em inconstitucionalidade, ao ferir os dispositivos atinentes ao capítulo da Comunicação Social, notadamente os previstos nos arts. 5º e 220 da Carta Magna. Estes, combinados, asseguram plena liberdade de pensamento, criação, expressão e informação, sobre qualquer forma, processo ou veículo, sendo vedado toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística ou qualquer legislação que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social.”

A Comissão de Educação, Cultura e Desporto (CECD), aprovou em 11/10/2001 por unanimidade o Parecer do Relator, Dep. Costa Ferreira, pela aprovação:

“Na verdade, toda a discussão gira em torno desta questão: o nível dos programas de televisão reflete o nível educacional e cultural da audiência ou o nível educacional e cultural da audiência reflete o nível dos programas de televisão? Na impossibilidade de decidi-la no âmbito de um despretensioso e modesto parecer a projeto de lei e, até mesmo, para evitar que se possa acusar a Comissão de Educação, Cultura e Desporto de estar fugindo do debate e de estar fazendo vista grossa aos riscos morais a que programas de televisão permissivos e de baixo nível expõem a audiência infanto-juvenil, nosso voto é pela aprovação do Projeto de Lei nº 3.280, de 2000, desde que incorporada a emenda aprovada pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática.”

Encontra-se na Comissão de Constituição e Justiça e de Redação (CCJR) desde 12/11/2001, e aguarda designação de Relator.

Software livre

O Dep. Virgílio Guimarães (PT/MG), apresentou o PL nº 5.989/01 em 19/12/2001, que acrescenta § 4º ao artigo 5º da Lei nº 9.998/2000 que institui o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações. “Os terminais de operação deverão estar equipados, necessariamente, com plataforma operacional de ‘software livre'”.

Guimarães disse em sua justificativa que “o Brasil não poder ficar refém de monopólios, por mais qualidades que tenham seus produtos. Se forem indispensáveis, que se instale as duas plataformas, como já se determinou no Plano Plurianual para o caso da educação. O que se pretende aqui é se entender esta norma para todo o conjunto de ações derivadas do FUST.”

A proposição encontra-se na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI), com o Relator, nomeado em 3/6/2002, Dep. Salvador Zimbaldi. Aguarda Parecer.

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    é advogado, diretor de Internet do Instituto Brasileiro de Política e Direito da Informática (IBDI) e membro suplente do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).

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