Caso Olivetto

Leia decisão que condena seqüestradores de Washington Olivetto

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16 de julho de 2002, 12h07

A juíza da 19ª Vara Criminal de São Paulo, Kenarik Boujikian Felippe, reconheceu a motivação política do delito praticado por integrantes da Frente Patriótica Manoel Rodrigues (FPMR) e do Movimento de Esquerda Revolucionário (MIR). Em depoimento, Maurício Norambuena Hernandes, líder da ação, confirmou que era o responsável por enviar dinheiro para a FPMR, mas não citou quem recebia o valor. Na decisão, é detalhado como cada um dos integrantes trabalhou durante o seqüestro.

A juíza criticou a atuação policial no caso. Ela disse que “é inacreditável que um ato simples como o do isolamento do local (cativeiro) não tenha sido efetuado”. Por causa disso, os peritos não acharam provas digitais de outros seqüestradores. A juíza também criticou o fato de a Divisão Anti-Sequestro não ter registrado no inquérito depoimentos no momento em que foram colhidos.

Para a juíza, os seis seqüestradores não cometeram crimes de formação de quadrilha e tortura. Cometeram extorsão mediante seqüestro. Por isso, estabeleceu 16 anos de prisão para cada um dos seqüestradores. O Ministério Público considerou a pena branda e vai recorrer. Leia notícia sobre o assunto.

Veja a íntegra da decisão.

19ª Vara Criminal

Processo : 050.02.004.398.2

Controle: 176/02 – 177/02

Vistos, etc.

Willian Gaona Becerra (ou Frederico Antônio Aribas), Karina Dana Germano Lopez (ou Rosa Amália Ramos Quiroz), Mauricio Hernandes Norambuena, Marco Rodolfo Rodrigues Ortega (ou Carlos Renato Quiroz), Alfredo Augusto Canales Moreno (ou Ruben Oscar Sanches) e Martha Lígia Urrego Mejia (ou Maité Anália Bellon) e Pablo Munõz Hoffman e Raúl Julio Escobar Poblete, qualificados nos autos foram denunciados como incursos nos artigos 159, parágrafo 1º, 288, parágrafo único, do Código Penal e no artigo primeiro, inciso I, letra “b” e parágrafo 4o. inciso III, da lei 9455/97, todos c.c. o artigo 29, “caput”, 62, inciso I (primeira e última figura) e 69 do Código Penal, porque no dia 11 de dezembro de 2001, por volta das 19:45 horas, na confluência da Rua Minas Gerais com a Rua Novo Horizonte, nesta cidade, agindo em concurso, unicidade de propósitos e identidade de desígnios entre si e com pessoas não identificadas, com cada qual aderindo ao comportamento do outro, todos ajustados de forma estável e armados em formação de bando, seqüestraram Washington Luiz Olivetto, com o fim de obter para eles vantagem patrimonial indevida como preço para seu resgate no valor inicial de U$ 10.000.000,00 (dez milhões de dólares), sujeitando-o por constrangimento a intenso sofrimento físico e moral, mediante violência e grave ameaça para provocar ação de natureza criminosa. Os réus encontram-se estabelecidos de modo estável, armados e organizados, em associação criminosa que se volta ao cometimento de crimes, sob o falso manto de uma pseudo e indefinida “associação revolucionária”. Seriam componentes de grupos extremistas chilenos, que se encontram desativados, MIR e FPMR, divididos em inúmeras células, que se comunicavam entre si por sistemas de criptografia e radiofonia privada.

No dia 11.12.2001, por volta das 19:45 horas, simularam uma “batida” policial. Trajaram coletes com as inscrições da polícia federal municiando-se com armamento de grosso calibre. O veículo blindado guiado pelo motorista Antônio Barbosa da Silva teve a sua trajetória interceptada por pessoas, dentre eles Raúl Julio Escobar Poblete e Pablo Hoffman. O motorista obedeceu a ordem de parada, foi retirado do veículo de modo violento e arremessado no chão. Outros retiraram a vítima e o lançaram ao interior de um utilitário branco, sob violência e brandir de armas. A vítima teve os olhos vendados e foi algemado. Ele foi levado para um local, onde foi colocado no porta-malas de um outro automóvel e levado ao cativeiro, na Rua Kansas, número 44, Brooklin, Capital, num pequeno compartimento, isolado acusticamente, que possuía um catálogo de regras que deveriam ser obedecidas (dentre outras, não poderia encostar nas paredes, produzir ruídos ou deixar de exercitar-se diariamente). O local possuía um pequeno colchão, um banco de plástico, um balde que servia de sanitário, uma luz no teto que ficaria constantemente acesa, câmeras de vídeo para monitoramento e um olho mágico.

A cada instante que a vítima procurava gritar ou se mexer, seus algozes o golpeavam até que cessasse. Durante o período do cárcere a vítima era submetida a constante aflição física e psíquica, ouvindo música em alto tom e constante, postada sob uma lâmpada que não se apagava. O acesso de ar era feito através de um pequeno tubo plástico, que bombeava oxigênio. A vítima era constantemente sujeita a intensa aflição física, quando violava as regras, bem como de ordem psíquica, recebendo ameaças constantes, sujeita a respirar com dificuldade, a banhar-se e fazer higiene pessoal de quatro em quatro dias, recebendo alimentação insuficiente e servida no solo. Não poderia ouvir voz alguma e os poucos contatos eram por bilhetes, tudo a evidenciar a tortura.


No dia seguinte ao arrebatamento, a família recebeu através de Patrícia, esposa da vítima, um bouquet de rosas com o relógio de Washington a indicar que eram as pessoas que mantinham a vítima sob custódia e com quem deviam negociar e o preço de resgate. As tratativas ficaram a cargo de Gabriel Douglas Zellmeister e Javier Llussa Ciuret e sempre por meio de bilhetes. Outros dois foram encaminhados através de “motoboys”, um enviado por entre latas de tintas adquiridas em um comércio e outro por intermédio de entrega simulada de produtos farmacêuticos.

O comando do grupo estava sob o comando de Mauricio Hernandes Norambuena, que dispunha de Pablo Hoffman e Raúl Julio Escobar Poblete, como principais braços operacionais. Os demais difundiam-se em células de operação localizadas na cidade de Serra Negra, Ilhabela e Santos, além de três apartamentos nesta Capital: um na Rua Santa Madalena, número 320, outro na Rua Luis Góes e outro na Rua Batatais, no Flat Saint Paul e ainda o imóvel da Rua Kansas, que serviu como cativeiro.

Passados quase dois meses do arrebatamento, a polícia recebeu a informação que um grupo de estrangeiros estaria na chácara situada na Rua Antônio Beltrami, número 05, na cidade de Serra Negra e que tais pessoas utilizavam armas e entorpecentes. No dia 01 de fevereiro de 2002, munidos de mandado judicial de busca, policiais da Delegacia Anti-Sequestro encontraram os acusados, com exceção de Raul e Pablo e em um fundo falso de uma pasta, manuscritos de uma pessoa que se dizia cativa, com menção dos nomes Patrícia, Javier e Gabriel. No dia seguinte, por volta das 11:00 horas, o acusado Mauricio, acompanhado de policiais, foi até um telefone público e ao interlocutor informou acerca da prisão e determinou que soltassem a vítima, que deveria chegar bem. Disse aos policiais que a vítima não seria liberada naquele momento, pois seria necessário fazer uma faxina. A vítima foi abandonada no local e como o ar parasse de fluir e percebendo que estava sozinha passou a bater nas paredes e despertar a atenção da moradora vizinha, que chamou a polícia militar, que realizou o seu resgate.

Consta, ainda, que Mauricio planejou a ação no aspecto da inteligência. Pablo cuidava da parte operacional, desde o arrebatamento até a manutenção e proteção do cativeiro. Raúl era também responsável pela parte operacional e estes dois últimos participaram do arrebatamento com outras pessoas não identificadas. As mulheres, Karina e Martha, serviam para dar ao local que se encontravam uma situação de normalidade, o que afastaria suspeitas e daria ao local um aspecto familiar. Cuidavam dos afazeres domésticos e opinavam sobre o preço do resgate. Ambas revezavam-se, como os demais, em firmar contratos de locação e também de encaminhar os bilhetes que foram destinados para negociação do resgate. Karina participou de duas locações. Marco Rodolfo é perito em computador e responderia pelas mensagens criptografadas que estavam nos aparelhos de computação apreendidos e auxiliava no trabalho de negociação. Willian cuidava do transporte de todos, participava ativamente na negociação, na intermediação das demais células e na “limpeza”.

A denúncia foi recebida por decisão datada de 15.2.2002 e rejeitada em relação aos denunciados Pablo Munõz Hoffman e Raúl Julio Escobar (fls.95/100); o aditamento da denúncia, para constar os nomes corretos dos réus, foi recebido aos 27.3.2002 (fls.832); a vítima foi admitida como assistente do Ministério Público (fls. 187); os acusados foram interrogados (fls.607/629); a Defesa manifestou-se nos termos do artigo 395 do CPP (fls.652/655); foi produzida prova oral (fls. 762/802, 833/869) e pericial .

Ultrapassada a fase do artigo 499 do Código de Processo Penal, as partes apresentaram alegações finais, requerendo o Ministério Público a condenação nos termos da denúncia. O assistente do Ministério Público reiterou pedidos formulados na fase do artigo 499 do CPP e no mérito reiterou a manifestação do Ministério Público. A Defesa requereu a absolvição de todos os acusados em relação aos crimes tipificados no artigo 288 do Código Penal e na Lei 9455/97; a absolvição dos acusados Marco Rodolfo, Willian, Karina e Martha no tocante ao delito previsto no artigo 159 do Código Penal, adotando a tese da insuficiência probatória. Requereu a aplicação da pena no mínimo legal considerando-se a confissão e a motivação política e a causa de diminuição da pena prevista no artigo 159, parágrafo 4o, do Código Penal.

É o relatório.

Decido.

Afasto o pedido do assistente do Ministério Público apresentado em sede de preliminar, no tocante a oitiva de outras testemunhas, mantendo a decisão de fls. 1746 e 1417/1420 e passo a analisar o mérito.

A ação é parcialmente procedente.

A prova é segura e firme para embasar o decreto condenatório, não sendo possível acolher a tese da Defesa no tocante ao crime de extorsão mediante seqüestro.


a) Da Extorsão Mediante Seqüestro

No auto de prisão em flagrante os acusados fizeram uso do direito constitucional de permanecerem calados e, em juízo, Mauricio e Alfredo Augusto admitiram a pratica do crime e afirmaram que a incumbência de ambos era cuidar da negociação do valor do resgate.

O acusado Mauricio disse que faz parte da organização chilena “Frente Patriótica Manoel Rodrigues” e participou de parte das ações referentes ao seqüestro. Sua incumbência era realizar a negociação do valor do resgate junto com Alfredo Augusto, que era do organização denominada MIR. Um dia pós o seqüestro recebeu o material informativo sobre a vítima através de um intermediário a quem chamavam de Marcelo, bem como trinta mil dólares, quantia que ficou a seu cargo e de Alfredo Augusto, utilizados para as despesas de manutenção do grupo, como locação , compra de veículo, etc. Os valores eram controlados e registrados no computador. Indicou o nome das cidades pelas quais passaram, a última Serra Negra, onde foram presos, oportunidade que foram apreendidos quatro computadores, que eram utilizados por Alfredo Augusto , Marco Rodolfo e os outros dois de seu uso, um dos quais para enviar mensagens pela internet. O delegado Bittencourt esteve no local em que estavam presos e queria saber da localização do cativeiro. “Ele propôs que fizesse um acordo para que todos saíssem bem. Disse a ele que poderia fazer gestões para libertação de Washington Olivetto, mas queria que o acordo fosse presenciado e avalizado por uma outra pessoa, como um Juiz…queria a presença desta autoridade para que ficasse assegurado que estaria fazendo a tentativa de libertação da vítima por vontade própria, pois não queria que as pessoas do grupo que estivessem no cativeiro corressem riscos, como não queria riscos para a vítima. Tinha receio que pudessem incorporar, futuramente, outras razões para suas gestões”. O delegado disse que não poderia apresentar alguém para afiançar o acordo, tendo em vista o adiantado da hora, mas deu a sua palavra. Foram trazidos para São Paulo e no dia seguinte foi levado até um telefone público, quando conversou com Marcelo e “ esclareceu qual era a situação, que fizeram um acordo para realizar gestões para que a vítima fosse libertada”. Marcelo não tinha poder de decisão, mas iria retransmitir as informações. Afirmou que o valor do resgate seria dividido entre as duas organizações, que as negociações eram conduzidas exclusivamente por sua pessoa e Alfredo Augusto e não informou as demais pessoas detidas que estavam seqüestrando Washington Olivetto. Eles apenas sabiam que estavam fazendo uma operação delicada e davam condições para que a operação pudesse ser realizada com tranqüilidade. Eles eram os incumbidos de organizar a rotina, dando cobertura, fazendo compras, providenciando os aluguéis, conduzindo veículos (fls. 607/611).

O acusado Alfredo Augusto prestou as mesmas informações. Disse que faz parte do MIR desde 1985 e participou da negociação do resgate com Mauricio. As mensagens eram enviadas através de Marcelo, que as recebia em envelope lacrado. Reafirmou que os demais detidos não tinham conhecimento sobre os fatos, nada sabiam do seqüestro. Afirmou que fez um convite para que Willian viesse para o Brasil. Fez o mesmo em relação à Karina, pois havia muitos homens e uma única mulher, sua companheira Martha. Por fim, Marco Rodolfo permaneceu no Brasil para servir de base de apoio para os companheiros do MIR que vinham para o Brasil e ele também foi convidado para viajar, sendo provável que no período da viagem tenha feito algumas tarefas do computador (fls. 612/616).

O acusado Marco Rodolfo também disse pertencer ao MIR e desconhecia que estava participando de um seqüestro. Estava morando em São Paulo, desde junho de 2001, na Rua Santa Madalena, sendo que assinou o respectivo contrato de locação. Viajou com os demais acusados e foram detidos em Serra Negra. Acredita que os contratos dos imóveis de Águas de Lindóia e Serra Negra foram assinados por Karina. Disse que as despesas deste período eram realizadas por Mauricio e Alfredo Augusto, pois o dinheiro era usado em comum por todos, mas ficava a cargo dos dois. Nada sabia sobre o seqüestro. Imaginava que Alfredo Augusto estava fazendo alguma coisa referente a sua militância política, pois caso contrário não seria chamado por ele, via e-mail, para vir ao Brasil e alugar um imóvel por onde passariam alguns companheiros. Entregava mensalmente o relatório de despesas para Alfredo , que lhe entregava o dinheiro. Esteve com Karina em Belo Horizonte , dois dias antes de ser preso, e lá foi adquirido o veículo Ranger, que foi apreendido pela polícia, bem como os quatro computadores e dois mil dólares que estavam em suas vestes (fls. 617/619).

O acusado William também afirmou que só soube do seqüestro após a sua prisão. Conheceu Alfredo Augusto na Colômbia, onde estava sendo perseguido por grupos paramilitares e não tinha trabalho. Por contato eletrônico solicitou ajuda e ele disse para vir ao Brasil e indicou o endereço que deveria ficar, no mesmo apartamento que morava Marco Rodolfo. Recebeu de Alfredo Augusto o documento com outro nome e aceitou o convite de viajar com ele, em férias. Recebeu dinheiro para ir até Manaus e Boa Vista para comprar uma máquina contadora de dinheiro (fls.620/623).


A acusada Martha também afirmou que soube do seqüestro com a sua prisão. É companheira de Alfredo Augusto e veio a encontrar-se com ele aqui no Brasil em março de 2001. Viajou com os demais acusados e foi presa com eles em Serra Negra. Soube em 1999/2000, que Alfredo Augusto era do MIR, mas não sabe quais eras as atividades deles como integrante desta organização. Participou do movimento estudantil que objetivava o acesso à educação e ficou marcada por grupos paramilitares da Colômbia, onde residia. Recebeu o documento falso de Alfredo (fls. 624/626).

A acusada Karina também afirmou que soube do seqüestro através dos policiais que realizaram a prisão. Disse que veio ao Brasil em outubro de 2001 e em dezembro encontrou-se com Alfredo Augusto e Marco Rodolfo e com eles foi para a cidade de Águas de Lindóia, onde alugou uma casa. Passados dois dias os demais acusados chegaram na cidade e juntos permaneceram até serem detidos. Assinou também o contrato de locação do imóvel de Serra Negra. Foi na imobiliária acompanhada de Marco Rodolfo e apresentou o documento falso, com o nome de Rosa, sendo que o dinheiro da locação e os documentos falsos lhe foram entregues por Alfredo. Havia uma identidade entre todos do grupo e achava que eles estivessem trabalhando, ou seja, militando, mas jamais pôde imaginar que fosse um seqüestro . É filha de desaparecido político argentino, exilou-se com seus familiares e residia na Espanha. Foi para Argentina para tratar da indenização referente ao desaparecimento e lá conheceu Alfredo (fls. 627/629)

Os acusados Mauricio e Alfredo Augusto admitem a pratica do crime limitando a ação de ambos na negociação do resgate, razão pela qual não tinham contato com os demais agentes, salvo alguém que chamavam de “Marcelo”. Os dois tentam afastar a responsabilidade dos demais acusados, mas em vão, pois o conjunto probatório não deixa margem alguma para dúvida. Todos os acusados praticaram o crime de extorsão mediante seqüestro. A negativa dos réus permaneceu isolada nos autos e os fatos narrados na denúncia foram confirmados pela prova produzida no tocante à extorsão.

É irreal, sem qualquer lógica e razoabilidade a afirmativa dos réus Martha, Karina, William e Marco que não sabiam que estavam participando de um seqüestro e que somente souberam do fato com a prisão.

O conjunto probatório indica que eles estavam participando ativamente do crime. Mauricio afirmou que os demais acusados estavam juntos para dar sustentação para que eles pudessem realizar a negociação com tranqüilidade. Eram eles que organizavam a rotina fazendo compras, dando cobertura, providenciando os aluguéis, etc. Alfredo diz que foi ele que chamou os demais para se juntarem ao grupo e Marco Rodolfo veio para dar base de apoio aos companheiros do MIR e provavelmente fez algumas tarefas no computador.

Não é crível que os quatro lá estivessem sem conhecimento do seqüestro. Não se pratica um crime desta natureza, com o planejamento que foi realizado, chamando outras pessoas apenas para fazerem companhia. Eles sabiam e tiveram uma participação efetiva no crime, com atribuições específicas. Lá estavam para realizar parte dos serviços necessários para que a empreitada criminosa pudesse ser bem sucedida. Trata-se de uma divisão de tarefas para a consecução do objetivo almejado.

A versão apresentada pelos réus é fantasiosa e são os dados do processo que revelam da imaginativa narrativa dos réus, pois todos os réus estavam com documentos falsos, usavam outros nomes e somente depois é que se teve conhecimento sobre a real identidade dos acusados, com exceção de Mauricio, que desde o primeiro momento, no auto de prisão em flagrante, forneceu aos policiais a sua real identidade e informou que era procurado pela Interpol e foragido de um estabelecimento penal de segurança máxima no Chile.

Além de estarem com documentos falsos, tinham material que poderia ser utilizado como disfarce, dentre eles as perucas. Possuíam armamento, sendo um deles da polícia chilena. William foi comprar máquina de contar dinheiro; Karina comprou veículo em outro Estado acompanhado de Marco Rodolfo (recibo de venda em nome de Rosa Amália Ramos Quiroz juntado as fls. 392 dos autos apartados); Karina tratou dos aluguéis de alguns dos imóveis que o grupo fez uso, no período de negociação (contratos de locação em nome de Rosa Amália Quiroz juntados as fls. 403/406 dos autos apartados); Marco Rodolfo fez tarefas no computador e era um dos que fazia uso da máquina. Todos juntos davam a idéia de um grupo de turistas, com pessoas dos dois sexos para dar certa aparência familiar e assim não levantar suspeitas.

Em relação à acusada Martha Ligia soma-se o reconhecimento realizado em juízo pelo atendente da farmácia através da qual foi encaminhada a última mensagem dos seqüestradores para Patrícia Viotti. Acrescente-se as anotações efetuadas no computador, pois no roteiro do planejamento consta que ela, com o nome de Maite, iria realizar duas espécies de tarefas: mensagens e plano de exploração (fls. 561).


Ainda, consta do computador a forma de encaminhamento da mensagem número 6, através de uma farmácia, com os nomes Maite e Pancho. Neste arquivo há a indicação de como teria que ser procedida a compra, ou seja entrar na farmácia com uma lista de compras de cerca de cem reais e depois indicar o endereço da entrega. O disfarce a ser utilizado seria composto por trajes de aspecto formal, com uso de colar ortopédico (fls. 1845). Esta descrição coincide com o relato da testemunha Alberto, que reconhece a acusada Martha em juízo.

O auto de exibição e apreensão de fls. 19/24 do apenso do auto de prisão em flagrante relaciona os objetos apreendidos em Serra Negra, dentre eles armamento, munição, perucas e inúmeros documentos falsos, com a fotografia dos réus e com diversos nomes.

Os documentos apreendidos foram submetidos à perícia e constata-se a apreensão de documentos falsos com todos os acusados, conforme laudo juntado as fls. 969/1019.

Foram também apreendidos os contratos de locação e recibos de aluguéis de casas utilizadas e é a acusada Karina, usando o nome de Rosa Amália, que subscreveu alguns destes contratos.

Consta dos autos o laudo pericial realizado em arquivos dos computadores apreendidos. Nele constata-se a existência das observações realizadas em relação à vítima, seus costumes, seu perfil, carros que usa, restaurantes que freqüenta, pessoas que estão ao seu redor, descrição do local do trabalho, preferências artísticas, região que circula, etc. Há ainda a relação de floriculturas, farmácias, casas de carne, e outros estabelecimentos, com o respectivo endereço e observações como, número de pessoas que realizam o atendimento, se são do sexo masculino ou feminino, se há câmaras filmadoras instaladas, preço de produtos, meios de acesso.

Há registros de observação do local e da vítima desde o mês de agosto (fls. 503), como também a contabilidade dos gastos efetuados, com indicação de vários nomes: Maite, Tono, Pablo, Claudia, Pancho, Miguel, Cristian, sendo a despesa mais antiga datada de janeiro de 2001 (fls. 572/580).

É possível observar um roteiro do planejamento do seqüestro as fls. 561, inclusive com divisão das tarefas. O plano de exploração e mensagens fica a carga de uma pessoa em conjunto com Maitê, ou seja, a acusada Martha.

Em um dos computadores foi encontrado um arquivo deletado referente a carta enviada para a mulher da vítima em espanhol e em português, sendo a mesma recebida por Patrícia Viotti (fls. 1757).

Necessário destacar a prova oral produzida sob o crivo do contraditório, que revela como o seqüestro ocorreu, a forma de negociação, a reunião dos agentes, o modo como a prisão ocorreu e a libertação da vítima. Em apertada síntese, destaco o fundamental das oitivas:

A vítima Washington Olivetto não reconheceu os acusados em juízo. Relatou que estava junto com o seu motorista, que dirigia o carro blindado quando se deparou com a blitz, que obrigou a parada do automóvel. Viu vários homens, cerca de dez a quinze que usavam coletes da polícia federal e pela forma como se aproximaram percebeu que eles não eram policiais. Alguns foram em direção ao motorista Antonio e dois ou três o arrancaram do veículo. Foi colocado no porta malas de um furgão, onde permaneceu com mais três homens e foi agredido, algemado e vendado. Houve uma troca de veículo e foi levado ao cativeiro. Tiraram as suas vestes, foi apalpado, revistado e conduzido por quatro pessoas no local em que permaneceu até ser libertado. Os homens entraram encapuzados e ao reagir àquela situação foi agredido fisicamente. No período que permaneceu cativo não saiu do cubículo, onde fazia as necessidades fisiológicas em uma lixeira plástica; a luz ficou acesa durante todo o tempo; ouviu música ininterruptamente , com o que conseguiu manter a noção temporal; sabia que era vigiado em razão das câmaras e do olho mágico instalados; não ouviu uma palavra sequer dos seqüestradores; permanecia de costas e com uma venda nos olhos quando os seqüestradores entravam no cativeiro para entrega de comida e nos dias de banho. Explicou que os seqüestradores se comunicavam por bilhetes e davam a entender que estava participando das negociações para a sua soltura, pois escreveu cerca de trezentas cartas.

Foram estas cartas que permitiram a prisão dos acusados, quando parte delas foram apreendidas em Serra Negra. Elas foram periciadas e constatado que procederam do punho da vítima, conforme laudo documentoscópico de fls. 507/536. Em uma delas Washington Olivetto diz, como uma premonição: “Esta carta tem que me salvar. Por favor leiam com atenção” (fls. 523 do apenso, volume 3). Não tivesse ele escrito aos seus seqüestradores por tantas vezes, certamente elas não apareceriam algum dia.

A vítima relatou o regulamento que se encontrava na parede do cativeiro. Disse das dificuldades e das dores pelas quais passou no cativeiro sintetizando a angústia em três blocos de sentimentos: pela sensação de injustiça que estava sentido; pelo medo e pânico e pela sensação de terem lhe tirado a vida, pois era como se fosse um morto-vivo, tinha “saudade de mim”. Relatou em detalhes os mecanismos utilizados para manter a sanidade e ocupar o tempo, que era interminável. Por fim esclareceu que no último dia faltou energia elétrica e passado algum tempo começou a sentir calor e percebeu que não havia qualquer ruído , tentou abrir a porta usando a haste de seu óculos e percebendo que poderia ser ouvido, começou a gritar, até que ouviu uma voz feminina, tratando-se da moradora vizinha que chamou a polícia, que arrombou a porta e o libertou (fls. 835/846).


O motorista do veículo, Antonio Barbosa da Silva, asseverou que fez o caminho obrigatório da saída da empresa e viu os cones que obrigavam a passagem de um veículo por vez. Acredita ter visto cerca de cinco homens armados, brancos, vestidos de preto, com indicação da polícia federal. Um deles veio em sua direção, fez um gesto para que abrisse a janela e assim que cumpriu a ordem ele destravou as portas e os demais se dirigiram para a vítima. Foi retirado do veículo e jogado no chão e agredido na face com a arma. Não viu o momento que a vítima foi colocada em outro automóvel, mas foi informado que ele tinha sido colocado em um carro branco. Não ouviu uma palavra sequer dos arrebatadores. Não soube fornecer as características do indivíduo que o abordou, afora a cor da pele (fls. 765/769).

A mulher da vítima, Patrícia Viotti, relatou em minúcias todo o desenrolar da comunicação que manteve com os seqüestradores. Esclareceu que a primeira comunicação ocorreu no dia seguinte, através de um ramalhete de rosas, com parte do relógio de Washington e com um bilhete ameaçador determinando que a imprensa e a polícia fossem afastadas. Reuniu um grupo de pessoas que a ajudaram a enfrentar aquela situação. Recebeu a segunda mensagem somente em 20.12.2001 com a exigência de dezoito milhões e meio de dólares informando que a resposta deveria ser fornecida através de anúncios em dois jornais no dia 22, sendo que ficou em pânico, pois o anúncio não saiu em um deles. Passaram o período de festas natalinas sem qualquer contato e somente em 5.1.2002 recebeu a terceira mensagem, numa entrega de açougue. A testemunha relata o seu desespero numa verdadeira cena de horror, pois começou a revirar os pedaços de carne procurando algum pedaço do corpo de Washington. Somente depois de certificar-se que nada havia é que leu o bilhete que insistia no valor do resgate, devendo responder sempre da mesma forma, por anúncios de jornal, em data e forma pré-estabelecidos. A quarta comunicação foi retirada em uma loja de no dia 15 de janeiro. E aí nova cena dantesca: a testemunha recebeu as latas de tinta, mas sem mensagem, então revirou as latas e nada encontrou. Em desespero, pois se não localizasse o bilhete não teria como responder aos seqüestradores, telefonou para a empresa e conseguiram encontrar o bilhete que tinha caído no veículo . A quinta mensagem foi entregue no dia 23 de janeiro por carta expressa do correio e a última no dia 31 de janeiro, sendo que a resposta deveria ser publicada no dia dois de fevereiro. Porém no dia primeiro de fevereiro foi contatada para saber de alguns dados para que fossem confrontados com aqueles que estavam nas cartas encontradas em Serra Negra. Relatou as conseqüências de ordem pessoal e econômicas que o seqüestrou deixou e disse que não houve pagamento de resgate (fls. 861).

Quatro dos anúncios referidos por Patrícia Viotti constam as fls.278 do apenso de cópias.

A testemunha Gabriel Douglas Zellmeister, sócio da vítima, disse que as tratativas foram realizadas por um grupo composto por ele, pelo sócio Javier, pela mulher da vítima, Patrícia e solicitaram que dois amigos acompanhassem s negociações, Juca Kfouri e André Midani, pois acharam que eles teriam melhores condições de manter alguma interlocução com os seqüestradores. O último ficou encarregado de atender o telefone celular especialmente destinado para a negociação, mas não houve telefonema. Relatou a forma estabelecida de negociação pelos autores do crime. Sempre encaminhavam mensagens em envelopes lacrados, nunca manuscritos com a determinação da forma como deveriam enviar a resposta, ou seja, sempre através de anúncios no jornal em datas pré-estabelecidas. Informou detalhadamente as mensagens e respectivas datas e a forma como foram recebidas. As decisões sobre as negociações eram realizadas por Patrícia e pelo grupo de amigos, sem outras interferências. Durante o período do seqüestro mantiveram contato direto com a polícia. Na data da prisão dos réus recebeu o telefonema do delegado querendo algumas informações para confirmar se as cartas apreendidas com os réus eram do punho de Washington. Narrou o estado psicológico que todos estavam e as conseqüências para todos que estavam envolvidos com a vida da vítima. Acrescentou que “não houve pagamento de resgate” (fls. 770/779).

A testemunha Javier prestou as mesmas informações. Relatou notadamente as conseqüências do seqüestro no âmbito da empresa e pessoal (fls. 846/849).

A testemunha Alberto, que trabalha na farmácia, reconheceu a acusada Martha em juízo, com segurança e certeza. Disse que ela esteve no estabelecimento usando um colar cervical; falou em “portunhol” e realizou a compra e deu o bilhete para ser entregue, no qual constava o endereço da Alameda Franca e o nome de Patrícia. Pouco tempo depois da entrega um policial se apresentou e queria saber quem tinha realizado a compra. Foi chamado na delegacia, mas antes disso, já tinha acompanhado o noticiário da televisão e reconhecido a compradora. Na delegacia reconheceu a acusada por fotografia, bem como os óculos e o colar cervical que ela usava no momento da compra (fls. 862/863).


A testemunha Eduardo, que trabalha em uma academia de ginástica, disse que quatro pessoas de um mesmo grupo, que falavam com sotaque castelhano, freqüentavam a academia. Reconheceu três deles em juízo: Mauricio, Alfredo, Martha. Disse que a quarta pessoa tinha o nome de Villabela e não teve certeza quanto ao acusado Willian, que seria parecido com Villabela, mas um pouco mais novo. Teve dúvida em dizer se a pessoa fotografada a fls. 743 (Willian) seria tal pessoa e afirmou que a pessoa fotografada as fls 65 do apenso de flagrante (Willian) lhe parece Villabela. Na delegacia reconheceu os mesmos três e também a foto de Miguel Armando Villabela (fls. 864/866).

O porteiro do edifício localizado na Rua Luis Góes disse que os acusados Alfredo Augusto, Martha e Mauricio moraram naquele imóvel até dezembro de 2001, quando saíram e soube que eles tinham ido para a Argentina (fls. 867/869).

O delegado de polícia Dr. Wagner Giudice asseverou que não recebia os bilhetes encaminhados pelos seqüestradores, mas tomava conhecimento do conteúdo e da forma de entrega, só não era comunicado acerca do valor do resgate. Disse que entraram em contato com a pessoa que vendeu o veículo utilizado pelos seqüestradores e souberam que o carro tinha sido adquirido por uma pessoa que falava em castelhano. Entraram em contato com o vendedor da loja de tintas, uma das que foram usadas para realização da entrega de mensagem e souberam que a compra teria sido realizada por uma mulher que se apresentava como surda e muda. Recebeu a informação da prisão dos réus e do encontro das cartas. Através do conteúdo das mesmas chegaram a conclusão que eram escritas pela vítima. Manteve contato com os réus e pode perceber que apenas os acusados Mauricio e Alfredo Augusto falavam indicando a liderança que eles tinham em relação aos demais.

O delegado Wagner asseverou que soube através dos outros dois delegados, Dr. Emygdio e Bittencourt, que houve uma proposta de libertação de Washington, pois Mauricio e Alfredo poderiam soltar a vítima com vida, caso fosse autorizado um telefonema, mas ele teria que ligar no dia seguinte às onze horas, um horário que era pré-estabelecido. Mauricio disse que temia que algo acontecesse, que a polícia chegasse ao cativeiro. Deu a entender que um impasse poderia ocorrer no local e queria resguardar a vida dos demais seqüestradores e da própria vítima. Foi autorizado o telefonema e no mesmo dia a vítima foi abandonada no cativeiro. Acrescentou que “em nenhum momento Mauricio indicou o local do cativeiro. Ele não mencionou o nome das pessoas que teriam, de alguma forma participado do crime, seja na vigilância do cativeiro, seja na organização, seja no contato telefônico que ele possuía“. Soube que Mauricio tem condenação em razão de tentativa de homicídio contra Pinochet, pela morte de um senador e um seqüestro (fls.780/ 795).

O delegado de Serra Negra asseverou que policiais militares comunicaram que algumas pessoas da cidade estavam estranhando a conduta de alguns turistas que tinham alugado uma chácara, pois permaneciam grande tempo dentro da mesma. Achou que pudessem ser traficantes e munido de um mandado de busca e apreensão, esteve no local e prendeu os réus. Um sargento encontrou dentro do fundo falso de uma pasta as cartas de uma pessoa seqüestrada. Repassou os dados para a delegacia especializada e foi confirmado, através do teor dos manuscritos, que se tratava de Washington Olivetto. Apreendeu armas e diversos objetos no local (fls. 798/801).

A ação policial que culminou com a prisão dos réus, foi realizada mediante mandado exarado pelo juízo de Serra Negra, cumprido por policiais desta cidade e a diligência não tinha nenhuma relação com o seqüestro da vítima. Tratava-se de envolvimento de estrangeiros com armamentos e drogas. O encontro das cartas da vítima foi casual, sem qualquer vínculo com a investigação que estava em curso.

A representação do delegado de Serra Negra consta a fls. 18 do apenso da prisão em flagrante e aponta a necessidade da busca e apreensão em razão de denúncia de existência de tráfico de entorpecente e de armas de fogo no local , razão pela qual a diligência foi cumprida. Entretanto, acabaram por encontrar as cartas manuscritas pela vítima.

O imóvel onde estava instalado o cativeiro foi periciado e através do laudo pode-se ter uma visão bem real do local onde a vítima permaneceu por cinqüenta e três dias. As fotografias que constam dos autos e que ilustram o laudo pericial, notadamente as fotografias de fls. 446/447, 449, 452/456, nos permite visualizar a descrição do cativeiro, fornecida pela vítima e pelo policial inquirido.

Lamentavelmente, o local do cativeiro não foi devidamente preservado desde o primeiro momento. Somente depois da chegada dos peritos é que foram tomadas as providências primárias de qualquer investigação. Consta da prova pericial referente ao local do cativeiro:


“Ao adentrar literalmente ao interior do imóvel, notei o mesmo estar ‘invadido’ por Policiais Militares e Policiais Civis, todos em cômodos diferentes, portanto, sem preservação alguma do local, denotando com isso provavelmente perdas importantes para o trabalho pericial, pois as pessoas andavam de um lado para o outro, subiam e desciam as escadas, bolinavam os objetos, abriam e fechavam portas de armários, abriam janelas, enfim, em nenhum momento notei por parte destas pessoas, qualquer tipo de preservação, destruindo, assim, campos importantes para pesquisas periciais vindouras.

Cumpre salientar que a preservação de locais de crime é, sobremaneira necessária, uma vez que a importância das perícias sobrepõe qualquer atitude descabida por pessoas não pertinentes ao ramo da criminalística, sem os cuidados necessários, sem qualquer instrução do campo pericial, daí produzindo prejuízo à própria Justiça…

Do exposto o relator informa que o local em pauta achou-se descaracterizado ao procedimento pericial “ (fls. 255).

É inacreditável que um ato simples como o do isolamento do local não tenha sido efetuado, o que garantiria a possibilidade de colheita de material para a realização de diversos exames. Diante da constatação dos peritos, certamente os que lá estavam não contribuíram para a elucidação do crime. É indispensável uma orientação (que inclua questões primárias como a do isolamento do local do crime) para todos os policiais, para que o trabalho de investigação científica possa ser realizado de forma produtiva e útil para o processo.

Outrossim, as cautelas de registro de investigação não podem ser menosprezadas. O inquérito é procedimento através do qual são ofertados elementos que servem à formação da opinio delicti, razão pela qual o legislador determinou as obrigações da autoridade policial no artigo 6o. do Código de Processo Penal e dentre elas tem o dever de colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias. O inquérito deve revelar todas, sem exceção, diligências realizadas pela autoridade policial. Não se pode olvidar o estabelecido no artigo 9o. do mesmo código: “todas as peças do inquérito policial serão, num só processado reduzidas a escrito ou datilografadas…”

Ao que consta, a testemunha Alberto, vendedor da farmácia, foi procurado e inquirido no mesmo dia pela polícia, mas as suas declarações somente foram tomadas por termo no dia 8.3.2002, pela delegada que assumiu posteriormente a presidência do processo. O termo deveria ser tomado no dia da oitiva e não após um mês, quando o processo já estava instaurado, o que permitiria inclusive, que o Ministério Público arrolasse a testemunha ao oferecer a denúncia.

O conjunto probatório não deixa margem para a dúvida . Todos os acusados praticaram o crime de extorsão mediante seqüestro e a condenação se impõe.

b) Quadrilha ou Bando

Mas há que se acolher o pedido da Defesa e afastar o delito previsto no artigo 288, parágrafo único do Código Penal, que exige para sua configuração um mínimo de quatro agentes, atuando em reunião estável, o que não se confunde com o concurso de pessoas. A conjunção transitória não é crime autônomo. Neste sentidos confira-se decisões colacionados da obra acima referida, vol I, tomo II:

“Não basta para configurar o delito de quadrilha ou bando a reunião de mais de três pessoas para a execução de um ou mais crimes. É necessário que, além dessa reunião, haja um vínculo associativo permanente para fins criminosos, uma predisposição comum de meios para a prática de uma série indeterminada de delitos e uma contínua vinculação entre os associados para a concretização de um programa delinqüencial (TACRIM-SP-AC- Rel. Silva Franco- RT 493/322).

“O simples ‘acordo’ para a prática de um crime não é punível. O que transforma o acordo em associação, quadrilha ou bando e o torna punível é a organização com caráter de estabilidade. É, assim, uma certa permanência ou estabilidade, o que distingue o crime do art.288 do CP da simples participação criminosa, societas sceleris ou societas in crimine (TJSP-HC 23.329-3- Rel. Diwaldo Sampaio- RT 588/323)”.

No mesmo sentido: RT 705/353, 567/348, 538/383, 521/425, 514/354, 511/400, 463/410, 457/418, 443/506, 398/109, 296/114; RJTJSP 139/282, 135/428, 83/406, 26/411, 21/508, 8/536, 7/503; RF 236/250, 229/283, 210/355; RTFR 27/86; JUTACRIM 54/372, 61/400, 42/276, 39/200, 37/235.

No caso vertente, não há prova de estabilidade ou permanência entre os acusados. A prova produzida indica que para o seqüestro de Washington Olivetto, houve um período longo de planejamento e observação. Os réus se reuniram para praticar este crime, mas não foi produzida prova no sentido de que eles tenham formado uma associação. Nem sequer há indícios neste sentido. Nada há nos autos que conduza a afirmação da existência do crime capitulado no artigo 288 do Código Penal. O que restou provado é a reunião para a pratica de um único delito.


c) Crime de Tortura

O delito de tortura imputado aos réus não está caracterizado, mas não porque se exige que o autor deste crime seja funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência, como alegado pela Defesa, que tem razão ao afirmar que o legislador não poderia construir um tipo de tortura que não levasse em conta o conceito aprovado em convenções internacionais. Entretanto, a Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, adotado pela Resolução 39/46 da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1984 e ratificada pelo Brasil em setembro de 1989, dispõe ao término do artigo primeiro, que estabelece o conceito de tortura :

“O presente artigo não será interpretado de maneira a restringir qualquer instrumento internacional ou legislação nacional que contenha ou possa conter dispositivos de alcance mais amplo” .

É o que ocorreu na legislação brasileira, que somente após treze anos definiu o crime de tortura, no artigo primeiro da lei 9455/97 e não impôs a qualidade acima referida no tocante ao agente do delito. Portanto, a legislação nacional deu alcance maior ao crime em tela, o que não afronta de maneira alguma a Convenção.

Mas ainda assim, não esta caracterizado o delito, pois o constrangimento causador do sofrimento físico ou mental, conforme regramento da Lei 9455/97, deve estar circunscrito a uma das três hipóteses apresentadas pelo legislador, quais sejam: com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; em razão de discriminação racial ou religiosa , ou para provocar ação ou omissão de natureza criminosa .

A denúncia destaca que a finalidade específica consistia em provocar ação de natureza criminosa, embora não indique em que consistiria a mesma. Contudo esta elementar não está concretizada, pois não há qualquer indicativo nos autos que o constrangimento causador do sofrimento para Washington Olivetto tenha provocado alguma ação de natureza criminosa. A lei exige uma vinculação entre o constrangimento sofrido pela vítima e a provocação de uma ação criminosa. O constrangimento praticado seria para uma finalidade especial, qual seja, a obtenção de uma ação criminosa, o que não se verifica, pois não consta nenhuma ação criminosa por parte da vítima ou mesmo de terceiros. O único crime que se vê é o praticado pelos acusados.

Houve emprego de violência e grave ameaça e foi causado sofrimento físico e mental para a vítima, porém, estes elementos não são suficientes para a caracterização do crime de tortura, que deve ser afastado.

d) Pena

Na aplicação da pena, considerando as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal, fixo a pena base além do mínimo legal, ou seja, em dezesseis anos de reclusão.

É preciso registrar que em nenhum momento foi requerido o reconhecimento de crime político próprio, para tanto seria indispensável que o delito atentasse contra a soberania, a integridade, a estrutura e o regime político do Brasil, o que não ocorreu.

O pedido restringe-se ao reconhecimento da motivação política para a pratica do seqüestro, o que por certo não pode ser afastado por se afirmar que os tempos são outros. De fato, há uma nove ordem política no Chile. Há alguns anos atrás seria impensável sequer imaginar o julgamento de Pinochet, mas também é forçoso reconhecer que as distâncias existentes entre o povo da mesma nação estão cada vez maiores.

Os acusados Mauricio e Alfredo disseram que fazem parte de duas organizações chilenas, Frente Patriótico Manuel Rodrigues e MIR, respectivamente, e que o dinheiro do resgate seria dividido entre os dois grupos. Os acusados têm histórico de participação política, inegavelmente. Mauricio tem condenação em seu país por homicídio de um “senador de direita” e de um seqüestro. À toda evidência, a vítima destes crimes não foram alvos casuais. O pai da acusada Karina é desaparecido político da Argentina, conforme prova documental, e sua mãe foi acolhida na Suécia como exilada; a mãe de Marco Rodolfo foi fundadora do MIR e foi exilada; Martha e William são perseguidos pelas lutas que travaram em seu país de origem, Colômbia.

A forma como o crime foi praticado, revela a estrutura de grupo, própria de organizações políticas clandestinas, que atuaram no Chile e em outros países da América Latina na época das ditaduras.

Os documentos juntados pela Defesa dão prova mais do que suficiente para reconhecer a ligação umbilical dos réus com o que se costuma chamar de movimento social. Não há que se questionar, neste tanto, a correção da via escolhida pelos réus. Cabe apenas constatar que ao praticar o delito estavam eles agindo com a finalidade política.


Vale destacar trecho do voto do Ministro Sepúlveda Pertence, acórdão RE 160.841-2, do Supremo Tribunal Federal, referente ao seqüestro de Abílio Diniz:

“Certo, os motivos e as finalidades políticas- e, portanto altruístas, da ação delituosa- embora irrelevante, nas circunstâncias para configurar crimes políticos, segundo a lei brasileira- em tese, poderiam e deveriam ter sido considerados na medida da culpabilidade e na individualização das penas correspondentes aos delitos aqui cometidos”.

No conjunto das circunstâncias judiciais, há que se levar em conta as circunstâncias do crime para sopesar a pena base. E aqui cabe registrar que o seqüestro foi longo, durou cinqüenta e três dias, e terminou por acaso. Neste período a vítima teve sofrimento físico e mental intenso. Permaneceu sem trocar uma palavra sequer, ouviu música de forma ininterrupta, foi mantido com luz artificial em tempo integral, sem ver a luz do dia e o escuro da noite; constantemente vigiada, com os movimentos limitados ao minúsculo espaço que lhe foi destinado como cativeiro. Outrossim, revelaram perversidade, pois deram livros como “1984” e “Papillon” para que a vítima lesse. Agiram da mesma forma, ao encaminhar uma das mensagens através de um açougue, com evidente sentido simbólico neste gesto.

Também há que se avaliar as conseqüências do crime. A prolongada ausência e a incerteza do que estava por acontecer desestabilizou todas as pessoas que cercam a vítima. A mãe dele foi hospitalizada e todos que vivem à sua volta foram também foram atingidos e ainda estão abalados psicologicamente, como comprova a prova oral produzida em juízo. As conseqüências também são de ordem econômica, pois algumas pessoas tiveram que se afastar do trabalho rotineiro.

Diante deste conjunto de circunstâncias, ainda que levando-se em conta a motivação política, a pena deve ficar além do mínimo legal.

Presente a circunstância atenuante estabelecida no artigo 65, inciso III, “d”, do Código Penal, pois os acusados Mauricio e Alfredo Augusto confessaram o delito.

Em relação aos dois também está caracterizada a circunstância agravante do artigo 62, inciso I do Código Penal. A prova produzida indica que os dois realizavam a direção das atividades daquele núcleo. É possível fazer tal afirmativa tendo em vista as informações do Delegado Wagner Giudice, que disse que os demais acusados nem sequer respondiam as perguntas e diziam para que ele perguntasse para Mauricio e Alfredo. Outrossim, eram os dois que estavam na posse do dinheiro utilizado pelo grupo. Marco Rodolfo disse que prestava as contas para Alfredo Augusto. Foi Mauricio que saiu com os delegados para realizar o telefonema.

A circunstância atenuante apontada tem índole subjetiva e a agravante possui a mesma natureza , razão pela qual será realizada a compensação e mantida a pena como definitiva, por inexistirem causas de aumento ou diminuição a serem consideradas.

A causa de diminuição pleiteada pela Defesa não pode ser reconhecida, sob o fundamento que o ato foi político e houve confissão judicial. A delação premiada prevista no artigo 159, parágrafo 4o. do Código Penal permite a redução da pena se o crime é cometido em concurso e se o concorrente o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado.

É duplo o propósito do instituto em tela: facilitar a libertação do seqüestrado e a identificação dos demais agentes do crime, sendo estes seus requisitos.

No caso em tela, nenhum dos propósitos foram atingidos pela conduta dos acusados Mauricio e Alfredo Augusto. Esta suficiente provado que o acusado Mauricio saiu da delegacia e realizou um telefonema no dia posterior à sua prisão informando ao seu interlocutor que estavam detidos pela polícia brasileira, que deveriam interromper a operação e soltar a vítima. Por outro lado, avisou a polícia que a libertação não seria imediata, pois teriam que realizar uma limpeza no local, ou seja, iriam apagar os rastros identificadores no local do cativeiro. Também é certo que a vítima foi localizada sem qualquer informação prestada pelos réus, pois quando percebeu que estava sozinho, com o cessar da música e sem ruídos do cativeiro, começou a gritar, até que a moradora vizinha ouviu e avisou a polícia. A ocorrência foi atendida por policiais militares que não tinham conhecimento algum sobre os fatos, portanto, realizaram a libertação em razão de fatores externos, já que até aquele momento nenhuma informação tinha sido prestada por Mauricio e Alfredo.

Nenhum meio foi fornecido pelos réus para a identificação do local do cativeiro e das demais pessoas que praticaram o crime. Tudo indica, notadamente o silêncio dos acusados em relação aos demais agentes do seqüestro, que Mauricio tinha o intuito de salvaguardar a vida dos demais autores e também evitar uma eventual prisão e identificação, ainda que concomitantemente pretendesse salvaguardar a vida da vítima. O fato de dizer que seria necessário um certo tempo para a libertação de Washington, após o telefonema realizado, é por certo um mecanismo de “ganhar tempo” para possibilitar a fuga dos demais seqüestradores. Havia a possibilidade do restante do grupo saber da prisão, já que a notícia acerca deste fato foi amplamente transmitida no mesmo dia pela televisão, mas o telefonema seria uma garantia de comunicação com os demais agentes sobre estas circunstâncias. O próprio acusado Mauricio disse ao delegado que “poderia fazer gestões para libertação de Washington Olivetto, mas queria que fosse presenciado e avalizado por uma outra pessoa, como um juiz… queria a presença desta autoridade para que ficasse assegurado que estaria fazendo a tentativa de libertação da vítima por vontade própria, pois não queria que as pessoas do grupo que estivessem no cativeiro corressem riscos, como não queria riscos para a vítima” (fls. 609).


O fato concreto é que o cativeiro foi abandonado e a libertação da vítima não tem qualquer nexo com a ação dos réus Mauricio e Alfredo, que não forneceram a identificação dos seqüestradores e ainda tentam afastar a responsabilidade dos demais acusados. Logo, não podem ser considerados delatores nos termos do artigo 159, parágrafo 4o., do Código Penal e serem beneficiados com a redução da pena.

Neste tanto, vale destacar acórdão referente à revisão criminal 265.434/9, TACRIM-SP, Rel. Figueiredo Gonçalves: “ Não há cogitar, no entanto, da causa redutora de pena quando, não obstante os fatos concretos apresentados pelo delator, ocorra a intervenção de fatores externos, como por exemplo, a auto liberação do seqüestrado ou a sua libertação por policiais que desconheciam os informes prestados. Da mesma forma, não caberia a causa de diminuição da pena se a liberação do seqüestrado não foi devida às informações fornecidas pelo delator mas, sim, ao pagamento do resgate” .

Fixo o regime fechado para o início do cumprimento da pena privativa de liberdade, nos termos do artigo 33, parágrafo 2º, “a”, do Código Penal, tendo em vista a quantidade da pena aplicada.

A norma do artigo segundo, parágrafo primeiro, da Lei 8072/90 é inconstitucional, porque fere o direito fundamental da individualização da pena, o da igualdade e da dignidade da pessoa humana, estabelecido no artigo 5o da Carta Magna.

Colho na lição de Marco Aurélio de Mello, ministro do Supremo Tribunal Federal :

“Assentar-se, a esta altura, que a definição do regime e modificações posteriores não estão compreendidas na individualização da pena é passo demasiado largo, implicando restringir garantia constitucional em detrimento de todo um sistema e, o que é pior, a transgressão a princípios tão caros em um Estado Democrático como são o da igualdade de todos perante a lei, o da dignidade da pessoa humana e o da atuação do Estado sempre voltado ao bem comum. A permanência do condenado em regime fechado durante todo o cumprimento da pena não interessa a quem quer que seja, muito menos à sociedade que um dia, mediante o livramento condicional ou, o mais provável, o esgotamento dos anos de clausura, terá necessariamente que recebê-lo de volta, não para que este torne a delinqüir, mas para atuar como um partícipe do contrato social, observado-se os valores mais elevados que o respaldam.

Por último, há de se considerar que a própria Constituição Federal contempla as restrições a serem impostas àqueles que se mostrem incursos em dispositivos da Lei 8072/90 e dentre elas não é dado encontrar a relativa à não progressividade do regime de cumprimento da pena” (Revista Brasileira de Ciências Criminais, volume 8).

Ainda sobre o mesmo tema temos o magistério de Alberto Silva Franco “in” Leis Penais Especiais e a Interpretação Jurisprudencial, Editora Revista dos Tribunais, 1995:

“O parágrafo primeiro da Lei 8072/90 proíbe, em relação aos crimes hediondos e aos a ele equiparados, o regime progressivo de cumprimento da pena privativa de liberdade, lesando deste modo, ao mesmo tempo, tanto o princípio constitucional da individualização penal, como também o princípio igualmente constitucional, da humanidade da pena. A individualização da pena, mercê do regime prisional progressivo, insere-se no tronco comum do processo individualizador que se inicia com a atuação do legislador, passa pela ação do juiz e se finda, ao atingir o nível máximo de concreção, na execução penal. Destarte, excluir, legalmente, o sistema progressivo, é impedir que se faça valer, na fase final, o princípio constitucional da individualização. Lei ordinária que estabeleça, portanto, regime prisional único, sem possibilidade de nenhum tipo de progressão atenta contra tal princípio e revela expressa ofensa a preceito constitucional. Mas não é só. A exclusão legal do sistema progressivo conflita também com o princípio constitucional da humanidade da pena… À exclusão integral da pena, em regime fechado, de acordo com o parágrafo primeiro do artigo segundo da Lei 8072/90, contraria de imediato, ao modelo tendente à ressocialização do delinqüente e empresta à pena um caráter exclusivamente expiatório ou retributivo, a que não se afeiçoam nem o princípio constitucional da humanidade da pena, nem as finalidades a ela atribuídas pelo Código Penal (art. 59) e pela Lei de Execução Penal (art. 1o.)” .

Deixo de condicionar eventual recurso dos réus a prisão deles.

O artigo 594 do Código de Processo Penal é inconstitucional, posto que vincula a “prisão cautelar” com o direito de apelar e a Constituição Federal e as Conveções Internacionais ratificadas pelo Brasil garantem o duplo grau de jurisdição sem qualquer condicionamento ou vinculação. Este é o magistério de Luiz Flavio Gomes “in” Direito de Apelar em Liberdade, Editora Revista dos Tribunais:

“O direito de apelação integra o contraditório e a ampla defesa, nos termos do art. 5º, inciso LV, da CF. Cabe observar que a ampla defesa e os recursos a ela inerentes foram previstos irrestritamente na Constituição…Logo, não podia o legislador infra-constitucional condicionar a apelação à prisão. Um fenômeno processual não se confunde com o outro; um não pode “condicionar” o outro. Ainda que fosse possível superar o argumento expendido, ainda assim, seria tal dispositivo inconstitucional por violar o “devido processo legal” (CF, art, 5º, inc. LIV). Vejamos: o direito de duplo grau de jurisdição legal, seja pelo próprio sistema processual adotado entre nós, seja agora por força do dispositivo do art. 8º, 2, ”h”, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos; restringir, por lei, o duplo grau de jurisdição, significa, destarte, restringir o devido processo legal ou, dito de outra maneira, retirar por lei o que é garantido pela Constituição e pelo Direito Internacional”.

Tal entendimento não implica na impossibilidade da decretação ou manutenção da prisão cautelar. No caso vertente, nesta fase processual, presente a circunstância autorizadora da prisão preventiva consubstanciada na garantia da aplicação da lei penal, razão pela qual mantenho a prisão cautelar dos acusados.

Isto posto, Julgo Parcialmente Procedente a ação penal promovida pela Justiça Pública contra Willian Gaona Becerra (ou Frederico Antônio Aribas), Karina Dana Germano Lopez (ou Rosa Amália Ramos Quiroz) , Marco Rodolfo Rodrigues Ortega (ou Carlos Renato Quiroz), Martha Lígia Urrego Mejia (ou Maité Anália Bellon) , Alfredo Augusto Canales Moreno (ou Ruben Oscar Sanches) e Mauricio Hernandes Norambuena para:

a) condená-los ao cumprimento de dezesseis anos de reclusão, tendo-os como incursos no artigo 159, parágrafo 2º, do Código Penal, fixando o regime fechado para o início do cumprimento da pena privativa de liberdade.

b) absolvê-los da acusação que lhes foi feita como incursos no 288, parágrafo único, do Código Penal, o que faço com fundamento no artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal.

c) absolvê-los da acusação que lhes foi feita como incursos no artigo 1o., inciso I, letra “b” e parágrafo 4o., inciso III, da Lei 9455/97, o que faço com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal.

Recomende-se os réus na prisão em que eles se encontram.

P.R.I.C.

São Paulo, 15 de julho de 2002.

Kenarik Boujikian Felippe

Juíza de Direito

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