Caso TRT-SP

Veja a sentença que absolve o ex-senador Luiz Estevão

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1 de julho de 2002, 19h49

MARIA DA GLÓRIA, mulher de origem humilde, esposa e companheira de NICOLAU por décadas, revelou ter forte personalidade quando seu marido começou a enriquecer rápida e ilicitamente. Tinha conhecimento de absolutamente tudo o que se passava nos sórdidos bastidores da obra do Forum trabalhista. Ajudava NICOLAU a recepcionar os co-réus ligados ao Grupo Monteiro de Barros para reuniões a portas fechadas em sua residência, fazia exigências e pressionava NICOLAU para que fossem atendidos todos os seus caprichos na aquisição de bens materiais. Casada em comunhão universal de bens e tendo, portanto, direito à metade de todo o patrimônio, MARIA DA GLÓRIA tinha plena ciência da origem espúria do dinheiro de seu marido, sem que isso a impedisse de, com prazer, também deleitar-se em esbanjar.

A – O APARTAMENTO EM MIAMI:

Em 1995, num dos vários períodos de férias passados em Miami (Estados Unidos), conheceram o Sr. LAURO BEZERRA, brasileiro lá radicado. Como MARIA DA GLÓRIA teimasse em querer um apartamento em Miami, “de qualquer jeito”, Lauro Incumbiu-se de mostrar ao casal três ou quatro apartamentos, todos de altíssimo padrão e na faixa de valor de US$ 1,000,000.00 (um milhão de dólares).

MARIA DA GLÓRIA teria dito que não aceitaria, de maneira nenhuma, um apartamento que já tivesse sido habitado. E foi assim que Lauro Bezerra os apresentou ao THE BRISTOL TOWER, situado na Avenida Brickell, nº 2.127, um dos melhores edifícios da cidade, cujo empreendimento era da incorporadora “Acosta’s Enterprises” com vendas pela “The Daniels Group”. Marco Aurélio lá esteve com NICOLAU e MARIA DA GLÓRIA visitando o apartamento 3201 duas ou três vezes antes do fechamento do negócio e, depois, outras vezes já para efetiva hospedagem.

O edifício tinha três apartamentos de cobertura e apenas uma, a de número 3201, estava à venda, sendo efetivamente adquirida em 20 de março de 1994 por NICOLAU e MARIA DA GLÓRIA. Os outros vizinhos das coberturas? O tenor Plácido Domingos e a cantora Whitney Houston…

O apartamento foi comprado em nome da Hillside Trading, empresa do tipo off shore montada por NICOLAU para essa e outras finalidades. Após a venda, NICOLAU não quis pagar a comissão de corretagem para o Sr. Lauro Bezerra, que com ele rompeu relações e ameaçou processá-lo perante os tribunais americanos. E para isso constituiu o escritório do advogado Roberto Allen, como será narrado nos itens 83 e 84, abaixo.

Diversos documentos encontram-se juntados aos autos da CPI, mais precisamente às fls. 1171/1199 do Relatório Final da CPI e nos documentos de fls. 390/396, onde se verifica a transação da compra do apartamento em Miami, pelo valor aproximado de US$ 1,000,000.00. Todos os documentos referem-se a NICOLAU e sua família como proprietários, aquele na qualidade de representante da Hillside Trading. Há bilhetes que foram reconhecidos por NICOLAU perante a CPI como sendo de sua assinatura.

A empresa “Howard-Luaces Associates” foi contratada por NICOLAU e MARIA DA GLÓRIA para realizar os serviços de decoração no apartamento, que custou a importância de US$ 476,000.00 (quatrocentos e setenta e seis mil dólares), pagos pela Sra. Josefina de La Llama, gerente da conta de NICOLAU junto ao Banco Santander daquela cidade. Há correspondências nos autos da CPI de NICOLAU para Lauro Bezerra e também para o gerente do The Bristol Towers, autorizando o Sr. Nicolas A. Luaces a entrar no apartamento 3201 para tirar medidas e outras providências preliminares. A empresa “Howard-Luaces Associates” confirmou à CPI todas as correspondências por ela emitidas.

Apesar da assessoria de Lauro Bezerra, NICOLAU contou com outros importantes aliados em seus “negócios” em terras norte-americanas: os co-réus FÁBIO e JOSÉ EDUARDO. Como se verifica às fls. 1198 da CPI, houve telefonemas à empresa “Howard-Luaces Associates” (que cuidava da decoração) feitos a partir de telefones de propriedade do Grupo Monteiro de Barros.

Há correspondências trocadas entre a empresa The Daniels Group e o Grupo Monteiro de Barros, nominadas ao co-réu FÁBIO, na qualidade de representante da Monteiro de Barros no negócio (v. fls. 1147 e 1149 da CPI). Da mesma forma, entre a Monteiro de Barros e o escritório do advogado Robert Allen, que representava os interesses de Lauro Bezerra, apresentando o consultor Edward Riggs-Miller, enviado especial a Miami “para dirimir dúvidas quanto à recente transação imobiliária efetuada em parceria como The Daniels Group” (fls. 1157 da CPI).

Consta correspondência, também, de Lauro Bezerra à Monteiro de Barros, cobrando seus honorários pela corretagem da venda do apartamento 3201 do The Bristol Tower e outras despesas, como telefonemas de longa distância efetuados por Lauro, FÁBIO e NICOLAU para a venda e finalização da compra do apartamento (fls. 1158 da CPI). Comprovou-se que o consultor da Monteiro de Barros referido no item 83 acima, Edward Riggs-Miller, foi a Miami exatamente para pagar os US$ 8,000.00 devidos a Lauro Bezerra pela corretagem (fls. 1160 da CPI).


B – OS CARROS DE LUXO:

Logo após a compra do apartamento e lá mesmo em Miami, NICOLAU comprou um automóvel Mercedes E-320, pelo valor de US$ 45,000.00 (quarenta e cinco mil dólares), do empresário venezuelano Jaime Balesteros (de quem NICOLAU compraria, mais tarde, as cotas na sociedade The Dent Wizard – oficina de carros – em nome de suas filhas). Trocou-a, depois, por outra do mesmo modelo E-320. Simultaneamente, NICOLAU adquiriu um Porsche BiTurbo, na requintada loja The Jaguar Collection. Inúmeros telefonemas foram feitos por NICOLAU a esta revendedora, como de verifica do extrato telefônico juntado às fls. 1213 da CPI.

O Porsche custou US$ 127,000.00 (cento e vinte e sete mil dólares), foi pago por intermédio da gerente Josefina e tinha a placa “LALO”, como NICOLAU é chamado pelos mais íntimos, tendo sido segurado na Cia. “All Estate Insurance”. A CPI recebeu cópia da respectiva Nota Fiscal do Porsche, em nome de NICOLAU (fls. 1215 da CPI), data da compra 22.06.1995. Segundo consta, esse veículo encontra-se em Miami.

Em nome de MARIA DA GLÓRIA foi adquirida uma Mercedes modelo C280, da revendedora “Ussery Motors Incorporated”. Diversas ligações telefônicas foram feitas a esta revendedora, mais uma vez, a partir dos telefones instalados no Grupo Monteiro de Barros, conforme extratos de fls. 1216/1217 da CPI.

Outro Porsche BiTurbo foi adquirido por NICOLAU, em meados de 1996/1997, desta feita aqui mesmo em São Paulo, da empresa “Biscayne Veículos”, pelo qual NICOLAU teria pago a quantia de US$ 330,000.00 (trezentos e trinta mil dólares). A documentação teria sido colocada em nome de João Lino de Souza ou de Carlos Morais Sarmento, respectivamente motorista e dono da Biscayne, que agiriam como “laranjas” para não despertar suspeitas. João Lino confirmou à Polícia Federal que tem em seu nome automóveis incompatíveis com sua renda.

C- A CASA NO GUARUJÁ

O casal NICOLAU e MARIA DA GLÓRIA adquiriu uma mansão no município do Guarujá, num condomínio do tipo “praia fechada”. Em algum momento não determinado, NICOLAU esteve nesse local, com a família, hospedando-se em casa de um amigo, que teria dado “passe livre” para que frequentassem aquela prais fechada nos finais de semana.

MARIA DA GLÓRIA, então, instou a que seu marido efetivamente adquirisse ali um imóvel. NICOLAU adquiriu um terreno, por cerca de US$ 300,000.00, chegando a contratar uma empresa de arquitetura para realizar o projeto de construção. (Não era a INCAL). MARIA DA GLÓRIA não gostou e insistiu que queria a casa em outro local, de frente para o mar. Atendendo às exigências de sua esposa, NICOLAU conseguiu meses mais tarde um terreno como MARIA DA GLÓRIA queria, pagando por ele cerca de US$ 800,000.00.

Ato contínuo, mais uma vez MARIA DA GLÓRIA fêz impor sua vontade, no sentido de que não esperaria três anos para a construção da casa, o que motivou NICOLAU a comprar uma mansão, já pronta, de frente para o mar, vendendo o terreno de US$ 800,000.00, mais um apartamento que possuíam em outro ponto do Guarujá (Praia da Enseada) no valor de US$ 300,000.00 e, ainda, completando o preço com a importância de US$ 800,000.00 em dinheiro.

A casa no luxuoso condomínio foi declarada à Receita Federal no exercício de 1996, mas pelo módico valor de RS$ 192.886,14 (v. fls. 1218 do relatório final da CPI), o que será objeto de processo-crime em separado quando a fiscalização estiver encerrada, como já referido no item 66, acima.

D – AS JÓIAS PARA MARIA DA GLÓRIA

De um bilhete assinado de próprio punho por NICOLAU e de correspondência enviada pelo joalheiro radicado em Miami Jacob Tuchman consta a clara intenção de adquirir, possivelmente para MARIA DA GLÓRIA, um anel de diamantes com 6.4 quilates, lapidado com corte de esmeralda, com dois diamantes menores afilados em baguetes, montados sobre um conjunto de platina. A jóia teria o valor de US$ 320,000.00 (trezentos e vinte mil dólares), conforme documentos juntados às fls. 1190, 1220 e 1224 da CPI, este último uma correspondência da Joalheria YAMRON, nominada a NICOLAU e assinada por Jacob Tuchman, mencionando as especificações do referido anel.

Não há prova de que o anel tenha sido efetivamente adquirido, mas só se prestaria a manter contatos desse nível, inclusive telefonemas internacionais (v. fls. 1221 da CPI) quem estivesse realmente com intenção de adquirir uma jóia. E pudesse bancar esse quilate.

E – AS CONTAS NA SUÍÇA

NICOLAU é titular da conta corrente identificada por “NISSAN 20706”, transferida após para a “NISSAN 51706”, junto ao Banco Santander – Agência de Genebra, na Suíça, cuja Justiça, com base em dispositivo que reprime a lavagem de dinheiro (artigo 305bis do Código Penal Suíço) e em notícias da imprensa lá veiculadas sobre as fraudes nas obras do Forum Trabalhista, enviou Carta Rogatória ao Brasil, por solicitação do Excelentíssimo Procurador-Geral da República e Cantão de Genebra Jean-Louis Crochet.


A Rogatória (nº 8.933-3/080 no STF) recebeu o exequatur do Supremo Tribunal Federal e foi distribuída sob nº 1999.61.81.007331-3 à 7ª Vara Criminal Federal de São Paulo.

Em seu depoimento, NICOLAU não conseguiu dar explicações que convencessem sobre a origem de seus ativos financeiros ou de sua intensa movimentação bancárias no exterior, não só na Suíça como em outra conta sediada nas Ilhas Cayman, conhecido paraíso fiscal e berço de falcatruas envolvendo lavagem de dinheiro.

Extraídas peças da rogatória e enviadas como peças de informação ao Ministério Público Federal, foi oferecida denúncia em 1º de março de 2000 pela Excelentíssima Procuradora da República Karen Louise Jeanette Kahn, sendo a mesma distribuída a esta Egrégia 1ª Vara Criminal, do Júri e das Execuções Penais de São Paulo sob nº 2000.61.81.001248-1 e recebida por Vossa Excelência em 15 de março de 2000. Tal ação penal tem por objeto as contas no exterior e a imputação da conduta do réu NICOLAU como incurso nas sanções do artigo 22 da Lei nº 7.492/86 (Dos crimes contra o Sistema Financeiro) e artigo 1º, § 1º, incisos I e II da Lei nº 9.613/98 (Lei da Lavagem de Dinheiro).

Os documentos juntados à carta rogatória e à referida ação penal demonstram que, no período de 1991 a 1994, foram depositados nessa conta do Banco Santander na Suíça valores correspondentes a US$ 6,848,123.00 (seis milhões, oitocentos e quarenta e oito mil, cento e vinte e três dólares). V. documentos de fls. 1199 a 1205 do relatório final da CPI.

F – AS CONTAS NAS ILHAS CAYMAN

NICOLAU mantém, ainda, conta-corrente no Banco Noroeste, cujos extratos encontram-se juntados no volume II apenso a esta ação penal. Nessa conta, a movimentação foi da ordem de US$ 5,900,000.00 (cinco milhões e novecentos mil dólares).

Os documentos de fls. 1205 a 1211 da CPI, além de demonstrar contabilmente a movimentação, trazem ao conhecimento que, na verdade, essa conta nº 1117 (que NICOLAU jurou desconhecer perante a CPI) funcionava nas Ilhas Cayman apenas de maneira virtual, pois fisicamente era gerenciada e movimentada no Brasil, em São Paulo.

Os saques eram feitos em dinheiro aqui em São Paulo e, certa vez, funcionários do Banco Noroeste foram até a casa de NICOLAU apanhar cerca de US$ 100,000.00 (cem mil dólares) em dinheiro vivo, para serem depositados na conta virtualmente localizada nas Ilhas Cayman.

Esses depoimentos constam da Ação Civil Pública em curso perante a 12ª Vara Cível desta Justiça Federal e ora são juntados em cópia (ANEXO ___).

G – A RENDA OFICIALMENTE DECLARADA

Verifica-se das declarações do Imposto de Renda Pessoa Física juntadas no volume I em apenso que NICOLAU não declara ter outros rendimentos além de seus vencimentos como Juiz do Trabalho, hoje aposentado.

Perante a CPI, cujo depoimento integral também se encontra no mesmo volume I, NICOLAU declarou que, além de seus vencimentos mensais de cerca de R$ 8.800,00 (oito mil e oitocentos reais), recebia aluguéis mas que estes não constavam de suas declarações, numa sonegação fiscal explícita, para dizer o mínimo. Tal conduta será apreciada penalmente no momento em que o Ministério Público Federal receber a conclusão da fiscalização da Receita Federal, referida no item 66, acima.

H – OS GASTOS COM CARTÕES DE CRÉDITO INTERNACIONAIS.

NICOLAU recusou-se a dizer à CPI sobre suas despesas com cartões de crédito e teve dificuldades até para admitir que tivesse um. Tanto Marco Aurélio quanto Lauro Bezerra declararam que as despesas lançadas no cartão de crédito eram de grande monta, havendo notícias de que NICOLAU chegou a gastar a quantia de US$ 100,000.00 (cem mil dólares) apenas numa tarde! (v. fls. 1220/1221 da CPI).

AS FORTES LIGAÇÕES ENTRE OS ACUSADOS – FORMAÇÃO DE QUADRILHA –

De toda a narrativa desta denúncia – extensa, é verdade, mas absolutamente necessária à exata descrição das condutas típicas, que são muitas – verifica-se que NICOLAU, FÁBIO, JOSÉ EDUARDO, ANTONIO CARLOS e, em menor grau, GILBERTO, associaram-se para o fim de cometer os crimes aqui descritos. MARIA DA GLÓRIA, esposa de NICOLAU, de tudo tinha conhecimento, sendo conivente com as práticas criminosas por delas tirar também suas vantagens.

O Relatório Final da CPI atribui a essa relações a natureza de “promíscuas, inaceitáveis e ilegais”, considerando tratar-se da Administração Pública, das posições de contratante e contratado. Com efeito, a consistente e profunda relação entre os acusados está bem descrita e comprovada a partir de fls. 1141 do Relatório Final da CPI, merecendo destaque:

Transferências de numerários das empresas do grupo Monteiro de Barros, dirigidas pelos acusados FÁBIO e JOSÉ EDUARDO, para as contas de NICOLAU, ANTONIO CARLOS e GILBERTO;

Transferências de numerário das contas da INCAL INC., onde eram creditados os pagamentos do TRT-SP, para paraísos fiscais e outras contas de empresas do Grupo Monteiro de Barros, havendo indícios de lavagem de dinheiro por operações feitas com doleiros locais (em face do enorme número de cheques de terceiros);


Habitualidade de reuniões de NICOLAU com FÁBIO na residência do primeiro, a portas fechadas, e que duravam cerca de uma hora, que se realizavam até nos finais de semana;

Intenso contato telefônico entre todos eles e com números externos, para os mesmos destinatários, principalmente as empresas do GRUPO OK e o SENADOR LUIZ ESTEVÃO, que deverá ser investigado e denunciado na instância competente, posto gozar de foro criminal privilegiado em razão da função.

Ligações numerosas, tanto das linhas de NICOLAU quanto das pertencentes ao Grupo Monteiro de Barros, aparecem para os mesmos destinatários, ainda não identificados, conforme quadro às fls. 1143 da CPI.

Conforme já relatado acima nos itens 82, 83 e 84, FÁBIO e JOSÉ EDUARDO, em nome das empresas do grupo Monteiro de Barros, participaram decisivamente na compra do apartamento de NICOLAU em Miami e em outros negócios por este entabulados, como a compra de veículos. Inúmeras ligações telefônicas internacionais para a empresa onde trabalhava Lauro Bezerra estão registradas às fls. 1150/1151 da CPI.

Há veementes evidências de pagamentos de despesas de NICOLAU e sua família em Miami quitados pelo Grupo Monteiro de Barros. FÁBIO pagou diretamente a Lauro Bezerra a importância de US$ 6,230.00 (seis mil, duzentos e trinta dólares) decorrentes de despesas efetuadas por NICOLAU, cuja cópia da respectiva ordem de transferência bancária de FÁBIO para a Sra. Mary Babacheff, proprietária da “Host International” de Miami, onde Lauro trabalhava, encontra-se juntada às fls. 1162 da CPI

Lauro apresentou a FÁBIO carta apresentando o valor dos serviços profissionais da Host International “para você e sua família e seu amigo Dr. Nicolau dos Santos Neto e família” (fls. 1163 da CPI).

Ao final de um ano de serviços prestados a NICOLAU, o Sr. Lauro Bezerra, em nome da Host International, apresentou-lhe a conta final, no valor de US$ 98,052.00 (noventa e oito mil e cinquenta e dois dólares). Como NICOLAU se recusasse terminantemente a pagar (como já fizera anteriormente, com a comissão devida a Lauro pela corretagem do apartamento, que acabou sendo paga pelo grupo Monteiro de Barros – vide itens 82 e 83, acima), Lauro entrou em contato com FÁBIO, tendo ficado combinado que JOSÉ EDUARDO deslocar-se-ia a Miami para resolver o pagamento. FÁBIO e JOSÉ EDUARDO contrataram nos Estados Unidos, então, o advogado CARLOS BATLLE, que por sua vez acertou os pagamentos com o advogado da “Host International” , George Elias Jr.

Com o abatimento conseguido pessoalmente pela ida de JOSÉ EDUARDO a Miami especialmente para cuidar das despesas de NICOLAU, a Monteiro de Barros pagou à Host a importância de US$ 80,000.00 (oitenta mil dólares), sendo vinte mil no ato e mais seis prestações mensais de dez mil. Os inúmeros telefonemas de FÁBIO e das linhas instaladas na INCAL e outras empresas do Grupo Monteiro de Barros ao escritório do advogado Carlos Batlle encontram-se listados às fls. 1164.

Outras evidências igualmente incontestáveis estão às fls. 1164 a 1168 da CPI.

Por fim e não menos grave do que todas as outras, comprovou-se que os depósitos feitos na conta corrente de NICOLAU na Agência do Banco Santander em Genebra eram efetuados entre um e vinte e nove dias após o crédito das ordens bancárias do TRT-SP à INCAL INC. Vide relação às fls. 1169 da CPI, onde se apresentam indícios indeléveis de que os depósitos na conta da Suíça se originaram dos recursos desviados da obra do edifício sede do Forum Trabalhista da Cidade de São Paulo.

CONCLUSÕES FINAIS

Os possíveis co-responsáveis pela fraude na licitação, integrantes da Comissão de Licitação original, que dissolveu-se quando da adjudicação do objeto (Juiz Jamil Zantut, Sr. Orlando Apuêne Bertão e Itagiba Souza de Toledo), deixam de ser denunciados pela ocorrência da pretensão punitiva do Estado quanto ao delito do artigo 335 do Código Penal.

Outros possíveis responsáveis, o Senador LUIZ ESTEVÃO e o Juiz DÉLVIO BUFFULIN, deverão ser denunciados na instância competente, posto gozarem de foro criminal privilegiado em razão das funções públicas por eles exercidas.

O Ministério Público Federal reserva-se o direito de aditar a denúncia, se acaso se verificar novos elementos que assim o indiquem, para a inclusão de outros agentes no polo passivo desta ação penal.

REQUERIMENTOS FINAIS

Por todo o exposto, o Ministério Público Federal, observado o que dispõem os artigos 14,inciso I; 18, inciso I; 29; 61, inciso II, alíneas a e g; 62, inciso I; 69, 70 e 71, todos do Código Penal, denuncia:

NICOLAU DOS SANTOS NETO, como incurso nas sanções dos artigos 171, § 3º (estelionato contra entidade de direito público), 288 (quadrilha ou bando), 312 (peculato, por tantas vezes quantos foram os pagamentos do TRT-SP à INCAL), 317 e seu parágrafo 1º (corrupção passiva, em caráter continuado, com prática de atos em infringência de dever funcional), todos do Código Penal;


MARIA DA GLÓRIA BAIRÃO DOS SANTOS, como incursa nas sanções dos artigos 171, § 3º (estelionato contra entidade de direito público), 288 (quadrilha ou bando) e 312 (peculato) todos do Código Penal;

FÁBIO MONTEIRO DE BARROS FILHO, como incurso nas sanções dos artigos 171, § 3º (estelionato contra entidade de direito público), 288 (quadrilha ou bando), 312 (peculato), 333, parágrafo único (corrupção ativa, com agravante de cometimento de ato público com infringência de dever funcional) todos do Código Penal;

JOSÉ EDUARDO CORREA TEIXEIRA FERRAZ, como incurso nas sanções dos artigos 171, § 3º (estelionato contra entidade de direito público), 288 (quadrilha ou bando), 312 (peculato), 333, parágrafo único (corrupção ativa, com agravante de cometimento de ato público com infringência de dever funcional) todos do Código Penal;

ANTONIO CARLOS DA GAMA E SILVA, como incurso nas sanções dos artigos 171, § 3º (estelionato contra entidade de direito público), 288 (quadrilha ou bando), 299 (falsidade ideológica), 312 (peculato), 317 e seu parágrafo 1º (corrupção passiva, em caráter continuado, com prática de ato em infringência de dever funcional) todos do Código Penal;

GILBERTO MORAND PAIXÃO, como incurso nas sanções dos artigos 171, § 3º (estelionato contra entidade de direito público), 288 (quadrilha ou bando), 299 (falsidade ideológica) todos do Código Penal.

Requeiro digne-se Vossa Excelência de receber a presente denúncia, determinando a citação dos denunciados para comparecer ao interrogatório e acompanhar todos os atos processuais, até final decisão, ouvindo-se, no decorrer da instrução criminal, as testemunhas a seguir arroladas.”

Em 4.5.2000 a denúncia foi recebida por este juízo em relação a NICOLAU, FÁBIO MONTEIRO e JOSÉ EDUARDO, tendo sido rejeitada quanto aos denunciados MARIA DA GLÓRIA BAIRÃO DOS SANTOS, ANTONIO CARLOS DA GAMA E SILVA e GILBERTO MORAND PAIXÃO (fls.2494/2506). Na oportunidade, outrossim, foi decretada a prisão preventiva de NICOLAU, FÁBIO e JOSÉ EDUARDO. A seguir os réus Fábio e José Eduardo foram citados pessoalmente (fls.3313 e 3361vº) e interrogados (fls.3753/3763 e 3773/3792), após o que os ilustres drs. defensores apresentaram as respectivas defesas prévias (fls.3800/1 e 4038/9), oportunidade em que arrolaram, respectivamente, seis e sete testemunhas cada qual. Por sua vez, Nicolau foi citado por edital (fls.4.960), tendo sido decretada sua revelia em face de seu não comparecimento à data aprazada para o interrogatório (fls.5705). Em seu favor, os doutos defensores apresentaram defesa prévia, a fls.3802/5, ratificada a fls.5722, com rol de oito testemunhas. Posteriormente, tendo sido efetivada sua prisão, o mesmo foi devidamente interrogado (fls.7.715/9)

O MPF aditou a denúncia em 4.7.2000 (fls.5213/5267), para incluir no processo LUIZ ESTEVÃO DE OLIVEIRA NETO, bem como para imputar crimes de falsidade ideológica e uso de documento falso a FÁBIO MONTEIRO e JOSÉ EDUARDO, nos seguintes termos:

“O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pela Procuradora da República signatária, no pleno exercício de suas atribuições constitucionais e legais, vem perante Vossa Excelência ADITAR A DENÚNCIA já oferecida contra Nicolau dos Santos Neto e outros para nela incluir a pessoa de LUIZ ESTEVÃO DE OLIVEIRA NETO, brasileiro, casado, empresário, nascido em 06.07.1949, portador do documento de identidade nº 159375, expedido pela Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal, inscrito no CPF/MF sob nº 010.948.581-53, domiciliado em Brasília – DF, onde reside na SHIS QI 05, Chácara 80,

pela prática dos atos delituosos a seguir descritos:

Em 10 de abril de 2000, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofereceu denúncia perante este DD. Juízo, contra NICOLAU DOS SANTOS NETO, MARIA DA GLÓRIA BAIRÃO DOS SANTOS, FÁBIO MONTEIRO DE BARROS FILHO, JOSÉ EDUARDO CORREA TEIXEIRA FERRAZ, ANTONIO CARLOS DA GAMA E SILVA e GILBERTO MORAND PAIXÃO.

Neste ato, adita-se a referida denúncia para a inclusão do ora denunciado LUIZ ESTEVÃO DE OLIVEIRA NETO, em virtude da Resolução nº 51, de 28 de junho de 2000, do Excelentíssimo Senhor Presidente do Senado Federal, Senador Antonio Carlos Magalhães, publicada no D.O.U. de 29.06.2000, que decretou a perda do mandato do Senador Luiz Estevão, nos termos do art. 55, II, da Constituição Federal, combinado com o art. 5º, I, da Resolução nº 20, de 1993, do Senado Federal.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL reporta-se aos termos da denúncia já oferecida, em sua inteireza, aos quais o presente aditamento ora se integra.

A LICITAÇÃO DO PRÉDIO DO TRT-SP

Em janeiro de 1992, o Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região – São Paulo, sob a presidência do acusado NICOLAU DOS SANTOS NETO, fêz publicar o Edital de Licitação nº 01/92, para aquisição de imóvel destinado a ser a sede do Fórum Trabalhista da Cidade de São Paulo, ainda sob a égide do Decreto-Lei nº 2.300/86, que à época regia o tema de Licitações e Contratos.


Propositadamente mal redigido, o Edital previa o oferecimento de propostas em quatro modalidades, tendo por objeto:

OBJETO

A presente licitação, na modalidade de concorrência, tem por objeto a aquisição de imóvel, adequado para a instalação de no mínimo 79 JCJ da cidade de São Paulo, permitindo a instalação posterior de no mínimo mais 32 JCJ em uma das quatro modalidades como segue:

– imóvel construído, pronto, novo ou usado;

– imóvel em construção, independentemente do estágio da obra, com projeto de adaptação;

– terreno com projeto aprovado, acompanhado de projeto de adaptação;

terreno com projeto elaborado especificamente para instalação das Juntas de Conciliação e Julgamento.

Foram adquiridas 30 cópias do Edital, pelas pessoas físicas e jurídicas. Algumas delas eram ligadas ao Grupo Monteiro de Barros; outras, ao Grupo OK, do acusado LUIZ ESTEVÃO – a saber :

CIM – Construtora e Incorporadora Moradia Ltda.,

Grupo OK Construções e Incorporações S/A e

SAENCO – Saneamento e Construções Ltda.

A CPI do Judiciário apurou que OITO das empresas que retiraram o Edital de Licitação receberam, posteriormente, cheques do Grupo Monteiro de Barros. Uma delas foi NORVAS SERVIÇOS, pertencente a Pedro Rodovalho Marcondes Chaves Neto, denunciado conjuntamente com FÁBIO e JOSÉ EDUARDO na ação penal nº 1999.61.81.000636-1, em curso perante esta E.

Vara, pelos delitos de evasão de divisas e lavagem de dinheiro. Pedro apresenta-se como procurador da empresa International Real State Investments Company, por meio da qual os envolvidos no caso TRT enviavam dinheiro para fora do país.

Apenas 3 propostas foram efetivamente entregues, tendo uma delas sido desqualificada, a saber, a da Empreendimentos Patrimoniais Santa Gisele Ltda. Das outras duas propostas, uma foi apresentada por formação de consórcio entre as empresas GRUPO OK, pertencente ao acusado LUIZ ESTEVÃO DE OLIVEIRA NETO e CONSTRUTORA AUGUSTO VELLOSO e a outra, vencedora do certame, pela empresa INCAL INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE ALUMÍNIOS LTDA., que ostentava, aparentemente, ter como sócios os acusados FÁBIO MONTEIRO DE BARROS FILHO e JOSÉ EDUARDO CORREA TEIXEIRA FERRAZ.

A EMPRESA INCAL INCORPORAÇÕES

Estranhamente, a Presidência do TRT/SP, na pessoa do acusado NICOLAU, adjudicou o objeto da licitação a empresa que não participou da concorrência: a INCAL INCORPORAÇÕES LTDA., constituída após a licitação, mais precisamente em 19.02.1992, tendo como sócias a futura vencedora Incal Indústria e Comércio de Alumínios Ltda. e a Monteiro de Barros Investimentos S/A, esta tendo como sócios os acusados FABIO MONTEIRO DE BARROS FILHO e JOSÉ EDUARDO CORREA TEIXEIRA FERRAZ. Essa prática delituosa confrontou com o que dispunha o artigo 40 do Decreto-Lei nº 2.300/86.

A nova empresa INCAL INCORPORAÇÕES LTDA. foi constituída com capital integralizado de Cr$ 100.000,00 (cem mil cruzeiros), quantia equivalente, em 19.02.92, a US$ 69,99 (sessenta e nove dólares e noventa e nove cents).

Em 21.02.1992, conforme documento anexo, a Monteiro de Barros Investimentos S/A transferiu 90% de suas cotas de participação da INCAL INCORPORAÇÕES ao GRUPO OK CONSTRUÇÕES E INCORPORAÇÕES S/A, titularizado por LUIZ ESTEVÃO DE OLIVEIRA NETO. Essa alteração contratual encontrava-se guardada em um cofre, que teve seu conteúdo apreendido pela Polícia Federal, sob a ordem deste DD. Juízo.

As firmas de LUIZ ESTEVÃO e FABIO, bem com das testemunhas, foram reconhecidas, na mesma data, pelo 3º Tabelionato de Notas de São Paulo.

A composição acionária da INCAL INCORPORAÇÕES S/A, então, passou a ser a seguinte:

Em 19.02.1992 (constituição da Incal Incorporações S/A)

Acionistas:

Incal Indústria e Comércio de Alumínios Ltda. (sócio: João Júlio César Valentini)

Fábio Monteiro de Barros Filho (pessoa física)

Monteiro de Barros Investimentos S/A (sócios: Fábio Monteiro de Barros Filho e José Eduardo Correa Teixeira Ferraz)

Em 21.02.1992 (instrumento de compra e venda de ações e mandato)

Acionistas:

Monteiro de Barros Investimentos S/A (sócios: Fábio Monteiro de Barros Filho e José Eduardo Correa Teixeira Ferraz)

Grupo OK Construções e Incorporações S/A (sócio: Luiz Estevão de Oliveira Neto)

(Continue a ler a sentença).

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