Caso DNER

MPF pede quebra de sigilos de EJ e Eliseu Padilha

Autor

18 de fevereiro de 2002, 18h52

Mais jurisprudência que ampara os pedidos:

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ACÓRDÃO: ROMS 8716/GO (199700485234)

RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANÇA

DECISÃO: POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO DO RECURSO.

DATA DA DECISÃO: 31/03/1998

ORGÃO JULGADOR: PRIMEIRA TURMA

EMENTA

AÇÃO CAUTELAR (EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS BANCARIOS). LEGITIMIDADE DO MINISTERIO PUBLICO ESTADUAL. PROVIDENCIAS INVESTIGATORIAS URGENTES E PREPARATORIAS PARA O INQUERITO CIVIL E AÇÃO CIVIL PUBLICA.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ARTS. 5., X E XII, 37, 127 E 129. LEI 4.595/64 (ART. 38). LEI 7.347/85. LEI 4.728/65 (ART. 4., PAR. 2.) E LEI 8.625/93 (ARTS. 25 E 26).

1. A PARLA DE RELEVANTE INTERESSE PUBLICO E SOCIAL, AMPLIOU-SE AO AMBITO DE ATIVIDADES DO MINISTERIO PUBLICO PARA REALIZAR ATIVIDADES INVESTIGATORIAS, ALICERÇANDO INFORMAÇÕES PARA PROMOVER O INQUERITO E AÇÃO CIVIL PUBLICA (C. F., ARTS. 127 E 129, III, – LEI 7.347/85, ARTS. 1. E 5.).

2. O SIGILO BANCARIO NÃO E UM DIREITO ABSOLUTO, QUANDO DEMONSTRADAS FUNDADAS RAZÕES, PODENDO SER DESVENDADO POR REQUISIÇÃO DO MINISTERIO PUBLICO EM MEDIDAS E PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS, INQUERITOS E AÇÕES, MEDIANTE REQUISIÇÃO SUBMETIDA AO PODER JUDICIARIO.

3. A”QUEBRA DE SIGILO”COMPATIBILIZA-SE COM A NORMA INSCRITA NO ART. 5., X E XII, C. F., CONSONO JURISPRUDENCIA DO STF.

4. O PRINCIPIO DO CONTRADITORIO NÃO PREVALECE NO CURSO DAS INVESTIGAÇÕES PREPARATORIAS ENCETADAS PELO MINISTERIO PUBLICO (RE 136.239 – AG. REG. EM INQUERITO 897 – DJU DE 24.03.95).

5. NÃO CONSTITUI ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER, PROVIMENTO JUDICIAL APARELHANDO O MP NA COLETA DE URGENTES INFORMAÇÕES PARA APURAÇÃO DE ILICITOS CIVIS E PENAIS.

6. RECURSO IMPROVIDO.

RELATOR: MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA

FONTE: DJ DATA: 25/05/1998 PG: 00011

VEJA: ROMS 7423-SP, AGINQ 187-DF, RHC 1290-MG (STJ) ROMS 15925, RE 71640-BA, MS 1047, RE 94608-SP, PET 577, AGINQ 897-DF, HC 55447, HC 69372, RE 136239 (STF)

DOUTRINA: OBRA: O SIGILO BANCARIO COMO PROTEÇÃO A INTIMIDADE, RT, 648 AUTOR: SERGIO CARLOS COVELHO OBRA: O SIGILO BANCARIO E O PODER PUBLICO, REV. DE DIREITO MERCANTIL, V. 79, P. 34-37 AUTOR: CARLOS ALBERTO HAGSTROM

TRIBUNAL:TR1 ACORDÃO DECISÃO:24-03-1999 PROC:MS NUM:8320-1 ANO:1998 UF:DF TURMA:2S REGIÃO:01 MANDADO DE SEGURANÇA FONTE: DJ DATA:19-04-99 PG:000073 =====> EMENTA: TRIBUTARIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ANULAÇÃO DE ATO JUDICIAL. QUEBRA DE SIGILO FISCAL E BANCARIO AUTORIZADA POR JUIZ FEDERAL A REQUERIMENTO DO MINISTERIO PUBLICO FEDERAL. NECESSIDADE.

1. A SITUAÇÃO VERTENTE CERTAMENTE INCLUI-SE ENTRE AQUELAS QUE A CF E A LEI AUTORIZAM A QUEBRA DE SIGILO.

2. NESSE SENTIDO, OS FATOS APONTADOS IMPÕEM O RECONHECIMENTO DO ACERTO DO EDITO INSURRECIONADO. HA PRECEDENTE.

3. ORDEM DENEGADA. RELATOR: JUIZ:170 – JUIZ HILTON QUEIROZ INDEXAÇÃO: QUEBRA, SIGILO BANCARIO, SIGILO FISCAL. MANUTENÇÃO, DECISÃO, QUEBRA, SIGILO BANCARIO, SIGILO FISCAL, MOTIVO, EXISTENCIA, INDICIO, ENRIQUECIMENTO ILICITO, ACRESCIMO, NECESSIDADE, FUNDAMENTAÇÃO, PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. LEGALIDADE, QUEBRA, SIGILO BANCARIO, SIGILO FISCAL, DECORRENCIA, ATO JUDICIAL, AUTORIZAÇÃO. CATÁLOGO: 1DENEGAR A ORDEM, A UNANIMIDADE. OUTRAS REFERÊNCIAS: VEJA: AMS 94.02.19358/RO, TRF 1. REGIÃO, DJ 28.06.96; AMS 96.01.46201/MG, TRF 1. REGIÃO, DJ 24.04.97; AGINQ 960000187/DF, STJ, DJ 16.09.96; ROMS 96.0007423/SP, STJ, DJ 03.11.97.

Sobre o direito de investigação do MPF, vejamos uma das obras mais reputadas na análise da Lei de Improbidade, o livro de MARINO PAZZABLINI FILHO, MÁRCIO FERNANDO ELIAS ROSA e WALDO FAZZIO JÚNIOR, Improbidade Administrativa, Editora Atlas, 3ª Edição, 1998:

“Pág. 180

8.21 – QUEBRA DO SIGILO BANCÁRIO

Quando se trata de investigar a improbidade administrativa na modalidade enriquecimento ilícito, às vezes é necessário que se promova a quebra do sigilo bancário da empresa atingida pelo ato e, principalmente, do agente público ou terceiro responsável pelo ato lesivo.

Pág. 181

Por isso, o Supremo Tribunal Federal consagrou o entendimento segundo o qual ao Ministério Público é vedada a quebra direta do sigilo bancário, devendo fazê-lo, quando necessário, fundamentadamente, através do Poder Judiciário.

Recentemente, no Mandado de Segurança n.º 21.729-4, relator o ministro Francisco Rezek, a Corte Suprema decidiu, por maioria, que o Ministério Público pode promover diretamente a quebra do sigilo bancário quando se tratar de empresa em cujo capital social haja participação de dinheiro público, tal o caso das sociedades de economia mista e das empresas públicas em que o Poder Público é acionista.

Pág. 182/185

Para conferir concreção ao controle jurisdicional da conduta administrativa, o Ministério Público necessita, em alguns casos, especialmente nos de enriquecimento ilícito, de agentes públicos, comprovar acréscimos patrimoniais indevidos, entradas e saídas de valores de contas-correntes bancárias, rastrear cheques, etc. Se não o fizer, não terá elementos probatórios para implementar, mediante o exercício do direito de ação, o agir judiciário, combatendo a corrupção e malversação da coisa pública. Nesses casos simplesmente deverá oferecer à apreciação judiciária sua pretensão, demonstrando seu fumus boni juris, a prevalência do interesse público e a que se destinam os documentos e informações de que necessita.


Ao direito individual à privacidade deve se antepor o interesse público na apuração dos casos de corrupção administrativa, na supremacia da lei sobre a ilicitude e no primado da Justiça. É uma decorrência do princípio da proporcionalidade.

Realmente, não se pode conceber que um agente público que viola a moralidade administrativa e todos os padrões de legalidade, praticando atos de improbidade contra a coisa pública, possa valer-se do sigilo bancário para colocar obstáculos à apuração promovida pelo Ministério Público e, assim, ancorado a pretenso sigilo constitucional, ficar a salvo das sanções que deve receber. Deve, no caso, ser removido o manto de proteção constitucional, mas pelo caminho adequado, justificadamente, sem amarrar os braços do Ministério Público e sem permitir que o devassar da privacidade se torne regra.

(…)

Luiz Fernando Bellinetti, citando Covello e Auletta entende que

“toda vez que o interesse do conhecimento da notícia é considerado relevante, em face da ordem social, deve prevalecer sobre aquele da intimidade, porque a divulgação da circunstância coberta pelo sigilo se justifica por representar interesse superior. Tem-se, então, a supremacia de bem maior de interesse geral”. (…)

Assim, os dados e informações bancárias, além de dados patrimoniais, de pessoas naquelas condições (ocupante de cargo ou função pública) não guardam paralelo com os de outro cidadão, e seus atos produzem conseqüências na sociedade, às vezes significativas. Daí porque não se pode falar, na hipótese, da prevalência do direito à intimidade.

Em síntese, seja em virtude da copiosa legislação tributária e das medidas regulamentadoras dos órgãos do Tesouro, seja em virtude da crescente necessidade de ler os ditames da Constituição Federal à luz da realidade socioeconômica do país, seja porque o interesse público no resguardo da probidade administrativa o reclama, a tendência é no sentido do paulatino enfraquecimento do sigilo bancário, através de uma interpretação jurisprudencial menos abrangente do chamado direito à privacidade”.

Fábio Medina Osório, no livro”Improbidade Administrativa”, 2ª ed. – Porto Alegre: Síntese, 1998, também apresenta a mesma interpretação, acolhida pelo STJ, pelos TRFs e por inúmeros tribunais estaduais:

“8.1. Da quebra do sigilo bancário

Não deve causar surpresa a possibilidade direta e imediata de quebra do sigilo bancário à luz da lei nº 8.429/92, pois os agentes públicos estão obrigados a uma completa transparência na aquisição de seus bens e na apresentação de seu patrimônio às autoridades competentes.

Aliás, cabe lembrar conhecida lição do jurista e Magistrado EDGARD DE MOURA BITTENCOURT, que, decidindo uma causa, assim se pronunciou:

“O direito não criou o sigilo para impedir a apuração da verdade, procurada honestamente . E acresce que quanto mais uma parte se opõe a uma prova tanto mais cresce a curiosidade do juiz. Ocorre ainda que o direito (se assim se pudesse designar a impugnação dos réus) não se exerce abusivamente, e os réus não demonstram que prejuízos lhes advêm da revelação de suas transações bancárias . E, se tais prejuízos forem porventura o possível desfecho desfavorável desta demanda, então se vê que a diligência pode Ter influência na decisão, sendo impossível indeferi-la. No reverso da situação, poder-se –á dizer que a diligência é inócua: nesse caso, não se justifica a impugnação.

A necessidade de quebra do sigilo bancário, em qualquer de suas facetas, quando referida pelo autor da ação civil pública, via de regra, não pode merecer indeferimento do Poder Judiciário, sob pena de se cercear a proteção da sociedade em benefício de interesses egoísticos e injustificados, pois o sigilo permanece garantido em terreno processual.

O sigilo pode ser quebrado no bojo de ação cautelar de indisponibilidade e seqüestro de bens.

Pode ser o sigilo bancário quebrado, ainda, no bojo de uma investigação, em inquérito civil público, com pedido endereçado ao juiz. Nesse caso, não há que se falar em demanda, citação ou ação processual. Trata-se de uma medida investigativa semelhante a um mandado de busca e apreensão ou uma prisão preventiva. São necessários leves indícios de ilícito para justificar a medida, que não deveria causar tanto impacto, pois, vale repetir, o sigilo permanece assegurado dentro do processo e especialmente dentro do inquérito civil público, sendo o agente ministerial responsável pelo mau uso das informações, se for o caso.

Necessário que o legislador, rapidamente, autorize o Ministério Público à quebra do sigilo bancário, para instruir seus expedientes investigatórios, ficando responsável pelo sigilo das informações. Não se justifica que tal pedido tenha que ser submetido ao poder judiciário, quando se sabe que o órgão ministerial dispõe de poder requisitório.


A judicialização da medida pode emperrar, ou até inviabilizar um procedimento investigativo, o que não se compreende. Veja-se que os agentes do Ministério Público, dotados de idênticas garantias conferidas aos membros do Poder Judiciário, órgãos imparciais e comprometidos com a busca da verdade material, com elevada formação profissional, certamente deveriam poder, em atos fundamentados, requisitar a quebra de sigilos bancários, buscando esclarecer o montante de dinheiro que circula nas contas de investigados, cruzando, se necessário, informações com a receita federal.

O excesso de judicialização de investigações pode, longe de proteger direitos fundamentais, dificultar essa mesma proteção, pois não se pode olvidar que também o Ministério Público, quando atua na defesa de interesses difusos protegidos pela ordem constitucional, está defendendo direitos fundamentais, protegendo toda sociedade”.

O SIGILO BANCÁRIO É RELATIVO E NÃO ABSOLUTO

Conforme a doutrina, o sigilo bancário tem sua origem mais remota na concepção do estado liberal. Entretanto, a garantia do sigilo bancário não pode servir para a proteção de atos contrários ao princípio da moralidade (Constituição, art. 37, caput), nem pode servir como mecanismo inibidor do direito à investigação.

Este mesmo entendimento sustentou, em seu voto no Mandado de Segurança nº 21.729-4, o Senhor Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE:

“O sigilo bancário só existe no Direito brasileiro por força de lei ordinária.

“Não entendo que se cuide de garantia com status constitucional. Não se trata da”intimidade”protegida no inciso X do art. 5º da Constituição Federal. Da minha leitura, no inciso XII da Lei Fundamental, o que se protege, e de modo absoluto, até em relação ao Poder Judiciário, é a comunicação”de dados”, o que tornaria impossível qualquer investigação administrativa, fosse qual fosse. Reporto-me, no caso, brevitatis causae, a um primoroso estudo a respeito do Professor Tércio Sampaio Ferraz Júnior.

“Em princípio, por isso, admitiria que a lei autorizasse autoridades administrativas, com função investigatória, e, sobretudo, o Ministério Público a obter dados relativos a operações bancárias.”

E conclui o eminente Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE:

“Ora, em matéria de gestão de dinheiro público, não há sigilo privado, seja ele de status constitucional ou meramente legal, a opor-se ao princípio basilar da publicidade da administração re públicana.”

Concorde com a ora exposta motivação de quebra de sigilo e da capacidade e função do Ministério Público para requerer a quebra diante do Judiciário, o Senhor Ministro FRANCISCO REZEK, hoje pontificando na Corte da Haia, que assim se pronunciou, em seu voto, no Mandado de Segurança nº 21.729-4 em referência:

“Parece-me, antes de qualquer outra coisa, que a questão jurídica trazida à Corte neste mandado de segurança não tem estatura constitucional. Tudo quanto se estampa na própria Carta de 1988 são normas que abrem espaço ao tratamento de determinados temas pela legislação complementar. É neste terreno, pois, e não naquele da Constituição da República, que se consagra o instituto do sigilo bancário — do qual já se repetiu ad nauseam, neste país e noutros, que não tem caráter absoluto. Cuida-se de instituto que protege certo domínio — de resto nada transcendental, mas bastante prosaico — da vida das pessoas e das empresas, contra a curiosidade gratuita, acaso malévola, de outros particulares, e sempre até o exato ponto onde alguma forma de interesse público reclame sua justificada prevalência”.

Pelo trecho do acórdão transcrito acima, fica evidente que o MPF tem o direito de requerer a quebra de sigilo de suspeitos, desde que justificando e demonstrando a necessidade e os indícios suficientes, o que fundamenta a extensão deste pedido. E isso foi feito, a abonar o deferimento dos pedidos de quebra dos sigilos.

Fica, destarte, demonstrada a base jurídica para os pedidos a seguir expostos. A fumaça do bom direito decorre da narração dos fatos acompanhados de provas indiciárias. O perigo da demora decorre do risco de possível prescrição de sanções previstas na Lei de Improbidade.

DO FUMUS BONI IURIS E DO PERICULUM IN MORA

DO ASPECTO DO BOM DIREITO

Para a quebra de sigilos são necessários indícios: são o”fumus boni juris”.

Vejamos o conceito de”fumus boni juris”, no livro de Marcus Cláudio Acquaviva, Dicionário Jurídico Brasileiro Acquaviva – Versão Informatizada, JB Data Ed. de Informática Jurídica Ltda:

“Fumus boni juris” é locução latina que significa indício, possibilidade da existência de um direito ou, como assinala Gilberto Caldas, presunção de legalidade. Da mesma forma que, vulgarmente dizemos”onde há fumaça, há fogo”, também o jargão latino consagrou a”fumaça do bom direito”, advertindo aos juizes de que também o simples indício da existência de um direito deve ser cuidadosamente observado, a fim de que não ocorram lesões irreparáveis a um interesse legítimo.


Exemplo disto‚ o art. 765 da CLT:”Os Juízos e Tribunais do Trabalho terão ampla liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas”(grifo nosso). Caldas, Gilberto, Novo Dicionário de Latim Forense, São Paulo, Editora Universitária de Direito, 1984.

O”fumus boni juris”é a previsão mais do que razoável da existência do bom direito, a respaldar a pretensão do requerente. O número de ilicitudes apontadas demonstra cabalmente que há mais que simples fumaça do bom direito.

O PERIGO DA DEMORA

O”periculum in mora”está evidenciado pela possível prescrição dos atos de improbidade, pois o exame das condutas previstas no artigo 9 o. da Lei de Improbidade depende desta investigação.

A propósito do tema também disserta o Professor Marcus Cláudio Acquaviva, ob. cit.:

“Periculum in mora”é locução latina que designa uma situação de fato, caracterizada pela iminência de um dano, em face da demora de uma providência que o impeça. Trata-se, portanto, que um dano em potência, que ainda não se perfez”.

E assim se posicionam os nossos Tribunais:

“são condições da ação cautelar o”fumus boni juris e o perculum in mora”.

Há que se destinguir relativamente ao primeiro, o interesse no processo do interesse jurídico substancial, exigindo-se, que outra não é senão fumaça do direito, até porque se estaria eliminando a necessidade da ação principal se viável fosse o questionamento do direito material já no âmbito estreito do processo cautelar se o autor reúne em si as condições ou requisitos da ação de mérito, ou, por outra, se é titular do direito de ação, ou direito ao processo principal – que se tutela com a cautelar – preenche as condições e, assim, tem ela, a ação cautelar, possibilidade de vida.

A tutela do direito material é espécie de exclusiva perquirição na ação principal.”

Já o”periculum in mora”se apura do estado do perigo no qual se encontra o direito principal, ou a perspectiva, ou mesma a certeza, de que a atuação normal do direito chegará tarde. Em outras palavras, é o risco de dano provável, fundado, o direito da parte, antes do julgamento da ação principal, isto é, enquanto se espera a entrega da tutela definitiva”(ac. unân. da 4a câm. do TJBA de 7.12.88, na Apel. 474, Rel. Des. Paulo Furtado, Adcoas, 1989, no 123.181).

Estão presentes, no caso em tela, os requisitos para a concessão da medida liminar.

INDÍCIOS – O suficiente para a quebra de sigilos

O Código de Processo Penal, no artigo 239, consagra o princípio da livre apreciação racional da prova, dispõe que o Juiz pode ordenar a produção de ofício de provas e traz ainda o conceito legal de”indícios”:

“Título VII – Da Prova.

Art. 156 – A prova da alegação incumbirá a quem a fizer; mas o juiz poderá, no curso da instrução ou antes de proferir sentença, determinar, de ofício, diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante.

Art. 157 – O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova.

CAPÍTULO X – DOS INDÍCIOS

Art. 239 – Considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias”.

Este conceito vale também para processos de improbidade.

Em todo processo, é necessária a prova sobre os fatos. A exigência maior incide sobre a existência (materialidade) do crime. A autoria pode ser provada por indícios convergentes e veementes, sem que haja um álibi para refutá-los.

Neste sentido, vejamos a lição de Helio Tornaghi:”enquanto que, relativamente à existência do crime, o Código exige prova (querendo significar prova cabal), no que se refere à autoria, ele se contenta com indícios, isto é, meros sinais. Se houver maiores provas, tanto melhor; mas a lei não as exige”(Curso de Processo Penal, 2/85, Saraiva, 1983).

Indícios são provas indiretas, circunstanciais. Estas provas, no caso de atos planejados, organizados, são as provas mais importantes para a elucidação dos fatos. Somente os crimes passionais são, em regra, resolvidos por provas diretas. Os que são planejados exigem o exame de amplo conjunto de provas, como um mosaico.

O indício é um fato ou circunstância certa, da qual se pode tirar, por indução lógica, uma conclusão acerca da subsistência ou insubsistência de um fato a provar. Este conceito foi determinado na obra célebre de VINCENZO MANZINI,”Tratado de Derecho Procesal Penal”. Nosso Código a adotou, simplificando o conceito, como fato ou circunstância conhecida e provada que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outras circunstâncias ou fatos.

JULIO FABBRINI MIRABETE, em seu comentário ao CPP, simplifica ainda mais dizendo que indícios são a representação do fato a ser provado através da construção lógica, a qual revela um outro fato ou circunstância.


O valor probatório dos indícios está intimamente ligado ao livre convencimento do juiz, quanto maior for sua ligação com o fato, maior o valor do indício.

Existem duas correntes jurisprudenciais referentes a sentença condenatória alicerçada somente em indícios: uma baseia-se na premissa de que a prova indiciária é suficiente para proferir a condenação, e a outra rejeita a suficiência do indício como base para a procedência da condenação. A tendência é em prol da primeira, sob pena da impunidade dos crimes do”colarinho branco”aumentar mais ainda. O mesmo vale para atos de improbidade.

Na Exposição de Motivos de nosso atual Código de Processo Penal, como leciona Mirabete,”a prova indiciária, também chamada circunstancial, tem o mesmo valor das provas diretas”, já que não existe hierarquia de provas. Indícios isolados não bastam, mas um conjunto de indícios veementes e convergentes, sim. Por isso, Mirabete também ensina que

“indícios múltiplos, concatenados e impregnados de elementos positivos de credibilidade são suficientes para dar base a uma decisão condenatória, máxime quando excluem qualquer hipótese favorável ao acusado”[ausência de álibis].

[“Código de Processo Penal Interpretado”, 3ª edição, Atlas, São Paulo, pp. 186/187].

O direito de investigação beneficia os investigados, pois evita qualquer possível injustiça. No término da investigação, após a elucidação dos fatos, ou próprio MPF poderá concluir que não houve o cometimento das condutas descritas no artigo 9º. da Lei de Improbidade.

As quebras são imprescindíveis para permitir que se separe O JOIO DO TRIGO, para jogar luzes sobre vários fatos estranhos e suspeitos envolvendo o nome do Sr. EDUARDO JORGE e demais investigados. Se for inocente, o mesmo deve ser declarado como tal; se culpado, deve ser denunciado. E para esta análise, é absolutamente necessário que seja investigado.

RUI BARBOSA, na obra A Crise Moral, Organizações Simões, Rio de Janeiro, 1962, pp. 12 e 13 e 53, escreveu algumas linhas dignas de serem transcritas:

“FONTES DA CORRUPÇÃO

De onde emana essa longa série de perversões? Do mecanismo das leis? Não, senhores; da corrupção dos homens. Enquanto se não atacar essa corrupção nas suas fontes, baldadas serão tôdas as leis, com que nos procuremos aliviar.

Todos os que exercem, senhores, uma função pública, todos os que têm à sua conta um serviço, todos os que encarnam em si uma partícula maior ou menor de autoridade, todos a obtiveram mais ou menos irregularmente, e, ao desempenhá-la, só têm o interêsse de a usar mal, para a conservar por mais tempo, menos ameaçada e mais tranqüila: os funcionários que, entrando aos cargos, de ordinário, ùnicamente graças à valia de bons protetores, só das suas relações pessoais com os influentes esperam a segurança e o acesso; os ministros, que, seguros da irresponsabilidade e admitidos, por manejos mais ou menos escusos, a situações para as quais não se lhes confia senão na subserviência, aderem como crustáceos à generosa remuneração dos seus postos; o chefe da nação, que, encartando-se, contra vontade explícita desta, numa dignidade subtraída a outrem, vive de alimentar, com os sobejos da prêsa devorada pela sua gula, a matilha das voracidades, em cuja sujeição confia; o Congresso, cujos membros, designados pelo Govêrno, pelos seus lordes protetores e pelos senhores locais da fraude, penetraram agachados nas câmaras, e a elas não tornariam, se erguessem o espinhaço, cuja curvatura ajustaram com os seus nomeadores.

MENTIRA, FURTO E TRÁFICO

Tôdas essas criaturas da injustiça e da baixeza se encantoaram nas situações cobiçadas, mentindo, furtando e traficando. Mentido à lei do merecimento, que não têm, e assoalham. Furtando aos competentes, que preterem, e esbulham. Traficando com a sua individualidade mesma, que alienam, para alcançar pela docilidade o título de estima, que na capacidade não levam.”

“O CULTO DA INCOMPETÊNCIA

Aí temos a consagração da incompetência moral, a benevolência administrativa liberalizada à improbidade notória e oficial. Outras vêzes é a incompetência profissional, a incompetência intelectual, a incompetência vulgar, absoluta. Aos cargos mais eminentes do serviço administrativo, como aos da política, os que se elevam são os mais incultos, os mais obtusos, os mais ignaros, os mais desacreditados, os mais servis e os mais baixos. Criam-se, até, ministérios, para se encherem de nepotes e favoritos.

É um govêrno, que, se em algum princípio assenta, será ùnicamente no culto da incompetência. Faguet escreveu o seu livro antes de tempo. Devia ter estudado primeiro o Brasil depois da sua hermetificação.”

PEDIDOS DE QUEBRA DE SIGILOS

Desta forma, com base no que já foi exposto, requer o Ministério Público Federal seja decretada a quebra do sigilo bancário das contas correntes (com possibilidade de rastreamento), dos cartões de crédito e dos registros telefônicos das PESSOAS, FÍSICAS E JURÍDICAS, listadas no início desta petição, de setembro de 1997 até 31 de dezembro de 2000, oficiando-se ao Banco Central do Brasil, para que procedam as comunicações às instituições bancárias indicadas.


Além da subsunção da conduta dos réus nas sanções do artigo 10 da Lei 8.429/92, há indícios de que os réus estejam incursos no disposto no artigo 9º, incisos I e IX daquela lei. É no mínimo duvidosa a forma como os acordos foram celebrados:

Para a efetiva comprovação do aqui alegado é necessário quebrar o sigilo bancário dos réus, em suas operações ativas e passivas. No processo de quebra de sigilo o Ministério Público Federal sugere:

A) oficiar ao Banco Central solicitando a veiculação, em seu correio eletrônico, de mensagem dirigida a todas as instituições financeiras, indagando-se sobre a movimentação de caixa e extra-caixa das pessoas relacionadas como réus, de setembro de 1997 em diante, e ordenando a remessa dos extratos das referidas movimentações a este Juízo. Principalmente os extratos bancários. As instituições financeiras deverão também informar a não existência de movimentação, para fins de controle;

B) requisitar ao Banco Central uma lista – com endereços e pessoas responsáveis – de todas as instituições financeiras que atuam ou atuaram no mercado desde 1998 até os dias de hoje, no intuito de verificar se todas responderam à mensagem enviada pelo BC;

C) Além da quebra do sigilo bancário, faz-se necessária uma verificação nas contas de cartão de crédito das pessoas ora investigadas, compreendendo o período de setembro de 1997 até hoje. Como é consabido, é possível grande movimentação financeira por meio de cartões de crédito.

D) Para a quebra das contas de cartão de crédito, o MPF requer envio de ofício ao Banco Central, para que este forneça os endereços das firmas administradoras de cartões de créditos, e assim possa ser enviado os ofícios requerendo a movimentação dos réus em seus cartões de setembro de 1997 até hoje.

E) Da mesma forma, que seja oficiado ao Ministério da Justiça para que acione o tratado internacional de cooperação e que requeira ao Departamento de Justiça dos EUA informações se os investigados têm contas nos EUA ou no exterior, como titulares ou procuradores e que os extratos sejam enviados a estes autos;

F) sejam oficiadas as empresas TELEBRASÍLIA e GVT, operadoras de telefonia fixa, e TELEBRASÍLIA CELULAR S.A. e AMERICEL, de telefonia celular, para que apresentem ao Juízo os extratos telefônicos de todas as linhas de uso dos requeridos EDUARDO JORGE CALDAS PEREIRA E DEMAIS INVESTIGADOS, relativos ao período de setembro de 1997 a dezembro de 2001, carreando aos autos, desde logo, os extratos das seguintes linhas comprovadamente de uso dos requeridos, quase todas usadas por EDUARDO JORGE CALDAS PEREIRA:

2259404, 2259405, 2111224, 2111225, 4111224, 4111225, 4111226, 4111227, 4111309, 4111349, 3217022, 3460044, 3460055 e 3460066, 3460077, 3460088, 3467799 (telefone que está na EJ PEREIRA CONSULTORIA SC LTDA., 3466646, 3466446, 3640022, 3640055, 3640066, 3640077, 3640099, 3643040, 2449755, 2453973, 2452576, 3453154, 2457799, 9620044, 3270020, 3270030, telefone que tem titular a firma JCP Assessoria Empresarial S/C Ltda, 3270040, 3270060, 3272060, 3280077, 3288002, 3288001, 9620044, 0720044, 9720055, 9720077, 9720088, 9720099;

Mais os extratos dos telefones 327.3500 e 327.3000, pertencente ao Grupo META, do qual o Sr. Eduardo Jorge é ou era sócio. Para tanto, informa os endereços e nomes dos representantes legais das seguintes empresas de telefonia.

TELEBRASÍLIA

Dr. ARI JOAQUIM

PRESIDENTE DA TELEBRASÍLIA

SIA SUL, ÁSP, Bloco A, Área da Presidência, 2º andar

CEP 71215-000 – Brasília/DF

GVT

Representante: NATHAN GILOH

Diretor Operacional Centrooeste da GVT

SCN, Quadra 1, Bloco A, Sala 801, 8º andar

Brasília/DF

TELEBRASÍLIA CELULAR S.A

Representante: MARIO CESAR PEREIRA DE ARAÚJO

Presidente da TELEBRASÍLIA CELULAR S.A

SCS, Q 02, Bloco C, 226, Ed. Telebrasília Celular, 7º andar.

CEP 70302-916 – Brasília/DF

AMERICEL S/A

Representante: GUNNAR BIRGER UINOF UIKBERG

Presidente da AMERICEL S/A

SEPS, Quadra 702/902, conj. B, Bloco B, Ed. General. Alencastro, 1º/3º andar

CEP 70390-025 – Brasília/DF

F) sejam oficiadas as empresas operadoras de telefonia celular no Distrito Federal e no município de São Paulo para que informem ao Juízo, desde logo, se a linha número 986-2005 é de uso de EDUARDO JORGE CALDAS PEREIRA, vez que, segundo informações de Francisca Brochado, Secretária de Eduardo Jorge, ouvida pelo Ministério Público Federal, esse seria usuário da referida linha, esclarecendo, outrossim, as empresas operadora de telefonia em São Paulo se há qualquer outro número de uso dos requeridos. Para tanto, informa também os endereços e nomes dos representantes legais das seguintes empresas de telefonia celular em São Paulo:

TELESP CELULAR


Representante: Presidente Abilio Ança Henriques

R. Peixoto Gomide, 316, 10º andar – Cerqueira César

CEP 01409-901 – São Paulo/SP

BCP CELULAR

Representante: Presidente Fábio Coelho

Tel: 5509-6955

R. Flórida, 1970, 5º andar – Brooklin Novo

CEP 04565-902 – São Paulo/SP

TESS CELULAR

Representante: Presidente Barry Bystet

Tel: (019) 3741-1000

R. Dr. Olavo Egídio, 287, 9º andar – Santana

CEP 02037-000 – São Paulo/SP

G) que seja oficiado ao Palácio do Planalto, para que seja fornecido a estes autos os números de telefones usados pelo Sr. EDUARDO JORGE, na Secretária Geral da Presidência, e que estes telefonemas tenham o sigilo quebrado; e

H) seja, desde logo, autorizada a utilização pela Receita Federal, para continuação da ação fiscal requerida contra EDUARDO JORGE, que já o autuou em cerca de R$ 300.000,00, conforme foi noticiado e que o fez sem a quebra, e ação que pode ser reaberta, com esta quebra, tal como a verificação de dados oriundos de arrecadação de CPMF dos requeridos EDUARDO JORGE CALDAS PEREIRA e demais investigados;

I) seja expedido ofício à Presidência da República para que esta traga aos autos todos os AVISOS firmados pelo Sr. EDUARDO JORGE e a correspondência entre ele e o Sr. PADILHA sobre precatórios do DNER;

J) que seja oficiado ao Ministério da Justiça, para que o mesmo acione o tratado com os EUA e envie ofício ao Departamento de Justiça, requerendo a lista de contas bancárias dos investigados no exterior, com os respectivos extratos, principalmente a conta do Sr. EDUARDO JORGE no Citibank, em Nova Iorque;

PEDIDOS FINAIS

Ante o exposto, o Ministério Público Federal requer:

a)a citação dos réus nos endereços constantes no preâmbulo desta inicial;

b)a condenação dos réus ao pagamento das custas e despesas processuais;

c) a procedência da presente ação cautelar com a confirmação, na sentença final desta cautelar, das liminares requeridas e o deferimento definitivo desses pedidos; e

d) a intimação da União e do DNER para que decidam se vão compor o pólo ativo ou se querem apresentar contestação em pedidos que lhe beneficiam.

A ação principal a ser ajuizada será de improbidade, requerendo a condenação dos Réus às sanções previstas no art. 12 da Lei 8.429/92, nos seguintes termos:

1) acaso comprovado — após analisada a movimentação financeira dos réus, que houve enriquecimento ilícito, previsto no artigo nono da Lei de Improbidade, será ajuizada ação principal pedindo a aplicação das sanções do artigo 12, 1, da Lei 8.429/92, ficando a critério desse Juízo a fixação do quantum da multa e da duração do período de suspensão dos direitos políticos; e

2) não sendo o caso de subsunção da conduta dos réus na descrição do artigo 9.º, I a IX, será pedido a condenação desses nas sanções dos incisos II e III do artigo 12 da Lei 8.429/92, asseverando-se que também nesse caso deve esse douto Juízo determinar o valor da multa e o prazo da suspensão dos direitos políticos;

O Ministério Público Federal pugna pela produção de todas as provas em direito admitidas, especialmente pela nomeação de auditores da Receita Federal para analisar os extratos bancários dos réus.

Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

Brasília, 15 de fevereiro de 2002.

LUIZ FRANCISCO FERNANDES DE SOUZA

Procurador da República

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