Ergonomia e estresse

Especialistas analisam estresse no ambiente de trabalho

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12 de fevereiro de 2002, 8h53

O fenômeno conhecido como “Stress” tornou-se uma causa mundial de preocupação pelos malefícios que provoca no ser humano, atingindo a todos, empregador e empregados, sendo sabido que o trabalhador estressado de hoje é o doente de amanhã.

Seu estudo na literatura médica ainda é recente, embrionário e raso. As principais causas ainda não são conhecidas. Os sintomas, que podem aparecer como uma inocente dor de cabeça e acabar numa úlcera ou num enfarte, costumam desembocar também no uso das famosas muletas de “alívio”: álcool, drogas, remédios para dormir.

O advogado trabalhista João José Sady, que já pesquisou os efeitos do stress a que são submetidos os ferroviários brasileiros no ambiente do trabalho, e que também é presidente da comissão de Direitos Humanos da OAB-SP, vê o assunto do ângulo dos tribunais e garante que o empresário só tranca a porta depois que o ladrão entrou (de novo: a expressão é minha). Na linguagem dele: “Não adianta falar em prevenção. As empresas só investem para evitar a dor, por exemplo, depois que foram condenadas e obrigadas a indenizar a dor”.

A lei deve indenizar a dor provocada pelo Stress e não tratar a questão apenas de forma discreta, estipulando alguns limites a ser observado pelo empregador, como por exemplo o da exigência de ergonomia.

“Sendo obrigado a pagar, o empresário pode desenvolver uma consciência”. Mesmo assim, o advogado adverte: “A empresa só é culpada quando não segue a normas corretamente”.

Veja o que disseram especialistas no assunto ao Jornal da Lillian

As causas do stress no trabalho

As principais causas do stress no escritório ainda não são conhecidas. Tudo pode começar por causa de um expediente longo demais, por exemplo.

De tão comum, o assunto vem sendo estudado e pesquisado cada vez. O que se sabe é que o trabalhador estressado de hoje é o doente de amanhã. Tudo pode começar com uma inocente dor de cabeça – e acabar numa boa úlcera ou até mesmo num enfarte.

Fora as famosas muletas de “alívio”, para suportar a estafa: álcool, drogas, remédio para dormir. Uma pesquisa inglesa revelou, recentemente, que as doenças relacionadas ao estresse afetam mais da metade dos trabalhadores britânicos. A maioria dos que tomaram a iniciativa de entrar na justiça contra os patrões perdeu a causa. E quem é que não se interessa por esse tema? Veja o que pensam o psicólogo José Roberto Leite, da Universidade Federal de São Paulo; o advogado trabalhista João José Sady; e o diretor da Sociedade Paulista de Medicina do Trabalho, Gilberto Archêro.

Stress benigno

Para o psicólogo José Roberto Leite, qualquer situação pode beirar o estresse. “Uma simples mudança de temperatura pode ocasionar o estresse”, disse. Segundo Leite, o importante é procurar o equilíbrio. “Nem sempre o estresse é prejudicial. O indivíduo pode lançar mão do conjunto de respostas que ele ocasiona no organismo de maneira benéfica, por exemplo, durante a prática esportiva”. Mas o psicólogo confirmou que no trabalho o estresse é quase sempre patogênico e pode levar ao desenvolvimento de inúmeras doenças. “Neste caso, o fator mais prejudicial é o tempo a que o indivíduo é exposto aos estímulos do estresse”.

Médicos estressados

Segundo o especialista em medicina do trabalho Gilberto Archêro os médicos são os profissionais que mais se submetem ao stress. Ele disse que os cirurgiões são os campeões de separação na profissão.

Entre 40 e 50 anos de idade, muitos médicos morrem de enfarte e outros, para suportar as pressões do cotidiano, usam drogas. “O objetivo do médico do trabalho é avaliar como é possível melhorar as condições dentro de um escritório, fábrica ou indústria”, disse Archêro. Segundo ele, o primeiro passo é avaliar as condições coletivas de trabalho e, em seguida, as individuais.

“No caso do stress, é preciso medir o seu nível assim como um agente físico, químico ou biológico”, disse. Ele exemplificou com o caso de uma fábrica com uma fonte de ruídos. “Primeiro é preciso abafar na fonte, depois criar uma parede de proteção e, por último, oferecer ao funcionário uma proteção individual”, afirmou.

Como Chaplin

O psicólogo José Roberto Leite discorda da tese de que apenas o ambiente criaria um cenário estressante. “O ambiente pode contribuir, mas não é tudo”, disse. Para explicar a afirmação ele usou um trecho do clássico “Tempos Modernos”, onde Charles Chaplin aparecia atordoado entre botões, parafusos e esteiras alucinadas. “Prestando atenção no filme, você verá que há muitos trabalhadores que faziam funções idênticas a de Chaplin na fábrica. E por que eles não enlouqueceram?”, perguntou Leite.

De acordo com o psicólogo, tudo depende da estrutura e da interpretação do indíviduo. “Quando eu falo de stress, eu tiro o foco do meio e coloco o foco no indivíduo”, disse.

A vertigem da automação

Usando como gancho o filme de Chaplin, o especialista em medicina do trabalho disse que a automação também é um dos motivadores do estresse do trabalhador. “Depois que o homem foi substituído pela máquina a tensão no trabalho aumentou”. Ele disse que o operário em geral não consegue acompanhar o ritmo da evolução tecnológica e dos treinamentos cada vez mais constantes nas fábricas. “Quando eles finalmente aprendem a lidar com uma determinada máquina muda tudo. É aí que surge o sentimento de impotência e o estresse”, disse.

A visão da lei

O advogado trabalhista João José Sady disse que o Estado influencia e incentiva as atitudes das empresas, estipula limites e estabelece normas trabalhistas. Seria por isso, que o estresse só apareceria na legislação de forma discreta, como, por exemplo, na exigência de ergonomia. Segundo ele, caberia à lei indenizar a dor.

“Sendo obrigado a pagar, o empresário pode desenvolver uma consciência”. Mesmo assim, o advogado adverte: “A empresa só é culpada quando não segue a normas corretamente”.

Sentimento de inferioridade

O psicólogo disse que o mais preocupante são as conseqüências que as relações de trabalho inadequadas podem causar para o indivíduo do que com os conflitos vivenciados no ambiente.

Leite contou que na Universidade, há o caso de um paciente de pouco mais de 30 anos que sofre de depressão por causa de uma relação de trabalho inadequada, onde o chefe era um crápula. “Ele foi convidado a trabalhar numa empresa, abandonou os projetos pessoais e se deparou com um chefe que o humilhou e o demitiu em pouco tempo”, contou.

Para esses casos, o psicólogo deu dicas: “é preciso saber que o seu valor não está em fatos como estes. O ideal seria fazer uma avaliação sobre a situação”.

Assédio moral e sexual

Na opinião do advogado, assédio moral e assédio sexual seriam similares. Segundo Sady, ambos lidam com a questão do poder delegado a pessoas. “Algumas cedem à tentação e acabam por oprimir ou humilhar subalternos”, contou.

Diferentemente do assédio sexual, afirma, o moral pode ser facilmente provado, já que costuma acontecer na frente de todos os empregados. “Já tive o caso de um jornalista que com um simples telex ofensivo que havia recebido do chefe conseguiu abrir queixa de injúria”.

Para não ter que se responsabilizar pelo ato de funcionários descontrolados, algumas empresas já adotaram mecanismos de defesa. Segundo Sady, em algumas delas é possível recorrer a uma instância dentro da própria empresa, que tentará resolver o impasse.

Condenar um funcionário ao ostracismo como punição é uma atitude indenizável, por exemplo. “É a famosa história do caranguejo na latinha. Botou fogo, ele pula fora”, ilustrou o advogado.

Fitness no escritório

O psicólogo discorda da obrigatoriedade de academias de ginástica para os funcionários como solução. “Nada deve ser compulsório. Tem gente que não se adapta à ginástica e prefere a meditação. “De acordo com Leite, o ideal seria que as empresas oferecessem opções para o trabalhador. “Tenho certeza que este seria um belíssimo investimento, que poderia trazer o aumento da produtividade”.

O perigo do modismo

Archêro alertou para o risco do estresse no trabalho cair no modismo. “É perigoso acontecer com o stress o mesmo que aconteceu com o LER”. Segundo o especialista em medicina do trabalho, é preciso avaliar caso a caso, mas muitas fraudes podem acontecer.

“Em todos os anos de trabalho só me lembro do caso de ter em mãos uma batalha judicial por estresse no trabalho”. A mulher trabalhava como ajudante de palco de um hipnotizador e sofreu convulsões por causa do estresse. “Tudo foi comprovado cientificamente e ela ganhou a ação”, relatou.

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