Na mira

Justiça autoriza quebra de sigilo bancário de médico

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22 de agosto de 2002, 18h43

O juiz substituto da 2ª Vara Federal de Campinas (SP), Fernando Moreira Gonçalves, revogou liminar que proibia a Receita Federal de ter acesso a dados bancários de um médico. De acordo com o Fisco, o médico “movimentou, durante o ano de 1998, em instituições financeiras, valor 11 (onze) vezes maior do que a renda declarada às autoridades fiscais”.

Gonçalves entendeu que “diante desse indício de sonegação fiscal, agiu corretamente a autoridade fiscal ao instaurar procedimento administrativo destinado a apurar os fatos”.

O médico entrou com Mandado de Segurança no final do mês de julho contra ato da Receita Federal. A intenção era barrar a apresentação de documentos bancários relativos ao ano de 1998.

De acordo com o médico, a requisição de informações bancárias feita diretamente pela Receita Federal, sem prévia autorização judicial, viola os direitos e garantias individuais asseguradas pela Constituição.

Além disso, a legislação em vigor na época dos fatos sob investigação proibia a Receita Federal de utilizar os dados da CPMF para cobrar outros tributos. A restrição foi revogada em janeiro de 2001. Mas, segundo o médico, a lei que revogou a restrição não poderia retroagir.

A Justiça de Campinas suspendeu liminarmente a ordem expedida pela Receita Federal até receber mais informações.

Depois de receber as informações, o juiz decidiu revogar a liminar por entender que o procedimento adotado pela Receita Federal estava correto.

Leia a decisão

Mandado de Segurança

Impetrado: Delegado da Receita Federal em Jundiaí

Vistos.

Em decisão proferida a fls. 67/68, entendi por bem, ante o caráter irreversível da quebra de sigilos, suspender a requisição de informações bancárias feita pela Receita Federal, em procedimento administrativo destinado a apurar a incompatibilidade entre a renda declarada pelo impetrante e sua movimentação bancária.

Prestadas as informações pela autoridade impetrada, no entanto, verifico que a aparência de bom direito alegada pelo impetrante não mais subsiste.

Com efeito, informa a Receita Federal, a fls. 79, que o impetrante movimentou, durante o ano de 1998, em instituições financeiras, valor 11 (onze) vezes maior do que a renda declarada às autoridades fiscais. Diante desse indício de sonegação fiscal, agiu corretamente a autoridade fiscal ao instaurar procedimento administrativo destinado a apurar os fatos.

Resta, nesse contexto, analisar se a autoridade impetrada poderia, no curso do referido procedimento fiscal, requisitar informações relativas a período anterior à legislação que permite a utilização dos dados da CPMF para o lançamento de outros tributos.

Para a exata compreensão do tema, é necessário inicialmente ressaltar-se que a Receita Federal nunca esteve proibida de utilizar informações bancárias para instruir procedimento fiscal. A vedação, sempre discutida, refere-se exclusivamente à possibilidade de ser feita requisição ou utilização de informações bancárias sem prévia autorização judicial. Na legislação citada pelo impetrante (Lei n.º 9.311/96), era vedada a utilização das informações recebidas pela Receita, por conta do recolhimento da CPMF, justamente porque, em caso contrário, estar-se-ia autorizando por via transversa o acesso da Receita a informações bancárias sem que houvesse lei complementar regulando a matéria.

No entanto, com a edição da Lei Complementar n.º 105, de 10 de janeiro de 2001, que regulamentou o acesso de autoridades fiscais a informações bancárias, a norma que vedava a utilização dos dados da CPMF para a constituição de outros créditos tributários perdeu sua razão de existência, motivo pelo qual a restrição foi abolida pela Lei n.º 10.174, de 9 de janeiro de 2001.

A respeito da possibilidade de se utilizar informações anteriores a janeiro de 2001, os argumentos trazidos aos autos pelas informações da autoridade impetrada afastam a aparência de bom direito inicialmente vislumbrada por este juízo nas alegações da impetrante.

Nesse sentido, transcrevo o seguinte trecho das informações prestadas pela autoridade impetrada, a fls. 82:

“No âmbito do direito tributário, o CTN prescreve a irretroatividade das leis, conforme anotado no art. 105. Entretanto, para o caso de critério de fiscalização o sistema tributário segue a regra da retroatividade das leis. Autoriza-nos esta conclusão o art. 144, § 1.º, do código, cujo teor é transcrito a seguir:

Art. 144. O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada.

Aplica-se ao lançamento a legislação que, posteriormente à ocorrência do fato gerador da obrigação, tenha instituído novos critérios de apuração ou processos de fiscalização, ampliado os poderes de investigação das autoridades administrativas, ou outorgado ao crédito maiores garantias ou privilégios, exceto, neste último caso, para o efeito de atribuir responsabilidade tributária a terceiros. (grifei)”

Assim, tendo em vista que a retroatividade dos critérios de fiscalização está expressamente prevista no Código Tributário Nacional, desde a sua edição, sem que se tenha notícia da declaração de incompatibilidade dessa norma com o texto constitucional, não subsiste a aparência de bom direito nas alegações apresentadas pelo impetrante.

Em razão do exposto, REVOGO a liminar concedida a fls. 67/68, ficando em conseqüência a autoridade impetrada autorizada a requisitar as informações bancárias do impetrante, na forma prevista na Lei Complementar nº 105/2001, mesmo em relação ao ano de 1998.

Providencie a Secretaria a comunicação desta decisão no Agravo de Instrumento noticiado a fls. 87 e seguintes.

Encaminhem-se os autos com vista ao Ministério Público Federal.

Intime-se e Comunique-se.

Campinas, 13 de agosto de 2002.

Fernando Moreira Gonçalves

Juiz Federal Substituto

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