Cyberslacking

Desvio de funções em empresa com uso da Web causa danos

Autor

  • Rodney de Castro Peixoto

    é advogado especialista em Tecnologia da Informação consultor de empresas de Internet autor do livro "O Comércio Eletrônico e os Contratos" (Forense 2001) e professor do IPGA - Instituto de Pós-Graduação Avançada em Tecnologia e Negócios.

14 de agosto de 2002, 12h20

Cyberslacking (1) é o termo utilizado para designar o uso de equipamentos e sistemas informáticos dispostos pelo empregador para fins particulares, no ambiente de trabalho.

Uma pesquisa conduzida no ano de 2000 pelo site Vault.com (www.vault.com) junto a empresas de médio e grande porte, nos Estados Unidos, indicou que 90% dos funcionários utilizam regularmente a Internet para finalidades particulares.

O perigo jaz nos teclados dos computadores disponibilizados para o trabalho.

As corporações, ao formularem os conceitos do escritório moderno, com suas divisórias, baias e cubículos, procuraram despir o ambiente de trabalho de distrações maiores, visando deixar o funcionário atento e voltado para a efetivação de suas tarefas, livrando-o de interesses externos.

Com o advento da Internet e suas possibilidades, ambiguamente direcionadas para obrigações e também distrações, surge um espectro de tentações ao alcance dos dedos, e o simples pressionar de um botão leva o funcionário para longe de seu trabalho, sem precisar se levantar da cadeira. Claro que o ambiente de trabalho não deve ser um confinamento, com os empregados 100% do tempo compenetrados e rígidos em seus lugares. Porém, o excesso no desvio de funções pode trazer danos, e não somente no que toca a produtividade medida em números.

Hoje em dia, uma rede de comunicação eficiente é crucial para a elaboração eficaz de tarefas. Não há como se furtar dos benefícios trazidos pela Internet no meio produtivo, e esta há de ser alvo de atenção por parte de todos os usuários envolvidos na empresa.

Considerando a dependência cada vez maior da web no ambiente de trabalho, temos um quadro potencialmente danoso para a lucratividade, uma vez que o gasto de tempo com atividades extra-profissionais pode acarretar :

1- perda de banda da rede da empresa

2- perda de produtividade

3- vulnerabilidades de segurança

4- responsabilidades legais

Vejamos cada uma destas possibilidades.

Perda de banda – o uso indiscriminado das aplicações de comunicação da Internet pode acarretar o consumo exagerado da banda da empresa, gerando lentidão no sistema, instabilidades, congestionamento e até mesmo impossibilidades de comunicação e queda total da conexão.

As práticas que devem ser evitadas pelos funcionários :

– download de arquivos MP3

– download de arquivos de vídeo

– download de arquivos de áudio

– download de arquivos de imagem

– download de software

– jogos on line

– pagamento de contas on line

– uso de streaming media (2)

-uso de endereço eletrônico da empresa em listas, formulários e correntes, possibilitando a aquisição por spammers

De acordo com o instituto de pesquisas Dataquest (www.dataquest.com), 20% dos funcionários de uma empresa utilizam a Internet por três horas por semana para finalidades particulares.

Em muitas empresas, a convergência digital transformou a rapidez e estabilidade de sua conexão em ativo. Portanto, falhas na comunicação causadas por mau uso da infra-estrutura de rede por parte de funcionários pode ser extremamente prejudicial aos negócios. Somado a isso, podemos também lembrar que o sistema como um todo sofre com o acúmulo de dados inúteis, seja na memória, no cache ou em discos rígidos das máquinas, terminais e servidores, aumentando os custos com manutenção periódica e trazendo lentidão ao trabalho off line.

Perda de produtividade – aqui os prejuízos podem ser verificados mesmo em negócios pouco dependentes da Internet. A mesma pesquisa do Vault.com delineou os hábitos dos funcionários enquanto procuram seus interesses na web :

– 72% procuram notícias

– 40% fazem compras

– 37% procuram outro emprego

– 34% procuram notícias da bolsa de valores

– 28% assumem compromissos sociais

Sobre o tempo gasto com atividades na Internet não relacionadas ao trabalho, diariamente :

– 9.6% não gasta tempo com atividades pessoais

– 18.4% até 10 minutos

– 25.1% de 10 a 30 minutos

– 22.4% de 30 minutos a 1 hora

– 11.9% de 1 a 2 horas

– 12.6% mais de 2 horas

Sobre o uso do sistema de e-mail da empresa com finalidades particulares, média diária :

– 17.8% não utilizam a conta de e-mail da empresa para fins particulares

– 56.3% de 1 a 5 e-mails

– 12.4% de 6 a 10 e-mails

– 6.3% de 11 a 20 e-mails

– 7.2% mais de 21 e-mails

Mesmo constando numa pesquisa efetuada no mercado norte-americano de trabalho, estes dados são importantes. Se adicionarmos a estes outros hábitos bem conhecidos, como salas de bate-papo e busca por pornografia e esportes, temos um quadro que nos leva a pensar : o que faz um funcionário quando não está exercendo seu trabalho, mas se encontra nos limites da empresa? Com certeza, este tempo gasto com atividades estranhas ao trabalho, com periodicidade excessiva, traz perda de produtividade, e, consequentemente, prejuízos financeiros. Estes prejuízos nem sempre são de fácil constatação e mensuração.

O International Data Corporation (www.idc.com) indica ser de 30% a 40% de toda a produtividade de uma empresa aquela disperdiçada on line.

Vulnerabilidades de segurança – destacamos a 7ª Pesquisa Nacional sobre Segurança da Informação feita pela Módulo Security Solutions (www.modulo.com.br) , elaborada em 2001,que traz o panorama da segurança de dados nas empresas brasileiras.

Nesta pesquisa obtemos importante dado de que 53% das empresas relacionam funcionários insatisfeitos como a maior ameaça à segurança de seus sistemas. Além disso, 35% das empresas entrevistadas reconheceram já ter sofrido ataques provenientes de empregados. Continuando, acessos indevidos (42%) constam como a segunda maior ameaça para a informação das companhias, sendo seguidos por vírus (42%) e divulgação indevida de informações (39%). Todos estes tipos de ameaças estão ou podem estar diretamente ligados ao uso interno da informação da empresa por parte de quem detém seu acesso.

Quanto mais a Internet se infere no cotidiano empresarial, mais o seu uso correto se faz necessário para obstar a ocorrência de falhas de segurança e prejuízos decorrentes. Vírus, bugs, trojans, worms, ataques e invasões podem surgir a partir de comportamento desavisado ou indevido de um empregado. Temos também a figura do “ameba”, que é o funcionário que não possui conhecimento suficiente de informática mas se dispõe a mexer na configuração das máquinas. Um firewall com funções desabilitadas é o suficiente para um grande prejuízo vir à tona. A informação confidencial de uma corporação pode facilmente parar nas mãos da concorrência, pelo simples descuido de alguém no envio de um e-mail.

Responsabilidades legais – a tecnologia trouxe um avanço inconteste para o ambiente corporativo, mas seu uso descuidado acarreta todo o tipo de problema. As questões legais estão presentes no espaço cibernético tanto quanto em outro lugar qualquer, e as lacunas existentes em atividades empresariais devem ser corretamente preenchidas com previsões de comportamento dirigidas aos funcionários para evitar problemas. Tivemos conhecimento de uma funcionária da Business Travel International em Middleton, Massachussets, Estados Unidos, que invadiu o sistema da empresa obtendo correspondência privada de seu chefe, e repassou-as para ex-colegas. Aqui no Brasil, notícias de demissões por uso indevido de sistemas de e-mail corporativo tomaram as manchetes recentemente, com repercussão internacional, e uma decisão de corte superior condenou uma empresa a pagamento de indenização por danos morais a empregado demitido de maneira semelhante. Outra grande empresa do setor químico se viu vítima de um hoax (3)saído diretamente de suas máquinas.

Devemos nos ater ao fato da responsabilidade da empresa perante seus funcionários, conforme os ditames do art. 1521, inc. III do Código Civil , bem como o poder de direção do empregador descrito em vários pontos da CLT. Neste caminho, a empresa se encontra na linha de responsabilidade sempre que algum ato ilícito ocorre com participação de funcionário, em suas dependências ou fora delas, com a utilização de seus equipamentos e informações. Ameaça, calúnia, fraude, difamação, ataques a sistemas, vazamento de informações confidenciais, e outros pontos podem acarretar sérios problemas pelo simples fato de alguém utilizar de maneira desastrada o sistema de comunicação da empresa. Exemplificando, temos inúmeros casos de telefones móveis sendo clonados, o que obriga as operadoras a arcar com os custos de reembolso e indenizações, e muitas vezes o problema advém de funcionários inescrupulosos que facilitam a fraude internamente.

O melhor caminho para prevenção das armadilhas ocultas neste fenômeno típico de nossos dias digitais, o cyberslacking, é a elaboração minuciosa de políticas de segurança de dados, amarrando todos os pontos obscuros envolvidos nos tópicos descritos acima, com a conseqüente disseminação de seu conteúdo no intuito de promover uma verdadeira cultura de segurança no ambiente profissional, minimizando os riscos, aumentando a produtividade e garantindo os postos de trabalho.

Todos os envolvidos no mercado de trabalho precisam estar conscientes de seu papel no mundo da informação.

Notas de rodapé:

(1) Do inglês, cyber (abrev.) = relativo a computadores e redes; slack = devagar, lento, desocupado.

(2) Processo que permite a transmissão em tempo real de arquivos de áudio e vídeo.

(3) boato em forma de mensagem eletrônica, podendo ter conteúdo ofensivo.

Autores

  • é advogado especialista em Tecnologia da Informação, consultor de empresas de Internet, autor do livro "O Comércio Eletrônico e os Contratos" (Forense, 2001) e professor do IPGA - Instituto de Pós-Graduação Avançada em Tecnologia e Negócios.

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