Debate polêmico

Juízes e advogados têm opiniões diferentes sobre férias forenses

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1 de agosto de 2002, 17h02

O segundo semestre do Judiciário começa nesta quinta-feira – 1º de agosto – depois do recesso forense, com um debate: os juízes devem ter férias de 60 dias? e tendo ou não: essas férias devem ser coletivas ou cada juiz deve tirar suas férias isoladamente, para que a máquina do Judiciário não pare tanto tempo?

O presidente do STF, ministro Marco Aurélio, entende que os juízes não devem parar ao mesmo tempo, como forma de dar vazão ao grande volume de processos que se acumula nos tribunais. Mas a opinião de Marco Aurélio não parece refletir o posicionamento majoritário da magistratura.

O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), juiz Paulo Sérgio Domingues é contra o fim do recesso nos tribunais. Para ele, a medida não teria nenhuma influência sobre a morosidade do trâmite judicial. Ele disse que, atualmente, cada juiz profere mais de duas mil sentenças por ano, inclusive nas férias forenses.

“É um trabalho mais que estafante, até desumano, pois os juízes ainda fazem plantões de final de semana, sem qualquer remuneração”, argumenta Domingues. “O problema real é a falta de juízes, não a necessidade dos magistrados trabalharem mais”, afirma.

Domingues lembrou ainda que os juízes de primeira instância não tiram folga em janeiro e julho. Ele considera que as férias coletivas devem permanecer. “Se cada magistrado tirar férias em uma data diferente, sempre faltará quórum para os julgamentos. É como num time de futebol: se cada jogador tiver férias em data diferente, o time nunca jogará completo”.

O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, juiz Cláudio Baldino Maciel, também é contra o fim das férias de 60 dias. Segundo ele, o juiz não tem a rotina de um jornalista, por exemplo, que trabalha “somente seis horas diariamente”. Segundo Maciel, o juiz teoricamente sempre está disponível para proferir decisões e acaba trabalhando mais do que “burocratas” de outras profissões.

O juiz defende o fim do recesso de julho. De acordo com ele, as férias de janeiro poderiam ser coletivas e os outros 30 dias seriam tirados em épocas diferentes pelos juízes.

O presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro Francisco Fausto, defende a manutenção do recesso forense para os ministros nos meses de janeiro e julho. Segundo Francisco Fausto, cada ministro do TST tem sob sua responsabilidade cerca de dez mil processos anuais, sendo obrigado a levá-los para casa para analisá-los inclusive aos finais de semana.

“É preciso que haja uma interrupção nos julgamentos para que os gabinetes se organizem, para que os acórdãos sejam publicados e os votos elaborados”, afirmou o presidente do TST.

O presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Nilson Naves, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, disse que o juiz trabalha nos fins de semana e, por isso, “precisa ter um período para se dedicar a leituras”. O ministro é contra o fim das férias forenses e lembra que juízes de outros países têm períodos de descanso semelhantes aos dos brasileiros.

O juiz aposentado e professor, Luiz Flávio Gomes, afirma que o ideal seria que o juiz tivesse 30 dias de férias, “como qualquer outro trabalhador do país”. E os outros 30 dias, como na Alemanha, deveriam ser utilizados para que o juiz fizesse obrigatoriamente um curso de atualização.

“O juiz, em seu dia-a-dia é muito atarefado e não tem condições, muitas vezes, de estar atento a todas as alterações legislativas e jurisprudenciais. Se ele fizesse um curso de atualização uma vez por ano, seguramente a prestação jurisdicional melhoraria”, afirmou.

Advogados defendem o fim das férias forenses

O presidente interino da OAB-SP, Orlando Maluf Haddad afirmou que a advocacia é favorável à redução do período de férias dos juízes. Segundo ele, os juízes deveriam ter férias de 30 dias assim como os demais brasileiros.

“O advogado e o cidadão em geral propugnam por uma Justiça mais célere e se aumentarmos a carga de trabalho dos juízes, em tese, teremos um andamento menos moroso das ações e julgamentos”, afirmou.

Mas ele disse que também é preciso ampliar o número de juízes “porque os atuais julgam milhares de processos anualmente e não conseguem mais dar conta da crescente demanda”. Haddad defendeu também a ampliação do número de servidores e condições materiais, como prédios, informatização, para que os servidores possam atuar.

A OAB-SP defende ainda a uniformização do período de férias, tanto na Justiça Federal, como a Estadual, porque as duas agendam datas diferentes. “O ideal seria adotar um calendário único com base nas férias da Justiça Estadual”, disse.

Na opinião do advogado tributarista Raul Haidar, “os juízes devem ter férias normais, de 30 dias por ano, a serem gozadas em escalas individuais”. Segundo Haidar, “as férias coletivas devem ser abolidas em todos os serviços públicos, pois são remuneradas com tributos que são pagos sem qualquer interrupção”.

O advogado vai mais longe: “O Judiciário deveria funcionar todos os dias, inclusive sábados, domingos e feriados e mesmo 24 horas por dia nos casos de urgência”. Ele defende a implantação de plantão permanente no Judiciário assim como há em hospitais e na Polícia.

Haidar lembrou que já há casos de sentenças em Mandado de Segurança que demoram mais de 10 anos na Justiça Federal para serem apreciados.

O advogado Eduardo Nobre considera que a redução das férias forenses não resolveria o problema do volume de trabalho no Judiciário. Para Nobre, “é necessário aumentar os recursos destinados ao Judiciário, aumentar o número de juízes e o número de varas”.

O advogado Théo Dias lembrou que, além dos 60 dias de férias, em São Paulo, tribunais concedem ainda dias adicionais de folga por número de processos julgados. Segundo Dias, “o juiz deve ser bem remunerado, mas não usufruir de privilégios que ferem o princípio da isonomia e prejudicam a legitimidade do Poder Judiciário perante a sociedade civil”.

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