Crimes virtuais

Justiça argentina decide que hackear websites não é ilegal

Autor

  • Omar Kaminski

    é advogado e consultor gestor do Observatório do Marco Civil da Internet membro especialista da Câmara de Segurança e Direitos do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) e diretor de Internet da Comissão de Assuntos Culturais e Propriedade Intelectual da OAB-PR.

16 de abril de 2002, 12h04

Os hackers de computador, pessoas que desenvolvem programas para interceptar mensagens eletrônicas, decodificar segredos e penetrar em sistemas seguros, podem ser considerados por alguns a escória da era digital e têm sido perseguidos pela polícia além das fronteiras. Mas na Argentina, conseguiram um aliado improvável – o mesmo sistema jurídico que desprezam.

O juiz federal argentino Sergio Torres decidiu que, por ausência de definição, o hacking é legal naquele país, argüindo que o Código Penal protege de crimes ligados a “pessoas, coisas e animais”, mas não ao ciberespaço, e que páginas na Internet “por sua natureza, não são objetos corpóreos e nem podem ser detectadas materialmente”. Segundo a agência Reuters, trata-se do primeiro caso versando sobre hacking na Argentina.

O juiz proferiu sua decisão em março passado após ter presidido o caso de um grupo que invadiu o website da Corte Suprema de Justiça. A sentença foi publicada no dia 11 de abril.

A lei argentina não protege websites, então o ato de se “hackear” não pode ser considerado ilegal, disse o juiz, declarando os réus inocentes das acusações de violação do site. Contudo, alertou para a existência de um “sério vazio legal” para a persecução dos crimes digitais.

Um dos advogados da Microsoft na Argentina, Antonio Millé, criticou a decisão do juiz sustentando que “se atentou contra um bem material ou coisa, que é a memória onde está gravado o arquivo HTML, que quando é executado mostra o sítio ou a página web”. E que os hackers alteraram os estados de tensão correspondentes às células que suportam esse arquivo, trocando a combinação de uns e zeros que as sustentam, completou.

O caso também “disparou um conflito de competência ainda não resolvido” entre a Polícia Federal, a Gendarmería (polícia de fronteiras) e a Secretaria de Inteligência do Estado para liderar as investigações de delitos informáticos, disse o jornal La Nación.

A correspondente da BBC em Buenos Aires, Lourdes Heredia, apurou que o grupo, conhecido como X-Team, desfigurou o website da Corte Suprema em 25 de janeiro de 1998, inserindo acusações de acobertamento da morte do fotógrafo jornalístico Jose Luis Cabezas pelos juizes, e exigindo o esclarecimento do crime.

O corpo de Cabezas foi encontrado carbonizado em seu carro em 1997, após a publicação de fotografias do empresário Alfredo Yabran, suspeito de corrupção e de ligações escusas com o então presidente Carlos Menem. Yabran teria cometido suicídio logo após sua prisão ter sido decretada.

A morte do fotógrafo, que ocorreu durante o governo Menem, provocou diversos protestos contra a impunidade e a corrupção da elite argentina, e contra abusos dos direitos humanos por oficiais do alto-escalão.

Autores

  • é advogado, diretor de Internet do Instituto Brasileiro de Política e Direito da Informática (IBDI) e membro suplente do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).

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