Flexibilização da CLT

Novo presidente do TST defende debate sobre flexibilização da CLT

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10 de abril de 2002, 15h02

A sociedade deve participar de um amplo debate antes da deliberação do Projeto de Lei que flexibiliza a Consolidação das Leis do Trabalho. A opinião é do novo presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Francisco Fausto, que toma posse nesta quarta-feira (10/4) no lugar do ministro Almir Pazzianotto.

“A legislação trabalhista não pode ser objeto de mudanças fundadas em interesses momentâneos, circunstanciais. O Direito do Trabalho corresponde a um sistema e a uma conquista não só do Brasil, mas de todo o mundo. Qualquer mudança não pode ser objeto de mera portaria ou resolução, tem de ser precedida de um profundo debate técnico”, avalia o novo presidente do TST.

Durante o discurso de posse, o presidente deve abordar os aspectos polêmicos sobre a flexibilização da CLT. “De acordo com dados da ONU, o Brasil possui 55 milhões de miseráveis; o governo estima uma massa de 27 milhões de subempregados e desempregados. Qualquer que seja o número, ele é alarmante e certamente superior à quantidade de miseráveis existentes na época em que surgiu a CLT. Além disso, a ganância pelo lucro e a concentração de renda são maiores que antes. Este contexto autoriza a supressão de direitos trabalhistas?”, questiona Francisco Fausto.

A intenção do novo presidente do TST é promover um seminário internacional sobre o tema, em Brasília, no segundo semestre. Ele quer reunir especialistas da Alemanha, Espanha, França, Inglaterra e Itália, além de juízes trabalhistas, parlamentares, representantes do governo federal, lideranças sindicais e demais setores da sociedade.

“Todas as correntes de interpretação sobre esse tema polêmico estarão representadas no seminário”, disse o presidente do TST, que já obteve o apoio do Ministério do Trabalho e da Academia Brasileira de Direito do Trabalho para a realização do evento, precedente à qualquer deliberação legislativa sobre o assunto.

Para Francisco Fausto, há a necessidade da criação de um órgão de controle para salvaguardar os direitos dos trabalhadores. “Tem-se hoje um entendimento pacífico entre os ministros do Tribunal Superior do Trabalho de que a flexibilização é possível e, em alguns casos, pode até mesmo ser necessária. Nós entendemos, contudo, que a falta de um órgão de controle resultará na destruição do Direito do Trabalho. Não vamos confundir flexibilização com desmonte da CLT”, opina o presidente do TST, para quem uma flexibilização indiscriminada fragilizaria as relações trabalhistas, “principalmente em regiões onde os sindicatos não são tão fortes”.

Neste sentido, Francisco Fausto faz questão de afastar qualquer conotação paternalista em sua defesa das prerrogativas trabalhistas. “Esse posicionamento nada tem de paternalista. Trata-se de uma visão tutelar do tema, ou seja, a importância de salvaguardar os direitos trabalhistas, que não foram criados pelo Judiciário, mas pela legislação que consagrou uma conquista universal. Direitos como o repouso semanal remunerado, licença para tratamento de saúde, dentre inúmeros outros, são comuns à humanidade como um todo”.

Flexibilização das leis trabalhistas no exterior

Francisco Fausto cita a experiência de países europeus com as hipóteses de flexibilização. Na Suíça, por exemplo, qualquer mudança na legislação trabalhista é analisada por um órgão tripartite, com representantes do patronato, trabalhadores e governo. Já Alemanha e França permitem a atenuação das normas quando a empresa interessada comprovar um estado de dificuldade financeira.

No Brasil, o ministro destaca a própria atuação da Justiça do Trabalho, em particular do TST, na atenuação das normas conforme as mudanças verificadas nas relações empregatícias e da própria sociedade.

Desta forma, o Tribunal reviu um enunciado contrário à possibilidade de terceirização de mão-de-obra diante do grande volume de recursos ajuizados por empresas do Rio Grande do Sul que não conseguiram manter condições de competitividade diante da impossibilidade de terceirização e o advento simultâneo do Mercosul.

A mesma “visão política e pedagógica” foi adotada mais recentemente quando o TST admitiu a possibilidade de salário diferenciado para menores de 18 anos de idade.

Fortalecimento dos sindicatos

O ministro abordará ainda na cerimônia de posse a necessidade de fortalecimento dos sindicatos, por meio da pluralidade das entidades representativas dos trabalhadores e a eliminação de todos os resquícios de atrelamento entre a máquina estatal e os órgãos sindicais.

“É fundamental que a organização sindical possua ampla liberdade e autonomia, para que os sindicatos tenham poder de negociação, e para isso, precisam ser fortalecidos”, observa.

Sobre as Comissões de Conciliação Prévia, órgãos criados para reduzir o volume de causas na Justiça Trabalhista, por meio da celebração de acordos prévios entre as partes, o presidente do TST defende uma reavaliação do papel atualmente desempenhado por estes órgãos não judiciais. Segundo Francisco Fausto, como os conciliadores são remunerados pela quantidade de acordos obtidos, muitas vezes há soluções forçadas, em detrimento dos trabalhadores.

O presidente do TST destaca que denúncias de irregularidades estão sendo apuradas pelo Ministério Público do Trabalho.

Reforma do Judiciário

O novo presidente do TST defende a adoção da súmula vinculante para decisões repetitivas do TST e a ampliação da competência do Judiciário trabalhista para examinar também os dissídios relacionados ao funcionalismo público.

Ele afirma estar otimista diante da futura previsão constitucional para a implantação de uma Escola Superior da Justiça do Trabalho, a ser instalada em moldes semelhantes às existentes na França e Portugal, as melhores do gênero.

Perfil

Potiguar de Areia Branca, o juiz de carreira Francisco Fausto de Paula Medeiros alcança a presidência do Tribunal Superior do Trabalho após 11 anos de atuação no órgão de cúpula da Justiça trabalhista brasileira, onde desempenhou os cargos de corregedor-geral e vice-presidente.

Os mais de 30 anos de carreira na magistratura tiveram início em 1961 com a nomeação para a Junta de Conciliação e Julgamento de Natal (RN). Posteriormente, Francisco Fausto atuou como juiz do Trabalho em Pernambuco e, em 1978, foi promovido – por critério de merecimento – para o Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, sediado em Recife (PE).

Em novembro de 1989, foi nomeado para o TST após aprovação unânime na sabatina do Senado Federal. Além das diversas atividades desenvolvidas na justiça trabalhista, Francisco Fausto tem diversos trabalhos publicados e esteve envolvido em diversos projetos culturais no Estado do Rio Grande do Norte.

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