Livre comércio

Falta de competitividade força Bush a impor barreiras às importações

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26 de outubro de 2001, 11h38

Os governos Clinton e Bush sempre procuraram manter um discurso repetitivo no sentido de que promover o livre comércio é uma das principais prioridades econômicas. J.K. Galbraith, Prêmio Nobel de Economia, norte americano, ridiculariza a infantilidade dos governos que passaram a adotar, sem reservas, o receituário do FMI zombando de todos os que seguiram à cartilha neoliberal.

“Globalização não é um conceito sério. Nós, americanos, o inventamos para dissimular nossa política de entrada econômica nos outros países” (Folha de SP, julho/98).

Bush, astuto, tirando proveito do orgulho ferido dos americanos com os ataques terroristas, apesar de duvidosa legitimidade de origem, acabou por se legitimar com a crise do terrorismo e passou a agir rapidamente, buscando alavancar os apoios necessários para obter poderes na área das negociações internacionais de comércio e de finanças “fast track”. (Carta Maior, A Guerra como instrumento de reafirmação de poder).

Mas internamente está enfrentando um dilema atual de difícil solução, cujo cálculo político é dos mais complexos. De um lado, a necessidade de manter o discurso neoliberal de defesa do livre comércio. De outro, a falência a indústria do aço, que deixou de ser competitiva.

Do lado nacionalista, é pressionado pelos poderosíssimos “lobbys internos”. O própro Leo W. Gerard, presidente do sindicato United Steelworkers of America, chamou a decisão de “o primeiro raio de esperança em anos” para os operários siderúrgicos e cerca de 600 mil aposentados, cujos benefícios dependem das finanças abaladas dos fabricantes de aço.

Do lado neoliberal, a observação de Calman J. Cohen, presidente do Emergency Committee for American Trade, um grupo apoiado pela indústria que defende o livre comércio. “Este é um péssimo momento para o protecionismo do aço. Neste momento de crise sem precedentes, o mundo espera liderança dos Estados Unidos, e não protecionismo”.

Pressionado, o governo apresentou o caso do aço à comissão de comércio sob a Seção 201 da lei de comércio de 1974. É preciso ressaltar que a referida medida é poderosa. De acordo com essa Seção 201, a Casa Branca pode impor sobretaxas mesmo sem necessitar determinar se os produtores estrangeiros obtiveram vantagem ao estabelecerem o preço de suas exportações abaixo do custo de produção.

Da mesma maneira, qualquer sobretaxa se aplicará a todos os exportadores estrangeiros, e não podendo apenas punir países específicos ou empresas consideradas como praticantes de concorrência desleal. As sobretaxas provavelmente serão aplicadas sobre quase todos os tipos de produtos de aço, e afetarão o preço de tudo, de automóveis até cabides de roupas.

As restrições comerciais atenderão aos apelos de um dos setores mais debilitados do país, mas incomodará os defensores do livre comércio e alarmará parceiros comerciais chaves, como Grã-Bretanha, Alemanha, México, Brasil e Coréia do Sul.

Todas essas observações e conclusões resumem-se, no fundo, a uma só questão crucial que está no coração do debate sobre os desequilíbrios e as injustiças do atual sistema mundial de comércio. Se os ricos não deixam espaço aos pobres para produzir e competir em alguns setores, como poderão esses últimos pagar as importações de bens de capital e tecnologia provenientes dos primeiros? (Rubens Ricúpero, Folha de São Paulo – 17 de junho de 2001).

A situação da completa dependência do Brasil às decisões dos países ricos que comandam as regras dos reais interesses do comércio internacional, exemplifica os tropeços desse modelo. Analisando todo esse quadro de conflito de interesses internacionais, lúcida é a conclusão de Joaquim Francisco de Carvalho.

“Os países pobres ou relativamente pobres são irresponsáveis quando entram (na globalização) acreditando que devem fazer concessões ao capital, para se tomarem competitivos. Isso é ingênuo, pois o capital tem sempre um custo. De fato, os países que mais receberam capitais externos são precisamente aqueles que agora estão em crise mais profunda, como a Indonésia e a Tailândia. É ingênuo pensar que se deva curvar perante o capital, pala criar condições de integração de um país à economia mundial. O que provoca desastres é que as pessoas entram na globalização com uma idéia muito ingênua do que poderia ser obtido com isso, aceitando níveis de sacrifício que jamais trarão os frutos esperados”. (JB edição de 09.11.97).

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