Guerra de mídia

STF: professores grevistas e governo anunciam vitória.

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26 de novembro de 2001, 21h02

O Supremo Tribunal Federal decidiu arquivar, nesta segunda-feira (26/11), a Reclamação apresentada pelo governo contra a decisão do Superior Tribunal de Justiça, que mandou o Ministério da Educação repassar às universidades as verbas correspondentes às suas folhas de pagamentos.

Antes de propor que o plenário não conhecesse do pedido – o que foi aprovado por unanimidade – a ministra Ellen Gracie, relatora do pedido, teceu críticas em relação à greve, à decisão do ministro Gilson Dipp, do STJ, e manifestou-se claramente a favor da tese defendida pela Advocacia-Geral da União (Leia, abaixo, o informe distribuído pela AGU, o informe do STF e a decisão constante do acompanhamento processual do Supremo).

As considerações da relatora foram interpretadas pela AGU como uma vitória. No comunicado distribuído pelo órgão afirma-se que, apesar do arquivamento, os ministros do STF afirmaram “que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não possui competência para julgar mandado de segurança ajuizado contra o ministro da Educação, Paulo Renato Souza, quanto à retenção de verbas para pagamento dos professores das Instituições Federais de Ensino Superior”.

Para o advogado dos professores universitários, Roberto Caldas, “essa interpretação é absurda”. Em sua opinião, “embora a ministra tenha feito observações de ordem pessoal, o que os ministros votaram foi o arquivamento”.

O advogado-geral da União, Gilmar Mendes, contesta: “Os ministros aprovaram a proposta do arquivamento com os fundamentos dados por ela. E não é possível separar o entendimento manifestado pela relatora de sua proposta – uma vez que eles estão devidamente integrados”.

Para Caldas, “o governo está jogando com a desinformação para criar um fato consumado”. Para o advogado dos grevistas, as opiniões manifestadas por Ellen Gracie “não foram sequer incidentais”, insistiu.

O ministro Gilmar Mendes preferiu listar, no voto da ministra, os fundamentos utilizados por ela para demonstrar que a decisão do STJ não deve prevalecer enfatizando os pontos em que ela antecipou a apreciação de mérito – embora tenha concluído que a Reclamação não poderia ser examinada pelo Supremo, por razões técnicas.

Antes de decidir que não cabia o exame da matéria proposta pela AGU, o pleno decidiu que o governo tinha razão ao considerar que, por já ser relatora de ação relacionada ao assunto, Ellen é quem deveria examinar o tema.

O advogado Roberto Caldas negou que, ao peticionar no sentido de que a Reclamação fosse redistribuída, estivesse questionando a imparcialidade da ministra, como interpretou esta publicação. “Nossa argumentação teve fundamento técnico”, afirmou.

Questionado se iria manter a desistência do habeas corpus para livrar o ministro da Educação de eventual sanção por parte do STJ, como anunciara pela tarde, Gilmar Mendes confirmou. “O sentido do arquivamento proposto pela relatora foi o de que a matéria não deveria ser julgada porque questionava uma decisão juridicamente descabida”, afirmou.

O imbroglio transfere para o STJ – especificamente, para o ministro Gilson Dipp – a decisão de avançar (sancionando Paulo Renato) ou recuar (aceitando a interpretação da AGU).

As jornalistas Silvana de Freitas da Folha de S.Paulo e Mariângela Galucci da Agência Estado, que fizeram a cobertura da votação in loco, não tiveram dúvidas em cravar que a decisão representou uma derrota para o governo.

Para Silvana, “ao negar o pedido do governo, o STF apenas manteve a decisão do STJ, que determina o pagamento” dos grevistas, já que os ministros não chegaram a apreciar as questões de mérito da disputa, como, por exemplo, se o governo deve ou não repassar imediatamente a verba da folha de pagamento às universidades, se os professores têm ou não o direito de permanecer em greve ou, ainda, se é válido ou não o decreto que trata dos repasses.

Pelo relato da Folha, a AGU (Advocacia Geral da União) tentará cassar a decisão de Gilson Dipp amanhã em julgamento na 3ª seção do STJ de recurso movido pelo governo.

O presidente do STF, ministro Marco Aurélio, explicou a decisão do plenário em seu aspecto técnico, afirmando que o tribunal considerou que somente o STJ pode decidir, neste momento, a questão, porque o mandado de segurança que gerou a ordem contra Paulo Renato envolve um ministro de Estado e o presidente da República. Cabe ao STJ julgar os atos dos ministros, e ao STF, as decisões do presidente.

Pelo texto da Folha, o advogado-geral da União também nega a derrota, afirmando que Ellen acolheu a tese do governo sobre a questão, ou seja, não reconheceu a validade das decisões de Dipp contra Paulo Renato, abrindo o caminho para a sua cassação.

“A questão do ponto de vista jurídico está resolvida. Precisávamos de uma interpretação do STF. Isso conseguimos.”

A AGU queria que a ministra decidisse individualmente o pedido de liminar, mas ela preferiu dividir essa tarefa com os outros dez colegas em razão da repercussão da decisão.

Na semana passada, o ministro Gilson Dipp havia reafirmado a ordem judicial da liberação da verba para o pagamento e dado o segundo ultimato para que Paulo Renato cumprisse a decisão.

Gilson Dipp entende que o decreto do pacote antigreve não vale nesse caso porque é posterior à sua decisão.

No texto de Mariângela Galluci tampouco existem dilemas: “O governo sofreu nova derrota na Justiça, frente aos professores grevistas”, afirma a notícia de O Estado de S.Paulo. Também aqui se entendeu que os ministros do STF mantiveram, por unanimidade, a decisão do STJ, que determinou ao ministro da Educação, Paulo Renato Souza, que repasse às universidades federais recursos para o pagamento dos salários dos professores.

O governo, explica a jornalista, alegava que o STJ tinha usurpado uma competência do Supremo, e que a decisão tinha de ser cassada.

O Estadão também registrou a interpretação da AGU de que Ellen Gracie sinalizou que concorda com a tese do governo, de que Paulo Renato não pode repassar os recursos para as universidades, já que o decreto presidencial transferiu para o presidente da República essa competência.

Mariângela colheu também a opinião do presidente do STJ, Paulo Costa Leite, para quem cabe ao relator da ação no tribunal, Gilson Dipp, examinar as conseqüências da decisão do Supremo. Dipp, informou-se está no Rio Grande do Sul, participando de um congresso.

Para negar a reclamação do governo, os ministros apresentaram razões processuais. Eles entenderam que o STJ não usurpou competência do Supremo porque decidiu uma ação contra ministro de Estado. Se a ação fosse contra o presidente da República, haveria a usurpação, já que caberia exclusivamente ao STF essa competência.

Leia a síntese da decisão constante do acompanhamento processual do STF

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, assentou a correção da distribuição verificada e não conheceu da reclamação. Declarou impedimento o Senhor Ministro Néri da Silveira. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Senhor Ministro Celso de Mello. Plenário, 26.11.2001.

Veja a decisão, segundo a assessoria da AGU

“STF AFIRMA A INCOMPETÊNCIA DO STJ PARA JULGAR SOBRE O PAGAMENTO DE PROFESSORES EM GREVE

Em julgamento realizado nesta tarde, em ação de Reclamação de autoria da AGU, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) afirmaram – muito embora não conhecessem da referida reclamação – que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não possui competência para julgar mandado de segurança ajuizado contra o ministro da Educação, Paulo Renato Souza, quanto a retenção de verbas para pagamento dos professores das Instituições Federais de Ensino Superior. “A edição do decreto 4.010, havia retirado dessa autoridade (ministro da Educação) a potestade para dispor sobre tais recursos, tornando-lhe impossível o cumprimento da decisão judicial, já que a liberação de verbas foi centralizada na pessoa do presidente da República”, afirmou a ministra no seu voto.

A ministra Ellen Gracie, relatora do processo, apontou a impossibilidade de o sindicato dos docentes (ANDES) ajuizar ação tendo por fundamento a autonomia universitária. No julgamento da ministra, compete ao presidente da República, e não ao ministro da Educação, autorizar o repasse para o pagamento daqueles servidores, o que inviabiliza a competência do STJ, uma vez que compete apenas ao Supremo julgar mandados de segurança contra ato do presidente da República.

O ministro Nelson Jobim, seguindo a ministra Ellen, enfatizou a perda de objeto da ação movida pelo ANDES perante o STJ (em que é relator o Ministro Gilson Dipp). Durante o julgamento, os ministros afirmaram ainda, a desnecessidade de habeas corpus em favor do Ministro Paulo Renato (em face de eventuais ameaças de instauração de procedimento criminal), uma vez que o STJ não poderia tomar qualquer medida de coação contra o ministro de Estado. “O ilustre relator no STF não tem poderes para exercer a coação que seria obviada pelo habeas corpus de ofício, ante o foro privilegiado de que goza o Ministro de Estado, essa providência é desnecessária”, afirmou a ministro no seu voto.

Tendo em vista a decisão do STF, a Advocacia-Geral da União protocolará pedido de desistência no Habeas Corpus Preventivo nº 81.531, ajuizado hoje em favor do Ministro Paulo Renato.

Ainda no seu voto a ministra Ellen ressaltou que tais ações, como o caso do pagamento de salário aos professores grevistas, devem ser objeto de julgamento do colegiado do tribunal. “A organização judiciária nacional, firmada pela Constituição Federal, reserva a análise de determinadas questões aos órgãos colegiados. Tais matérias, exatamente por sua dimensão e pela repercussão que representam na vida nacional ou pelos personagens e instituições que envolvem, são subtraídas ao voluntarismo das decisões monocráticas”, disse no seu voto.

Segundo a ministra as decisões individuais devem ser utilizadas com “extrema parcimônia” e “tão logo remetidas ao conhecimento e revisão do corpo julgador”. “Já disse em ocasião anterior que o maior privilégio do magistrado que ascende a uma cátedra de tribunal é poder compartilhar com seus colegas os ônus e responsabilidades da tarefa tão árdua de julgar para que da contribuição de muitas inteligências, bagagens pessoais de conhecimento e visões de mundo diversas possa afinal emergir do grande exercício dialético em que se constituem as sessões de julgamento, a desejável Justiça”, afirmou a ministra.”

Leia a decisão, na descrição da assessoria do STF

Ministros negam seguimento à Reclamação da AGU contra a decisão do ministro do STJ

O Supremo Tribunal Federal negou seguimento hoje (26/11), por unanimidade, à Reclamação (RCL 1.984) ajuizada pela Advocacia Geral da União (AGU) contra a decisão do ministro do Superior Tribunal de Justiça Gilson Dipp, que determina o repasse de verbas às universidades federais referente ao mês de outubro.

A Reclamação tinha por objetivo chamar para o Supremo a competência para julgar a causa, levando-se em conta a expedição do Decreto 4.010/01, responsável pela transferência da competência ao Presidente da República para liberar recursos relativos à folha de pagamentos dos servidores públicos federais.

A relatora do processo, ministra Ellen Gracie, entendeu que, no caso, não houve invasão da competência do STF porque não houve mudança do sujeito passivo da questão. “O ato impugnado, de ordenar o pagamento, dirige-se ao ministro da Educação, e não ao presidente da República”, explicou a ministra. Segundo Ellen, a questão se o ministro da Educação tem poder ou não para cumprir a ordem não poderia ser discutida em um processo de Reclamação.

Os ministros concordaram com o voto da relatora e foi negado seguimento à ação da AGU.

O Plenário entendeu ainda que foi correta a distribuição por prevenção da Reclamação à ministra Ellen Gracie indicada pela Advocacia da União.”

Com informações da Folha de S.Paulo e da Agência Estado

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