Juízes investigados

Juízes do TRF/3ª são investigados por improbidade administrativa

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3 de novembro de 2001, 20h21

A juíza federal Regina Helena Costa, da 14ª Vara Cível, autorizou o MPF (Ministério Público Federal) em São Paulo a prosseguir investigação para apurar a suspeita de improbidade administrativa dos juízes Paulo Theotonio Costa e Roberto Luiz Ribeiro Haddad, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.

A apuração estava suspensa desde julho de 1999. Os magistrados respondem a inquérito criminal no STJ (Superior Tribunal de Justiça) em Brasília, por suspeita de enriquecimento ilícito. Com a decisão da juíza federal, ao denegar segurança pleiteada em 1999, os juízes serão também investigados em inquérito civil público pelo MPF em São Paulo.

A eventual comprovação de improbidade poderá sujeitar Theotonio Costa e Haddad à suspensão dos direitos políticos, perda de função, indisponibilidade de bens e ressarcimento ao erário.

Em julho de 1999, ao julgar recurso dos magistrados ao TRF, o então presidente do tribunal, José Kallás, suspendeu provisoriamente a investigação instaurada pela procuradora da República Samantha Dobrowolski.

A procuradora iniciara procedimento administrativo em virtude de reportagem publicada pela Folha de S.Paulo, em 11 de julho de 1999, que noticia – segundo a representação do MPF – “sinais exteriores de riqueza incompatíveis, em tese, com os salários dos impetrantes”.

No mandado de segurança, Theotonio Costa e Haddad sustentaram que têm a prerrogativa de serem investigados somente perante o Poder Judiciário: pelo próprio TRF ou então pelo STJ.

Inconformados, sustentaram que a procuradora passara a praticar atos de caráter investigativo, inclusive com a decretação, de ofício (sem autorização judicial), da quebra do sigilo fiscal.

Em sentença proferida no último dia 26, a juíza Regina Helena Costa decidiu pela “absoluta competência” do MPF para proceder ao inquérito civil e ajuizar ação civil pública por improbidade administrativa, perante a Justiça de primeira instância, em relação a quaisquer autoridades, entre elas juízes federais.

Segundo a juíza, a Constituição aponta como funções do MPF “promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social”.

Ainda segundo a sentença, o texto constitucional, ao disciplinar a competência dos tribunais regionais federais, define que a prerrogativa de função deferida aos magistrados é restrita ao julgamento de crimes.

“Não há, à evidência, foro por prerrogativa de função para ações civis de improbidade, pelo simples fato de que não há qualquer exceção feita pela Constituição nesse sentido”, afirma a juíza.

A sentença cita decisão do Supremo Tribunal Federal envolvendo o ex-senador Luiz Estevão, em que o STF negou a pretensão de foro por prerrogativa de função para a investigação de atos de improbidade administrativa.

Também é mencionada decisão do STJ que considerou improcedente reclamação de Délvio Buffulin, ex-presidente do Tribunal Regional do Trabalho paulista. Ele pretendia paralisar ação civil pública movida pelo MPF por improbidade administrativa.

A juíza federal considerou prejudicado o exame da quebra do sigilo fiscal, diante da instauração de inquéritos no STJ para apurar supostos ilícitos penais envolvendo os dois desembargadores.

Em abril de 2000, o STJ instaurou inquérito para apurar a suspeita de enriquecimento ilícito de Theotonio Costa e Roberto Haddad, com base nas reportagens da Folha. Em maio último, o STJ instaurou novo inquérito criminal contra Haddad, por suspeita de sonegação fiscal e falsificação de documentos. Em junho, por unanimidade, a Corte Especial do STJ rejeitou recurso oferecido por Theotonio Costa, mantendo a quebra do sigilo bancário do desembargador, da sua mulher e de três empresas do casal.

O advogado Sebastião Botto de Barros Tojal, que defende os juízes Paulo Theotonio Costa e Roberto Luiz Ribeiro Haddad, diz que vai recorrer da decisão no Tribunal Regional Federal. “A sentença foi publicada, obtive cópia e estou preparando recurso, justamente por não me conformar com os fundamentos jurídicos da decisão”, diz Tojal. “Estou absolutamente convencido de que o Ministério Público não pode, de ofício, quebrar o sigilo fiscal dos impetrantes”.

Segundo Tojal, “o Ministério Público Federal não tem essa autorização legal”. “Penso que a sentença incorre num erro jurídico e essa é a razão pela qual estou preparando o recurso.”

Para Tojal, a quebra do sigilo fiscal dos desembargadores nos inquéritos criminais do STJ não modifica essa avaliação.

“O fato de existir um procedimento investigatório não invalida a necessidade de se recorrer da decisão. Mesmo que o processo tenha perdido o objeto, a sentença não deixa de significar uma formulação injurídica. E o TRF é a instância apropriada para apreciar o acerto ou desacerto da decisão”, disse o advogado.

Em 1999, Tojal afirmara que “o desejo [dos juízes] é que todos os fatos sejam apurados, mas no foro competente”.

Theotonio Costa e Haddad moveram ação de indenização contra a Empresa Folha da Manhã S/A, que edita a Folha.

Ao menos quanto ao sigilo bancário, o Supremo Tribunal Federal já tem decisão definida a respeito. Na semana que passou, o STF publicou o acórdão que confirma o poder dos procuradores da República de devassar as contas de suspeitos de desvio de dinheiro público, sem autorização judicial.

Hoje, os bancos se negam a prestar informações sobre a movimentação financeira dos clientes sem a autorização do juiz. A partir de agora haverá maior agilidade na apuração dos desvios de recursos, apressando a condenação dos culpados.

A decisão versa sobre um mandado de segurança de 1995, do Banco do Brasil contra o então procurador-geral da República, Aristides Junqueira. Na época, o Ministério Público requisitou informações sobre empréstimos feitos com dinheiro do Tesouro Nacional a usineiros falidos. A transação fora denunciada pelo jornal Folha de S. Paulo como irregular estava sob investigação da Justiça.

O BB se recusou a atender o pedido dos procuradores. Alegou que não podia quebrar o sigilo dos clientes. O mandado de segurança no Supremo serviria para garantir que as informações só seriam fornecidas ao Ministério Público mediante autorização judicial.

A decisão do Supremo deverá levar a uma mudança nas sentenças dos demais tribunais. Segundo o jornal Correio Braziliense, levantamento do Banco Central mostra que a maioria dos crimes praticados por dirigentes de instituição financeiras ficam impunes. São casos como o dos usineiros que pegaram financiamentos suspeitos com recursos do Tesouro que até hoje não foram resolvidos (leia ao lado). Os crimes mais comuns, segundo os números do BC, foram estelionato e empréstimos indevidos, entre outros. A maior parte dos processos acaba arquivado por falta de provas. Outros, terminam prescrevendo pelo tempo excessivamente longo de apuração.

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