Conciliação prévia

Artigo: Pressão sobre trabalhador existe em qualquer hipótese.

Autor

1 de março de 2001, 0h00

A Lei 9.958/00 autoriza a criação das Comissões de Conciliação Prévia e visa, com isso, a solução rápida e eficaz para um eventual conflito trabalhista, que poderá ter sua sede dentro da própria empresa ou dentro dos sindicatos, buscando a pacificação definitiva na solução de uma relação de emprego.

O ponto histórico mais relevante para a formação do Direito do Trabalho ocorreu na Inglaterra, em 1824, quando o parlamento inglês autorizou a livre associação para a criação de associações e sindicatos. Todo o direito do trabalhador passou a ser reconhecido a partir da criação de associações e sindicatos, quando o trabalhador percebeu sua identidade e descobriu que somente tem força quando atua como grupo organizado e não quando se rebela individualmente.

Toda conquista do Direito do Trabalho conhecida teve seu início a partir das associações que passaram a reivindicar direitos, entre eles o do trabalho exercido por mulheres e menores e na determinação da jornada de trabalho. A partir dessas conquistas, todas as demais vieram se somando até o reconhecimento dos sindicatos e associações e da negociação coletiva e do dissídio coletivo, que vem regulamentar a atividade não mais de todos os trabalhadores, mas as atividades e as necessidades de cada categoria profissional.

Então, com o advento da Lei 9.958/00, cabe a pergunta: que justiça queremos? A Justiça Estatal de há muito se mostra insuficiente por razões múltiplas, que não são neste momento objeto maior de nossa discussão, e em razão dessas dificuldades traz morosidade excessiva para a solução dos litígios além de soluções muitas vezes desastrosas para ambas as partes, inclusive para o trabalhador que mesmo quando faz um acordo o faz de forma desastrosa diante de suas necessidades e do tempo decorrido entre o seu desligamento da empresa e o momento em que se senta na mesa do Estado-juiz para a solução de seu litígio.

Sejamos coerentes. A pressão econômica exercida sobre o trabalhador existe em qualquer hipótese, visto que o empregador não está obrigado, de forma definitiva, a cumprir com os pagamentos devidos ao empregado em razão da rescisão do contrato de trabalho, sendo que o empregado pode ser dispensado sem receber qualquer valor e ser obrigado (não existindo a Comissão de Conciliação Prévia na sua empresa) a ingressar com ação perante a Justiça do Trabalho, que muitas vezes marca a audiência inicial para até seis meses depois da distribuição, o que resultará em um acordo desastroso, caso o empregado não tenha conseguido um emprego até a audiência.

Não entraremos no mérito da resistência da empresa, que poderá ocorrer e levar, nesse caso, a solução desse feito para cinco ou seis anos à frente.

A Lei 9.958/00 em seu primeiro artigo 625-A diz que “As empresas e os sindicatos podem instituir Comissão de Conciliação Prévia (…)”, logo, esta faculdade se mostra semelhante àquela que autorizou a associação de pessoas para a criação de entidades representativas.

No mais das vezes a legislação parte de uma elite muitas vezes despreocupada com o bem estar da maioria, visando apenas os benefícios próprios. No entanto, como bem nos ensina Maquiavel, não existe maior virtude do que aquela de se fazer bom uso e se tirar mérito da adversidade.

A autorização para a criação das comissões permite aos trabalhadores e aos sindicatos promover um trabalho melhor do que aquele que criticamos e que é fornecido pelo Estado.

Todas as vezes que criticamos o Estado, isto em qualquer uma de suas administrações, chamamos para nós a responsabilidade de fazermos algo melhor. Esta oportunidade temos agora, por isso repito a pergunta: Que justiça queremos?

A comissão criada dentro de cada empresa permitirá que os empregados conheçam da realidade das funções que lhe são atribuídas e desenvolvidas, de forma que estarão muito mais próximos das reivindicações a que tem direito.

O empregador estará moralmente pressionado e economicamente dependente quando os empregados organizados acompanharem cada rescisão de contrato de seus colegas, que não poderão mais ser afastados da empresa e jogados na rua sem que toda uma coletividade participe desse momento, solidarizando-se com aquele que mereça, também expurgando aquele que não tenha comportamento compatível com as necessidades daquela coletividade.

O que tem se visto com a novidade da lei é mais uma manifestação de despreparo por parte dos empregados e sindicatos e de corporativismo por parte dos advogados e demais profissionais do Direito, que em vez de lutarem por uma sociedade melhor e mais justa, gritam do alto de suas bancas com temor da perda de espaço profissional e político, esquecendo o que verdadeiramente cada um representa.

Todos somos responsáveis pelo desenvolvimento e pelo progresso econômico e social, principalmente nós que nesse momento temos a oportunidade de democraticamente apresentarmos nossa manifestação para que todos a conheçam para a ela aderirem ou dela discordarem.

As modalidades alternativas para solução de conflitos têm crescido em todo o mundo e a velocidade com que ocorrem as relações impõem a todos essas perspectivas, que não podem ser descartadas. Já está também amplamente demonstrado, não só no Brasil como em outros países desenvolvidos, que o Estado não está aparelhado para atender as atuais necessidades da sociedade na solução de seus conflitos e para atuar como único agente de pacificação social.

Dessa forma, algo precisa ser feito e precisamos assumir as nossas responsabilidades enquanto atores sociais e políticos e não mais nos escondermos, querendo crer que ao Estado cabe toda a responsabilidade para a solução de todos os males sociais e econômicos.

A proposta da Lei 9.958/00 é interessante e poderá ser altamente produtiva se os agentes políticos e econômicos assumirem seu papel e tentarem fazer algo melhor do que o que aí está. Sem temores, sem hipocrisias e sem corporativismos, que com certeza não nos levarão a parte alguma.

Encerro esses comentários com uma reflexão deixada por Wilhelm Reich, que sempre acreditou que o homem pode sempre fazer melhor do que o que lhe mandam fazer : “Amor, trabalho e conhecimento são as fontes de nossa vida. Deveriam também governá-la”.

Revista Consultor Jurídico, 1º de março de 2001.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!