Caos ético-moral

Corrupção na magistratura causa repugnância, diz professor.

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25 de junho de 2001, 0h00

Os avanços tecnológicos, as grandes conquistas da ciência não conseguem esconder o caos ético-moral em que nos encontramos. E nenhuma nação está livre dessa situação. Até mesmo os povos mais abastados sofrem em grau de intensidade às vezes maior do que aqueles que padecem no subdesenvolvimento, da verdadeira degeneração moral que assola a humanidade. A terra é um imenso hospital e nós somos os doentes. O remédio, todos conhecemos. Basta termos coragem e vontade de aplicá-lo.

É chegada a hora, portanto, de abrirmos nossos horizontes a novas idéias. O novo milênio traz consigo um imperativo: mudança. No tocante à ciência do direito e seus operadores é grandiosa a necessidade de uma reformulação.

Calorosos debates são travados na busca de alternativas para o aperfeiçoamento do Judiciário. Procura-se reformar a instituição da Justiça, torná-la mais célere e eficaz; mais viável ao cidadão e, evidentemente, mais justa. Mas como melhorarmos o Judiciário (Instituição, Poder) sem melhorarmos os homens, artífices responsáveis pela distribuição da justiça terrena?

Numa sociedade cada vez mais excludente; num mundo onde somente as desgraças ocupam lugar de destaque nos noticiários; onde há um verdadeiro desprestígio dos valores cristãos, onde o mal é a regra e a bem a exceção, urge priorizarmos o aperfeiçoamento ético e moral dos homens da lei, máxime daqueles que são instrumentos imediatos na luta pela pacificação social: os juízes de direito.

Neste sentido, não há como falarmos de um magistrado ou de qualquer outro profissional, sem inseri-lo no contexto social em que vivemos. O aprimoramento técnico-científico do direito já não basta. Nunca bastou. Necessitamos e sempre necessitaremos de grandes juristas, mas, no momento, carecemos de grandes homens. Não daqueles responsáveis por vultosos feitos, mas, sim, daqueles que compreendam a importância e a grandiosidade das pequenas coisas do dia a dia, do trato com seus semelhantes, com os membros de sua família, com os colegas de trabalho, com as partes no processo… Essa é a grande missão da raça humana e, porque não dizer, também dos magistrados.

O fim de nossa existência é, pois, o aprimoramento moral e intelectual e não conseguiremos atingir nosso objetivo sem nos conscientizarmos de nossa imortalidade e de que somos todos filhos de um mesmo Pai.

A nobre missão do juiz está longe de ser, apenas e tão somente, aplicar o Direito positivo. Entretanto, Direito sem justiça não é Direito. De nada serve, a não ser para escravizar. E não me rotulem de “alternativo”. Embora concorde, em tese, com grande parte do conteúdo desta novel corrente do pensamento jurídico, ainda acredito que a lei, aplicada com o coração voltado à verdadeira justiça (não aquela fria dos códigos) seja, principalmente numa sociedade tão desigual como a nossa ainda o melhor caminho. Os métodos interpretativos e de aplicação do direito estão aí, à disposição de todos os exegetas, basta termos um coração aberto e vontade de bem servir.

E como serem justos os juízes se aqueles a quem prestam seus serviços não o conhecem verdadeiramente? Presume-se que o juiz conheça o direito (iura novit curia); presume-se ser o juiz alguém de inteligência destacada, probo e honesto, qualificado para prestar a jurisdição, capaz de atuar sempre com imparcialidade nos feitos de sua alçada…Na triste e subjetiva definição de muitos, o magistrado é um verdadeiro semideus, vestido em sua toga negra, capaz de dar a cada um o que é seu! Infeliz daqueles que assim pensa.

Com efeito, graça no senso comum o sentimento de que seja o juiz um privilegiado. Na verdade o é, mas não pelos motivos que rotineiramente se lhes atribuem.

A verdade é uma só: o juiz é gente também. Sujeito a todos os acertos e erros, a todas as alegrias e tristezas. Não é mais nem menos. É igual. É espírito e corpo em busca de aperfeiçoamento. No entanto, como servo da justiça, recebeu a incumbência e o poder de julgar. Sobrepõe-se, de certa forma, às demais pessoas da sociedade, não por ser melhor que os outros, mas pelo próprio exercício da parcela de poder que lhe é constitucionalmente atribuída. Ninguém quer ser julgado por um igual, daí a sobreposição natural do magistrado. Mas essa “superioridade” tem seu preço. Um preço muito alto! Afinal, foi Cristo mesmo quem disse: “A quem muito é dado, muito será pedido”.

De todos os males que açodam qualquer profissão, um causa exacerbada repugnância, principalmente quando impingido à magistratura: a corrupção. Aquele que negocia suas sentenças em troca de favores dourados, que faz da toga um disfarce para se esconder daqueles a quem lesa, pode acreditar que, quando chegar a hora do seu derradeiro julgamento não será julgado da forma como fazia, segundo seus escusos interesses. Será julgado com a justiça que, no decorrer da vida negou e, com certeza, suas faltas haverá que reparar.

Não pode, assim, o magistrado, jamais, descurar de seu objetivo, que é, em cada processo, buscar a justiça, acima de tudo. Não aquela de aparências, que sobrepõe a forma ao conteúdo, mas a verdadeira, que repare o dano ao lesado e possibilite ao faltoso tirar de cada deslize uma lição que lhe sirva de impulso a não mais persistir no erro, a caminhar para frente e não retroceder. Punir por punir refoge à Lei de Deus, que deve ser a Lei dos homens. A sanção deve ser ensino. Mais que beneficiar o ofendido deve ser fonte de aprendizado ao ofensor.

Nossa sociedade anseia por uma magistratura que efetivamente responda à sua sede e fome de justiça. Um árduo e doloroso caminho afasta-nos deste compromisso. É chegada a hora de começarmos a trilhá-lo.

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