Equalização de armas

MP Faz procuradores experimentarem seu próprio veneno

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2 de janeiro de 2001, 23h00

Ao dar a chance de defesa prévia às autoridades acusadas de improbidade pelo Ministério Público e – no caso de a imputação ser manifestamente improcedente – o acusado trocar de lugar com o acusador, no mesmo processo, a MP 2.088-35 abriu a polêmica.

O teor crítico dos textos publicados nesta Consultor Jurídico, provocou algumas reações em defesa da norma baixada pelo Palácio do Planalto.

Uma delas é a de que os procuradores, em vez de atacar atos e condutas – o que deve ser objeto de Ação Civil Pública – têm dado preferência ao ataque direto sobre a autoridade, com a Ação de Improbidade Administrativa.

As penas impostas a ato de improbidade são gravíssimas, como a perda do cargo e dos direitos políticos, por exemplo. Mas o mais grave seria o achincalhe e a desmoralização da autoridade, no momento em que a denúncia é apresentada. Mais grave, afirma integrante do corpo jurídico do governo, “porque esses processos não prosperam e sua única finalidade fica sendo a de manchar a reputação do administrador”.

Quanto à defesa prévia antes da instauração de processo, esta já existiria há muitos anos, em relação ao servidor público, no Código de Processo Penal (artigo 514). A MP apenas a teria estendido às autoridades. E em relação à crítica do juiz Fernando Tourinho Neto, que aplaudiu a norma, mas condenou o uso de Medida Provisória, a informação é de que o projeto com este objetivo já tramita no Congresso desde 1996.

O procurador Luiz Francisco de Souza repudiou a subjetividade embutida na MP, que dá ao juiz o poder de arbitrar e punir a existência de eventual má-fé por parte do denunciante. Essa subjetividade, entendem os defensores do governo, é a mesma praticada pelos procuradores “que vêem em uma viagem em avião da FAB motivo para cassação dos direitos políticos de alguém”.

O sentido da MP, afirma-se, é o de equilibrar as relações entre o acusador e o acusado. Na igualdade de armas, o julgamento caberá ao Judiciário. E a reação dos procuradores a essa equalização demonstraria desconfiança no discernimento da Justiça.

Não é verdade, tampouco, que eventual multa ao autor de denúncia improcedente, em caso de má-fé evidente, seria desembolsada pelo próprio Erário – uma vez que o procurador estaria exercendo sua função institucional.

A Ação de Responsabilidade Civil é aplicável e pode recair diretamente sobre a pessoa física do agente. Os exemplos disponíveis são dados por dois casos recentes: o da procuradora da República, Armanda Figueiredo, que acionou o atual ministro do STJ, Francisco Falcão – e foi apenada, na primeira instância, com multa de 100 salários mínimos; e o de um procurador da Paraíba, que denunciou os juízes do TRT da Paraíba (em vias de ser fechado pelo TST) e foi condenado ao pagamento de R$ 1 milhão.

O debate não está encerrado. O Partido dos Trabalhadores já teria apresentado emendas ao texto da MP, ao mesmo tempo em que o Supremo Tribunal Federal deverá examinar, em breve, a constitucionalidade da iniciativa do governo.

Leia a íntegra da Medida Provisória.

Os trechos da polêmica estão grafados em negrito

MP No 2.088-35, DE 27 DE DEZEMBRO DE 2000.

Altera as Leis nos 6.368, de 21 de outubro de 1976, 8.112, de 11 de dezembro de 1990, 8.429, de 2 de junho de 1992, e 9.525, de 3 de dezembro de 1997, e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:

Art. 1º O art. 3º da Lei no 6.368, de 21 de outubro de 1976, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 3º As atividades de prevenção e repressão do tráfico ilícito, do uso indevido e produção não autorizada de substâncias entorpecentes e drogas que causem dependência física ou psíquica, bem como aquelas relacionadas com o tratamento, a recuperação e a reinserção social de dependentes, serão integradas num Sistema Nacional Antidrogas, constituído pelo conjunto de órgãos que exercem essas atribuições nos âmbitos federal, estadual, distrital e municipal.

…………………………………………………………………..” (NR)

Art. 2º Os arts. 25, 46, 47, 91, 117 e 119 da Lei no 8.112, de 11 dezembro de 1990, passam a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 25. Reversão é o retorno à atividade de servidor aposentado:

I – por invalidez, quando junta médica oficial declarar insubsistentes os motivos da aposentadoria; ou

II – no interesse da administração, desde que:

a) tenha solicitado a reversão;

b) a aposentadoria tenha sido voluntária;

c) estável quando na atividade;

d) a aposentadoria tenha ocorrido nos cinco anos anteriores à solicitação;

e) haja cargo vago.

§ 1º A reversão far-se-á no mesmo cargo ou no cargo resultante de sua transformação.

§ 2º O tempo em que o servidor estiver em exercício será considerado para concessão da aposentadoria.

§ 3º No caso do inciso I, encontrando-se provido o cargo, o servidor exercerá suas atribuições como excedente, até a ocorrência de vaga.

§ 4º O servidor que retornar à atividade por interesse da administração perceberá, em substituição aos proventos da aposentadoria, a remuneração do cargo que voltar a exercer, inclusive com as vantagens de natureza pessoal que percebia anteriormente à aposentadoria.

§ 5º O servidor de que trata o inciso II somente terá os proventos calculados com base nas regras atuais se permanecer pelo menos cinco anos no cargo.

§ 6º O Poder Executivo regulamentará o disposto neste artigo.” (NR)

“Art. 46. As reposições e indenizações ao erário, atualizadas até 30 de junho de 1994, serão previamente comunicadas ao servidor ou ao pensionista e amortizadas em parcelas mensais cujos valores não excederão a dez por cento da remuneração ou provento.

§ 1º Quando o pagamento indevido houver ocorrido no mês anterior ao do processamento da folha, a reposição será feita imediatamente, em uma única parcela.

§ 2º Aplicam-se as disposições deste artigo à reposição de valores recebidos em cumprimento a decisão liminar, a tutela antecipada ou a sentença que venham a ser revogadas ou rescindida.

§ 3º Nas hipóteses do parágrafo anterior, aplica-se o disposto no § 1º deste artigo sempre que o pagamento houver ocorrido por decisão judicial concedida e cassada no mês anterior ao da folha de pagamento em que ocorrerá a reposição.” (NR)

“Art. 47. O servidor em débito com o erário, que for demitido, exonerado ou que tiver sua aposentadoria ou disponibilidade cassada, terá o prazo de sessenta dias para quitar o débito.

Parágrafo único. A não quitação do débito no prazo previsto implicará sua inscrição em dívida ativa.” (NR)

“Art. 91. A critério da Administração, poderão ser concedidas ao servidor ocupante de cargo efetivo, desde que não esteja em estágio probatório, licenças para o trato de assuntos particulares pelo prazo de até três anos consecutivos, sem remuneração.

Parágrafo único. A licença poderá ser interrompida, a qualquer tempo, a pedido do servidor ou no interesse do serviço.” (NR)

“Art. 117. …………………………………………………………………..”

X – participar de gerência ou administração de empresa privada, sociedade civil, salvo a participação nos conselhos de administração e fiscal de empresas ou entidades em que a União detenha, direta ou indiretamente, participação do capital social, sendo-lhe vedado exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário;

…………………………………………………………………..”” (NR)

“Art. 119. …………………………………………………………………..”

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica à remuneração devida pela participação em conselhos de administração e fiscal das empresas públicas e sociedades de economia mista, suas subsidiárias e controladas, bem como quaisquer empresas ou entidades em que a União, direta ou indiretamente, detenha participação no capital social, observado o que, a respeito, dispuser legislação específica.” (NR)

Art. 3º Os arts. 11 e 17 da Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992, passam a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 11. ……………………………………………”

VIII – instaurar temerariamente inquérito policial ou procedimento administrativo ou propor ação de natureza civil, criminal ou de improbidade, atribuindo a outrem fato de que o sabe inocente.” (NR)

“Art. 17 ………………………………………….”

§ 6º A ação será instruída com documentos ou justificação que contenham indícios suficientes da existência do ato de improbidade ou com razões fundamentadas da impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas.

§ 7º Estando a inicial em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do indiciado, para oferecer resposta por escrito, que poderá ser instruída com documentos e justificações, dentro do prazo de quinze dias.

§ 8º O juiz rejeitará a ação, em despacho fundamentado, se convencido, pela resposta do réu, da inexistência do ato de improbidade ou da improcedência da ação.

§ 9o Recebida a ação, será o réu citado para apresentar contestação.

§ 10. O réu poderá, em reconvenção, no prazo da contestação, ou em ação autônoma, suscitar a improbidade do agente público proponente da ação configurada nos termos do art. 11, incisos I e VIII, desta Lei, para a aplicação das penalidades cabíveis.

§ 11. Quando a imputação for manifestamente improcedente, o juiz ou o tribunal condenará nos mesmos autos, a pedido do réu, o agente público proponente da ação a pagar-lhe multa não superior ao valor de R$ 151.000,00 (cento e cinqüenta e um mil reais), sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior.

§ 12. Aplica-se aos depoimentos ou inquirições realizadas nos processos regidos por esta Lei o disposto no art. 221, caput e § 1º , do Código de Processo Penal.” (NR)

Art. 4º O art. 2º da Lei no 9.525, de 3 de dezembro de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 2º Aplica-se aos Ministros de Estado o disposto nos arts. 77, 78 e 80 da Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990, exceto quanto ao limite de parcelamento das férias, cabendo àquelas autoridades dar ciência prévia ao Presidente da República de cada período a ser utilizado.” (NR)

Art. 5º Ficam convalidados os atos praticados com base na Medida Provisória nº 1.964-34, de 21 de dezembro de 2000.

Art. 6º Esta Medida Provisória entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 7º Revogam-se:

I – o art. 26 da Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990;

II – o inciso III do art. 61 e o art. 67 da Lei no 8.112, de 1990, respeitadas as situações constituídas até 8 de março de 1999;

III – a Medida Provisória nº 1.964-34, de 21 de dezembro de 2000.

Brasília, 27 de dezembro de 2000; 179º da Independência e 112º da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

José Gregori

Pedro Malan

Martus Tavares

Alberto Mendes Cardoso

Revista Consultor Jurídico, 3 de janeiro de 2001.

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