Projeto antigreve

Projeto extingue direito de greve de servidores, diz Costa Leite.

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30 de dezembro de 2001, 16h33

O Palácio do Planalto enviou ao Congresso, na última semana do ano, o projeto de lei que limita o direito de greve do funcionalismo público previsto na Constituição, até hoje não regulamentado.

Na opinião de sindicalistas e juízes, o projeto, na prática, proíbe a greve do servidor público em quaisquer circunstâncias.

O texto proíbe que o governo pague os salários dos dias parados, se a greve for considerada ilegal. Se for legal, os servidores receberão os salários, mas terão de repor os dias parados.

O ministro-chefe da Casa Civil, Arthur Virgílio, disse acreditar na aprovação do projeto no ano que vem, apesar da campanha eleitoral.

O projeto exige que as decisões de greve sejam tomadas em assembléia geral com a presença mínima de dois terços dos integrantes da categoria, e a proposta precisa ser aprovada por maioria absoluta dos presentes.

Segundo exposição de motivos dos ministros Martus Tavares (Planejamento) e Aloysio Nunes Ferreira (Justiça), o objetivo da exigência é impedir que um número reduzido de pessoas decida pela maioria.

Conforme o projeto, a administração pública precisa ser avisada com 30 dias de antecedência sobre a greve, quando poderá apresentar proposta conciliatória.

O projeto também prevê a obrigatoriedade de manutenção durante a greve de no mínimo 50% dos servidores em atividade, de forma a garantir a continuidade dos serviços.

Na opinião do ministro Paulo Costa Leite, presidente do Superior Tribunal de Justiça, o governo usou o pretexto da regulamentação para, na prática, impedir o direito de greve dos servidores.

“Como está, em relação ao quorum de 2/3, o projeto está simplesmente frustrando o exercício de um direito assegurado pela Constituição”, afirmou o ministro.

Para ele, é preciso que haja um amplo debate sobre esse ponto e outros que poderão cercear “uma conquista importante dos servidores públicos, como é o direito de greve”.

Pelo que dispõe a proposta, diz Costa Leite, “não haverá greve legal de funcionário público e o Judiciário pagará o pato pois caberá a ele decretar a ilegalidade do movimento”. O Executivo se sairia bem “e o Judiciário será, mais uma vez, usado como bode expiatório. Isso nós não vamos aceitar passivamente”, alertou ele.

Leia a íntegra do Projeto de Lei

Disciplina o exercício do direito de greve dos servidores públicos dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, previsto no art. 37, inciso VII da Constituição e dá outras providências.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º Esta Lei disciplina o exercício do direito de greve dos servidores públicos da Administração Pública direta, autárquica ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e estabelece os termos e os limites para o seu exercício.

Art. 2º Considera-se exercício regular do direito de greve a suspensão coletiva, temporária e pacífica de serviço ou atividade estatal dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Art. 3º Será suspenso de ofício, pela autoridade competente, o pagamento da remuneração do servidor em greve, relativamente aos dias não trabalhados.

§ 1º Declarada a legalidade da greve, será restabelecido o pagamento da remuneração, com efeitos retroativos à data de sua suspensão, ficando o servidor obrigado a repor os dias não trabalhados, mediante jornada diária acrescida de duas horas.

§ 2º Declarada a ilegalidade da greve, é vedada a reposição do pagamento dos dias paralisados.

Art. 4º Cabe à entidade representativa dos servidores públicos convocar assembléia-geral específica para deliberar sobre suas reivindicações perante o Poder Público.

Parágrafo único. Inexistindo entidade representativa dos servidores públicos, estes se farão representar por comissão de liderança do movimento grevista que, para os fins desta Lei, terá capacidade processual.

Art. 5º As decisões da assembléia-geral somente poderão ser tomadas com a presença mínima comprovada de dois terços do total dos servidores da categoria, considerando-se aprovadas se obtiverem a maioria absoluta dos votos dos membros presentes.

Art. 6º As deliberações aprovadas em assembléia-geral, com indicativo de greve, serão notificadas ao Poder Público para que se manifeste no prazo de trinta dias, acolhendo as reivindicações, apresentando proposta conciliatória ou fundamentando a impossibilidade de seu atendimento.

§ 1º A omissão do Poder Público ou a frustração da tentativa conciliatória no prazo previsto neste artigo permitirá aos servidores decidir pela paralisação dos serviços, em assembléia-geral específica.

§ 2º Decidindo a assembléia-geral pela paralisação de serviço ou atividade pública, caberá à entidade representativa dos servidores comunicar tal fato ao Poder Público, com antecedência mínima de dez dias.

§ 3º No prazo estabelecido no § 2º deste artigo, a entidade representativa deverá informar à comunidade sobre as reivindicações apresentadas ao Poder Público.

Art. 7º Durante a greve deverá ser mantido percentual mínimo de cinqüenta por cento de servidores em atividade, de forma a garantir a continuidade dos serviços ou das atividades públicas.

Art. 8º São assegurados aos servidores em greve:

I – a livre divulgação do movimento grevista; e

II – atos de convencimento dos servidores para adesão à greve, fora do local de serviço, e mediante o emprego de meios pacíficos.

Parágrafo único. As manifestações e atos de convencimento utilizados pelos servidores em greve não poderão impedir o regular funcionamento do serviço ou da atividade pública, a liberdade de locomoção, o acesso ao trabalho, aos logradouros e prédios públicos, nem causar ameaça ou dano à pessoa ou ao patrimônio público ou privado.

Art. 9º A ameaça concreta de deflagração de greve autoriza o Poder Público a ingressar em juízo postulando a declaração de ilegalidade do movimento, inclusive liminarmente.

§ 1º Sob pena de indeferimento, a petição inicial da ação a que se refere o caput será obrigatoriamente instruída com os documentos necessários ao pronto julgamento da causa, requisito também exigido da contestação, sendo vedada dilação probatória a pedido das partes.

§ 2º As manifestações do Ministério Público serão proferidas no prazo improrrogável de dez dias.

§ 3º O Poder Público poderá postular liminarmente a fixação de percentual de servidores em atividade, superior ao definido no art. 7º, quando, por sua natureza, a atividade assim o exigir.

§ 4º Da decisão que julgar o pedido de liminar caberá agravo de instrumento, a ser julgado na sessão seguinte à sua interposição, independentemente da concessão de efeito suspensivo ao recurso.

§ 5º Da decisão que julgar o agravo de que trata o § 4º caberá pedido de suspensão ao Presidente do Tribunal competente para julgar eventual recurso especial ou extraordinário, ainda que pendente de juízo de admissibilidade no tribunal de origem.

§ 6º Da decisão que indeferir o pedido de que trata o § 5º caberá agravo no prazo de cinco dias, a ser julgado na sessão seguinte à sua interposição.

§ 7º O processo prosseguirá até decisão final sobre a legalidade ou ilegalidade da greve, independentemente do encerramento do movimento de paralisação.

§ 8º Os processos referidos nesta Lei terão prioridade sobre todos os atos judiciais, salvo habeas corpus e mandado de segurança.

Art. 10. A participação em greve, após declarada sua ilegalidade, produzirá os efeitos de falta não justificada, a partir da data de início do respectivo movimento grevista.

Art. 11. Enquanto não declarada ilegal é vedada a demissão de servidor, exceto na hipótese de conclusão de processo administrativo disciplinar que tenha por objeto fato não relacionado com a participação na greve.

Art. 12. Em caso de manutenção da greve após a declaração de ilegalidade do movimento, a Justiça imporá à entidade representativa dos servidores pena cominatória em valor não superior a R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) por dia de paralisação, até a cessação completa do movimento.

Art. 13. Será declarada ilegal a greve deflagrada em desacordo com o disposto nesta Lei.

Art. 14. O art. 132 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, passa a vigorar acrescido dos seguinte inciso XIV:

“XIV – prática, durante a greve, de qualquer ato que viole os direitos e garantias fundamentais de outrem, impedindo o acesso ao trabalho, perturbando o regular funcionamento do serviço ou atividade pública ou causando ameaça ou dano a propriedade ou a pessoa.” (NR).

Art. 15. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

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