Delitos de informática

Veja a íntegra do projeto que prevê penas para delitos de informática

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24 de dezembro de 2001, 9h49

Práticas criminosas na área de informática poderão ser previstas em lei específica. No início do próximo ano, a Comissão de Educação do Senado deve apreciar o Projeto de Lei 76/00, de autoria do senador Renan Calheiros (PMDB-AL).

De acordo com o projeto, que destoa do conjunto de propostas em exame no Congresso, constituem crimes de uso indevido de informática os que ferem a inviolabilidade de dados e sua comunicação, a propriedade e o patrimônio, a honra e a vida privada, a integridade física das pessoas, o patrimônio fiscal, a moral pública e opção sexual e a segurança nacional. O projeto prevê penas para cada tipo de crime, que podem ser de detenção, reclusão e multa.

Segundo o autor, ao definir como conduta delituosa determinados procedimentos não tipificados no Direito Penal brasileiro, o projeto pretende preencher uma lacuna existente no ordenamento jurídico.

Para o advogado Zanon de Paula Barros, do escritório Leite, Tosto e Barros Advogados Associados, o projeto é uma verdadeira “aberração”. “Pelo texto (Art.1, § 1º, incisos I, IV e V), a pessoa que apagar, suprimir ou modificar dados que ela mesma inseriu e utiliza, mesmo que não sejam de interesse de outrem, estará sujeita à pena de um a seis meses de detenção”, disse o advogado.

Ele esclarece que a regra punitiva somente seria razoável se impedisse a modificação, destruição e supressão de dados alheios ou de dados contábeis de interesse do Fisco. “Pode ter sido esta a intenção, não esclarecida, do autor do projeto”, ressalta.

O advogado também faz ressalvas à redação dada ao § 4º, que estabelece pena para o crime contra a vida e integridade física das pessoas. Segundo Zanon, enquanto o mundo busca meios legais para conter o terrorismo, o senador estabelece pena de reclusão de um a seis anos e multa para quem fere ou mata alguém, utilizando explosivos ativados por meio de processos informatizados.

“É um benefício dado ao terrorista, pois, de acordo com o Código Penal, a lesão corporal, dependendo de sua gravidade, pode ser punida com reclusão de até oito anos e se resultar em morte a pena pode chegar até doze anos”, afirma.

O advogado Frederico Diamantino, do Diamantino Advogados Associados, acredita que, mesmo com uma lei específica para delitos de informática, o Brasil precisará firmar acordos internacionais para garantir a punição de crimes cometidos por estrangeiros.

Segundo Diamantino, o autor do projeto se equivoca quando propõe um parágrafo que estabelece pena para crimes de segurança nacional. “O grande sucesso da Internet é a democratização da informação. Restringir ou perseguir pessoas por indução a atos de subversão ou ainda por difusão de informação atentatória à soberania nacional, como preceitua o projeto, são atos tão perigosos como os crimes que podem ser cometidos”.

Veja a íntegra do projeto do senador Renan Calheiros

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 76, DE 2000.

Define e tipifica os delitos informáticos, e dá outras providências.

O CONGRESSO NACIONAL decreta,

Art. 1º Constitui crime de uso indevido da informática:

§ 1º contra a inviolabilidade de dados e sua comunicação:

I – a destruição de dados ou sistemas de computação, inclusive sua inutilização;

II – a apropriação de dados alheios ou de um sistema de computação devidamente patenteado;

III – o uso indevido de dados ou registros sem consentimento de seus titulares;

IV – a modificação, a supressão de dados ou adulteração de seu conteúdo;

V – a programação de instruções que produzam bloqueio geral no sistema ou que comprometam a sua confiabilidade.

Pena: detenção, de um a seis meses e multa.

§2º contra a propriedade e o patrimônio:

I – a retirada de informação privada contida em base de dados;

II – a alteração ou transferência de contas representativas de valores;

Pena: detenção, de um a dois anos e multa.

§ 3º contra a honra e a vida privada:

I – difusão de material injurioso por meio de mecanismos virtuais;

II – divulgação de informações sobre a intimidade das pessoas sem prévio consentimento;

Pena: detenção, de um a seis meses e multa.

§ 4º contra a vida e integridade física das pessoas:

I – o uso de mecanismos da informática para ativação de artefatos explosivos, causando danos, lesões ou homicídios;

II – a elaboração de sistema de computador vinculado a equipamento mecânico, constituindo-se em artefato explosivo;

Pena: reclusão, de um a seis anos e multa.

§ 5º contra o patrimônio fiscal :

I – alteração de base de dados habilitadas para registro de operações tributárias;

II – evasão de tributos ou taxas derivadas de transações “virtuais”;

Pena: detenção, de um a dois anos e multa.

§ 6º contra a moral pública e opção sexual:

I – a corrupção de menores de idade;

II – divulgação de material pornográfico;

III – divulgação pública de sons, imagens ou informação contrária aos bons costumes.

Pena: reclusão, de um a seis anos e multa.

§ 7º contra a segurança nacional:

I – a adulteração ou revelação de dados declarados como reservados por questões de segurança nacional;

II – a intervenção nos sistemas de computadores que controlam o uso ou ativação de armamentos;

III – a indução a atos de subversão;

IV – a difusão de informação atentatória a soberania nacional.

Pena: detenção, de um a dois anos e multa.

Art. 2º Os crimes tipificados nos §§ 1º a 3º são ações penais públicas condicionadas a representação e os demais ações penais incondicionadas.

Art. 3º Qualquer um desses crimes que venha a ser praticado contra empresa concessionária de serviços públicos, sociedades de economia mista ou sobre qualquer órgão integrante da administração pública terão suas penas aumentadas para dois a seis meses e multa, nos casos dos §§1º e 3º e de um ano e seis meses a dois anos e seis meses e multa nos demais casos.

Art. 4º Caso seja praticado qualquer um dos crimes tipificados nesta Lei como meio de realização ou facilitação de outro crime, fica caracterizada a circunstância agravante qualificadora, aumentando-se a pena de um terço até a metade.

Art. 5º Todos os crimes por uso indevido de computador estão sujeitos a multa igual ao valor do proveito pretendido ou do risco de prejuízo da vítima.

Art. 6º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

O espaço cibernético é um mundo virtual onde os defeitos e os atos ilícitos dos seres humanos se reproduzem com a mesma facilidade como as suas virtudes e suas atividades lícitas.

O uso da tecnologia informática é um instrumento que facilita o desenvolvimento social e cultural da sociedade, permitindo que um número crescente de pessoas tenham acesso a esta tecnologia, utilizando-a nas suas diversas atividades, como educativas, comerciais, industriais e financeiras, entre outras.

Paralelamente a este avanço tecnológico surgiram novas formas de conduta antisocial fazendo dos equipamentos de informática, meios de delinqüência e de infrações.

Entre as condutas ilícitas mais comuns que constituem os chamados “delitos informáticos” estão: o acesso não autorizado a computadores e sistemas eletrônicos, a destruição e alteração das informações, a sabotagem por computadores, a intercessão de correio eletrônico, a fraude eletrônica e a transferência ilícita de fundos.

A Organização das Nações Unidas reconheceu que este tipo de delito é um sério problema, já que vários países não adequaram suas legislações mediante a criação de novos tipos penais e procedimentos de investigação. Países membros da União Européia têm uma regulamentação mais abrangente no campo da informática, incluindo a segurança de dados, as criações intelectuais relativas à informática, defraudação informática, entre outros. Estabelecem como condição de acesso aos seus arquivos policiais que o país solicitante tenha legislação protetora da privacidade informática. A Alemanha, a França e a Áustria criaram uma lei específica para tal, enquanto que os Estados Unidos, a Argentina e a Espanha optaram por inclusão em seus Códigos Penais.

A tipificação desse tipo de delito pelas legislações de todos os países é medida urgente e que não pode esperar mais. Como afirmativa disso tivemos recentemente a invasão dos principais “sites” da rede mundial de computadores “INTERNET”, que sofreu ação dos chamados “hackers” ou piratas cibernéticos. Essa ação, embora não tenha chegado atingir diretamente aos consumidores, impediu a oferta de serviços, pois tiraram os sites do ar. É difícil medir a dimensão de uma ação desta e de outras modalidades de ataque, como as realizadas por piratas chineses que invadiram páginas do Governo Americano para protestar contra o bombardeio da Embaixada da China em Belgrado, ou a suspensão das atividades do Lloyds em Londres ao descobrir invasão de hackers, e ainda a constatação da American Express e da Discover que vários números de seus cartões haviam sido descobertos e publicados ensejando sua substituição. Estes são exemplos recentes e é preciso que estejamos preparados para aplicar a punição devida a este tipo de delito, desencorajando qualquer conduta incentivada por esses piratas cibernéticos, até agora de difícil identificação, mas não é, de forma alguma, tarefa impossível. Acresça-se ainda que, a tipificação desse delito, possibilitará, inclusive, a reparação de danos prevista no Direito Civil, pois é princípio fundamental do Direito Penal : “não há crime se não há lei que o defina.”

Uma questão tem sido suscitada em razão das características peculiares ao cometimento deste tipo de delito: a possibilidade de ser feito à distância, envolvendo diversos países, motivo pelo qual surgem dificuldades vinculadas ao Direito Internacional, em especial no que diz respeito a quem compete investigar e punir tais ilícitos. Assim, há que se considerar sempre os princípios que determinam a jurisdição internacional para sua aplicação em nosso território.

Assim sendo, faz-se mister a tipificação deste tipo de delito, bem como a sua punição, cuja penalidade deve ser estabelecida de forma a desincentivar o seu cometimento.

Procuramos tipificar cada delito, utilizando classificação similiar àquela adotada pelo Código Penal Brasileiro, bem como para o critério básico de aplicação da pena, sempre sem prejuízo da punibilidade aplicável a cada caso, quando de sua utilização para cometimento de outros crimes já tipificados pelo Código Penal.

Em razão do exposto, entendemos que este projeto ao definir como conduta delituosa determinados procedimentos até agora não tipificados no nosso Direito Penal, pretende preencher uma lacuna existente no ordenamento jurídico, colocando nosso país em igualdade com outros tantos.

Isto posto, é de suma importância contarmos com o apoio imprescindível dos nobres colegas na aprovação do presente projeto.

Sala de Sessões, em

Senador RENAN CALHEIROS

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