Acordo coletivo

Advogado critica Projeto de Lei que altera CLT

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3 de dezembro de 2001, 14h42

A questão do “negociado” e do “legislado” parece ser a tônica dos debates no momento. Como sempre, posições se radicalizam diante do tema. De um lado, Sindicato de trabalhadores, juízes especializados ou não e parlamentares manifestando repúdio ao projeto de lei n.º 5.483/01. De outro, por paradoxal que possa parecer, Sindicatos de Trabalhadores, parlamentares, juízes trabalhistas ou de outras cortes defendendo a prevalência da CLT. A divergência de opiniões reina absoluta.

Numa análise simplista, podemos concluir que os que se dizem contrários ao projeto do Governo são retrógrados e os demais,vale dizer, os favoráveis à imediata alteração do texto consolidado seriam progressistas! O velho dilema maniqueísta que ronda nossas vidas.

Com efeito, é nesse fogo cruzado, repita-se, que está para ser votado o Projeto de Lei do Governo Federal, que objetiva introduzir nova redação ao artigo 618 da CLT, viabilizando a negociação entre patrões e empregados, devidamente representados pelas entidades sindicais, de tudo aquilo que não contrarie a Magna Carta, assim como assuntos ligados à medicina e segurança do trabalho.

É certo que um substitutivo ao projeto de Lei n.º 5.483/01 já foi apresentado pelo Deputado Federal Ney Lopes, por meio do qual se objetiva “abrandar politicamente” o impacto gerado pelo texto primitivo, a fim de se estabelecer que “os Acordos Coletivos de Trabalho ou Convenções Coletivas de Trabalho poderão convencionar sobre assuntos que não contrariem a “Constituição Federal, Lei Complementar, Lei n.º 6.321/76, Lei n.º 7.418/85, a legislação tributária, a previdenciária e a relativa ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, bem como as normas de segurança e saúde do trabalho.”

De concreto, no entanto, a alteração revela a mesma intenção consignada no texto primitivo, daí porque, no meu entendimento, o substitutivo propõe uma saída apenas política para viabilizar a aprovação do projeto de lei.

Não se pode negar a importância da discussão que está sendo travada no Congresso Nacional, notadamente sobre a imperiosa necessidade de se alterar a CLT, atualizando-a diante dos efeitos da mundialização e, principalmente, assegurando-se competitividade à classe empresarial.

Apesar do atual contexto, ainda sobram a ambos os lados argumentos contra e a favor de mudanças no artigo 618 consolidado, mas referidos posicionamentos não serão exauridos no presente artigo, na medida em que há uma questão que deve anteceder a conveniência ou não de se alterar a CLT nos moldes propostos.

Há, nesse sentido, que se colocar o dedo na ferida, antes de se esgotar melancolicamente a discussão sobre o tema que, no meu entendimento, ocorrerá independentemente da aprovação ou rejeição do referido projeto de lei. Isto porque somente com a modificação na atual estrutura sindical vigente é que efetivamente poderemos pretender lançar vôos mais altos no caminho da negociação trabalhista e, com isso, deixar de lado a crise de representatividade que assola grande parte das entidades sindicais.

Nessa linha de raciocínio o que se pode esperar das negociações entre sindicatos e empresas após a alteração da CLT? Permitir a livre negociação para um País que acolhe, aproximadamente, 18.000 entidades sindicais (1) ? Permitir a livre negociação num sistema sindical que, em grande número, ainda se sustenta devido às custas de contribuições sindicais compulsórias? Permitir a livre negociação para um sistema que ainda cultua o arcaico formato da unicidade sindical fruto do intervencionismo da era Vargas? Permitir aos sindicatos de cartório ou sindicatos sem qualquer representatividade “legislar” sobre direitos trabalhistas? Permitir que assembléias de Sindicatos, cujos associados não ultrapassam uma centena, decidam, por maioria, o destino de milhares empregados de uma categoria?

Todas estas questões sem definição levam-me ao convencimento de que a aprovação do projeto, no presente momento, não se apresentará como medida profilática, mas sim temerária.

Tenho certeza que, assim como eu, muitos defendem com grande entusiasmo as mudanças que se fazem necessárias no texto consolidado. No entanto, aquilo que se está pretendendo modificar de forma açodada poderá gerar um efeito contrário na tão almejada necessidade de se transformar o atual cenário legal trabalhista, gerando no pensamento do comum a idéia equivocada de que ações nesse sentido somente visam pulverizar direitos conquistados ao longo de inúmeros anos e, pior, enfatizando-se o pensamento de que a mão do Estado deve continuar “regendo” o capital e o trabalho, em que pese a capacitação dos atores sociais resolverem seus próprios conflitos, desde que em bases sólidas.

Precisamos ter coragem de dizer que a atual estrutura sindical já não serve mais, alerta esse que vale para os sindicalistas de entidades patronais, como também aos sindicatos que representam a classe dos trabalhadores. Após referida mudança, patrões e empregados estarão preparados para agir com mais eficiência e transparência no campo negocial na busca de uma convivência mais harmoniosa entre o capital e trabalho.

Sob essa ótica, entenda-se, manifestar desagrado a aprovação ao projeto do governo na forma como está sendo colocada a discussão deve ser registrada como um posicionamento progressista e não retrógrado.

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