Devassa fiscal

Justiça paulista determina quebra de sigilo fiscal de Maluf

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28 de agosto de 2001, 9h39

A Justiça de São Paulo decretou a quebra do sigilo fiscal do ex-prefeito Paulo Maluf (PPB), acusado de manter ilegalmente aplicações financeiras na Ilha de Jersey. A decisão foi tomada pelo juiz-corregedor, Maurício Lemos Porto Alves, que acolheu requerimento da Comissão Parlamentar de Inquérito da Dívida Pública na Câmara Municipal. Em despacho de cinco páginas, Porto Alves autorizou acesso aos dados de Maluf a partir de 1.º de janeiro de 1993, data de sua posse na Prefeitura.

A devassa fiscal – a primeira já ordenada pela Justiça contra o ex-prefeito – tem base no artigo 5.º, inciso 38, da Constituição e no artigo 198 do Código Tributário Nacional.

Segundo Porto Alves, “o averiguado negou publicamente possuir qualquer valor monetário em instituição financeira no exterior; todavia, como dito na representação (da CPI), ainda que informalmente, surgiram novos e relevantes documentos que indicam o contrário do afirmado”.

O juiz cita detalhes de relatório transmitido pelo Bundesant Für Polizeiwsen – a polícia de inteligência financeira da Suíça. O documento revela que o ex-prefeito abriu pessoa jurídica nas Ilhas Cayman denominada Blue Diamond Ltd, que depois mudou para Red Ruby Ltd. “É notório que Paulo Salim Maluf exerceu a chefia do Poder Executivo municipal, estando, pois, sujeito à investigação por crimes em tese praticados contra a administração pública durante sua gestão ou posteriormente”, assinalou Porto Alves.

O juiz-corregedor também decretou outra vez a quebra do sigilo bancário e telefônico do ex-prefeito. O acesso a essas informações já havia sido permitido na semana passada, acatando requerimento da Promotoria de Justiça da Cidadania, órgão do Ministério Público Estadual que investiga a conta Jersey. Porto Alves transcreve trechos da representação da CPI.

Segundo os vereadores que investigam o rombo nos cofres públicos, quando a ex-prefeita Luiz Erundina encerrou sua gestão, em 1992, a dívida era de R$ 4,45 bilhões. Ao término da administração Maluf, em 1996, a dívida pública encontrava-se em torno de R$ 9,5 bilhões, um aumento de 114%.

Os vereadores também apontam “uma série de irregularidades”, como o superfaturamento de obras públicas – o Túnel Ayrton Senna e Avenida Água Espraiada -, e a emissão supostamente irregular de Letras Financeiras do Tesouro Municipal, no total de R$ 1,53 bilhão para pagamento de precatórios – efetivamente foram pagos R$ 309,3 milhões, “não se sabendo qual a destinação dada ao valor correspondente à diferença”, de acordo com relatório do Tribunal de Contas do Município.

A CPI sustenta que “ao longo dos anos, nos momentos decisivos na vida política do investigado, ao que tudo indica foram abertas contas no exterior, especialmente em bancos suíços, que foram sendo transferidas para o paraíso fiscal de Jersey”.

Extratos – Para o juiz-corregedor, o “direito social deve ter supremacia sobre o individual e é nesse contexto de prevalência do interesse social que a Constituição, ao assegurar a todos o direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse, faz a ressalva do sigilo imprescindível à segurança da sociedade e do Estado”.

Segundo Porto Alves, a presidente da CPI, vereadora Anna Martins (PC do B), “demonstrou estarem formalmente presentes os requisitos ensejadores do deferimento da petição inicial”. O juiz anotou que “um reparo deve ser feito ao argumento usado na representação inicial, quanto à conduta silenciosa ou negativa do investigado, assistido por advogado, ao lhe ser indagado acerca de valores presumivelmente existentes em instituições estrangeiras”.

O juiz autorizou a própria presidente da CPI, mediante requerimento, obter cópias autênticas dos documentos bancários, tributários e telefônicos. Para Porto Alves, “o inquérito parlamentar não pode transformar-se em instrumento de prepotência e nem converter-se em meio de transgressão ao regime da lei; os fins não justificam os meios”. Citando manifestação do ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, o juiz-corregedor observou que “há parâmetros ético-jurídicos que não podem e não devem ser transpostos pelos órgãos públicos, pelos agentes ou pelas instituições do Estado”.

Porto Alves mandou oficiar ao Banco Central solicitando “extratos da movimentação das contas bancárias e aplicações, nacionais ou estrangeiras, existentes a qualquer título (proprietário, beneficiário, tomador, cedente, cessionário, intermediário, procurador, representante, etc, assim identificado por nome, número ou qualquer outra forma) em nome de Paulo Maluf”.

Fonte: O Estado de S. Paulo

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