Maluf sem sigilo

Justiça quebra sigilo bancário e telefônico de Paulo Maluf

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21 de agosto de 2001, 8h00

O juiz-corregedor do Departamento de Inquéritos Policiais de São Paulo, Maurício Lemos Porto Alves, decretou nesta segunda-feira (20/8) a quebra dos sigilos bancário e telefônico (das ligações para o exterior) do ex-prefeito paulistano Paulo Maluf (PPB) e de seis pessoas de sua família a partir de 1º de janeiro de 1993.

O juiz pediu ainda a quebra do sigilo bancário internacional de Maluf e determinou o envio de uma “letter of request” (carta de solicitação) à Procuradoria-Geral de Jersey, paraíso fiscal localizado no canal da Mancha, pedindo à ilha que forneça todas as informações disponíveis sobre as movimentações financeiras de Maluf e de seus parentes.

A decisão foi tomada em um inquérito policial no qual o ex-prefeito de São Paulo é acusado de fraude, desvio de verbas públicas, corrupção, falsificação de documentos e formação de quadrilha.

É a primeira vez que a Justiça quebra os sigilos de Maluf. Cabe recurso da decisão. A Justiça ainda vai analisar o pedido de quebra de sigilo fiscal de Maluf.

No dia 10 de junho, reportagem da Folha informou que autoridades de Jersey bloquearam aplicações financeiras em nome de Paulo Maluf, Sylvia Maluf (sua mulher), Flávio Maluf, Ligia Maluf, Lina Maluf e Octavio Maluf (seus filhos) e de Jacqueline Maluf (mulher de Flávio Maluf).

Segundo o jornal Folha de S.Paulo, as aplicações somariam cerca de US$ 200 milhões. Mas tanto Maluf como seus advogados negam com firmeza o que se tem divulgado.

Foram abertas três investigações no Ministério Público para apurar o caso: um procedimento criminal sobre eventual evasão de divisas, pelo Ministério Público Federal de São Paulo; um inquérito civil sobre possível ato de improbidade administrativa e enriquecimento ilícito, pela Promotoria da Cidadania do Ministério Público do Estado de São Paulo; e um inquérito sobre eventual crime de lavagem de dinheiro, pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), órgão ligado ao Ministério Público do Estado de São Paulo.

No final de junho, o promotor Marcelo Mendroni, do Gaeco, havia feito um pedido para que a Justiça expedisse carta rogatória às autoridades de Jersey, solicitando informações sobre Maluf. O juiz pediu mais informações ao promotor e não mandou a carta.

Em julho, os promotores Silvio Antonio Marques, Nilo Spínola Salgado Filho e Sérgio Turra Sobrane, todos da Cidadania, fizeram o pedido de quebra dos sigilos de Maluf e de seus familiares. Mais uma vez, o juiz não analisou o mérito do pedido e determinou a instauração de inquérito policial pela Polícia Civil.

Nos 30 dias em que o inquérito correu na polícia, Maluf não compareceu para prestar depoimento. Os promotores anexaram mais documentos sobre o caso e o inquérito voltou para o juiz no final da semana passada.

O documento considerado mais importante para a decretação da quebra dos sigilos de Maluf é uma carta enviada pela Procuradoria Geral de Jersey ao promotor Marques, na qual o procurador-geral da ilha confirma a existência de um processo sobre Maluf na ilha.

O procurador-geral de Jersey diz ainda que não poderia fornecer as informações à Promotoria da Cidadania porque as leis de Jersey só permitem o envio de informações sobre movimentações financeiras realizadas na ilha para instruir inquéritos policiais ou processos criminais.

Seguindo as orientações do procurador-geral de Jersey, o promotor Mendroni desistiu do pedido para que fosse expedida uma carta rogatória e solicitou à Justiça que enviasse a “letter of request” para Jersey.

Esse pedido foi atendido esta semana. Com isso, os promotores acreditam que finalmente vão ter acesso às informações de Jersey sobre as movimentações financeiras realizadas por Maluf na ilha.

Outro documento anexado pelo promotor Marques ao inquérito é um ofício enviado à Promotoria da Cidadania por Adrienne Senna, presidente do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), no qual ela confirma ter recebido um pedido das autoridades de Jersey para que informasse sobre a existência de processos que envolvessem a família de Maluf no Brasil. O Coaf é um órgão ligado ao Ministério da Fazenda, que funciona como a unidade de inteligência financeira do Brasil.

O Brasil tomou conhecimento da existência da suposta conta de Maluf e de seus familiares em Jersey por meio do pedido de informações feito pelas autoridades da ilha ao Coaf. A partir daí, o Ministério Público entrou em contato com o paraíso fiscal e passou a suspeitar da origem do dinheiro.

A troca de correspondência entre Mendroni e agentes de investigação de Jersey, contudo, não confirma a existência da alegada conta e nem os valores a ela atribuídos.

A ilha de Jersey é um Território Autônomo pertencente ao Reino Unido. Ela possui 50 bancos, e sua legislação permite a abertura de contas sem a presença do titular.

Além disso, Jersey oferece a vantagem de ser praticamente desconhecida, ao contrário de paraísos como as Ilhas Cayman ou Genebra, e uma facilidade para os brasileiros: dos 80 mil habitantes da ilha, cerca de 10% são portugueses. A maioria dos bancos trabalha com um especialista português para atender preferencialmente a clientes brasileiros.

Com informações de Roberto Cosso, da Folha de S. Paulo

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