Imprensa acuada

ANJ: liberdade de imprensa está ameaçada por condenações

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14 de agosto de 2001, 16h03

A liberdade de imprensa está ameaçada por condenações judiciais em ações por danos morais, fixadas em valores exorbitantes, que comprometem a sobrevivência financeira das empresas jornalísticas e podem até determinar o seu fechamento. A afirmação é da Associação Nacional de Jornais – ANJ – em relatório divulgado sobre a liberdade de imprensa no Brasil, durante o 3º Congresso Brasileiro de Jornais e 1º Fórum de Editores, que acontece no Rio de Janeiro, nos dias 13 e 14 de agosto.

Segundo a ANJ, quando sentenças judiciais são lavradas sem considerar a proporção entre os fatos que motivaram a alegação do dano e o valor pedido da indenização, está sendo imposta censura econômica que penaliza os jornais com fortes impactos financeiros. A ANJ lembrou do caso que ocorreu com o Debate e o Taperá, ambos do interior de São Paulo, ameaçados de fechamento por não poderem suportar financeiramente a condenação que receberam.

O diretor do Comitê de Liberdade de Expressão da ANJ, Marcelo Beraba, diretor da sucursal, no Rio, da Folha de S.Paulo, citou três decisões que atentam contra a liberdade de imprensa. Segundo Beraba, as sentenças mostram “uma tendência perigosa”.

Em junho deste ano, uma juíza de São Paulo não apenas condenou a Rádio Eldorado em processo movido pelo prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro, como fez considerações conceituais contra a plena liberdade de expressão. Em sua decisão, afirma que “a liberdade de expressão não dispensa o controle ético do conteúdo da matéria, por estar em jogo não a mera transmissão de fatos ou idéias, mas a formação de opiniões em grande escala, que decorre do absoluto poder das empresas de comunicação de massa”.

Outro fato criticado pela ANJ ocorreu em julho, quando o governador do Rio, Anthony Garotinho, conseguiu na Justiça impedir temporariamente a divulgação jornalística do conteúdo de várias fitas com gravações telefônicas obtidas pelo jornal O Globo. “A decisão da Justiça viola a Constituição brasileira, que repudia a censura prévia, como nesse caso”.

A ANJ também afirma que recente decisão judicial violou a Constituição, ao determinar a apreensão do jornal Tribuna Popular, de São Lourenço do Sul (RS), que publicou denúncia do Ministério Público contra o prefeito municipal, por improbidade administrativa.

A juíza Ana Paula Braga Alencastro mandou apreender o jornal definindo, na liminar concedida, que “a liberdade de imprensa é respeitada e assegurada, mas não é absoluta”.

“Não existe democracia sem liberdade de expressão. Sem imprensa livre, a sociedade fica amordaçada e a cidadania, comprometida”, afirmou Beraba. Para ele, a liberdade de imprensa deve garantir aos profissionais e às empresas de comunicação o exercício pleno da sua missão. “Livre de ameaças, sem pressões, censura ou violência”.

Ele lembrou também que ao determinar o pagamento de valores elevados, fixados ao seu livre arbítrio e sem avaliar a capacidade financeira de quem vai pagar a indenização, a autoridade judicial permite ao ofendido auferir verdadeiro lucro pecuniário. “Assim, a sentença perde o seu caráter reparatório do dano moral para converter-se num lamentável incentivo à chamada indústria das indenizações, que impõe a censura econômica aos jornais, impede o livre exercício da imprensa e institui a auto-censura nos profissionais”.

De acordo com o relatório, a censura econômica apresenta-se também na forma de restrição de publicidade oficial, como a que sofreu o jornal A Tarde, de Salvador-BA. “Deve ser rejeitado com veemência o uso de recursos públicos para punir veículos de imprensa. O único critério aceitável na distribuição de verbas é o critério técnico”, afirmou o jornalista. A diretoria da ANJ, reunida em Fortaleza, no dia 19 de março, condenou formalmente práticas como essa.

Ele lamentou que ainda se use a intimidação contra jornalistas como meio de tentar bloquear o trabalho da imprensa, citando dois exemplos. Em Mato Grosso, um repórter do jornal A Gazeta foi denunciado pelo Ministério Público por porte ilegal de arma que comprou exatamente para fazer reportagem que mostrava a facilidade de se adquirir armamentos na região.

No Rio Grande do Sul, um repórter e um editor do jornal Zero Hora foram intimados a comparecer a uma delegacia de polícia para revelar fonte de matéria investigativa.

O relatório da ANJ mostra outra face da censura, a tentativa de aprovar legislações corrosivas à liberdade de imprensa como as mordaças legais apresentadas no Congresso Nacional que tentam dificultar um dos suportes da atividade jornalística – a investigação – e impedir que as fontes oficiais se manifestem. Acertadamente, foi denominado “Lei Mordaça” o projeto de lei do governo que proíbe informações sobre investigação, inquérito ou processo ou que cheguem a conhecimento de terceiros fatos ou informações contidas em investigações ou processos judiciais.

O relatório completo, produzido pelo Comitê de Liberdade de Expressão, com todas as ocorrências – agressões, censura, ameaça, dentre outras – do último ano está à disposição no site da ANJ: www.anj.org.br

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