Relações trabalhistas

Justiça do Trabalho faz 60 anos com 70 vezes mais processos

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30 de abril de 2001, 0h00

Ao completar 60 anos, neste dia 1º, a Justiça do Trabalho dá mostras de gigantismo e fadiga. Em relação ao início de seu funcionamento, o número de processos recebidos por ano multiplicou-se por 70, enquanto o número de ocupados no Brasil aumentou pouco mais de quatro vezes. A média entre 1941 e 1945 foi de 32,6 mil processos por ano, que passaram para 2,2 milhões entre 1996 e 2000. Nos anos 40, os ocupados no Brasil chegavam a aproximadamente 15 milhões – a maioria ainda em atividades agrícolas -, contra 70 milhões nos anos 90.

O crescimento sobrecarregou o Judiciário, e principalmente por essa razão seus representantes querem decretar o fim da tutela do Estado nas relações de trabalho. ‘É preciso reduzir o seu papel (da Justiça) ao mínimo necessário’, afirma o presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Almir Pazzianotto.

Para ele, grande parte dos dirigentes sindicais se acomodou. ‘E continua esperando que o Estado resolva os seus problemas’, acrescenta. É preciso, diz o ministro, estimular outras modalidades de solução de conflitos, como as comissões de conciliação prévia.

O presidente do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo – o maior entre os 24 TRTs do País -, Francisco Antônio de Oliveira, também defende a negociação direta, mas acrescenta que o Judiciário trabalhista precisa ser melhor equipado. ‘A tendência dela é crescer. É uma Justiça respeitada, que está próxima do fato social. Mas, ao mesmo tempo, é imolada’, comenta.

A Justiça do Trabalho atua há 23 anos no setor. Oliveira acredita que a Justiça trabalhista soube acompanhar as mudanças na economia. ‘Há 23 anos, não falávamos em globalização, flexibilização e terceirização. Nossa deusa tirou há muito a venda que lhe tapava os olhos’, diz, referindo-se ao símbolo da Justiça.

Possivelmente um dos juízes há mais tempo em atividade no País – exatos 40 anos, completados em março -, o ex-presidente do TRT paulista Floriano Vaz da Silva afirma que ‘desafogar’ a Justiça significa não o fim, mas a salvação para ela. ‘A Justiça do Trabalho não dá mais conta de tudo. Ela precisa ser mais enxuta, menos paquidérmica e mais ágil. As partes precisam ser estimuladas a negociar.’

Fórum será aberto em 2002

A burocracia vai atrasar o início das atividades do polêmico Fórum Trabalhista, na Barra Funda. As obras do prédio – suspensas há mais de dois anos, por causa do escândalo envolvendo o ex-juiz Nicolau dos Santos Neto – ainda não foram retomadas, o que deve ocorrer apenas no segundo semestre. Com isso, o presidente do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, Francisco Antônio de Oliveira, que esperava ver a obra concluída em janeiro, já prevê nova data para que o prédio entre em funcionamento: 1º de maio de 2002. ‘Seria uma data espetacular’, afirma.

O primeiro passo para que isso aconteça é a licitação para as obras por parte da Caixa Econômica Federal. A concorrência deveria ter sido aberta em março, mas o prédio ainda está sob controle da Secretaria de Patrimônio da União. Segundo uma fonte, a liberação deve ocorrer dentro de 15 ou 20 dias. A Caixa preferiu não se pronunciar a respeito.

Após o escândalo do desvio de verbas das obras do Fórum Trabalhista, a construção foi suspensa. O ex-juiz, que presidiu o TRT entre 1990 e 1992 e comandou a comissão responsável pela obra, está preso desde o fim do ano passado, após ficar meses foragido. ‘Aquilo é um fato lamentável, que está sendo apurado’, comenta o atual presidente do TRT, avaliando que o episódio já foi superado internamente.

Desde julho do ano passado, a guarda do prédio está sob responsabilidade da Caixa. Em dezembro, foi assinado protocolo que previa a retomada das obras. Após o escândalo, o TRT repassou o fórum para a União, mas depois de várias negociações ficou definido que a obra seria concluída. No edifício da avenida Marques de São Vicente, ficarão concentradas em torno de 100 Varas do Trabalho (denominação atual das antigas Juntas de Conciliação e Julgamento).

Com 25% do volume de processos, a 2ª Região (Grande São Paulo e Baixada Santista) tem 141 Varas. Projeto prevê a criação de outras 21.

Advogado quer reformas

Há mais de 45 anos atuando na área, o advogado e professor Octavio Bueno Magano defende o fim do poder normativo da Justiça. ‘Não tem o menor cabimento’, afirma Magano, ele mesmo um ex-juiz do Trabalho, entre 1955 e 1961. ‘O ideal seria incentivar cada vez mais mecanismos de autocomposição’, acrescenta o especialista, adepto de modalidades privadas de arbitragem. ‘A Justiça foi criada em tempo de intervencionismo estatal intenso e pernicioso.’ Ele cita o exemplo dos Estados Unidos, onde estudou nos anos 60. ‘Não existe Justiça do Trabalho. As relações são reguladas pela vontade das partes ou pelos sindicatos.’

Outro advogado veterano – formado em 1949 -, Agenor Barreto Parente, defende a manutenção do poder normativo. ‘As grandes categorias têm poder de barganha, as pequenas não.’ Ele elogia mecanismos como o do rito sumaríssimo (para ações de até 40 salários mínimos), mas diz que a conciliação prévia deve ser facultativa. Parente critica o excesso de recursos, que faz uma ação durar indefinidamente.

Ações chegam a 42 milhões

Desde a sua criação, em maio de 1941, a Justiça do Trabalho recebeu 42 milhões de processos. Quase 40% desse total refere-se ao Plano Real, lançado em meados de 1994. Mais da metade – 21,5 milhões de ações – deu entrada entre 1991 e 2000. Apenas no ano passado, foram 2,2 milhões de novos processos. O TST rrecebeu 125 mil, os 24 TRTs, 403 mil e as 1.109 Varas do Trabalho, quase 1,7 milhão.

Em seus primeiros anos, a Justiça trabalhista – instalada pelo então presidente Getúlio Vargas durante solenidade no estádio de São Januário, no Rio de Janeiro – foi atrelada ao Executivo. Passou a ser instância do Judiciário em 1946.

‘Vargas tinha aversão a conflitos entre patrões e empregados. Penso que ele via nisso uma espécie de porta de entrada de ideologias extremistas’, analisa o presidente do TST, Almir Pazzianotto. ‘A Constituição de 1937, que serviu de fundamento da CLT (em 1943), considera a greve recurso anti-social, nocivo ao desenvolvimento’, lembra.

Pazzianotto lembra que só 535 cidades brasileiras têm Varas do Trabalho, com jurisdição em 4.728 municípios. ‘Há 833 onde as questões trabalhistas são julgadas por juízes de Direito.’

O ex-presidente do TRT Floriano Vaz da Silva afirma que o crescimento da Justiça do Trabalho causou distorções, com distribuição desigual de recursos e até mesmo casos de nepotismo. ‘De certa forma, a Justiça foi vítima de seu gigantismo. Já se percebe que não podemos continuar querendo instalar Tribunais no País todo’, comenta.

Fonte: Diário Popular

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