Politização em sentenças

Juízes dizem que, em certos casos, ideologia influi em sentenças.

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30 de abril de 2001, 16h57

Para a maioria dos juízes brasileiros, as decisões envolvendo privatização e regulação dos serviços públicos freqüentemente são mais influenciadas pela visão política dos magistrados do que pela leitura rigorosa da lei.

Favorável às reformas introduzidas no Brasil na década de 90, como a abertura da economia, a entrada do capital estrangeiro no setor financeiro e a privatização de setores produtivos, a maioria dos juízes (60%) é contra privatizações na área de infra-estrutura.

As constatações foram feitas pelo Idesp (Instituto de Estudos Econômicos, Sociais e Políticos de São Paulo), que consultou 738 magistrados em 12 Estados sobre a reforma do Judiciário.

Dos pesquisados, 56% vêem “politização” das decisões sobre a privatização. Para 25% dos juízes, ela é “muito frequente”; para 31% deles, é “algo frequente”.

“Essa visão política nas decisões judiciais pode traduzir uma tentativa de favorecer grupos sociais mais fracos, como trabalhadores e pequenos devedores”, diz Armando Castelar Pinheiro, chefe do Departamento Econômico do BNDES e membro do Idesp.

Em seminário promovido pelo Idesp, na última sexta, em São Paulo, ele apresentou resultados de pesquisa que mostra a opinião dos juízes sobre as relações entre o Judiciário e a economia.

Quando há “tensão” entre o cumprimento de contratos, de um lado, e os interesses de segmentos sociais menos privilegiados, de outro, a grande maioria dos juízes (73%) afirma que “tem um papel social a cumprir, e a busca da justiça social justifica decisões que violem os contratos”.

A posição se mostra mais forte quando envolve direitos do consumidor, meio ambiente e disputas trabalhistas e previdenciárias. A maioria defende a necessidade de respeitar contratos quando se trata de causas comerciais.

A “politização” das decisões estaria ligada à morosidade da Justiça e ao ônus, para os juízes, da prática do Executivo e do Legislativo de transferir para o Judiciário disputas essencialmente políticas.

A pesquisa do Idesp também revelou que a resistência dos juízes brasileiros à criação de um órgão de controle do Judiciário diminuiu de forma “extraordinária”, segundo Maria Tereza Sadek, pesquisadora do Idesp e professora de Ciência Política da USP.

A proposta de criação do Conselho Nacional de Justiça, para fazer o controle administrativo do Poder Judiciário, é aprovada por 39%. Em 1993, pesquisa semelhante mostrava que 86,5% eram contra a instituição do conselho.

“É razoável supor que a permanência do tema em debate e o apoio de setores da sociedade civil geraram junto à magistratura um certo entendimento de que se trata de uma inovação ‘inevitável'”, avalia Maria Tereza. As atenções dos juízes, agora, se concentram na composição desse órgão.

Quase a metade (47%) se manifestou contra a inclusão de membros externos ao Judiciário. Dentre os 39% que são favoráveis à sua criação, 67% julgam que o CNJ deve ser composto apenas por membros do Judiciário.

A maioria apóia a Lei da Mordaça: 41,5% dos juízes são a favor, 32% são contra, 22% acham o tema irrelevante e 4% não opinam. A Lei da Mordaça proíbe a divulgação de informações sobre processos em andamento que violem o sigilo legal, a intimidade, a imagem e a honra das pessoas.

“É um índice de apoio mais alto do que fariam supor as discussões na imprensa e sobretudo as manifestações dos integrantes do Ministério Público”, diz Sadek.

De acordo com a pesquisa, 83, 5% dos juízes são favoráveis à redução de possibilidade de recursos aos tribunais superiores. Ao mesmo tempo, 85% consideram irrelevante a expansão dos juizados especiais.

Fonte: Folha de S. Paulo

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