Comércio eletrônico

Conheça as possíveis regras para comércio na Internet brasileira

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5 de março de 2000, 0h00

Para o secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, todas as idéias em torno de uma reforma tributária, hoje, tornaram-se obsoletas com o advento da Internet. O coordenador da Arrecadação Tributária paulista, Clóvis Panzarini, compartilha da opinião.

Sem uma regulamentação específica sobre a matéria, o Judiciário recorre a analogias e aproximações para solucionar o número crescente de casos que já começa a se avolumar nos tribunais.

No âmbito internacional, há um modelo de lei feito pela Uncitral (“United Nations Commission on International Trade Law”) que estabelece recomendações aos países, orientando-os na elaboração de leis sobre comércio eletrônico.

Os principais temas tratados são a definição das relações de comércio eletrônico, assinatura digital, formação e validade de contratos executados em ambiente de rede, aplicabilidade das normas de defesa do consumidor, publicidade e privacidade de informações, entre outros.

No Brasil, há um anteprojeto de lei da OAB paulista que se espelhou no modelo da Uncitral.

De acordo com o advogado Renato Opice Blum, especialista na matéria, o projeto brasileiro foi muito bem elaborado, reproduzindo de maneira exata o modelo internacional. A única crítica de Blum à proposta da OAB refere-se ao grande número de regras técnicas transformadas em normas, como por exemplo os dispositivos sobre criptografia. Segundo Blum, isso pode vir a dificultar as transações comerciais on-line pois o comércio eletrônico é um ramo muito dinâmico, principalmente quando se trata de elementos técnicos.

Embora nenhum projeto de lei tenha sido formalizado até agora, nos últimos meses a jurisprudência avançou muito na determinação do teor de suas decisões. Foram julgados casos no Rio Grande do Sul, envolvendo a empresa Grendene e no Paraná referente à tributação das provedoras. Em São Paulo, várias ações de conteúdo similar foram ajuizadas.

Registro de domínio

A empresa Grendene titular do direito de exclusivo da marca Ryder requisitou o registro de domínio www.ryder.com.br e surpreendeu-se com a existência de um site com esse nome, criado por outra pessoa.

A 4a Câmara do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul decidiu que o domínio cabia à Grendene pois ela é titular da marca Ryder, muito conhecida no mercado.

Problemas como esse ocorrem, pois a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), órgão que efetua o registro de domínio no Brasil, concede esse direito à pessoa que primeiro tiver feito o pedido. Entre a Fapesp e o INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial), responsável pelo registro de marcas, não há ligação alguma.

Assim, a jurisprudência estabeleceu exceções a essa regra de prioridade de domínio, visando proteger os detentores de marcas conhecidas e de alto renome e anular determinados atos de má-fé. A tendência atual é de que a marca famosa ou de alto renome prevaleça sobre a ordem em que foram requeridos os registros de domínio.

Já no caso da Telefónica, uma empresa chamada Greco Internet criou um site www.telefonica.com.br e um e-mail [email protected]. Esse caso ainda não foi julgado.

Há também problemas de marcas registradas em classes diferentes. Nesse caso, é aplicada a regra geral: o site será de quem registrar primeiro.

Constatado o grande número de casos que desrespeitam o direito de uso de marca, a Fapesp tem sido mais cuidadosa ao registrar domínios, comunicando as empresas e personalidades famosas ameaçadas ou até mesmo indeferindo o pedido de registro.

Tributação das provedoras de serviços via Internet

A 6a Vara Cível de Londrina isentou a provedora Sercomtel do pagamento de ICMS por entender que a empresa presta serviço de valor adicionado, hipótese em que não há incidência do imposto.

A discussão gira em torno da classificação dos serviços prestados pela Internet. Se considerados serviços de valor adicionado, incide ISS. Tratando-se de serviços de telecomunicação, incide ICMS.

Porém, as atividades sujeitas ao pagamento de ISS figuram numa lista taxativa, ou seja, não pode ser cobrado o imposto de atividade que não esteja presente no documento. As prefeituras, para legitimar a incidência do ISS, têm considerado que as provedoras prestam serviço de assessoria. As empresas, por sua vez, alegam que o serviço que oferecem é intermediário ao de telecomunicação …

Transações “business to business”

Transações “business to business” são aquelas realizadas entre empresas. Os conflitos que nascem dessas negociações geralmente referem-se à validade das transações on-line, ou seja, à prova de que o negócio é autêntico e verdadeiro.

Essa dúvida é solucionada pela assinatura digital que aponta qualquer alteração feita no acordo sem a conhecimento das partes.

A Receita Federal teria previsto um tipo de autenticação para a apresentação de declarações via Internet. Estranhamente, contudo, embora já haja prazo final para a remessa de informações pela rede, o sistema não foi estabelecido.

Direitos autorais

A conflitos envolvendo direitos autorais, aplicam-se as leis já existentes sobre a matéria. Artigos publicados na Internet serão protegidos pelos instrumentos pertinentes, com exceção daqueles editados pela imprensa.

De acordo com entendimento do TJ de São Paulo, em processo de autoria do advogado João Antonio Cesar da Motta contra o provedor Widesoft e o site Jurinforma “o acesso aos dados lançados na rede não concede ao usuário o direito de dispor deles como melhor lhe parecer, assim como a compra de um livro não dá direito a quem comprou de copiá-lo, revendê-lo ou usar, de forma não autorizada, de seu conteúdo, sem que sejam pagos os direitos autorais”.

Relações de consumo

Tanto o anteprojeto de lei da OAB como o modelo da Uncitral determinam que às relações de consumo on-line serão aplicadas as regras de defesa do consumidor.

Uma dúvida que deriva dessa disposição é a nacionalidade da lei a ser adotada em caso de contrato internacional. Segundo Blum, deve prevalecer a lei do domicílio do ofertante.

Solução de conflitos

As transações eletrônicas tendem a intensificar-se, o que terá como conseqüência grande número de controvérsias envolvendo relações de comércio eletrônico.

O anteprojeto de lei da OAB permite que controvérsias relacionadas à matéria sejam submetidas a juízo arbitral (espécie de justiça particular). Mas resta sempre a possibilidade de recorrer ao Judiciário.

RevistaConsultor Jurídico, 5 de março de 2000.

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