Juízes decepcionados

Ministro Marco Aurélio se diz frustrado com novo teto

Autor

2 de março de 2000, 0h00

Para quem acreditava que a intenção do governo federal era a de racionalizar o sistema remuneratório do serviço público, acabando com penduricalhos e discrepâncias, a proposta definida no Palácio Planalto para a definição do teto salarial foi decepcionante.

É o caso do ministro Marco Aurélio Mendes de Farias Mello, único integrante do Supremo Tribunal Federal que se insurgiu expressamente contra o incongruente acerto divulgado quinta-feira (2/3) pela Presidência da República.

“Receio que, a pretexto de resolver um problema, estejamos criando um problema muito maior”, lamentou Marco Aurélio, em entrevista à Consultor Jurídico.

Ainda na quinta-feira, os temores do ministro começaram a se confirmar. Para o presidente da Associação Nacional dos juízes trabalhistas, Gustavo Alkmin, o acerto no Planalto resumiu-se a um “trem da alegria” do Legislativo.

O presidente da Amatra da 15ª região, Francisco Giordani, classificou a proposta de “imoral”.

No próprio Supremo Tribunal Federal, a maioria dos ministros manifestaram sua frustração com a fórmula definida.

Tecnicamente, Marco Aurélio invocou a previsão feita pela Emenda Constitucional 19, que fixou a exigência de um projeto de lei de autoria conjunta dos presidentes da República, do STF, da Câmara e do Senado – que agora será embutido em uma proposta destinada a tratar do subteto, em tramitação na Câmara.

Em termos políticos – referindo-se à Lei 9.655/98, onde se estabeleceu efeitos financeiros a partir daquele ano e à definição, em 1997, do teto salarial em R$ 12.720,00 – Marco Aurélio citou o romance “O inverno de nossa esperança”, onde Steinberg escreveu que “quando uma luz se apaga, é muito mais escuro do que se jamais houvesse brilhado”.

De qualquer forma, para ele, continuará havendo um teto inócuo, passível de drible pela criatividade brasileira, ficando suplantada a Emenda Constitucional nº 199/98, que sequer foi experimentada.

– “O deboche nacional continuará”, disse Marco Aurélio.

O ministro não quis comentar o fato de os congressistas terem obtido, com a proposta, institucionalizar, acima do limite previsto, ganhos equivalentes a até um teto salarial por mês.

Acompanhando o caso à distância, o presidente do Sindicato dos Procuradores do Estado de São Paulo, Ney Duarte Sampaio, mostrou-se espantado com o tom do noticiário a respeito do assunto. “Entristecedor notar que, embora se aceite, com naturalidade, que um jornalista com altas responsabilidades possa ganhar até R$ 100 mil por mês; e valores muito mais altos sejam pagos a jogadores de futebol, modelos e artistas e não se aceite que um servidor com a responsabilidade de um ministro do STF possa receber R$ 12.720,00”.

Revista Consultor Jurídico, 3 de março de 2000.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!