O desabafo de João

Polêmica: O desabafo de João Figueiredo

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3 de janeiro de 2000, 23h00

A descoberta de uma fita de vídeo gravada há 12 anos na casa do atual prefeito de Paraíba do Sul (RJ), Rogério Onofre de Oliveira (PSD), publicada pelo Jornal do Brasil (JB) e as anotações do decano dos jornalistas que cobrem a área militar, Hélio Contreiras, que hoje trabalha na revista Istoé, trazem à luz mais opiniões e informações dadas pelo ex-presidente João Figueiredo, antes de sua morte em 24 de dezembro passado.

Na gravação – feita durante um descontraído churrasco em 10 de setembro de 1987 – o ex-presidente ataca diversos desafetos políticos como, por exemplo, o presidente do Senado, Antonio Carlos Magalhães: “se houvesse um sistema mundial para medir mau caráter, ele seria a unidade do sistema!”, afirma Figueiredo.

ACM preferiu não contra-atacar. Para ele, as declarações são de um homem doente, “esclerosado”. Outros políticos como o ex-governador do Rio Leonel Brizola e o deputado federal Miro Teixeira também são alvos do ataque. Em relação a Brizola, o ex-presidente afirma que se ele chegar à Presidência “será o maior ditador que o país já viu”.

O presidente das Organizações Globo, Roberto Marinho, é citado como “o dono da opinião pública no país”. O último militar a governar o Brasil afirma que rompeu com a Globo porque não quis dar a Roberto Marinho nenhuma estação de rádio ou TV.

A resposta da emissora ficou a cargo do apresentador Cid Moreira que afirmou, no Fantástico de domingo passado, que o empresário nunca procurou Figueiredo para pedir favores.

Alguns personagens são enaltecidos. Sobre o atual governador de São Paulo, Mário Covas, o general diz se tratar de “um homem sério, inteligente, mas muito de esquerda”.

É confirmada a versão de que o relatório do Inquérito Policial Militar (IPM) que apurou as responsabilidades pelo atentado à bomba do Riocentro não passou de uma farsa para não provocar ainda mais a ira daqueles que se opunham à abertura política iniciada no governo Ernesto Geisel e que teve continuidade no governo de Figueiredo.

O atentado do Riocentro matou o sargento Guilherme do Rosário e feriu o capitão Wilson Machado, em 1981. Acredita-se que os dois iriam provocar um atentado durante o show que comemorava o Dia do Trabalho para retardar o processo de abertura política, mas, acidentalmente, uma das bombas explodiu no Puma dos militares.

Uma segunda bomba explodiu na casa de força de um prédio, sem fazer vítimas. O governo Figueiredo foi marcado por atentados à bomba em bancas de jornais em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Também ocorreram atentados contra a quadra de ensaios as Escola de Samba do Salgueiro e contra a OAB, matando a secretária Lydia Monteiro da Silva.

Pelo texto de Contreiras, publicado na Istoé, Figueiredo tinha conhecimento de que “a investigação seria uma farsa”, mas se omitiu porque “os atentados contra entidades da sociedade civil e bancas de jornais acabariam”. Na transcrição da fita publicada pelo JB, o ex-presidente afirma que “queriam que eu inventasse um réu para acusar, para botar na cadeia. Aí começaram a me acusar de ter acobertado. Não acobertei”.

Nem o Exército escapou do desabafo de Figueiredo. Para o ex-presidente “o Exército brasileiro não é um Exército profissional”. O general afirma que “o soldado tem as mesmas reações de qualquer popular. Então ele se corrompe”. E dá a receita para melhorar as condições da Instituição: “Tem que dar instrução, salário e incutir na mentalidade do soldado que ele é o maior, o melhor, aquilo que se faz com os pára-quedistas no Exército. Se não fizer isso a corrupção vencerá”.

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