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Fapesp: estrangeiros sem sede no Brasil poderão ter registro .br

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19 de dezembro de 2000, 23h00

A Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), órgão encarregado do registro de domínios na Internet brasileira tem uma boa notícia para anunciar, segundo publica a revista Update, da Câmara Americana de Comércio.

A Fundação decidiu liberar o registro de domínio no Brasil para empresas estrangeiras que não têm representação no território nacional. Os procedimentos de registro estarão implantados a partir de meados de janeiro e disponíveis no site da Fapesp.

As empresas estrangeiras poderão nomear um procurador para registrar o domínio, desde que este responsável seja devidamente identificado e validado pelo consulado do país de origem, enquanto conclui a burocracia junto aos órgãos federais e estaduais para atuar no Brasil.

A impossibilidade do registro “.com.br” para nomes e marcas mundiais, sem presença física no Brasil, até agora, vinha provocando uma enorme seqüência de litígios que ainda vão demorar para ser decididos nos tribunais.

O internauta que quiser conhecer, no Brasil, por exemplo, o maior provedor de acesso do mundo – o America Online, mais conhecido como AOL – surpreende-se com o que vê no endereço www.aol.com.br.

É que uma outra empresa, a América On Line Telecomunicações Ltda., registrou antes a famosa sigla em seu nome.

Para resgatar o domínio, a gigante americana conseguiu suspender a utilização do nome na Justiça de Curitiba. Mas os empresários paranaenses conseguiram reverter a situação na segunda instância.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região entendeu que a marca, “enquanto propriedade industrial, não se confunde com nome de domínio na seara das intercomunicações informatizadas”. Outro argumento foi o de que a marca “tem identidade e exaure-se em sua própria formação como elemento autônomo (AOL)”. Ou seja, ao acrescentar a desinência “.br”, tem-se um nome diferente que “não necessariamente corresponde à sua marca” que seria aplicada, estritamente, como endereço de correio eletrônico “e não como indicador de serviços, de produto ou de bem de comércio”, afirmou-se na sentença.

O litígio já dura dois anos e tornou-se objeto do noticiário mundial. Nesse período, o caso chegou até ao Superior Tribunal de Justiça. Transitou entre a primeira e a segunda instância; entre a justiça estadual e a justiça federal e, agora, por decisão do STJ, definiu-se a estadual como órbita adequada.

Mas a empresa curitibana leva nítida vantagem. Não só pelo trabalho de seus defensores – Losso, Malina Losso Advogados Associados – como pelo fato de o registro ter sido feito em 1997, antes, portanto, da vigência da Resolução nº 01, de 15/04/98, emitida pelo Comitê Gestor, que vedou, no Anexo I, a possibilidade do registro de “marcas de alto renome” ou “notoriamente conhecidas” – o que não era o caso da AOL, no Brasil e em 1997, onde aportou no final de 1999 e tornou-se conhecida graças a uma e milionária campanha publicitária.

Enquanto isso, a AOL está fadada a utilizar o longo endereço “americaonline.com.br” no Brasil.

Desfecho diferente teve o caso da Bloomberg, considerada um das duas maiores agências mundiais de notícias da área econômica. O seu nome foi registrado pela empresa Confecções New Top, de propriedade dos paraguaios Lu Fan Chung e Lu Chen Hsiu Mei, junto à Fapesp.

No inicio do ano, o juiz Carlos Eduardo Pachi, da 20ª Vara Cível do Fórum Central do Estado de São Paulo, determinou que a confecção seria multada diariamente em 20 salários mínimos enquanto não desistisse do registro.

A determinação não foi cumprida, o que originou uma dívida no valor de R$ 145 mil. Os representantes legais da Bloomberg no Brasil, o escritório de advocacia Dannemann Siemsen, concederam então um acordo a New Top. Pelo trato, a dívida seria perdoada em troca da desistência imediata do registro. O acordo, contudo, ainda não foi implementado, como se vê no site da Fapesp (registro.br).

O chamado cybersquatting (“grilagem cibernética”), contudo apanhou de surpresa também algumas marcas e nomes de empresas e instituições brasileiras. Foi o caso da rider.com.br (propriedade da Grandene – que acabou fazendo acordo), da Airtonsenna.com.br (Fundação Airton Senna), do www.starwars.com.br (que não chegou à esfera judicial) e dos conhecidos programas da TV Globo, jornalnacional.com.br e globoesporte.com.br. Até mesmo a sigla do INPI chegou a ser registrado no Brasil.

A Justiça, contudo, tende a adotar critérios cada vez menos simplistas. A grilagem, por exemplo, só está sendo considerada assim quando o registrante pretende obter lucro, revendendo o domínio ao possuidor da marca homônima. Leva-se em conta, também, se o registrante tentou induzir o consumidor a erro.

No caso Ayrton Senna e Starwars, por exemplo, o objetivo alegado dos registrantes era o de que se pretendia criar fã-clubes. A empresa paranaense que registrou o domínio “aol”, por exemplo, rechaçou todas as propostas de venda do registro que detém e demonstrou que não induziu os internautas a erro. O que explica a dificuldade do provedor americano na sua luta pelo domínio.

No caso da Globo, a juíza da 7ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo decidiu não só impedir o uso das marcas registradas da emissora como condenou a empresa baiana que edita jornais e revistas a pagar aproximadamente R$ 230 mil, por danos materiais à ofendida.

A juíza entendeu também que a atitude da empresa configurou crime e encaminhou o caso para o Ministério Público, que poderá ajuizar ação penal contra a editora.

A ação foi movida contra a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e contra a ML Editora. No entanto, a juíza da 7ª Vara da Fazenda Pública, entende que para ter direito ao domínio não basta registrar primeiro. Segundo ela, algumas condições previstas nas regras nacionais sobre Internet devem ser preenchidas.

Para se ver que a pirataria cibernética não tem fronteiras, há o caso da “harrods.com”, nome original da famosa loja britânica. Cinco americanos registraram o site. A Suprema Corte Britânica decidiu pelo cancelamento do domínio. Mas, como o órgão americano não estava sujeito à jurisdição britânica, ao solicitar o endereço, o navegador informa que há várias opções de Harrods, inclusive uma que é válida apenas para os Estados Unidos e Canadá.

Nos Estados Unidos, até Bill Gates foi passado para trás. O novo sistema operacional da Microsoft, o windowsme, foi registrado antes que a empresa tentasse fazê-lo. A popstar Madonna, teve o mesmo dissabor. Só no final de outubro ela conseguiu reaver todos os direitos sobre o domínio madonna.com. A marca havia sido registrada pelo empresário da indústria pornográfica, Don Parisi. A Justiça concluiu que Parisi havia registrado e utilizado o domínio com má-fé.

Nesses cinco casos, contudo, observou-se a tendência atual do Judiciário, como nota a advogada Maria Beatriz Bueno Siqueira Nunes, referindo-se à predominância de decisões contra a utilização de domínios com o nome alheio. Quase todos têm sido restituídos a seus respectivos donos. Mas, à exemplo do caso aol.com.br, nota-se que cada caso deve ser analisado de acordo com suas características e peculiaridades.

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