Prerrogativa de foro

Artigo: Prerrogativa de foro, impunidade aprovada em 1º turno.

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17 de abril de 2000, 0h00

Na mesma sessão ocorrida em 22 de março, em que a proposta de instituir a chamada mordaça para os membros do Ministério Público foi derrotada, a Câmara dos Deputados aprovou, em primeiro turno, com o voto de 317 dos seus 513 integrantes, modificação constitucional que prevê a criação da prerrogativa de foro para determinadas autoridades que estejam respondendo às chamadas ações de improbidade.

A referida modificação constitucional foi possível com a apresentação de destaque pelo Deputado Jutahy Junior do PSDB da Bahia ao relatório da Deputada Zulaiê Cobra do PSDB de São Paulo, relativo à proposta de emenda constitucional conhecida como Reforma do Judiciário.

E o que isto significa? Significa, por exemplo, que ministros de Estado e Presidentes de Tribunais como o TRT de São Paulo passarão a responder a ações de improbidade perante o Superior Tribunal de Justiça e não mais perante o Juízo Federal de primeira instância, e os Prefeitos, perante os Tribunais de Justiça Estaduais. Dizem os defensores de tal proposta que isto seria razoável tendo em vista que a Constituição Federal já estabelece tal prerrogativa de foro nas ações penais.

Ora, a questão é que a prerrogativa de foro é um privilégio que não se sustenta nas modernas democracias. Os Tribunais têm vocação para julgar recursos e não atuar em ações originais. É conhecida, até mesmo daqueles que não são profissionais do Direito, a dificuldade de tramitação nessas Cortes dos inquéritos policiais e das ações penais originárias e a prescrição que na maior parte das vezes redundam tais feitos. Por que seria diferente com as ações de improbidade?

A verdade é que as ações de improbidade transformaram-se desde a edição da Lei nº 8429/92, no instrumento mais eficaz de punição daqueles que no exercício da atividade público praticam ilícitos. Basta que leiamos os jornais para verificarmos como essas ações têm tido mais sucesso que as ações penais paralelas.

Os defensores da proposta aprovada em 1º turno de votação na Câmara dos Deputados, como se pode perceber dos discursos proferidos no curso da referida vocação, afirmam que determinadas autoridades não podem ser julgados em ações de improbidade pelo juiz singular pois isso feriria a dignidade de seus cargos.

A pergunta que fica é, então servidores públicos que não possuem prerrogativa de foro prevista na Constituição Federal nas ações penais não teriam dignidade a ser protegida? Seriam seus cargos menos importantes?

Vivenciamos um momento da história brasileira em que a própria prerrogativa de foro para ações penais deve ser repensada e não estendida como pretendem os Senhores Deputados que assim votaram para as ações de improbidade.

Neste sentido, o Supremo Tribunal Federal cancelou a súmula 394 em Agosto de 1999 que previa “Cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de função, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados após a cessação daquele exercício”.

Ainda temos mais um turno de votação na Câmara dos Deputados e dois turnos no Senado Federal e esperamos que a proposta da criação do foro privilegiado para as ações de improbidade não seja definitivamente aprovada.

Por que isso é tão importante? Porque precisamos reafirmar a nossa República e um de seus fundamentos, a cidadania, e a Constituição como pacto social e não como uma folha de papel que serve a poucos.

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