Reforma do Judiciário

Entrevista: Ministro Costa Leite fala sobre reforma do Judiciário

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25 de junho de 1999, 0h00

O presidente em exercício do Superior Tribunal de Justiça, ministro Costa Leite, também se mostra insatisfeito com o relatório da reforma do Judiciário elaborado pelo deputado Aloysio Nunes Ferreira. O atual vice-presidente do STJ é “totalmente contrário” ao tratamento que o parlamentar do PSDB propõe para a Justiça do Trabalho.

Segundo o ministro, a questão chega a ser matemática. “O Brasil não cabe dentro de Portugal. Temos 24 Tribunais Regionais do Trabalho e cinco Tribunais Regionais Federais. Como esses cinco TRFs vão absorver a estrutura dos 24 TRTs?”, questiona.

Para Costa Leite, a solução está numa correção de rumos e não na extinção de uma Justiça “num país onde há sensível carência de prestação jurisdicional”. O ministro é a favor da súmula vinculante e acha que o Judiciário deve possuir um mecanismo de controle, mas esse controle deve ser interno.

Leia a entrevista concedida pelo ministro Costa Leite

A reforma do Judiciário é necessária?

É sim. Há faltas, algumas de ordem estrutural no âmbito do Poder, de maneira que a reforma se justifica. A grande questão reside em encontrarmos os mecanismos corretos para proceder essa reforma, ou seja, mexer naquilo que é essencial, naquilo que vise o aprimoramento da prestação jurisdicional. Este tipo de reforma, a meu juízo, é essencial.

Quais as causas da lentidão da Justiça no Brasil?

Temos várias razões para justificar a lentidão da Justiça. Mas, o que mais se acentua em relação a isso é a própria legislação processual, que permite que uma causa tramite durante longo tempo no Judiciário. Por isso, deve-se pensar também numa reforma da legislação processual para agilizar os trabalhos do Judiciário. Temos também o aspecto estrutural, tanto que hoje existem os Juizados Especiais que estão cumprindo um papel relevantíssimo. Cito, por exemplo, um dado do livro do juiz Luis Felipe Salomão, do Rio de Janeiro, que revela que 65% das ações de competência da Justiça estadual em todo país são resolvidas nos Juizados Especiais. Não tenho dúvidas de que o Brasil, conseguindo implementar esses juizados, vai ter uma Justiça muito mais ágil.

O relatório do deputado Aloysio Nunes vem recebendo críticas pesadas da OAB e da AMB. Qual a sua opinião sobre este relatório de reforma do Judiciário?

O projeto apresentado pelo deputado Aloysio Nunes Ferreira também vem recebendo críticas de outros segmentos. Na verdade, estamos diante de um projeto para ser debatido, discutido, para ser aprimorado. Acredito que seja possível uma correção de rumos, para que tenhamos uma reforma desejada pela população brasileira.

Qual a sua posição em relação à súmula vinculante?

Eu sou favorável. Demandas que se multiplicam versando sobre questões idênticas não podem ficar entulhando os gabinetes nos tribunais. Temos que encontrar uma maneira de resolver isso, sobretudo em relação à administração, porque a administração é de uma litigiosidade impressionante. Quando falo em administração, falo nos três níveis: federal, estadual e municipal. A súmula vinculante não é propriamente para os juízes, porque, hoje, os juízes já observam a súmula. Raramente o juiz julga contra a súmula. Agora, a administração é renitente em relação aos julgados. E pior, continua ingressando em juízo muito embora a questão já esteja definida em todos os seus níveis.

E o controle externo do Judiciário?

Esse é um ponto muito polêmico. Não tenho mais nenhuma dúvida que deve existir um mecanismo de controle em nível nacional. No entanto, o que me parece, é que esse controle deve ser exercido no âmbito do próprio Poder. Não é possível que se tenha um controle externo para o Judiciário. Então vamos ter um controle externo para o Legislativo, um controle externo para o Executivo. O que temos é que aperfeiçoar o controle interno do Judiciário, criando um organismo de nível nacional capaz de uma atuação correicional eficiente. Até uma atuação no campo do planejamento das ações do Judiciário que cuidem da execução orçamentária.

Falemos sobre o fim da Justiça do Trabalho.

Eu sou totalmente contrário. Neste caso, o efeito do remédio é muito pior que a doença. Se existe algum problema na Justiça do Trabalho, se forem detectadas falhas, vamos partir para a correção de rumos, mas não simplesmente extinguir uma justiça num país onde há sensível carência de prestação jurisdicional. Enfim, não se justifica a extinção dos órgãos da Justiça do Trabalho em todos os níveis. Veja bem, o Brasil não cabe dentro de Portugal. Temos 24 Tribunais Regionais do Trabalho e cinco Tribunais Regionais Federais. Como esses cinco TRFs vão absorver toda estrutura dos 24 TRTs? Além disso, a Justiça do Trabalho vem prestando excelentes serviços ao país. Não me parece que a extinção da Justiça do Trabalho seja uma boa idéia.

Os classistas devem ser extintos?

Essa é uma outra questão. Há muito tempo a Associação dos Magistrados Brasileiros, representando o pensamento de toda magistratura, de todos os graus de jurisdição, defende esta posição. Realmente, não se justifica a existência de juízes leigos na Justiça do Trabalho.

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